As implicações da Medida Provisória nº 656/2014 para o adquirente de
imóvel
Por Roberto Santos Silveiro*
Com o propósito de dar maior segurança jurídica ao adquirente de imóvel, no
dia 07 de novembro deste ano passou a vigorar a Medida Provisória nº 656/2014.
Prestigia-se com o ato da Presidente da República, o Princípio da Concentração dos
Atos Registrais, este que nada mais é do que a reunião de todos os eventos jurídicos
referente ao imóvel e ao seu proprietário na matrícula do bem.
Neste sentido, na matrícula imobiliária deverá constar – além dos atos
translativos de propriedade e de instituição de direitos reais – as constrições judiciais
(penhora, arresto, sequestro), a existência de ações reais ou pessoais reipersecutórias,
as restrições administrativas (tombamento, servidões administrativas, etc.), a
existência de comodato, enfim, todas as situações que possam afetar a situação
jurídica do imóvel.
De acordo com a Exposição de Motivos da MP nº 656/2014, a concentração de
todas as informações relevantes ao imóvel na respectiva matrícula visa desburocratizar
os negócios translativos da propriedade no âmbito do mercado imobiliário, oferecendo
maior segurança jurídica sobretudo aos adquirentes de imóveis e agentes
financiadores, que também poderão conceder crédito com menos riscos e de forma
mais célere.
Com efeito, a aquisição de imóvel em nosso País se tornou, ao longo do tempo,
tarefa das mais árduas, exigindo do comprador de imóvel e dos operadores do direito,
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em geral, uma pesquisa aprofundada em diversos foros, comarcas e cartórios com
vistas a avaliar a segurança jurídica do negócio imobiliário pretendido. A MP nº
656/2014 objetiva facilitar as operações imobiliárias, abrandando os riscos de que o
adquirente seja surpreendido pelo direito de terceiros, mormente em face de atos de
constrição oriundo de ações que tramitem em comarcas distintas da situação do
imóvel e do domicílio das partes. Ganha-se, a um só tempo, em celeridade e segurança
jurídica.
Prevê-se, também, que a efetivação e consolidação em nosso sistema jurídico
do Princípio da Concentração dos Atos Registrais possa trazer, a longo prazo,
benefícios diretos e reflexos a toda a cadeia imobiliária, incluindo incorporadores,
construtores e imobiliárias.
Observe-se a título de ilustração, o ciclo virtuoso que pode ser alcançado nas
incorporações imobiliárias. A incorporadora, pelos motivos já expostos, terá mais
segurança nas aquisições imobiliárias dos terrenos, e potencialmente maior facilidade
na assunção de financiamentos bancário para o custeio dos empreendimentos
imobiliários, quiçá em melhores condições. Os agentes financeiros parte integrante de
grande parte dos negócios imobiliários também terão importante incentivo para
aumentar a concessão de crédito aos incorporadores e aos adquirentes de unidades.
Em decorrência de tal fato, os adquirentes de unidades imobiliárias ganharão em
segurança e agilidade. Ou seja, a concentração dos atos na matrícula do imóvel tem a
potencialidade de beneficiar o mercado imobiliário em geral.
Ressalta-se que a Medida Provisória em questão já se encontra em vigor para
os atos jurídicos novos, o que demanda atenção de todos os operadores do direito,
não apenas para aqueles que militam com a área imobiliária. Em relação aos atos
jurídicos ocorridos anteriormente a vigência da MP, esta conferiu o prazo de 02 (dois)
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anos para que sejam adequados aos seus termos, sob pena de inoponibilidade perante
terceiros.
Não obstante os seus méritos, a vigência da Medida Provisória trouxe consigo
uma série de indagações dentre os operadores do direito, sendo saudada por muitos e
duramente criticada por outros. O único consenso que parece haver, até mesmo entre
os seus apoiadores, é sobre a impertinência do tratamento da matéria via Medida
Provisória. Com efeito, além de não ser uma matéria dotada da urgência peculiar a
uma Medida Provisória, é altamente técnica e deve ser tratada com mais esmero, a fim
de que sua redação dialogue adequadamente com as demais normas de Direito
Imobiliário, com o Código de Processo Civil e demais legislações relacionadas a
matéria.
No que tange ao cerne da matéria, as críticas mais contundentes à Medida
Provisória centram o seu ponto de vista na figura do credor, que visualiza nos ativos
imobiliários a segurança jurídica para a efetivação dos seus direitos. É que a MP traz
um ônus imediato aos credores, qual seja o de registar/averbar na matrícula do imóvel
atos relacionados a existência do seu crédito, sob pena de que os negócios jurídicos
que lhe sejam antecedentes tenham plena eficácia, não podendo o credor, em
princípio, alegar evicção.
Sob o ponto de vista prático, ao invés de caber ao adquirente/financiador o
ônus de diligenciar em busca da existência, ou não, de processo judicial tendo como
objeto determinado imóvel sob pena de ficar sujeito a perda do bem (situação anterior
à Medida Provisória), este ônus fica transferido ao credor, que deve dar publicidade da
sua ação, na matrícula do imóvel, sob pena de não mais poder alcançá-lo em caso de
alienação ou oneração de dito bem. É, justamente por isso, que alguns operadores do
direito – certamente mais atentos ao viés de advogados do credor e aos ônus que lhe
são atribuídos – chegaram a nominá-la de “MP do Calote”.
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Ousamos discordar deste entendimento. É possível, aliás, que o credor diligente
possa obter benefícios com a nova ordem legal. Vale atentar, por exemplo, para a
redação do artigo 10º, inciso IV, da Medida Provisória, por força do qual o credor pode
requerer ao juiz da causa a averbação na matrícula do imóvel de ação judicial cujo
resultado possa reduzir seu proprietário à insolvência, sendo esta uma nova forma de
resguardar o direito do autor de demanda judicial para receber o que lhe é devido.
Certo é, no entanto, que a efetividade da norma dependerá e muito do melhor
funcionamento da máquina judiciária, em seu mais amplo sentido, assim
compreendido não somente os cartórios forenses, mas também os ofícios imobiliários.
Para tanto, se faz crucial o melhor aparelhamento do Poder Judiciário, inclusive com a
sua completa informatização e interligação entre os cartórios, abrindo caminho para a
implementação do sistema de registro eletrônico, por meio do qual o fluxo de
informações entre a ordem judicial e o Cartório de Registro de Imóveis seja
instantânea.
Ainda, de nada adiantará todo este aparelhamento informatizado e interligado
do Poder Judiciário se o Cartório Predial não estiver preparado para atender a grande
demanda que está por vir. Em contrapartida ao incremento dos emolumentos que
ingressarão em volume considerável, deverão os Cartório de Registro de Imóveis
investir em treinamento dos seus serventuários, bem como na formação de equipe
capaz de empreender agilidade na execução dos protocolos.
São, obviamente, as primeiras impressões acerca da matéria. Como toda a
legislação que ingressa no mundo jurídico, a sua assimilação será lenta, gradual e
sujeita a reviravoltas. Certamente ainda virão propostas de emendas, críticas e
divergências de entendimento quanto à sua interpretação até que a concentração dos
atos na matrícula do imóvel possa efetivamente dar maior segurança ao mercado
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imobiliário. Até lá, cabe aos operadores do direito atenção e cautela redobradas a fim
de atender adequadamente os interesses dos seus clientes.
Fonte: SILVEIRO, Roberto Santos. “As implicações da
Medida Provisória nº 656/2014 para o adquirente de
imóvel”. Caderno Justiça & Direito, Jornal do
Comércio, 02/12/2014.
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