UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA
CENTRO DE ARTES, HUMANIDADES E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
CARLOS AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA
O CAPITALISMO E O RECÔNCAVO DA BAHIA:
ANÁLISE DO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO ESTALEIRO ENSEADA DO PARAGUAÇU
CACHOEIRA
2014
0
O CAPITALISMO E O RECÔNCAVO DA BAHIA:
ANÁLISE DO PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DO ESTALEIRO ENSEADA DO PARAGUAÇU
CARLOS AUGUSTO OLIVEIRA DA SILVA
BACHAREL EM COMUNICAÇÃO COM HABILITAÇÃO EM JORNALISMO
FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DE FEIRA DE SANTANA, 2010
Dissertação apresentada ao Colegiado do Curso do
Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, como
requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em
Ciências Sociais, na Área de Concentração da
Cultura, Desigualdades e Desenvolvimento.
Orientador: Nilson Weisheimer
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA
MESTRADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
CACHOEIRA – BAHIA – ABRIL DE 2014
1
2
Ficha Catalográfica: Biblioteca Universitária de Cachoeira - CAHL/UFRB
Silva, Carlos Augusto Oliveira da
S586c
O capitalismo e o Recôncavo da Bahia: análise do processo de
implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu / Carlos Augusto
Oliveira da Silva. – Cachoeira, 2014.
353 f. : il. ; 22 cm.
Orientador: Prof. Dr. Nilson Weisheimer.
Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-Graduação em
Ciências Sociais: Cultura, Desigualdades e Desenvolvimento, Centro
EDICATÓRIA
de Artes, Humanidades
e Letras, Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia, 2014.
D
1. Capitalismo. 2. Indústria naval. 3. Estaleiro Enseada do
Paraguaçu. 4. Recôncavo (BA). I. Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia. Centro de Artes, Humanidades e Letras.
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. II. Título.
CDD:
338.981
3
A MINHA AMADA E INESQUECÍVEL MÃE, LUCY OLIVEIRA DA SILVA
(11 de setembro de 1947 – 9 de maio de 2013)
Quando fechos os olhos, lembro-me da ternura; do amor maternal; do sorriso meigo; do
perdão.
Quando choro, lembro-me do amparo; do conselho amigo; do beijo na face, e da fé
inabalável.
Quando penso em uma pessoa que me inspira, ela lá se encontra.
Na minha vida, e na de muitas outras pessoas, minha amada mãe Lucy foi ‘luz’. Agora,
que a matéria não está mais conosco, continua a ser ‘luz’ em espírito. Uma luz de bênção.
Não existem palavras que possam expressar a gratidão que tenho por tudo que minha mãe
me proporcionou, por todo amor que devotou.
A dor da ausência apenas será superada no dia em que puder revê-la, abraçá-la, beijá-la e
dizer, novamente, o quanto a amo.
No momento em que me despedir desta vida, quero ir ao encontro dela para nunca mais
deixá-la. Então, toda dor terá sumido.
Dedico este trabalho a extraordinária mulher, minha mãe, Lucy Oliveira da Silva.
Do filho
Carlos Augusto
(Guto)
Feira de Santana,
16 de abril de 2014.
4
AGRADECIMENTOS
Na jornada da vida encontramos pessoas extraordinárias que nos ensinam a viver e nos
apoiam quando precisamos. Em minha vida tive a ajuda de incontáveis pessoas, apenas
selecionei algumas delas, que de forma direta ou indireta contribuíram para a realização deste
trabalho. Porém, jamais poderia fazê-lo sem a contribuição das incontáveis pessoas, que me
ensinaram os valores necessários à construção digna da vida, e o ideal de sociedade justa.
Aos meus pais, José Augusto Dias da Silva e Lucy Oliveira da Silva (in memoriam);
A minha filha, Carla Patricia de Lacerda Silva;
A minha companheira, Alessandra de Paula Silva;
Aos meus irmãos, Luís Cláudio Oliveira da Silva e José Augusto Dias da Silva;
Aos meus tios, Fernando Oliveira da Silva e Juarez Walter Dias da Silva;
Ao meu primo, Jean Claudio Silva Araújo;
Ao casal, Carlos Alberto Kruschewsky Filho e Rita Kruschewsky;
Ao professor doutor Nilson Weisheimer, por me orientar na condução da pesquisa; e aos
professores doutores Antonio Renildo S. Souza, Herbert Toledo Martins e Sérgio Mattos por
terem contribuído com relevantes críticas ao trabalho acadêmico;
Aos professores da UFRB, Ana Paula C. de Carvalho, Ângela Figueiredo, Bruno Durães,
Diogo Valença, Fernando Pedrão, Rosimeire Guimarães, Osmundo Pinho, e Sérgio Schneider
da UFRGS;
Aos amigos Alberto Peixoto, André Marques, Edmundo Santana Filho, Eliel Paiva,
Genivaldo Oliveira, João Pinho, Joilton Freitas, José Cerqueira de S. Neto, Josse Paulo, Lilia
Campos, Marcus Oliveira, Mauro Cezar Mattos, Sérgio Jones, Valter Vieira, Gilson Carlos S.
Pereira (Gilson Alves, in memoriam), e Victor Behrmann;
A Antônio Bomfim F. Borges, Antônio C. Higino, Audo Rodrigues, Candra Martins de
Almeida, Caroline Azevedo, Eginaldo P. da Silva, João C. da Costa, João Paulo Carvalho,
Marcelo Gentil Espinheira, Marcos André Carneiro, e a comunidade da sede do distrito de São
Roque do Paraguaçu.
5
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Imagem aérea compreendendo o estaleiro da Petrobras, a sede do distrito de São
Roque do Paraguaçu, as obras de construção do EEPSA e a comunidade de Enseada do
Paraguaçu.................................................................................................................................. 21
Figura 2 – Mapa da Reserva Extrativista Marinha Baía do Iguape. .................................. 79
Figura 3 – Imagem aérea de um dos canteiros de obras do EEPSA.................................. 80
Figura 4 – Imagem aérea compreendendo a sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, e
a Ponta do Corujão. .................................................................................................................. 82
Figura 5 – Imagem aérea compreendendo a sede do povoado de Enseada do Paraguaçu, e
as obras de construção do Estaleiro, na Ponta do Corujão. ...................................................... 82
Figura 6 – Imagem aérea do trecho denominado como Costa do Descobrimento. ........... 93
Figura 7 – A imagem aérea apresenta o cercamento do litoral da Baía de Todos os Santos
pelos portos Aratu e Ford, em Candeias; e o Terminal Portuário Cotegipe, em Salvador. .... 104
Figura 8 – Ocupação das margens da Baía de Todos os Santos por loteamentos imobiliários.
Na imagem aérea o condomínio Praia do Sol e o balneário de Cabuçu, em Saubara. ........... 104
Figura 9 – Ocupação das margens da Baía do Iguape por empreendimento imobiliário
privado. ................................................................................................................................... 105
Figura 10 – Ocupação das margens da Baía do Iguape pela comunidade de São Roque do
Paraguaçu, Canteiro da PETROBRAS e Estaleiro Enseada do Paraguaçu, em Maragogipe. 105
Figura 11 – Vista aérea da sede do município de Maragogipe. ....................................... 117
Figura 12 – Vista aérea do território do distrito de São Roque do Paraguaçu. ............... 119
Figura 13 – Vista aérea da sede do distrito de São Roque do Paraguaçu. ....................... 120
Figura 14 – Imagem aérea da sede do distrito de São Roque e do povoado de Enseada do
Paraguaçu................................................................................................................................ 121
6
Figura 15 – Habitações subnormais foram edificadas na zona de mangue de São Roque do
Paraguaçu................................................................................................................................ 121
Figura 16 – Construção de novas habitações de taipa ao lado BR-420........................... 123
Figura 17 – Comunidade de Enseada do Paraguaçu e as obras do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu................................................................................................................................ 125
Figura 18 – Povoado de Enseada do Paraguaçu é formado por remanescentes quilombolas.
................................................................................................................................................ 126
Figura 19 – Remanescentes quilombola de Enseada do Paraguaçu são afetados pela
construção do Estaleiro. .......................................................................................................... 126
Figura 20 – Rodovia BR-420, trecho Maragogipe – São Roque do Paraguaçu. ............. 129
Figura 21 – Mapa com as ligações rodoviárias de São Roque do Paraguaçu. ................ 130
Figura 22 – Perfil da estrutura da PETROBRAS e posição no mercado global. ............ 140
Figura 23 – Mapa com a delimitação das áreas de proteção ambiental compreendendo a
Baía de todos os Santos e Baía do Iguape. ............................................................................. 178
Figura 24 – Mapa apresenta as áreas impactadas pela construção e operação do estaleiro.
................................................................................................................................................ 191
Figura 25 – Imagem aérea registra estágio de conclusão das plataformas P-59 e P-60. . 204
Figura 26 – Imagem aérea demonstra estrutura Canteiro de Obras de São Roque do
Paraguaçu................................................................................................................................ 205
Figura 27 – Representação gráfica da estrutura do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. .... 206
Figura 28 – Reprodução de 4 páginas do Plano Estratégico Interativo de Comunicação
Social. ..................................................................................................................................... 232
Figura 29 – Boletim Informativo sobre execução de Oficina de Comunicação Social... 234
Figura 30 – Reprodução da página 11 do Relatório Institucional nº 4. ........................... 238
Figura 31 – Reprodução de páginas do jornal institucional ‘Navegando Juntos”. .......... 240
Figura 32 – Fotocomposição a partir de 3 imagens de folhetos apensos no inquérito do MP
sobre o EEPSA. ...................................................................................................................... 264
7
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Hierarquia dos atores pesquisados. ................................................................ 54
Gráfico 2 – Comparativo com indicadores de analfabetismo de Maragogipe e do Brasil.
................................................................................................................................................ 115
Gráfico 3 – Indicadores de GINI de Maragogipe compreendendo o período de 1991, 2000
e 2010. .................................................................................................................................... 116
Gráfico 4 – Evolução do Gini no Brasil no período de 1995 a 2009. ............................. 163
Gráfico 5 – Percentual da cidade de origem dos trabalhadores do Consórcio Construtor.
................................................................................................................................................ 214
Gráfico 6 – Organograma do Plano de Gestão Ambiental (PGA). ................................. 230
8
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Medidas Mitigadoras estabelecidas no EIA/RIMA (2009). ............................ 27
Tabela 2 – Síntese da Análise de Conteúdo e Análise do Discurso .................................. 37
Tabela 3 – Publicações oficiais. ........................................................................................ 43
Tabela 4 – Relação de publicações na mídia. .................................................................... 45
Tabela 5 – Relação de registros fotográficos realizados durante pesquisa. ...................... 49
Tabela 6 – Indicadores de IDHM e renda per capita do Brasil e de seis municípios da Baía
de Todos os Santos, compreendendo o período de 1991, 2000 e 2010. ................................. 108
Tabela 7 – Dados demográfico referente ao município de Maragogipe e distritos. ........ 118
Tabela 8 – Principais políticas públicas de incentivo ao desenvolvimento da indústria de
Petróleo e Gás no Brasil. ........................................................................................................ 154
Tabela 9 – Cronograma para implementação do Programa de Comunicação Social...... 200
Tabela 10 – Síntese da entrevista aberta com membros da comunidade sobre a relação
dialética com os capitalistas. .................................................................................................. 249
9
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABDI – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial
ADA – Área Diretamente Afetada
AFRMM – Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante
AID – Área de Influência Direta
AII – Área de Influência Indireta
ANP – Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis
BCB – Banco Central do Brasil
BCE – Banco Central Europeu
BF – Bolsa Família
BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
BM – Banco Mundial
BMA – Biomonitoramento e Meio Ambiente Ltda.
BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social
BTS – Baía de Todos os Santos
CEAO – Centro de Estudos Afro-Orientais
CEB/1989 – Constituição Estadual da Bahia (1989)
CEP – Consórcio Estaleiro Paraguaçu
CF/1988 – Constituição Federal de 1988
CGTMO – Coordenação Geral de Transportes, Mineração e Obras Civis
CIA – Central Intelligence Agency (Agência Central de Inteligência dos EUA)
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho
CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente
COTRA – Coordenação de Transportes
10
CRFB – Constituição da República Federativa do Brasil
CRP – Consórcio Rio Paraguaçu
DESENVOLVE – Programa de Desenvolvimento Industrial e de Integração Econômica do
Estado da Bahia
DILIC – Diretoria de Licenciamento Ambiental
DNIT – Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes
DOU – Diário oficial da União
E&P – Exploração e Produção
EEP Participações S.A. – Estaleiro Enseada do Paraguaçu Participações S.A.
EEPSA – Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A.
EIA – Estudo de Impacto Ambiental
EIA/RIMA – Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto do Meio Ambiente
E-mail – Palavra inglesa, redução de electronic mail, correio eletrônico
EMBASA – Empresa Baiana de Água e Saneamento S.A.
EUA – Estados Unidos da América
FHC – Fernando Henrique Cardoso
FJP – Fundação João Pinheiro
FMI – Fundo Monetário Internacional
FMM – Fundo da Marinha Mercante
FPC – Fundação Pedro Calmon
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IDHAD – Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade
IDHM – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
IPAC – Instituto do Patrimônio Artístico Cultural da Bahia
11
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
JK – Juscelino Kubitschek
KHI – Kawasaki Heavy Industries
LI – Licença de Implantação
LP – Licença Prévia
MME – Ministério de Minas e Energia
MPC – Modo de Produção Capitalista
MPE/BA – Ministério Público do Estado da Bahia
MPEs – Micro e Pequenas Empresas
MPF – Ministério Público Federal
MPU – Ministério Público da União
NBTS – Núcleo de Defesa da Baía de Todos os Santos
ONU – Organização das Nações Unidas
P&G – Petróleo e Gás
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PCS – Programa de Comunicação Social
PDS – Partido Democrático Social
PEA – População Economicamente Ativa
PEA – Programa de Educação Ambiental
PEICS – Plano Estratégico Interativo de Comunicação Social
PETROBRAS – Petróleo Brasileiro S.A.
PGA – Plano de Gestão Ambiental
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PRN – Partido da Reconstrução Nacional
12
PROMEF I e II – Programas de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro I e II
PROMINP – Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural
PRONAVAL – Programa Estadual de Incentivos à Indústria da Construção Naval
PSD – Partido Social Democrático
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PT – Partido dos Trabalhadores
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
RDH – Relatório de Desenvolvimento Humano
REPETRO – Regime Aduaneiro Especial de Exportação e Importação de Bens Destinados
à Exploração e à Produção de Petróleo e Gás Natural
RESEX – Reserva Extrativista Marinha
RIMA – Relatório de Impacto ao Meio Ambiente
RLAM – Refinaria Landulpho Alves – Mataripe
RMS – Região Metropolitana de Salvador
RNB – Renda Nacional Bruta
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SEC – Secretaria de Educação
SEDUR – Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia
SEINP – Secretaria da Indústria Naval e Portuária do Estado da Bahia
SETRE – Secretaria de Trabalho, Emprego, Renda e Esporte
SICM – Secretaria da Indústria, Comércio e Mineração do Estado da Bahia
SNUC –Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
SUDIC – Superintendência de Desenvolvimento Industrial e Comercial da Bahia
TRANSPETRO – Petrobras Transporte S/A.
UDN – União Democrática Nacional
UFBA – Universidade Federal da Bahia
13
UFRB – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia
US$ – Dólar
14
SUMÁRIO
Lista de Figuras................................................................................................. 6
Lista de Gráficos............................................................................................... 8
Lista de Tabelas................................................................................................. 9
Lista de Abreviaturas e Siglas.......................................................................... 10
Resumo.............................................................................................................. 19
1 Introdução .......................................................................................................... 21
1.1 Apresentação do tema e delimitação do problema de pesquisa .................................. 22
1.2 Fundamentos Epistemológicos.................................................................................... 29
1.3 Problema ..................................................................................................................... 33
1.4 Objetivos Geral e Específicos...................................................................................... 33
1.5 Hipótese ...................................................................................................................... 33
1.6 Método ........................................................................................................................ 34
1.6.1
O método quantitativo ................................................................................................................34
1.6.2
O método qualitativo ..................................................................................................................35
1.6.3
Análise de Conteúdo e Análise do Discurso ..............................................................................36
1.7 Procedimentos operatórios .......................................................................................... 39
1.7.1
Pesquisa e análise bibliográfica .................................................................................................40
1.7.2
Pesquisa documental .................................................................................................................41
1.7.3
Observação Participante ............................................................................................................49
1.7.4
Entrevista em Profundidade .......................................................................................................50
1.8 Análise da Medida Mitigadora Número 40 ................................................................... 59
1.9 Estrutura dos capítulos ................................................................................................ 60
2 Análise marxista sobre a globalização e o avanço do Império no Recôncavo
da Bahia ................................................................................................................... 64
2.1 O pensamento marxista e as crises do capital ............................................................ 64
2.2 A Globalização e a mudança no modo de acumulação capitalista ............................... 69
2.3 Conceitos e características do ‘Modo de Produção Capitalista’ ................................... 69
2.4 Arrighi e os ‘ciclos sistémicos de acumulação’ ............................................................ 70
2.5 Do Imperialismo ao Império ......................................................................................... 71
2.6 A transição do Fordismo para Acumulação Flexível .................................................... 74
2.7 O capital e as modificações nos espaços físico e social .............................................. 78
15
2.7.1
A despossessão da massa.........................................................................................................81
2.8 Políticas Públicas e os processos de Accountability e Empowerment ......................... 83
2.8.1
Accountability e a necessidade de transparência das ações do Estado e dos capitalistas ......85
2.8.2
Empowerment e a opinião pública como forma de emancipação .............................................86
2.9 Do pensamento marxista às políticas públicas, uma síntese ....................................... 87
3 A constituição do Recôncavo da Bahia: da acumulação primitiva ao
desenvolvimento do capital petrolífero, e os reflexos sobre as comunidades
tradicionais .............................................................................................................. 89
3.1 O amálgama do povo brasileiro ................................................................................... 90
3.2 O encontro de povos e o surgimento do Brasil ............................................................ 91
3.3 Característica histórica pré-colonial do povoamento no Recôncavo da Bahia ............. 93
3.4 O processo histórico de exploração, povoamento e miscigenação do Recôncavo da
Bahia ................................................................................................................................... 94
3.5 A expansão mercantilista no Recôncavo da Bahia ...................................................... 97
3.6 A escravidão como elemento do trabalho compulsório ................................................ 99
3.7 A expansão do capital petrolífero no Recôncavo da Bahia ........................................ 102
3.8 Características históricas de Maragogipe .................................................................. 109
3.8.1
Características socioeconômicas de Maragogipe ................................................................... 111
3.8.2
Os impactos do capital petrolífero nos indicadores de Gini e IDHM de Maragogipe .............. 114
3.8.3
Características históricas e socioeconômicas de São Roque do Paraguaçu .......................... 117
3.8.4
As associações e a comunidade remanescente quilombola em São Roque do Paraguaçu ..124
3.8.5
O sistema de transporte de São Roque do Paraguaçu ...........................................................128
3.9 A dívida histórica do Estado com os povos tradicionais da Baía de Todos os Santos 131
3.10 Sociedade senhorial e desenvolvimento capitalista ................................................. 132
4 A expansão capitalista no Brasil: a disputa entre modelos de
desenvolvimento e o setor de petróleo e gás ..................................................... 134
4.1 Brasil, da acumulação primitiva ao capitalismo.......................................................... 135
4.2 Os governos de Getúlio Vargas e o estabelecimento da ideologia capitalista............ 139
4.3 Juscelino Kubitschek e a Ditadura Militar .................................................................. 141
4.4 A redemocratização e o avanço do neoliberalismo .................................................... 145
4.5 Os governos FHC e Lula – Dicotomias na economia política .................................... 146
4.6 Governo Lula – reforma gradual e pacto conservador ............................................... 148
4.7 Uma nova Política Pública para o desenvolvimento do setor de petróleo e gás ........ 150
4.8 PROMINP – a organização da cadeia de valor e o Estaleiro Enseada do Paraguaçu 153
4.9 O Império e a pressão ideológica através da mídia ................................................... 158
4.10 A evolução do Gini .................................................................................................. 163
4.11 Capitalismo, dominação ideológica e desenvolvimento humano no Brasil ............... 166
16
5 A dialética estabelecida entre Estado, capitalistas e a comunidade de São
Roque do Paraguaçu ............................................................................................ 168
5.1 A dialética do Estado ................................................................................................. 169
5.1.1
O Estado como indutor do desenvolvimento ...........................................................................170
5.1.2
O Estado Nacional e a Política Pública para o Petróleo e Gás ...............................................171
5.1.3
O Estado da Bahia e a Política Pública para o setor naval .....................................................173
5.1.4
O Estado e a dialética estabelecida com os capitalistas e a comunidade ..............................181
5.1.5 O Estado e a dialética estabelecida com a comunidade a partir da perspectiva do
licenciamento do Estaleiro ...................................................................................................................182
5.1.6
O Estado, o EIA/RIMA (2009) e o Programa de Comunicação Social ....................................190
5.1.7
O Estado, o Império e ampliação da superexploração e a manutenção do subproletariado ..201
5.2 A dialética dos capitalistas......................................................................................... 202
5.2.1
Os capitalistas e o Estaleiro Enseada do Paraguaçu ..............................................................202
5.2.2
Os capitalistas, o Estado, e a celebração da aliança com o Estado ....................................... 211
5.2.3
Os capitalistas, o Programa de Comunicação Social, e a Medida Mitigadora nº 40 ...............217
5.3 Análise dos documentos concernentes à Medida Mitigadora nº 40 ........................... 226
5.3.1
O Estaleiro e o Plano Estratégico de Comunicação Social .....................................................227
5.3.2
O Estaleiro e o Boletim sobre os programas socioambientais ................................................233
5.3.3
O Estaleiro e o Relatório Institucional nº 4 ...............................................................................237
5.3.4
O Estaleiro e o jornal institucional ............................................................................................239
5.4 A dialética da comunidade......................................................................................... 242
5.4.1
A comunidade de São Roque do Paraguaçu e a dialética estabelecida com o Estado ..........243
5.4.2
A comunidade de São Roque do Paraguaçu e a dialética estabelecida com os capitalistas ..248
5.5 O Estado e a fiscalização da Medida Mitigadora nº 40 e as condicionantes do
Licenciamento Ambiental ................................................................................................... 252
5.5.1 A Secretaria da Indústria Naval e Portuária da Bahia e o acompanhamento do EIA/RIMA
(2009) 253
5.5.2 O Ministério Público Federal, a fiscalização do EIA/RIMA (2009) e o cumprimento do
Licenciamento Ambiental .....................................................................................................................256
5.5.3 O Ministério Público Estadual, a fiscalização do EIA/RIMA (2009) e o cumprimento do
Licenciamento Ambiental .....................................................................................................................260
5.5.4 O IBAMA, a fiscalização do EIA/RIMA (2009) e o cumprimento do Licenciamento
Ambiental..............................................................................................................................................265
5.6 A supremacia do Império através da dialética da superexploração e degradação
ambiental ........................................................................................................................... 268
6 Conclusões ....................................................................................................... 270
7 Bibliografia ....................................................................................................... 284
8 Anexos .............................................................................................................. 297
8.1 Nota explicativa sobre a pesquisa apresentada aos gestores públicos ..................... 298
8.2 Roteiro de entrevista estruturada aberta com gestores públicos ............................... 301
17
8.3 Roteiro de entrevista estruturada aberta com capitalistas ......................................... 303
8.4 Roteiro de entrevista estruturada aberta com a comunidade ..................................... 305
8.5 Tabela explicita o modelo de análise das entrevistas ................................................ 308
8.6 Ata de Audiência Pública realizada em Maragogipe (2008) ....................................... 309
8.7 EIA/RIMA – Medias Mitigadoras (2009, p. 74 a 81) ................................................... 314
8.9 EIA/RIMA (2009, v. 8) – Programa de Gestão Ambiental (PGA) ................................ 318
8.10 EIA/RIMA (2009, v. 8) – Programa de Educação Ambiental (PEA) .......................... 320
8.11 EIA/RIMA (2009, v. 8) – Programa de Comunicação Social (PCS) .......................... 322
8.12 IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.................................................................... 324
8.13 IBAMA – Licença Previa Nº 354/2010 ..................................................................... 327
8.14 IBAMA – Licença de Instalação Nº 737/2010........................................................... 331
8.15 Fundação Cultural Palmares – Parecer Nº 11/DPA/FCP/MinC/2010 ....................... 334
8.16 Portal da Transparência detalha transferência de recursos da União para o Estaleiro
Enseada do Paraguaçu ..................................................................................................... 338
8.17 Publicação do Diário Oficial da União do Ato Declaratório Executivo Nº 18 da Receita
Federal .............................................................................................................................. 339
8.18 EEPSA – lançamento da pedra fundamental em julho de 2012 ............................... 340
8.19 Relatório da Odebrecht S.A. sobre o Estaleiro Ensedada do Paraguaçu (2013) ..... 342
8.20 Relatório Institucional nº 4 do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA, 2013) ..... 343
8.21 Cópia do requerimento de informações encaminhado ao IBAMA ............................ 346
8.22 Composição acionária do Consórcio Construtor ...................................................... 347
8.23 Diário de pesquisa ................................................................................................... 348
18
RESUMO
O processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S/A,
empreendimento localizado no distrito de São Roque do Paraguaçu, em Maragogipe, Bahia,
conformou novas relações de produção, estabelecidas a partir da dialética entre Estado,
capitalistas e a comunidade. A dissertação objetiva analisar a dinâmica de implantação e
operação do Estaleiro, a partir da análise materialista dialética e histórica estabelecida entre os
atores, reveladas através da pesquisa e análise do processo de implantação da Medida
Mitigadora Nº 40. A hipótese levantada é de que: na relação entre os atores prevalece os
interesses da atuação conjunta entre capitalistas e o Estado Nacional, em detrimento das
populações locais, de tal modo que no processo de implantação e operação do Estaleiro não
sejam cumpridas as condicionantes legais estabelecidas no EIA/RIMA (2009), através da
Medida Mitigadora nº 40. Isto ocorre por três motivos: correlação de forças entre os atores,
Estado e capitalistas; desconhecimento da população local, em decorrência do descumprimento
da Medida Mitigadora, e da falta de Accountability e Empowerment; e cumplicidade dos órgãos
estatais que deveriam fiscalizar o cumprimento das Medidas. A pesquisa identificou que o
Programa de Comunicação Social determinado pela Medida Mitigadora nº 40 não foi
implementado, ocorrendo o descumprimento de condicionante da Licença de Instalação nº
737/2010, levando ao comprometimento do conjunto de medidas destinadas ao meio
socioeconômico, que tem por finalidade mitigar os efeitos negativos e potencializar os efeitos
positivos da implantação do Estaleiro. Conclui-se que as comunidades situadas na Área de
Influência Direta (AID) – compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida
e Saubara; e na Área de Influência Indireta (AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira,
São Félix e Itaparica, mantêm baixos níveis de desenvolvimento social, em decorrência do
descumprimento da Medida Mitigadora Nº 40, e da condicionante da Licença de Instalação nº
737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social.
Palavras-chave: capitalismo, indústria naval, medidas mitigadoras, Recôncavo da Bahia.
19
ABSTRACT
The process of implementation and operation of the yard do Paraguaçu Cove S/A, venture
in the District of São Roque do Paraguaçu, in Kingston upon Hull, Bahia, formed new
relationships of production, established from the dialectic between State capitalists and the
community. The dissertation aims to analyze the dynamics of deployment and operation of the
site, from the materialist dialectic and historical analysis established between actors, revealed
through the research and analysis of the process of Mitigation Measure implementation
paragraph 40. The hypothesis is that: on the relation between the actors prevails the interests of
joint action between capitalists and the National State, to the detriment of local populations, so
that in the process of implementation and operation of the yard are not fulfilled the legal
requirements set out in the EIA/RIMA (2009) through the Mitigation Measure No. 40. This
occurs for three reasons: correlation of forces between the actors, and capitalist State; ignorance
of the local population, as a result of non-compliance with the Mitigation Measure, and the lack
of Accountability and Empowerment; and complicity of State organs should monitor
compliance with the measures. The research identified that the Social communication
programme determined by the Mitigation Measure n° 40 was not implemented, the breach of
condition of the installation license nº 737/2010, leading to impairment of the set of measures
to the socioeconomic, which aims to mitigate the negative effects and maximize the positive
effects of the implantation of the Shipyard. It is concluded that the communities located in the
area of direct influence (IDA) – comprising the municipalities of Kingston upon Hull, Salinas
and Daisy Saubara; and in the area of Indirect Influence (AII) – comprising the municipalities
of waterfall, São Félix and Itaparica, maintain low levels of social development, as a result of
non-compliance with the Mitigation Measures paragraph 40, and the condition of the
installation license nº 737/2010 establishing the Social communication programme.
Keywords: capitalism, naval industry, mitigating measures, Recôncavo da Bahia.
20
1 INTRODUÇÃO
O capital tem de criar um cenário adequado para suas
próprias necessidades – uma segunda natureza construída à sua
própria imagem – em um dado momento, só para revolucionar a
paisagem em um momento posterior, a fim de acomodar uma
maior acumulação numa taxa composta. (HARVEY, 2011, p. 76)
O objetivo desta dissertação é analisar a partir da perspectiva de dialética entre – Estado,
capitalistas, e a comunidade – como ocorre o processo de implantação e operação do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu S/A (EEPSA). Empreendimento que se encontra em fase de implantação
e operação às margens do Rio Paraguaçu, na Ponta do Corujão1, distrito de São Roque do
Paraguaçu, município de Maragogipe, Estado da Bahia (CIVIL 2010, p.121). A imagem a
seguir ilustra a localização do empreendimento:
Figura 1 – Imagem aérea compreendendo o estaleiro da Petrobras, a sede do distrito de São Roque do
Paraguaçu, as obras de construção do EEPSA e a comunidade de Enseada do Paraguaçu.
Fonte: Produção Própria (2013).
Ponta do Corujão – Área caracteriza pela topografia relativamente plana, com fitofisionomia alterada por cultivos e
áreas antropizadas. Apresenta alguns remanescentes de matas, extensos apicuns e manguezais acompanhando o curso do
Rio Baetantã. (EIA/RIMA, 2009, V. 5, p. 192)
1
21
No primeiro plano da imagem aérea (Figura 1) são observados o Canteiro de Obras de São
Roque do Paraguaçu (COSRP), de propriedade da Petrobras. Parte do Canteiro foi arrendado
ao Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEP). Ainda no primeiro plano, ao lado do Canteiro, fica
a sede do distrito de São Roque do Paraguaçu. No segundo plano, na margem oposta ao Rio
Baetantã, são erguidas as edificações do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Ao lado do
Empreendimento fica a sede do povoado de Enseada do Paraguaçu.
O Estaleiro Enseada do Paraguaçu foi projetado para ocupar uma área de aproximadamente
150,68 hectares, dos quais aproximadamente 37,67 hectares são destinados a área de Reserva
Legal (EIA/RIMA, 2009, p. 8). Na fase de implantação do empreendimento, “estão previstos
cerca de 3.900 empregos diretos para a construção das instalações prediais e industriais, além
das áreas operacionais” (EIA/RIMA, 2009, p. 12).
O empreendimento tem o objetivo de construir embarcações de grande porte, navios de
produção de petróleo e gás natural. Também objetiva construir barcos militares, barcos
especiais para apoio às atividades de perfuração e produção de petróleo, além de equipamentos
especiais para a indústria do petróleo e mineração (EIA/RIMA, 2009, p. 9).
1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA E DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA
O processo de implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu conformou novas relações
de produção entre a comunidade de São Roque do Paraguaçu2, a empresa capitalista, e o Estado
– responsável pela política de desenvolvimento da indústria naval. Esta relação dialética gera
conflito e completariedade, levando a dois questionamentos iniciais: Como um
empreendimento que utiliza elevado volume de capital e trabalho, além de tecnologia avançada,
está sendo introduzido em uma comunidade marcada por uma produção de subsistência,
baseada na pesca artesanal e na agricultura familiar? A partir desta relação, de que maneira o
Estado tem atuado no sentido de mitigar os aspectos negativos e potencializar os aspectos
positivos da implantação do estaleiro?
Para analisar o processo de implantação do estaleiro e as implicações decorrentes é
necessário observar uma realidade social multideterminada. Inicialmente, foram procedidas
análises documentais como base no licenciamento prévio ambiental, conforme a Licença Prévia
2
A atividade de pesca tradicional e a coleta de mariscos estão bastante disseminadas em todas as comunidades da região
estudada, desde aquelas onde a atividade industrial é forte, como São Roque do Paraguaçu, até as que estão voltadas para
atividades turísticas e de veraneio, como Saubara e Salinas da Margarida (EIA/RIMA, 2009, p. 42).
22
Nº 354/20103, Licença de Instalação Nº 737/20104 e o Parecer Técnico Nº 042/20105, ambos
emitidos pelo IBAMA6. Também foram analisados o conjunto de documentos que conformam
o Estudo de Impacto Ambiental7 e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA, 2009) do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA), produzidos pela Superintendência de
Desenvolvimento Industrial e Comercial da Bahia (SUDIC). Sendo examinado o processo de
implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A. toma como base a sequência
de determinações do EIA/RIMA (2009).
O estudo EIA/RIMA (2009, p. 59) foi produzido por uma equipe multidisciplinar de
profissionais de diversas áreas do conhecimento: geólogos, geógrafos, engenheiros, biólogos,
sociólogos, economistas e arqueólogos, e teve por finalidade diagnosticar e relatar os impactos
que a implantação do estaleiro pode provocar nos três meios: físico, biótico e socioeconômico.
Conforme relatório, “a ocorrência de impactos está concentrada no meio socioeconômico,
seguido pelo biótico, e em menor grau pelo meio físico.”.
Para compreender a dimensão da complexidade do estudo, observa-se que foram
necessários oito volumes de documentos. Uma das mais importantes contribuições desse estudo
são as definições e atribuições do Plano de Gestão Ambiental (PGA) formado pelo conjunto de
26 programas que visam dar sustentabilidade socioambiental ao empreendimento (EIA/RIMA
2009, p. 68). Também foram definidas Medidas Mitigadoras8:
Com base nessa análise dos dados, verificou-se que os benefícios trazidos pela
implantação do empreendimento superam os possíveis impactos negativos, desde que
sejam implementadas todas as medidas mitigadoras e programas identificados ao
longo da avaliação de impactos... Ao todo foram identificadas 54 (cinquenta e quatro)
medidas mitigadoras, para reduzir os efeitos negativos e melhorar os positivos
(EIA/RIMA, 2009, p. 59 e 69).
Ver Anexo 8.13 – IBAMA – Licença Previa Nº 354/2010.
Ver Anexo 8.14 – IBAMA – Licença de Instalação Nº 737/2010.
5 Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
6 O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) tem como principais atribuições
exercer o poder de polícia ambiental; executar ações das políticas nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições
federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos
naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental; e executar as ações supletivas de competência da União de
conformidade com a legislação ambiental vigente.”. Conforme Lei nº 11.516, de 28 de agosto de 2007. (IBAMA, 2014)
7 Impacto ambiental é qualquer alteração significativa no meio ambiente, em um ou mais dos seus componentes (água,
ar, solo, fauna, flora, populações, etc.), provocada pela ação humana. Os estudos ambientais realizados para o Estaleiro
do Paraguaçu tiveram o objetivo de avaliar de que maneira o empreendimento impactará o ambiente e, a partir disso,
propor ações, planos e programas destinados a minimizar, monitorar, compensar ou potencializar tais impactos, positivos
ou negativos, para que dessa maneira o empreendimento seja ambientalmente viável. (EIA/RIMA, 2009, p. 54)
8As Mediadas Mitigadoras foram definidas a partir dos estudos elaborados e apresentados no EIA/RIMA (2009). Elas
objetivam propor ações com a finalidade de prevenir, mitigar, monitorar, compensar os impactos negativos, além de
potencializar os impactos positivos, durante o processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Para cada Medida Mitigadora é determinado componente ambiental afetado, a fase do empreendimento em que devem
ser implementada, se tem caráter preventivo ou corretivo, a eficácia esperada, o agente executor e a indicação do
cronograma das medidas segundo a duração do impacto. (EIA/RIMA, 2009, p. 7)
3
4
23
Utilizando o conceito de ‘Análise de Conjuntura’, proposto por Souza (2012), pode-se
afirmar que a implantação do EEPSA se configura como um acontecimento por adquirir um
sentido especial para o Estado, os capitalistas, e a comunidade local, modificando o cenário,
com relação as estruturas e relações de forças de várias comunidades, conforme citado a seguir:
Com o objetivo de aproveitar essas oportunidades e a alta demanda de embarcações
para atender a indústria de petróleo e correlatas, o Governo do Estado planejou trazer
um novo ciclo de desenvolvimento para a região do Recôncavo Sul, particularmente
a região englobada pelos municípios de Cachoeira, São Félix, Maragogipe, Salinas da
Margarida e Saubara. Além de ser um local que apresenta as condições necessárias
para a implantação de um estaleiro, também foi levada em consideração a alta carência
social e econômica dessas localidades, desde o desmantelamento da indústria do
fumo, na década de 70. A implantação do estaleiro no Estado da Bahia, além de ativar
a economia da região, gera empregos diretos e indiretos, e consolida a indústria naval
no Estado, capaz de movimentar de modo significativo a economia estadual.
(EIA/RIMA, 2009, p. 9-10).
Analisando a citação, pode-se inferir que com a implantação do estaleiro são modificadas
relações historicamente construídas nas comunidades de seis municípios baianos: Maragogipe,
Salinas da Margarida, Saubara, Cachoeira, São Félix e Itaparica. Retornando a Souza (2012, p.
19), ele também afirma que “é importante relacionar a conjuntura com os elementos mais
permanentes, mais estruturais da realidade e levar em conta as dimensões locais, regionais,
nacionais e internacionais da realidade.”. Neste sentido, busca-se articular uma análise que
explique a dinâmica de implantação do estaleiro a partir de uma perspectiva global do capital.
Nota-se que a composição acionária da EEPSA é formada por capital nacional e
internacional, sendo distribuída da seguinte forma: 70% do capital é controlado EEP
Participações S.A. (Odebrecht, 50%; UTC, 25% e OAS, 25%) e 30% do capital pertence a
Kawasaki Heavy Industries (EEPSA, 2013) e (Kawasaki, 2013). Desta composição pode-se
confirmar a atualidade das análises de Souza:
O sistema do capital mundial se constitui no pano de fundo do processo econômico,
social e político que se desenvolve em nosso país. O sistema do capital mundial não
determina todos os acontecimentos de nossa realidade, mas seguramente ele é um
elemento condicionante do conjunto dos acontecimentos que definem o nosso
processo histórico. Neste sentido, é fundamental ter uma ideia global de suas
características e das formas concretas através das quais a realidade está relacionada a
este sistema. (SOUZA, 2012, p.19)
Observa-se que a questão traz dois componentes que definem o empreendimento como
parte do processo de globalização do capital: a composição acionária e a finalidade econômica
do estaleiro. Como afirma Souza (2012, p. 19), as empresas transnacionais são a ponta avançada
do capitalismo contemporâneo. Elas se caracterizam pelo uso da tecnologia avançada, pela
capacidade produzir bens sofisticados em volume e nível mundial.
24
A finalidade do uso do conceito de Análise de Conjuntura foi reduzir o conjunto das
multideterminações que conformam o fenômeno, a uma parcela apreensível da realidade social,
possibilitando análise e documentação do fenômeno em maior profundidade, conduzindo a
conclusões mais concretas e objetivas.
O primeiro documento analisado foi a ‘Licença Prévia Nº 354/20109, emitida pelo IBAMA.
Nele são listadas condições gerais e condições especificas para implantação. No item 2.22 foi
definido que o estaleiro deveria apresentar, detalhadamente, um Programa de Comunicação
Social (PCS), propor metas, caracterizar o público a ser atingido e o tipo de mídia a ser utilizada
(IBAMA, 2010 a, p.3).
Dando sequência a análise, foi verificado o segundo documento emitido pelo IBAMA, o
Parecer Técnico Nº 042/201010, que relata:
Aponta-se, como impacto negativo, a possibilidade de que a implantação do
empreendimento venha a gerar uma “concentração de habitações subnormais na
periferia dos centros urbanos, principalmente no entorno do distrito de São Roque do
Paraguaçu e Enseada (Maragogipe) e distrito de Cairu em Salinas da Margarida...”
Apresenta-se como medida mitigadora a contratação de mão de obra local e a
implementação dos Programas de Comunicação Social (que informe sobre os perfis
demandados para os empregos) e de Valorização da produção local (na perspectiva de
geração de empregos indiretos). De fato, é de se esperar que um empreendimento de
tal porte venha gerar um processo de migração interna e consequente favelização das
periferias urbanas, na medida em que o desemprego na região é um dado concreto de
realidade. Além do mais não se tem garantia de existência, na região, do tipo (e
quantidade) de mão de obra que será demandado pelo empreendimento. Nesta
perspectiva é que se avalia que as medidas propostas são insuficientes para fazer frente
a esta situação, podendo, quando muito, minimizá-la. Neste sentido é importante que
sejam definidas medidas concretas – além das já referidas – que, em conjunto com as
diferentes instituições envolvidas com a questão do uso e ocupação do solo urbano,
busquem a prevenção e equacionamento desta questão (IBAMA, 2010 b, p. 22).
Observa-se que no mesmo documento, emitido pelo IBAMA, ficou definido que:
O Programa de Comunicação Social apresentado tem os objetivos específicos
condizentes com a necessidade de informar a população sobre o que é o
empreendimento, os riscos previstos os possíveis impactos e benefícios de forma que
a população esteja sempre informada sobre todas as fases da construção e operação.
(IBAMA, 2010 b, p. 23).
O projeto executivo deverá ser apresentado com a proposta detalhada com metas e
ações discriminadas, caracterizando-se o público a ser atingido e o tipo de mídia a ser
utilizada para esse público. (IBAMA, 2010 b, p. 23).
Sugerimos que na fase de implantação a comunicação se faça massiva com
informações sobre o estaleiro, os possíveis impactos ao meio ambiente e a sociedade
do entorno e os cuidados que as populações residentes nas áreas mais atingidas devem
ter. (IBAMA, 2010 b, p. 23).
9
Ver Anexo 8.13 – IBAMA – Licença Previa Nº 354/2010.
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
10
25
Os materiais de divulgação deverão ser apresentados ao Ibama para aprovação e deve
constar o nome do Ibama e a informação de que o programa trata do cumprimento de
uma condicionante do processo de licenciamento. (IBAMA, 2010 b, p. 23).
No caso de se ter pensado em capacitações o projeto do curso deve conter a ementa,
tipo de público, objetivo, carga horária e material de apoio. Chamamos a atenção que
o programa de comunicação social deve ter como público preferencial as populações
das comunidades do entorno do empreendimento (IBAMA, 2010 b, p. 23).
O IBAMA (2010b, p. 24) define o Programa de Educação Ambiental como um elemento
que deve compor o PCS, cumprindo o objetivo da promoção da Educação Ambiental Difusa.
Por último, foi analisado o EIA/RIMA (2009, v. 5, p. 79), que estabelece que um Programa de
Comunicação Social deve promover junto às “comunidades das áreas de abrangência direta e
indireta do empreendimento, processos de informação e educomunicação1112 que promovam a
difusão de uma cultura de paz e sustentabilidade, assim como a segurança das comunidades no
ambiente onde vivem e na convivência com o Empreendimento”. O EIA/RIMA (2009) também
estabelece um conjunto de 54 Medidas Mitigadoras, contemplando os meios socioeconômico,
biótico, e físico.
Após análises das medidas mitigadoras, foram identificadas 10 medidas socioeconômicas,
que possuem correlação com o PCS. Sendo listadas na tabela a seguir:
CONJUNTO DE MEDIDAS MITIGADORAS INTER-RELACIONADAS COM A MEDIDA Nº 40
Medida
Nome da medida
Descrição
Nº 19
Capacitação de pessoas
Criar convênios de capacitação de pessoal das obras em
para o setor terciário.
empreendimentos do setor terciário (comércio e serviços),
visando a sua possível utilização nesse setor.
Nº 29
Programa
de
Alfabetização.
Programa voltado para a alfabetização de residentes na área de
influência do empreendimento, visando dar acesso à
informação às pessoas não alfabetizadas.
Nº 30
Programa do Primeiro
Programa destinado à inserção de jovens nos cursos de
Emprego.
qualificação profissional e a sua preparação para inserção no
empreendimento.
11
Conforme IBAMA (2010) a educomunicação é uma linha de ação prevista no Programa Nacional de Educação
Ambiental (ProNEA) com objetivo de articular as ações de comunicação para a Educação Ambiental. Em atendimento à
lei 9795/99, da Política Nacional de Educação Ambiental, esta linha de ação tem como objetivo proporcionar meios
interativos e democráticos para que a sociedade possa produzir conteúdo e disseminar conhecimentos, através da
comunicação ambiental voltada para a sustentabilidade.
12 A comunicação acionada por sua relação intrínseca com a educação. Compreendida a comunicação como um processo
de relação entre consciências, como propõe Vera Veiga França, “um processo social básico de produção e partilhamento
do sentido através da materialização de formas simbólicas” (FRANÇA, 2001, p. 41), comunicação e educação são
indissociáveis (ETHOS-HUMANUS, Nov. 2010a, p. 28).
26
Nº 31
Contratação de mão de
Priorizar a contratação de mão de obra com residentes de
obra em municípios da
Maragogipe, Salinas da Margarida, Saubara, Cachoeira, São
área de influência do
Félix e Itaparica.
empreendimento.
Nº 40
Programa
de
Comunicação Social.
Informar à comunidade sobre as reais necessidades de
contratação, visando evitar expectativas indevidas e fluxos
migratórios.
Nº 45
Preparação de mão de
Se não for possível o remanejamento de pessoal contratado para
obra
outras
outras obras, deverá ser analisada a possibilidade de absorver
atividades econômicas.
parte do contingente na fase de operação. As pessoas que não
para
forem absorvidas, devem receber treinamento e qualificação no
desempenho de atividades dos setores de comércios e serviços,
mediante convênios específicos com órgãos especializados em
empresariado, como o SEBRAE.
Nº 48
Nº 50
Implantação de núcleos
Nas sedes municipais de Maragogipe, Salinas da Margarida e
de empreendedorismo
Saubara devem ser implantados núcleos de empreendedorismo,
nas sedes municipais de
voltados para a capacitação de pessoas para atuar como
Maragogipe, Salinas da
empresários ou profissionais no setor terciário (comércio e
Margarida e Saubara.
serviços)
Informação
da
Programa de Comunicação Social (PCS) deverá informar a
Comunidade
de
programação
Enseada sobre a rotina
de
tráfego
de
tráfego
na
estrada
de
acesso
ao
empreendimento.
do
empreendimento.
Nº 52
Valorizar
outras
atividades produtivas.
Deve ser implementado o programa de valorização das
atividades produtivas praticadas na região, como artesanato,
produção com fibras vegetais, cerâmica, construção de
pequenas embarcações, visando fortalecer as atividades
tradicionais praticadas e a fixação de pessoas nos seus
respectivos locais de origem.
Nº 54
Estabelecer
parceria
com o SEBRAE.
Visa o desenvolvimento de oficinas de empreendedorismo,
para a preparação de pessoas para atuar no setor terciário da
economia.
Tabela 1 – Medidas Mitigadoras estabelecidas no EIA/RIMA (2009).
Fonte: EIA/RIMA (2009, p.74-81);
Analisando o conjunto de dados e a Tabela 1, infere-se que compete à Medida Mitigadora
nº 40, uma centralidade, sendo definida:
27
Nome da medida: Programa de Comunicação Social.
Descrição: Informar a comunidade sobre as reais necessidades de contratação, visando
evitar expectativas indevidas e fluxos migratórios.
Componente ambiental afetado: Fluxos migratórios.
Fase de implantação da medida: Implantação e Operação.
Caráter: Preventiva.
Eficácia: Alta.
Agente: Consórcio de empresas.
Cronograma: Nas fases de implantação e operação. (EIA/RIMA, 2009, p.79)
Como se chegou a centralidade da Medida Mitigadora Nº 40? Todas as dez medidas
listadas têm por finalidade transmitir algum tipo de conhecimento à comunidade, e ou, inserido
em algum tipo de processo produtivo, e ou, potencializando as características produtivas da
própria comunidade. Para que a comunidade tome conhecimento de cada medida, a finalidade
e o período em que deve ser implantada é necessário que um elaborado Programa de
Comunicação Social seja desenvolvido e aplicado, no intuito de dar conhecimento à
comunidade das medidas, do cronograma de ação, e de que maneira em que elas serão
implementadas. Portanto, é através do PCS que a comunidade terá conhecimento das medidas.
A eficácia das demais medidas está atrelada a correta execução da Medida Mitigadora Nº 40.
Também é importante notar que o próprio EIA/RIMA (2009) estabelece que dos meios, o
mais atingido pela implantação e operação do estaleiro é o meio socioeconômico. Das 54
medidas mitigadoras definidas, 42 foram destinadas ao meio socioeconômico. Conceito
reafirmado pelo IBAMA (2010b, p. 21): “O EIA apresenta, em seu Capitulo 7, uma avaliação
dos impactos decorrentes do empreendimento e apresenta as medidas mitigadoras propostas.
São relacionados 42 impactos (positivos e negativos) ao meio socioeconômico e as medidas
mitigadoras previstas.”.
Analisando o problema de pesquisa e os princípios operatórios apresentados, podemos
inferir que a comunidade de São Roque do Paraguaçu é afetada pela construção do estaleiro,
que é um empreendimento estabelecido a partir da determinação do Estado Nacional, que busca
atuar posicionando-se no capitalismo global, ou seja no ‘Império’. Esta mesma relação pode
ser aplicada ao ‘princípio de movimento permanente e do desenvolvimento’, ou seja, a presença
de um novo fenômeno no distrito de São Roque do Paraguaçu altera de forma permanente as
relações previamente estabelecidas, atuando no desenvolvimento de novas relações. Neste
processo são identificados a implicação dialética mútua; a ambiguidade dialética; a polarização
dialética; e a reciprocidade de perspectiva. Ao analisar cada um dos atores, através dos métodos
quantitativos e qualitativos, é realizada a complementaridade dialética.
28
1.2 FUNDAMENTOS EPISTEMOLÓGICOS
Para observar a dinâmica da Medida Mitigadora Nº 40, durante o processo de implantação
e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, em dialética com a comunidade de São Roque
do Paraguaçu e o Estado, foi selecionado, como primado ontológico, os pressupostos do
Materialismo dialético e histórico13, definidos por Karl Marx14. Compreende-se que esta teoria
fornece às bases necessárias a pesquisa e análises do fenômeno, devido as características
materiais percebidas empiricamente. Também permite reconstruir o fenômeno analisando
enquanto totalidade material, expressa através das seguintes características dialéticas: tudo se
relaciona, tudo se transforma, ocorre a mudança qualitativa e existe a luta de contrários. Sobre
a luta de contrários, ou luta de classes, Marx e Engels (2011) afirmam:
A história de todas as sociedades que já existiram é a história de luta de classes. [...]
Nossa época — a época da burguesia — distingue-se, contudo, por ter simplificado
os antagonismos de classe. A sociedade divide-se cada vez mais em dois grandes campos inimigos, em duas classes que se opõem frontalmente: burguesia e proletariado.
[...] A burguesia não pode existir sem revolucionar, constantemente, os instrumentos
de produção e, desse modo, as relações de produção e, com elas, todas as relações da
sociedade. (MARX, ENGELS, 2011, p.11 e 14)
Como observado na passagem anterior da obra ‘O manifesto comunista’, Marx e Engels
propõem a separação da sociedade em classes antagônicas, cabendo a burguesia o papel de
transformar as relações sociais de produção, e desta forma, a própria sociedade. Ou seja, a
implantação do Estaleiro provoca mudanças nas estruturas sociais, conformando novas
relações, sendo que é justamente a aplicação da teoria do Materialismo dialético e histórico que
irá revelar de que maneira este processo ocorre.
Para dar conta de uma realidade social complexa e multideterminada, Marx (2008, p. 258)
ensina que: “O concreto é concreto, porque é a síntese de muitas determinações, isto é, unidade
do diverso. Por isso, o concreto aparece no pensamento como o processo da síntese, como
resultado, não como ponto de partida, embora seja o verdadeiro ponto de partida e, portanto, o
ponto de partida também da intuição e da representação.”.
13
A doutrina política de Marx fundamenta-se no materialismo dialético e histórico. Denomina-se materialismo porque
seus conceitos diretivos são de conteúdo material; é dialético porque se apoia no método dialético de Hegel, no que tange
à evolução dos fenômenos sociais; enfim, qualifica-se como histórico porque os princípios do materialismo dialético são
aplicados à evolução dos fatos sociais e à política dos povos no decurso da marcha do tempo. (FERACINE, 2011, p. 23)
14 Karl Heinrich Marx (1818-1883), nasceu em 5 de maio de 1818, na cidade de Tréves, província Renana da Prússia
(Alemanha). Segundo filho do advogado liberal Heinrich Marx e de Henriette Pressburg. O pai e a mãe de Karl eram de
origem judaica. Mas, por causa das leis antissemitas que vigoravam na região, Heinrich, para não perder o direito de
exercer a profissão, decidiu converter-se ao protestantismo. (FERACINE, 2011, p. 15)
29
Nilson Weisheimer (2008, p. 148) explica sobre a citação anterior que a concepção de
ciência de Marx vai fundar-se na perspectiva materialista, dialética e histórica, afirmando que
o pensamento não é a gênese do real, nem o real é a gênese do pensamento, mas que o real
sempre antecipa ao teórico e que a teoria é um produto do real. “Desse modo, o conhecimento
científico do real começa com a produção crítica das determinações da própria ciência, portanto,
ao nível teórico que se realiza, simultaneamente, ao nível das categorias sociais.”.
Sobre o método de Marx15, Weisheimer resume que:
Consiste na passagem do concreto imediato ao abstrato e do abstrato ao concreto
pensado. O concreto imediato corresponde a uma realidade complexa, ou seja, à
unidade do diverso. O abstrato corresponde a percepções mais simples da realidade
imediata através de sucessivas reflexões que conduz das categorias mais simples às
mais complexas. O concreto pensado corresponde ao retorno das categorias mais
complexas às mais simples, que assumem a forma de categorias de análise. Essa é a
maneira de proceder do pensamento para se apropriar da realidade concreta, a fim de
reproduzi-la como categoria do pensamento, ou seja, como concreto pensado. Vale
lembrar que isso se faz necessário devido à própria natureza da realidade concreta que
é fruto de múltiplas determinações. (WEISHEIMER, 2008, p. 151)
É a partir deste método que se encontra o fio condutor para compreender a relação dialética
entre o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, a comunidade de São Roque do Paraguaçu, e o Estado.
As significações e ressignificações surgidas desta relação, explica Marx (2008, p. 48), têm
origem na produção burguesa, sendo a última forma antagônica do processo de produção social,
antagônica, não no sentido de um antagonismo individual, mas de um antagonismo que nasce
das condições de existência sociais dos indivíduos.
A necessidade de um mercado em expansão constante para seus produtos persegue a
burguesia por toda a superfície do globo. Precisa instalar-se em todos os lugares,
acomodar-se em todos os lugares, estabelecer conexões em todos os lugares. A
burguesia, por meio de sua exploração do mercado mundial, deu um caráter
cosmopolita para a produção e o consumo em todos os países. Para grande desgosto
dos reacionários, rebaixou a base nacional da indústria até o rés do chão. As indústrias
nacionais antigas foram destruídas ou seguem sendo destruídas dia após dia. Elas são
desalojadas por novas indústrias, cuja introdução torna-se questão de vida e morte
para todas as nações civilizadas; por indústrias que não mais trabalham com matériaprima nacional, mas matéria-prima extraída de zonas remotas; cujos produtos são
consumidos não só no próprio país, mas em todos os cantos do globo. (MARX,
ENGELS, 2011, p.14)
Marx nos fornece um método seguro, explicando ele próprio como chegou às suas
conclusões científicas a respeito da vida social.
O resultado geral a que cheguei e que, uma vez obtido, serviu-me de guia para meus
estudos, pode ser formulado, resumidamente, assim: na produção social da própria
Pertence ao consenso geral dos estudiosos do marxismo a tese de que ‘A Ideologia Alemã’ assinalou o nascimento do
materialismo histórico, teoria e metodologia da ciência social associada aos nomes de Marx e Engels. Louis Althusser
apontou nessa obra o corte epistemológico, que separa a fase pré-marxista do pensamento de Marx e Engels da fase
propriamente marxista, na qual trabalham com sua teoria original. (MARX, ENGELS, 2007, p. 7)
15
30
existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes
de sua vontade; essas relações de produção correspondem a um grau determinado de
desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de
produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se
eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais
determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o
processo de vida social, política e Intelectual. Não é a consciência dos homens que
determina o seu ser; ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência.
Em uma certa etapa de seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da
sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes, ou, o que
não é mais que sua expressão jurídica, com as relações de propriedade no seio das
quais elas se haviam se desenvolvido até então (MARX, 2008, p. 47)
A teoria de Marx explica a sociedade através das análises das relações sociais de produção
e de troca entre os homens, que se constituem na infraestrutura da sociedade, sendo a base
objetiva a partir da qual os homens produzem as representações, ideias e justificativas, elas são
consideradas reflexos, mais ou menos invertidos, desta realidade. Enquanto a superestrutura da
sociedade é produto da ação humana e está em constante transformação, motivada pelas
contradições, antagonismos e conflitos, produzindo sucessivas e cada vez mais superiores
formações sociais (WEISHEIMER, 2008).
Outro pesquisador a discorrer sobre o Materialismo dialético e histórico é Richardson
(2010). Ele explica que a interpretação da natureza, concepção dos fenômenos naturais e a teoria
são materialistas, e é histórico-dialético porque a aproximação (método e estudo) dos
fenômenos naturais é dialética. Sobre a dialética, Richardson (2010, p. 45) explica que está
vinculada ao processo dialógico, de debate entre posições contrárias, sendo também baseada no
uso de refutações ao argumento por redução ao absurdo ou falso. Sendo que o núcleo da
dialética, a essência, é a investigação das contradições da realidade, consideradas as forças
propulsora do desenvolvimento da natureza.
Georges Gurvitch (1987), na obra ‘Dialética e Sociologia’, explica que a dialética se
manifesta sob três aspectos:
1–
O movimento de totalização e de destotalização das realidades humanas, sobretudo
da realidade social;
2–
Como um método, uma maneira de captar, compreender, e conhecer o movimento
das totalidades humanas reais; e
3–
Das relações dialéticas entre o método dialético e o movimento dialético real.
Sobre o terceiro aspecto – Das relações dialéticas entre o método dialético e o movimento
dialético real – Gurvitch (1987, p. 177) afirma que é através da distinção entre vários
31
procedimentos operatórios de dialetização ou de esclarecimento dialético, procedimentos que
correspondem ao método dialético, mas que são aplicáveis, seja de forma exclusiva,
concorrente, ou conjunta. Citando cinco procedimentos operatórios nos quais se manifesta o
método dialético: a complementaridade dialética; a implicação dialética mútua; a ambiguidade
dialética; a polarização dialética; e a reciprocidade de perspectiva.
Sobre os procedimentos operatórios propostos por Gurvitch (1987), Weisheimer (2008)
sintetiza:
A complementaridade dialética;
Entre os diferentes eixos de investigação, como aspectos complementares do
fenômeno social analisado; (WEISHEIMER, 2008, p. 153);
Entre os métodos quantitativos e qualitativos; e (WEISHEIMER, 2008, p. 153)
Entre estruturas sociais e ações sociais; (WEISHEIMER, 2008, p. 153)
A implicação dialética mútua que se manifesta nas complexas relações entre dimensão
da coerção social e da ação social, evitando-se sua separação artificial e reconhecendo
o papel mediador das instituições que resultam das relações sociais e como elementos
da realidade social são essencialmente dialéticos porque estão submetidos ao contínuo
movimento de produção, reprodução e decomposição; (WEISHEIMER, 2008, p. 153)
A ambiguidade dialética presente nestes processos, uma vez que toda a realidade
humana traz contida em si a marca da ambiguidade; (WEISHEIMER, 2008, p. 153)
A polarização dialética que consiste em identificar os elementos em processo de
polarização e antinomia, que não se estabelecem a priori, mas sim através do exame
das relações sociais como as que se estabelecem entre dominadores e dominados
(relações de dominação), entre trabalhadores e capitalistas (relações de produção),
entre pais e filhos (relações geracionais) e entre homens e mulheres (relações de
gênero); e (WEISHEIMER, 2008, p. 153)
A reciprocidade de perspectivas permite identificar como, apesar das diferenciações,
as relações sociais permanecem em Estado de aparente equilíbrio permitindo
diferentes graus de coesão e troca, como as verificadas na divisão social, sexual e
etária do trabalho e no acesso aos seus resultados, sem chegar a converterem-se em
antinomias e ambiguidades. (WEISHEIMER, 2008, p. 154)
Observado os conceitos anteriormente expressos, como base nos princípios, estruturas e
leis do materialismo dialético e do materialismo histórico, com objetivo de analisar o fenômeno
a partir do problema de pesquisa proposto, podemos afirmar que a dissertação busca revelar as
contradições e complementariedades inerentes ao processo de construção e operação do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu, estabelecidos na relação dialética entre Estado, capitalistas e
a comunidade.
A fundamentação do uso da ‘Análise de Conjuntura’ proposta por Souza (2012), na escolha
pela centralidade da Medida Mitigadora Nº 40 e da análise do Programa de Comunicação
Social, é necessária para esclarecer como foram desenvolvidos os objetivos geral e específicos,
no sentido de estruturarem a abordagem científica que revele uma determinada realidade social.
32
1.3 PROBLEMA
Como o processo de globalização, a política do Estado Nacional e a dialética dos atores –
Estado, capitalistas, e a comunidade – explicam a dinâmica de implementação da Medida
Mitigadora Nº 40?
1.4 OBJETIVOS GERAL E ESPECÍFICOS
Para desenvolver esta dissertação foram definidos objetivos gerais e específicos, que serão
apresentados a seguir.
OBJETIVO GERAL
Analisar a dialética estabelecida entre os atores – Estado, capitalistas e a comunidade –
para explicar o processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu a partir
da análise da Medida Mitigadora Nº 40.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
1–
Analisar como a globalização explica o surgimento de um empreendimento que
utiliza elevado volume de capital e trabalho especializado em uma comunidade
marcada por relações tradicionais de produção (Capítulo I);
2–
Relatar como a política do Estado Nacional é determinante para o surgimento do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu (Capítulo II e III); e
3–
Explicar como a implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu entra em dialética
com o Estado e a comunidade local, e como ocorre a dinâmica de ação da Medida
Mitigadora Número 40 (Capítulo IV).
1.5 HIPÓTESE
Na relação entre os atores prevalece os interesses da atuação conjunta entre capitalistas e o
Estado Nacional, em detrimento das populações locais, de tal modo que no processo de
implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu não sejam cumpridas as
condicionantes legais estabelecidas no EIA/RIMA (2009), através da Medida Mitigadora nº 40.
Isto ocorre por três motivos:
1–
Correlação de forças entre os atores, Estado e capitalista;
33
2–
Desconhecimento da população local, em decorrência do descumprimento da
Medida Mitigadora, e da falta de Accountability e Empowerment; e
3–
Cumplicidade dos órgãos estatais que deveriam fiscalizar o cumprimento das
Medidas Mitigadoras.
1.6 MÉTODO
Richardson (2010 p. 70) alerta que o “método em pesquisa significa a escolha de
procedimentos sistemáticos para a descrição e explicação de fenômenos”. Tendo por finalidade
delimitar um problema, realizar observações e interpretá-las com base nas relações encontradas,
fundamentando as observações e interpretações nas teorias existentes. Ele destaca dois
métodos, o Quantitativo e o Qualitativo.
Para realizar os procedimentos operatórios necessários a responder ao problema proposto
nesta dissertação, optou-se pelo método misto (Quantitativo e Qualitativo), observando que “a
pesquisa moderna deve rejeitar como uma falsa dicotomia a separação entre estudos
‘qualitativos’ e ‘quantitativos’, ou entre ponto de vista ‘estatístico’ e ‘não estatístico’. Além
disso, não importa quão precisas sejam as medidas, o que é medido continua a ser uma
qualidade” (RICHARDSON, 2010, p. 79 apud W. Goode e P. K. Hatt 1973, p. 398).
Sobre o ‘Método Misto’ é importante destacar que a opção preponderante da
operacionalização do ‘Método Qualitativo’ é em decorrência do mesmo ser o método mais
adequado para delimitação do problema, observação e interpretação das estruturas sociais
envolvidas na implantação e operação do estaleiro, e as implicações relacionais entre os atores.
1.6.1 O MÉTODO QUANTITATIVO
A aplicação do Método Quantitativo tem por finalidade estabelecer correlações entre
varáveis de desenvolvimento humano, através de dados censitários e indicadores sociais. Foram
utilizadas duas fontes para levantar os dados: o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil
2013, e os levantamentos estatísticos do IBGE.
A análise de conteúdo quantitativo permite correlacionar os dados levantados, sendo
empregados na pesquisa com objetivo de descrever as características populacionais, bem como
a recorrência de categorias implícitas no fenômeno.
34
1.6.2 O MÉTODO QUALITATIVO
Richardson (2010, p. 80-82) pondera que o Método Qualitativo é indicado em “situações
em que observações qualitativas são usadas como indicadores do funcionamento de estruturas
sociais.”. Ele avalia que o Método Qualitativo é fundamental para análises das estruturas sociais
através das concepções teóricas estruturalistas ou dialéticas.
Richardson (2010, p. 82) indica que dentre os procedimentos metodológicos, as pesquisas
qualitativas de campo utilizam as “técnicas de observação e entrevistas devido à propriedade
com que esses instrumentos penetram na complexidade de um problema.
Também é citado por Richardson (2010, p. 82), outro aspecto de importante aplicação
metodológica, a observação, e que ao realizar a pesquisa deve-se organizar um conjunto de
informações ligadas a um sistema descritivo e, em seguida, criar, aplicar ou revisar categorias.
Outro procedimento metodológico do ‘Método Qualitativo’ é a ‘Pesquisa Documental’.
Richardson (2010, p. 85) explica que a análise de conteúdo utiliza como material de estudo
qualquer forma de comunicação, a exemplo de documentos escritos, como livros, jornais,
revistas, no diferentes suportes, como textos eletrônicos e impressos.
A ‘Análise de Conteúdo’ como procedimento metodológico, revela tendências percebidas
a partir dos diversos tipos de comunicação, que contenham palavras, símbolos, imagens e sons.
Na dimensão mais geral:
“A análise de conteúdo trata de descrever o texto segundo a forma e o fundo. A análise
da forma estuda os símbolos empregados, isto é, as palavras ou temas que são,
inicialmente, selecionados e, a partir daí, verifica-se a frequência relativa de sua
aparição em uma obra ou em diferentes tipos de comunicação. No caso de temas,
embora se venha a medir a sua frequência relativa em diversos tipos de comunicação,
toma-se necessário desdobrá-los e interpretar expressões, frases, parágrafos e,
naturalmente, classificá-los em categorias adequadas. A análise do fundo consiste em
estudar as referências dos símbolos, podendo revelar tendências constatadas nos
conteúdos das comunicações, comparar os meios ou níveis da comunicação, verificar
a adequação do conteúdo a seus objetivos, enquanto a análise da forma do conteúdo
se propõe descrever as técnicas de publicidade, avaliar o nível de assimilação pelo
público das informações recebidas e identificar as características do estilo das
comunicações. Este enfoque pode ser denominado análise quantitativa
(RICHARDSON, 2010, p. 86).
Observando a passagem anterior, Richardson (2010) descreve um método capaz de
transformar o dado qualitativo em dado quantitativo, destacando dois procedimentos
operacionais necessários à análise de conteúdo: a análise de forma e a análise de fundo.
No tópico a seguir, são apresentados os conceitos sobre Análise de Conteúdo e Análise do
Discurso, utilizados na análise dos dados pesquisados.
35
1.6.3 ANÁLISE DE CONTEÚDO E ANÁLISE DO DISCURSO
O conjunto de dados qualitativos coletados, entrevistas gravadas, textos, e imagens, são
analisados a partir da perspectiva da Análise de Conteúdo e Análise do Discurso nas ciências
sociais. Capelle, Melo e Gonçalves (2003) explicam que para transformar as informações
coletadas em resultado de pesquisa é necessária a utilização de procedimentos com objetivo de
sistematizar e categorizar os dados, tornando possível análise e verificação científica.
A Análise de Conteúdo e Análise do Discurso podem ser utilizadas de forma distinta
sobre o mesmo dado pesquisado. Utilizando o conceito de Laurence Bardin, professoraassistente de Psicologia na Universidade de Paris V, autora de ‘Análise de Conteúdo’ obra de
referência, Capelle, Melo e Gonçalves (2003, p. 4) explicam que a “análise de conteúdo abrange
as iniciativas de explicitação, sistematização e expressão do conteúdo de mensagens, com a
finalidade de se efetuarem deduções lógicas e justificadas a respeito da origem dessas
mensagens (quem as emitiu, em que contexto e/ou quais efeitos se pretende causar por meio
delas), e se constituem em conjunto de técnicas de análise que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção e recepção dos conteúdos.
A Análise do Discurso, segundo Capelle, Melo e Gonçalves (2003, p. 9) consiste em
teoria que busca revelar evidências e explicitar o caráter ideológico, com objetivo de destacar
as formas de dominação política nos discursos. “Nesse contexto, a linguagem está marcada pelo
conceito de social e histórico e deve ser considerada como uma interação inserida na relação
necessária entre homem e realidade natural e social (Orlandi, 1996). Sitya (1995) acrescenta
que não se deve apreender o sentido de um texto com base apenas nas palavras que o compõem.
Estas devem servir como pistas que ativam conhecimentos contextuais e históricos constantes
na formação discursiva em que estão inseridos.”.
Através do estudo apresentado em artigo, Décio Rocha e Bruno Deusdará (2005, p. 17)
compõem quadro-síntese de referência sobre as aproximações e diferenças entre a Análise de
Conteúdo e Análise do Discurso, conforme observa-se na tabela a seguir:
36
Tabela 2 – Síntese da Análise de Conteúdo e Análise do Discurso
Fonte: Rocha e Deusdará (2005, p. 17).
A Tabela 2 apresenta o quadro-síntese com a demarcação dos campos de análises a serem
abordados a partir das técnicas de pesquisa. Enquanto a Análise de Conteúdo busca revelar
objetivamente as intencionalidades do discurso, a Análise do Discursos permite revelar a
subjetividade do discurso, levando em consideração as relações de poder e a ideologia.
ANÁLISE DE CONTEÚDO
Três etapas são desenvolvidas na aplicação na Análise de Conteúdo: 1 – Pré-análise, 2 –
Exploração do material, e 3 – Tratamento dos resultados obtidos e interpretação, como processo
de explicitação, sistematização e expressão do conteúdo de mensagens.
A Pré-análise consiste, segundo Capelle, Melo e Gonçalves (2003, p. 6), na
“organização e sistematização das ideias, em que ocorre a escolha dos documentos a
serem analisados, a retomada das hipóteses e dos objetivos iniciais da pesquisa em
relação ao material coletado, e a elaboração de indicadores que orientarão a
interpretação final.”. (CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003, p. 6)
37
A Exploração do material é a fase em que os dados brutos são codificados para
alcançar o núcleo de compreensão do texto. Capelle, Melo e Gonçalves (2003, p. 6)
explicam que “a codificação envolve procedimentos de recorte, contagem,
classificação, desconto ou enumeração em função de regras previamente
formuladas.”. (CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003, p. 6)
No Tratamento dos resultados obtidos e interpretação “os dados brutos são submetidos
a operações estatísticas, a fim de se tornarem significativos e válidos e de
evidenciarem as informações obtidas. De posse dessas informações, o investigador
propõe suas inferências e realiza suas interpretações de acordo com o quadro teórico
e os objetivos propostos, ou identifica novas dimensões teóricas sugeridas pela leitura
do material. Os resultados obtidos, aliados ao confronto sistemático com o material e
às inferências alcançadas, podem servir a outras análises baseadas em novas
dimensões teóricas ou em técnicas diferentes. (CAPELLE, MELO, GONÇALVES,
2003, p. 6)
A partir da sistematização dos conteúdos são aplicadas as técnicas: 1 – Análise temática ou
categorial, e 2 – Análise de avaliação ou representacional. Conforme conceitos a seguir:
Análise temática ou categorial – Compreende o tipo de técnica mais utilizado pela
análise de conteúdo, a análise temática ou categorial, que consiste em operações de
desmembramento do texto em unidades (categorias), segundo reagrupamentos
analógicos Minayo (2000). Essas operações visam a descobrir os núcleos de sentido
que compõem uma comunicação, preocupando-se com a frequência desses núcleos,
sob a forma de dados segmentáveis e comparáveis, e não com sua dinâmica e
organização (Bardin, 1979). Por esse motivo, (Minayo, 2000) acredita ser uma técnica
com raízes positivistas com crença baseada na significação da regularidade.
(CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003, p. 8)
Análise de avaliação ou representacional – Essa técnica de análise de conteúdo visa a
medir as atitudes do locutor quanto aos objetos de que ele fala (pessoas, coisas,
acontecimentos) e fundamenta-se no fato de que a linguagem representa e reflete
diretamente aquele que a utiliza. Neste caso, os indicadores utilizados para se fazer
inferências acerca da fonte de emissão estão explicitamente contidos na comunicação.
A análise de avaliação atém-se à direção e à intensidade dos juízos, atendo-se,
basicamente, à atitude, ou predisposição do emissor da mensagem para reagir sob a
forma de opiniões (nível verbal), ou de atos (nível comportamental), em presença de
objetos, de uma maneira determinada (Bardin, 1979; Minayo, 2000). (CAPELLE,
MELO, GONÇALVES, 2003, p. 8)
ANÁLISE DO DISCURSO
Capelle, Melo e Gonçalves (2003) destacam que o fundamental da Análise do Discurso é
compreender o que significa o texto na filiação discursiva, e explicam que o pesquisador deve
percorrer o caminho inverso do discurso, ou seja, deve ir do concreto para o abstrato,
considerando que o texto é a unidade de análise, e que ele pode ser oral e ou escrita, estendido
também às linguagens não verbais. O texto contém a totalidade, que é revelada em três
dimensões de argumentação:
As relações de força, posições relativas do locutor (enunciador) e do interlocutor
(enunciatário); (CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003, p. 10)
A relação de sentido existente entre esse e vários outros discursos; e (CAPELLE,
MELO, GONÇALVES, 2003, p. 10)
38
A relação de antecipação, que envolve a experiência anteprojetada do locutor em
relação ao lugar e à reação de seu ouvinte. (CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003,
p. 10)
Nos discursos analisados são reveladas as categorias teóricas a partir da representação
material do discurso, depois descendo ao nível das subjetividades ideológicas. Durante o
processo de Análise do Discurso o pesquisador deve observar, segundo Capelle, Melo e
Gonçalves (2003), alguns aspectos dos discursos:
Rupturas, contradições ou momentos em que o discurso do entrevistado perde o
sentido; (CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003, p. 13)
Interpretar as metáforas identificadas como uma fonte rica de múltiplos significados,
e (CAPELLE, MELO, GONÇALVES, 2003, p. 13)
Examinar os silêncios e pausas, ou o que ficou subentendido. (CAPELLE, MELO,
GONÇALVES, 2003, p. 13)
No processo de Análise do Conteúdo, conforme Capelle, Melo e Gonçalves (2003, p.13),
é importante considerar os significados implícitos naquilo que não foi falado, bem como os
elementos intertextuais do discurso. Também deve-se observar que a linguagem deve ser
apreendida como uma atividade de interação social, “servindo apenas para ativar os
conhecimentos contextuais e históricos dados pela formação discursiva em que estão inseridos.
Esse marco representa um dos aspectos que distinguem a Análise do Discurso da Análise de
Conteúdo.”.
Os conceitos de Análise de Conteúdo e Análise do Discurso expressos anteriormente,
formam a base epistemológica com a qual são analisados os dados desta pesquisa, e tem a
finalidade de revelar as relações dialéticas estabelecidas entre os atores.
A seguir, são apresentados os conjuntos de procedimentos adotados com objetivo de
levantar os dados da pesquisa.
1.7 PROCEDIMENTOS OPERATÓRIOS
Utilizando os Métodos Quantitativos e Qualitativos foram realizadas coleta de dados,
utilizando as seguintes técnicas de investigação do universo empírico: revisão bibliográfica,
dados secundários (pesquisa documental, publicações na mídia, documentação fotográfica),
entrevista estruturada aberta, observação da realidade empírica com documentação técnica
(produção de fotos, áudios e vídeos).
39
São listados, a seguir, alguns dos principais procedimentos operatórios necessários para a
delimitação do problema, observação e interpretação das estruturas sociais envolvidas no
fenômeno.
1.7.1 PESQUISA E ANÁLISE BIBLIOGRÁFICA
Gil (2010, p.29) explica que “a pesquisa bibliográfica é elaborada com base em material já
publicado”, o que inclui material impresso, como livros, revistas, jornais, teses, dissertações e
anais de eventos científicos; além de materiais publicados da Internet, ou disponibilizados
através de outros formatos digitais, a exemplo de discos digitais e dispositivos de memória
eletrônica.
A pesquisa e análise bibliográfica, ou revisão bibliográfica, permite a sustentação teórica
de observações empíricas, além de reconstruir as análises correlacionadas ao fenômeno.
Também permite que documentos referentes ao fenômeno sejam introduzidos na pesquisa. A
bibliografia utilizada nesta pesquisa foi dividida em dois grupos de publicações: literatura sobre
a teoria marxista; e bibliografia sobre o recôncavo e processos industriais contemporâneos.
LITERATURA SOBRE A TEORIA MARXISTA
A literatura sobre a teoria marxista representa o marco teórico geral em que está sustentada
cientificamente está dissertação. Ela é utilizada no transcorrer do trabalho e serve de base
teórica para as análises do fenômeno. São feitos recortes de trechos de textos em que se reafirma
as observações realizadas pelo pesquisador, e inseridos na dissertação. O que permite uma
revisão de categorias previamente estabelecidas.
A base teórica do trabalho se sustenta nas fundamentações cientificas da obra de Karl Marx.
Na sequência é feita uma atualização epistemológica a partir de autores contemporâneos que
tratam da relação Capital/Trabalho. Dentre as principais obras utilizadas nas análises e
fundamentações do trabalho científico, estão: Marx (1982), (2008) e (2012) Marx e Engels
(2011) e (2007), Harvey (2011), (2012a) e (2012b); Arrighi (2009); Mészáros (2011a) e
(2011b), Giddens e Turner (2009), Georges Gurvitch (1987). Além destes cientistas, outros
autores serão citados no transcorrer da dissertação e poderão ser conferidos na bibliografia.
40
BIBLIOGRAFIA SOBRE O RECÔNCAVO E O MPC
No contexto da ‘Revisão bibliográfica’, também foram utilizados artigos, dissertações e
teses, com a finalidade de extrair observações sobre a realidade social contemporânea em que
se encontra o Recôncavo da Bahia, além de bibliografia sobre análise do Modo de Produção
Capitalistas, concernentes a estruturas industriais. Dentre os trabalhos estudados estão: Resex
Marinha versus Polo Naval na Baía do Iguape, Cathérine Prost; Troca de saberes tendo em vista
uma gestão ambiental participativa, Cathérine Prost; e Cercamento do litoral pelo capital
petrolífero: sinais das derrotas dos pescadores e marisqueiros, Arsênio Oswaldo Sevá Filho.
Além destes trabalhos, outras produções cientificas são utilizadas no transcorrer desta
dissertação.
1.7.2 PESQUISA DOCUMENTAL
A pesquisa documental, afirma Gil (2010, p. 30), é utilizada em, praticamente, todas as
ciências sociais e apresenta pontos de semelhança com a pesquisa bibliográfica, observando
que nas duas modalidades utilizam-se dados existentes. A principal diferença está na natureza
das fontes. Na pesquisa documental é utilizada variada fonte de documentos, elaborados com
finalidades diversas, cuja origem esteja ligada ao fenômeno e aos atores envolvidos na pesquisa,
ou que lhe digam respeito. Na pesquisa documental desenvolvida foram levantados documentos
oficiais, cientificamente autênticos, não fraudados, sobre o Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
além de documentos que apontem o papel do Estado na implantação do empreendimento, a
dinâmica de implantação do empreendimento e as medidas mitigadoras. Como forma de análise
serão selecionadas as categorias que apreendem o processo dialético de implantação da Medida
Mitigadora Nº 40, além de permitir uma percepção mais ampla da perspectiva dos atores.
Dentre os documentos mais utilizados na pesquisa estão: documentos institucionais,
mantidos em arquivos da empresa, em órgãos públicos, além de outras organizações; relatórios,
apresentações, vídeos, sites oficiais, diário de campo e fotografias. A análise dos documentos
segue a seguinte lógica: transcrição das anotações obtidas na coleta de dados; procura de
categorias e pautas (temas); destaque de seleção dos dados; elaboração de esquema de análise.
Os documentos, objeto da análise de dados secundários, foram agrupados e divididos em
três segmentos: Pesquisa documental – Publicações oficiais; Pesquisa documental –Publicações
na mídia; e Pesquisa documental –Produção de fotografias e anotações.
41
PESQUISA DOCUMENTAL – PUBLICAÇÕES OFICIAIS
A seleção dos documentos oficiais objetivou delimitar as competências dos atores, bem
como as especificidades do fenômeno, além de identificar as determinações da Medida
Mitigadora Nº 40. A seguir são listados na tabela alguns dos principais documentos oficiais
objeto de análise desta dissertação.
TABELA LISTA PUBLICAÇÕES OFICIAIS
Descrição do documento
Autor e ou Fonte
Disponibilidade
Atlas do Desenvolvimento Humano no Produzido pelas entidades Internet.
Brasil 2013, com recorte sobre o município PNUD, IPEA E FJP.
de Maragogipe.
Ata de Audiência Pública do Polo Naval da Emitido pelo MPF, em 11 MPF/BA.
Bahia.
de dezembro de 2008.
Estudo de Impacto Ambiental e Relatório Publicado pela SUDIC, em SEINP.
de Impacto Ambiental (EIA/RIMA, 2009) 2009.
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Medidas Compensatórias e Mitigadoras, EIA/RIMA (2009).
SEINP.
EIA/RIMA (2009).
Licença Prévia 354/2010.
Emitido pelo IBAMA.
SEINP.
Licença de Instalação nº 737/2010.
Emitido pelo IBAMA.
SEINP.
Parecer Técnico Nº 042/2010.
Emitido pelo IBAMA.
SEINP.
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A., Elaborado pela ETHOS- SEINP.
Relatório
Institucional,
Edição
nº
setembro de 2013.
1, HUMANUS
Consultoria,
sob encomenda do EEPSA.
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A., Elaborado pela ETHOS- SEINP.
Relatório
Institucional,
dezembro de 2010.
Edição
nº
2, HUMANUS
Consultoria,
sob encomenda do EEPSA.
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A., Elaborado pela Diretoria de Através do site
Relatório Institucional, Edição nº 4, julho Relações Institucionais e do EEPSA.
de 2013.
Sustentabilidade
do
EEPSA.
42
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A.; Elaborado pela ETHOS- SEINP.
Interação Social; Etapa II; Programas HUMANUS
Socioambientais;
Plano
Consultoria,
Estratégico em novembro de 2010, sob
Interativo de Comunicação Social.
encomenda do EEPSA.
Relatório III – Desenvolvimento da cadeia Produzido sob encomenda Internet.
de valor de petróleo e gás e investimentos do BNDES.
em E&P, BNDES, Editores: Bain &
Company e Tozzini Freire Advogados, São
Paulo, Junho de 2009.
Navegando Juntos - Ano 1, Nº1, de Produzido pelo EEPSA
Jornal impresso
Setembro de 2013
Tabela 3 – Publicações oficiais.
Fonte Produção Própria (2013).
Ao analisar o conjunto de documentos relacionados na Tabela 3, objetivou-se, a partir do
conceito de ‘Análise de Conjuntura’, a redução a categorias apreensíveis da realidade social
cuja dinâmica revele as implicações dialéticas estabelecidas entre os atores. A análise conduziu
a investigação da dinâmica de implantação do Programa de Comunicação Social previsto na
Medida Mitigadora nº 40 do EIA/RIMA (2009).
Também é importante destacar que durante o processo de investigação, foram solicitados,
do Estado, Capitalistas e da comunidade, documentos a respeito do Programa de Comunicação
Social. Dos atores entrevistados, o único a enviar documentos referentes ao programa foi a
Secretaria da Indústria Naval e Portuária do Estado da Bahia (SEINP).
Com relação ao Estaleiro Enseada do Paraguaçu, em resposta ao questionário enviado por
e-mail, os documentos referentes ao Programa de Comunicação Social foram sonegados, tendo
como justificativa, se tratar de “documentos sigilosos da empresa”. O que levanta uma série de
questionamentos a serem abordados no transcorrer deste trabalho científico.
Os únicos documentos apresentados pelo Estaleiro foram a cópia impressa do primeiro
exemplar do jornal ‘Navegando Juntos - Ano 1, Nº1 de Setembro de 2013’, e cópias impressas
da apresentação, denominada pelo estaleiro “Press Trip”. Os documentos foram produzidos
pelo EEPSA e entregues após a resposta ao questionário.
43
A convite da empresa, o pesquisador participou de uma apresentação do empreendimento
voltado para a imprensa. O evento, “Press Trip”, ocorreu no dia 5 de setembro de 2013 no
escritório da empresa, localizado no canteiro de obras do Estaleiro, em Enseada do Paraguaçu.
Na oportunidade foram entregues 27 páginas de documentos, impressas em papel, no qual
está reproduzido parte da apresentação dos slides utilizados durante o “Press Trip”. Das 27
páginas, duas páginas contendo quatro slides fazem alusão ao Programa de Comunicação Social
do Estaleiro. Observando não foram entregues os documentos que comprovasse o cumprimento
da Medida Mitigadora nº 40.
Com relação aos membros da comunidade entrevistados, eles disseram desconhecer
documentos referentes ao programa, mas, um deles afirmou que participou de treinamento
promovido pelo Estaleiro, referente ao Programa de Comunicação Social, com a finalidade de
formar e contratar educomunicadores16, afirmando que a atividade não foi continuada e que os
educomunicadores não foram contratados. Este assunto também será analisado, em maior
profundidade, no transcorrer da dissertação.
PESQUISA DOCUMENTAL – PUBLICAÇÕES NA MÍDIA
As notícias sobre o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, além do envolvimento dos demais
atores na conformação do fenômeno, publicadas na mídia, também estão inclusos nos
procedimentos operatórios de levantamento de dados secundários. Em decorrência de se
caracterizarem por publicações midiáticas, e por estarem aglutinados dentro desta categoria,
buscou-se separar dos dados anteriormente listados. A seguir, são apresentadas na tabela
algumas das notícias pesquisadas, cujo conteúdo confirma a dimensão econômica e social do
fenômeno:
16
Educomunicador é o profissional que demonstra capacidade para elaborar diagnósticos e coordenar projetos no campo
da inter-relação Educação/Comunicação (ETHOS-HUMANUS, Nov. 2010, p. 28).
44
TABELA LISTA PUBLICAÇÕES NA MÍDIA SELECIONADAS PARA ANÁLISE
Descrição do documento
Autor e ou Fonte
Data
Indústria naval está na agenda Jornal Valor Econômico
30 de abril de 2012
positiva de Dilma
Bahia e Japão assinam acordo para SICM
01 de junho de 2012
atrair investimentos
Estaleiro Enseada do Paraguaçu Revista
Grandes 29 de setembro de 2012
ressuscita a indústria naval da Bahia Construções
Centros vão formar mão de obra SICM
17 de outubro de 2012
para estaleiro baiano
Estaleiro Enseada do Paraguaçu: um Secretaria de Comunicação 24 de janeiro de 2013
marco
para
indústria
naval
e do Governo da Bahia
portuária
Conteúdo nacional em petróleo terá Jornal Valor Econômico
27 de fevereiro de 2013
alvos regionais
Encontro
discute
negócios
no Secretaria de Comunicação 29 de maio de 2013
entorno do Estaleiro Enseada do do Governo da Bahia
Paraguaçu
Tabela 4 – Relação de publicações na mídia.
Fonte: Produção própria (2013).
Conforme exposto na Tabela 4, observando o conteúdo das notícias, pode-se inferir que
existe uma tendência a positivar o empreendimento. Enquanto as dificuldades da comunidade
local permanecem obscurecidas por ausência de abordagem jornalística, observando, também,
que a perspectiva da comunidade sobre o fenômeno não recebe tratamento jornalístico. No
transcorrer da dissertação uma análise aprofundada das publicações midiáticas é abordada a
partir das observações de Ignácio Ramonet (1995) sobre ‘O pensamento único e os novos
senhores do mundo’.
PESQUISA DOCUMENTAL – PRODUÇÃO DE FOTOGRAFIAS E ANOTAÇÕES
Com objetivo de proceder observação da realidade empírica foram realizadas visitas a
campo, compreendendo a sede do município de Maragogipe, a comunidade de São Roque do
Paraguaçu e o Estaleiro Enseada do Paraguaçu. As visitas tiveram roteiro pré-estabelecido,
45
tendo por finalidade a apreensão do movimento dialético entre os atores. Como forma de
documentação técnica, em todas as visitas, foram realizados registros na forma de fotografias e
anotações.
Com objetivo de produzir registro documental, na forma de imagens aéreas e em terra das
características físicas e sociais em que se desenvolve o fenômeno no Distrito de São Roque do
Paraguaçu, foram realizadas pelo pesquisador tomadas aéreas em momentos distintos da
pesquisa.
Os registros fotográficos contribuem para a validação da pesquisa e se constituem em
documentos passiveis de análises e constatações por outros cientistas. Kitahara (2007, p. 127)
explica que a “fotografia documental tem o mérito de registrar um momento de tempo real que
não mais se repetirá, e que será sempre lembrado.”.
José de Souza Martins (2011, p.26), em Sociologia da fotografia e da imagem, expressa
que “a imagem fotográfica foi incorporada por sociólogos e antropólogos como metodologia
adicional” no elenco de técnicas operacionais. Martins também destaca o fato da fotografia ser
utilizada por historiadores, como forma de analisar a documentação da realidade social do
passado. Ele destaca que um recurso operatório utilizado em diferentes campos das ciências,
“amplia e enriquece a variedade de informações de que o pesquisador pode dispor para
reconstruir e interpretar determinada realidade social.”.
A seguir, são relacionadas na tabela as datas e atividades desenvolvidas, bem como
objetivos delineados:
TABELA LISTA REGISTROS FOTOGRÁFICOS REALIZADOS DURANTE PESQUISA
Data
Descrição
Objetivo
Quantidade
de imagens
02/03/2012
Foram
realizadas
imagens Documentar com imagens o 200
aéreas compreendendo a sede campo de pesquisa, com
do município de Maragogipe; a objetivo
de
promover
sede e entorno do distrito de comparações
São Roque do Paraguaçu, a modificações
sobre
no
meio
sede do povoado de Enseada do físico. Desenvolver uma
Paraguaçu, e as instalações do percepção empírica de um
46
Estaleiro da Petrobras; parte do ângulo
Estaleiro
da
diferenciado,
Petrobras proporcionando uma visão
arrendado à EEPSA.
de totalidade do campo de
pesquisa.
05/09/2013
Foram realizadas imagens em Foram identificadas novas 50
terra, durante visita a sede do construções subnormais na
distrito de São Roque do comunidade,
além
Paraguaçu, e no escritório da existirem
empresa,
em
Enseada
de
ganhos
do inexpressivos na qualidade
Paraguaçu, onde está sendo de vida da comunidade, em
erguido
o
EEPSA,
foram decorrência
de
não
realizados registro fotográficos existirem
novos
da comunidade e das obras do equipamentos
estaleiro.
destinados
urbanos
ao
uso
comunitário, além das ruas
e avenidas da comunidade
apresentarem
traçados
irregulares, inclusive sem
benfeitorias,
como
calçamento
ou
pavimentação asfáltica.
Um dos poucos ganhos
identificados
execução,
foi
à
através
da
EMBASA, do sistema de
esgotamento sanitário, com
início das obras em março
de 2013, e previsão de
conclusão em setembro de
2014.
Com
extensão
da
relação
obra,
à
foi
confirmada a amplitude do
empreendimento,
bem
47
como
o
significativo
número de trabalhadores
contratados
para
construção
e
o
a
setor
administrativo.
23/09/2013
Registro de imagens aéreas Documentar com imagens o 120
compreendendo a sede do campo de pesquisa, com
município de Maragogipe; a objetivo
de
promover
sede e entorno do distrito de comparações
sobre
São Roque do Paraguaçu, a modificações
no
meio
sede do povoado de Enseada do físico. Desenvolver uma
Paraguaçu, e as instalações do percepção empírica de um
Estaleiro da Petrobras; parte do ângulo
Estaleiro
da
diferenciado,
Petrobras proporcionando uma visão
arrendado à EEPSA, e parte da de totalidade do campo de
construção do EEPSA.
02/10/2013
pesquisa.
Foram realizadas imagens em As condições empíricas da 69
terra, durante visita a sede do realidade social não tiveram
distrito de São Roque do mudanças
substantivas.
Paraguaçu. Foi realizada uma Foram
percebidos
navegação, através de barco, pescadores
realizando
nos Rios Baetantã e Paraguaçu, atividades
e feitos registros fotográficos.
nas
proximidades
da
comunidade, as águas dos
rios
apresentavam
tom,
densidade e odor normais.
Observando a comunidade,
é perceptível a necessidade
de
investimentos
no
ordenamento espacial, bem
como na construção de
moradias
que
tragam
48
conforto e dignidade as
pessoas.
20/11/2013
Registro de imagens aéreas Documentar com imagens o 150
compreendendo a sede do campo de pesquisa, com
município de Maragogipe; a objetivo
de
promover
sede e entorno do distrito de comparações
sobre
São Roque do Paraguaçu, a modificações
no
meio
sede do povoado de Enseada do físico. Desenvolver uma
Paraguaçu, e as instalações do percepção empírica de um
Estaleiro da Petrobras; parte do ângulo
Estaleiro
da
diferenciado,
Petrobras proporcionando uma visão
arrendado à EEPSA, e parte da de totalidade do campo de
construção do EEPSA.
pesquisa.
Neste estágio, percebe-se a
dimensão
da
obra
em
relação a sede do distrito de
São Roque do Paraguaçu, e
do povoado de Enseada.
Também foram registradas
imagens com significativos
aglomerados
de
trabalhadores nas obras do
EEPSA.
Tabela 5 – Relação de registros fotográficos realizados durante pesquisa.
Fonte: Produção própria (2013)
O conjunto de atividades descritos na Tabela 5 teve por finalidade documentar e apreender,
em campo, o movimento dialético entre os atores, possibilitando a análise e aplicação dos dados
coletados, no transcorrer da dissertação.
1.7.3 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
Segundo Richardson (2010, p.91) a ‘Observação Participante’ permite apreender
convicções subjetivas dos atores entrevistados. “... Não temos como desconhecer a validez dos
49
resultados da compreensão participante: são uma fonte crucial de conhecimento, pois derivam
da experiência do mundo social.” (RICHARDSON, 2010, p. 91 apud Hammersley & Atkinson,
1983, p. 234).
Bronislaw Malinowski (1978, p. 32) nos ensina que “devemos partir do fato de que o objeto
de nosso estudo são os modos estereotipados de pensar e sentir. Enquanto sociólogos, não nos
interessamos pelo que A ou B possam sentir como indivíduos no curso acidental de suas
próprias experiências; interessamo-nos, sim, apenas por aquilo que eles sentem e pensam
enquanto membros de uma dada comunidade”.
Com finalidade de observar a realidade social em que estão inseridos os atores da
comunidade de São Roque do Paraguaçu, foram realizados procedimentos operatórios
compreendendo a técnica da ‘Observação Participante’, sendo realizadas visitada em quatro
oportunidades distintas, compreendendo as seguintes datas: 30 de dezembro de 2011, 7 de
setembro e 2 de outubro de 2013, e 11 de janeiro de 2014.
1.7.4 ENTREVISTA EM PROFUNDIDADE
A técnica de ‘Entrevista em Profundidade’ permite captar o ponto de vista ou opiniões que
só podem ser descobertas por meio da pesquisa qualitativa com as pessoas envolvidas em um
fenômeno, explica Richardson (2010, p. 99). Ele também afirma que “o que importa é a
qualidade das informações, não o número de entrevistados que compartilha a informação.”.
Richardson (2010, p. 89) salienta que o uso de entrevistas e a observação melhoram a
formulação do problema, o levantamento de hipóteses e a determinação da amostra, e que na
coleta de dados, entrevistas, observações e discussões complementam as informações obtidas,
através das técnicas de ‘Pesquisa Qualitativa’. Richardson (2010, p. 91) afirma também que é
uma tentativa de “compreensão detalhada dos significados e características situacionais
apresentadas pelos entrevistados”.
Objetivando apreender a realidade através da perspectiva dos atores envolvidos, foram
realizadas entrevistas estruturadas abertas em profundidade com roteiro preestabelecido,
abordando os atores – Governo, Capitalistas e comunidade local. Conforme listado, a seguir:
a) Para determinar o papel do Estado na conformação do fenômeno, foram
realizadas entrevistas com:
50
Representante do MPF/BA, em duas oportunidades, 26 de fevereiro de 2013 e 8 de julho
de 2013. Revelou desconhecer o Programa de Comunicação Social e a dinâmica de implantação
da Medida Mitigadora nº 40;
Representantes do MPE/BA, também em duas oportunidades, em 27 de fevereiro de 2013
e 26 de julho de 2013. Revelaram desconhecer o Programa de Comunicação Social e a dinâmica
de implantação da Medida Mitigadora nº 40
Questionário enviado para a SEINP, no formato de e-mail, com resposta sendo
encaminhada em 12 de agosto de 2013. Foram encaminhados diversos documentos relativos ao
empreendimento, mas a SEINP disse desconhecer a dinâmica de implantação da Medida
Mitigadora nº 40;
Questionário enviado por e-mail para o IBAMA, em 10 de setembro de 2013. Como não
ocorreu resposta, foi protocolado requerimento de informações com base na Lei de Acesso a
Informação (LAI nº 12.257/2011) na sede do órgão, em Salvador, em 3 de outubro de 2013. A
resposta não foi obtida.
Deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores da Bahia Luiz Alberto Silva dos Santos,
durante cerimônia de batismo da plataforma P-59, no estaleiro da Petrobras alugado a EEPSA,
localizado na sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, Maragogipe, em 13 de julho de 2012.
Acompanhando o discurso da presidenta da república, Dilma Vana Rousseff, durante
cerimônia de batismo da plataforma P-59, no estaleiro da Petrobras alugado a EEPSA,
localizado na sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, Maragogipe, em 13 de julho de 2012.
b) Para determinar o papel dos Capitalistas na conformação do fenômeno, foi
realizada entrevista com:
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S/A, através do envio de e-mail, com resposta sendo
devolvida em 4 de setembro de 2013. É importante destacar que foram necessárias diversas
tentativas para conseguir as respostas da entrevista. As gestões tiveram início em fevereiro de
2013 e, apesar da insistência por telefone para que a entrevista fosse gravada pessoalmente, o
procedimento não foi autorizado pela empresa. A empresa também negou dados sobre o quadro
funcional, sobre o Programa de Comunicação Social, bem como dados sobre a Medida
Mitigadora nº 40, além de não ter apresentado peças de comunicação, a exceção da primeira
edição do jornal impresso ‘Navegando Juntos’, entregue posteriormente à resposta do
questionário.
51
Além do questionário eletrônico, ocorreu, a convite do estaleiro, uma visita a sede da
empresa, no canteiro de obras localizado no povoado de Enseada do Paraguaçu, ao lado da sede
do distrito de São Roque do Paraguaçu. O evento ocorreu em 5 de setembro de 2013, ele foi
denominado pela empresa como ‘Press Trip’ e teve objetivo de apresentar o empreendimento a
imprensa. Durante o evento foram realizados registros nos formatos de áudio e foto.
c) Para determinar a percepção da comunidade de São Roque do Paraguaçu, na
conformação do fenômeno, foram realizadas entrevistas com:
16 atores locais, em duas oportunidades distintas. A maioria dos entrevistados são
vinculados à pesca artesanal, e ou a agricultura familiar, a exceção de dois atores entrevistos.
O primeiro trabalha através de contratos temporários como soldador, prestando serviços às
empresas terceirizadas que operam reforma de embarcações no estaleiro da Petrobras. O
segundo ator entrevistado é vereador e proprietário de pequena empresa de transporte. Os
entrevistados possuem certo nível de protagonismo e liderança social, alguns exercem ou
exerceram cargos representativos na comunidade.
Todos afirmaram que a presença do Estaleiro Enseada do Paraguaçu melhorou a economia
local, mas que pouca coisa mudou em relação as próprias vidas. Com relação ao Programa de
Comunicação Social disseram desconhecer, a exceção de um dos atores que participou da
capacitação para se tornar um educomunicador, mas, “o contrato de trabalho não foi firmado”,
declara.
É importante destacar que além de não terem contato com peças de comunicação imprensa,
encontros que informassem sobre as atividades do estaleiro, ou participado dos cursos previstos
no Programa de Comunicação Social, dois entrevistados informaram que, eventualmente, um
carro de som passa na comunidade fazendo anúncios sobre o Estaleiro.
Para garantir a precisão dos registros, foram efetuadas gravações eletrônicas de áudio, e
quase a totalidade, a exceção de um dos atores, autorizaram que fossem feitos registros
fotográficos durante as entrevistas. Richardson (2010, p.87) observa que uma das formas de
confiabilidade da pesquisa reside na possibilidade de documentação, e que é comum o uso de
gravador para registrar entrevistas.
As entrevistas são utilizadas para confirmar ou refutar informações contidas nas análises
dos documentos, bem como buscam apreender a dinâmica de implantação da Medida
Mitigadora Nº 40.
52
A seguir, são explicitadas a ordem de análise dos atores, o papel que cada um representa
na relação, e apresentadas as categorias de análises, bem como o processo do qual elas
emergem.
ATORES E NÍVEIS DE ENVOLVIMENTO
O processo de análise dos conteúdos seguem uma ordem lógica de compreensão do
fenômeno e da trajetória de surgimento do mesmo. Ou seja, um determinado ator expressa a
necessidade de constituição, operação, e as condicionantes do empreendimento; o segundo ator
mobiliza as forças de trabalho para a constituição e operação do empreendimento, sendo
responsável pela implantação de parte das condicionantes; e o terceiro ator é impactado pelas
mudança que ocorrem nos meios físico, biótico e socioeconômico, sendo o receptor de parte
das condicionantes. Este percurso permite estabelecer uma hierarquia de produção e análise das
entrevistas qualitativas, que envolvem os três tipos de atores, conforme expresso a seguir:
a)
Estado – Quem determina a concepção, implantação e a quem cabe fiscalizar o
cumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e os objetivos do PCS;
b)
Capitalista – Quem deve implantar o PCS; e
c)
Comunidade – A quem se destina o PCS.
O gráfico a seguir explicita a sequência de levantamento e análises dos dados. É utilizando
como princípio lógico que: os fundamentos do PCS são delineados pelo Estado (Medida
Mitigadora nº 40), são os capitalistas que devem implementar o PCS, e é a comunidade que
deve recepcionar o programa e ser beneficiada pela Medida Mitigadora Nº 40 (PCS).
53
Estado
Capitalistas
Comunidade
• Desenvolve a Política Pública para o petróleo e gás (P&G);
• Realiza o estudo do EIA/RIMA 2009, estabelece as
condicionantes, e licencia o empreendimento;
• Estabelece os objetivos gerais e específicos do PCS, bem
como um cronograma básico e linhas gerais programáticas; e
• É responsável pela fiscalização do empreendimento, de acordo
com as condicionantes do EIA/RIMA (2009).
• São os operadores do empreendimento
• São responsáveis pelas mudanças nos meios físicos, biótico e
socioeconômico;
• São os responsáveis por implementar algumas condicionantes,
a exemplo do PCS; e
• Devem desenvolver e aplicar o PCS de acordo com o que
determinado no EIA/RIMA 2009, levando ao cumprimento da
Medida Mitigadora nº 40 e da e da condicionante da Licença
de Instalação nº 737/2010.
• É atingida pelo empreendimento nos três meios – físico,
ciótico e socioeconômico;
• Deve ser beneficiada pelo PCS, cuja responsabilidade é dos
capitalistas; e
• Deve auferir ganhos sociais de acordo com os estudos e
programas apontados no EIA/RIMA (2009), e de acordo com a
legislação ambiental estabelecida para o empreendimento.
Gráfico 1 – Hierarquia dos atores pesquisados.
Fonte: Próprio autor (2013).
Conforme exposto no Gráfico 1, os dados são analisados, quantificados e qualificados de
acordo com o tipo de questionamento e utilizando as técnicas anteriormente citadas, sendo
extraído, a partir da análise de conteúdo e análise do discurso, os resultados.
O processo de análise da pesquisa segue o mesmo princípio lógico, e busca responder:
54
a)
Se Estado fiscalizou e documentou o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, se
os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009)
foram alcançados e em que extensão isto ocorre;
b)
Se os capitalistas cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, se os objetivos previstos
no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram alcançados e em
que extensão isto ocorre; e
c)
Se a comunidade foi beneficiada pelo cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, se
os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009)
foram alcançados e em que extensão isto ocorre.
Para verificar se o objetivo geral e os objetivos específicos do Programa de Comunicação
Social, estabelecido pelo EIA/RIMA (2009), foram atendidos, e a Medida Mitigadora Nº 40 foi
cumprida, foram delineados três tipos de questionário. O primeiro objetiva levantar
informações junto ao Estado; o segundo é aplicado aos capitalistas; e o terceiro objetiva levantar
dados junto aos membros da comunidade.
Os questionários foram elaborados a partir da análise dos objetivos geral e específicos do
Programa de Comunicação Social, estabelecido pelo EIA/RIMA (2009). Tendo por finalidade
mensurar o cumprimento Medida Mitigadora nº 40 e a aplicação do Programa de Comunicação.
A seguir são expostos os objetivos:
OBJETIVO GERAL – Promover junto às comunidades das áreas de abrangência
direta e indireta do Empreendimento, processos de informação e educomunicação que
promovam a difusão de uma cultura de paz e sustentabilidade, assim como a segurança
das comunidades no ambiente onde vivem e na convivência com o Empreendimento.
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 72-73)
OBJETIVOS ESPECÍFICOS – Promover ampla comunicação educativa e interativa
com as comunidades das áreas de influência direta e indireta do Empreendimento,
sobre conservação ambiental, saúde e segurança, combate e enfrentamento à violência
infanto-juvenil, combate ao trabalho infantil, prevenção contra prostituição, DSTs e
disseminação do HIV, conflitos ambientais e de propriedade; (EIA/RIMA, 2009, v. 8,
p. 72-73)
Desenvolver projetos de comunicação do Empreendimento com as comunidades
da área de influência direta, difundindo informações atualizadas sobre o Estaleiro, a
prevenção de danos ambientais, perfis profissionais e qualificações exigidas para
contratação de mão de obra; oferecer a comunidade um telefone 0800 para
atendimento de queixas, denúncias e problemas ambientais; (EIA/RIMA, 2009, v. 8,
p. 72-73)
Difundir junto às comunidades de pesca e colônias de pescadores das áreas de
influência direta e indireta do Empreendimento, informações periódicas sobre o
movimento das embarcações e tráfego marítimo, evitando conflitos de acesso e
mobilidade; (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 73)
55
Difundir junto à comunidade de Enseada informações sobre o tráfego de caminhões
nos acessos ao Empreendimento, evitando conflitos de tráfego e mobilidade.
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 73)
Promover ações e estratégias de comunicação direcionadas a distintos segmentos da
comunidade, como para crianças, jovens e idosos, respeitando as suas especificidades
enquanto atores sociais, favorecendo o protagonismo, a coesão social e a
autodeterminação dos cidadãos. (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 73)
A partir dos objetivos delineados para o PCS, foram extraídas categorias de análise a serem
aplicadas nos questionários, que são respondidos pelos atores envolvidos – Estado, capitalistas
e a comunidade. Foi delimitado como campo de pesquisa junto à comunidade, moradores da
sede do distrito de São Roque do Paraguaçu. Os questionários objetivam levantar dados e
documentos concernentes ao cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e ao Programa de
Comunicação Social previsto no EIA/RIMA (2009). Observando o conjunto de dados, é
analisado se os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009)
foram alcançados, se cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, e se a condicionante da Licença
de Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social foi atendida, e
em que extensão isto ocorre.
As categorias de análise inseridas nos questionários foram extraídas, tomando como
princípio ‘A ordem do discurso’ de Michel Foucault (2011) que estabelece que o discurso
expressa objetivos (desejos) e finalidades (poder):
Por mais que o discurso seja aparentemente bem pouca coisa, as interdições que o
atingem revelam logo, rapidamente, sua ligação com o desejo e com o poder. Nisto
não há nada de espantoso, visto que o discurso - como a psicanálise nos mostrou - não
é simplesmente aquilo que manifesta (ou oculta) o desejo; é, também, aquilo que é o
objeto do desejo; e visto que - isto a história não cessa de nos ensinar - o discurso não
é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo
por que, pelo que se luta, o poder do qual nós queremos apoderar. (FOUCAULT, 2011,
p. 10)
O que Foucault (2011, p.10) expressa é que o discurso aponta para uma finalidade “o poder
do qual nós queremos apoderar”, como objetivos a serem atingidos. É com a aplicação do
questionamento ‘quais os objetivos a serem atingidos pelo PCS?’ que se chegou a categorias
passíveis de verificação junto aos atores – Estado, capitalistas e a comunidade. As categorias
foram configuradas na forma de questionamentos passíveis de análise e verificação. ~
A seguir, são apresentados as estruturas e os itens dos dispostos nos questionários, para
serem respondidos pelo Estado, capitalistas e a comunidade.
56
ENTREVISTA ESTRUTURADA ABERTA COM GESTORES PÚBLICOS
A entrevista direcionanda aos gestores públicos foi desenvolvido com objetivo de levantar
dados (documentos e explicações) com relação ao acompanhamento, documentação e
fiscalização da Medida Mitigadora nº 40, e com relação dialética estabelecida entre os atores,
respondendo se os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA
(2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, e se a condicionante da
Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social foi
atendida, e em que extensão isto ocorre.
Foram selecionados, no âmbito do Estado, gestores públicos17 das seguintes instituições:
Ministérios Públicos18 Federal (MPF), e Estado da Bahia (MP), Secretaria da Indústria Naval e
Portuária do Estado da Bahia (SEINP), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (IBAMA). As instituições foram selecionados a partir do envolvimento
das mesmas com o fenômeno. Este dado pode ser confirmando ao analisar a ‘Ata de Audiência
Pública realizada em Maragogipe (2008)19’, nele constam o envolvimento das instituições no
processo de implantação do Estaleiro.
No documento, representando o Governo do Estado da Bahia está o representante da
Superintendência de Desenvolvimento Industrial e Comercial da Bahia (SUDIC). Mas, foi
selecionando a SEINP para responder ao questionário, em decorrência da mudanças de
atribuições impostas pelo Governo da Bahia, no processo de implantação e acompanhamento
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Observa-se que, de acordo com as atribuições de cada representante do Estado envolvido
no processo de acompanhamento, documentação e fiscalização da Medida Mitigadora nº 40, e
com relação dialética estabelecida com a comunidade e os Capitalistas, as questões listadas
Ver Anexo 8.1 – Nota explicativa sobre a pesquisa apresentada aos gestores públicos.
A organização do MP no Brasil está dividida entre o Ministério Público da União (MPU) e o Ministério Público dos
Estados (MPE). O MPU compreende os ramos: Ministério Público Federal (MPF); Ministério Público do Trabalho
(MPT); Ministério Público Militar (MPM) e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). O MPE possui
unidades representativas em todos os Estados. [...] O MPU é regido pela Lei Complementar n.º 75/1993 e o MP pela lei
n.º 8.625/1993. [...] O Ministério Público (MP) é um órgão de Estado que atua na defesa da ordem jurídica e fiscaliza o
cumprimento da lei no Brasil. Na Constituição de 1988, o MP está incluído nas funções essenciais à justiça e não possui
vinculação funcional a qualquer dos poderes do Estado. [...] Considerado o fiscal das leis, o órgão atua como defensor do
povo. É papel do MP defender o patrimônio nacional, o patrimônio público e social. O que inclui o patrimônio cultural,
o meio ambiente, os direitos e interesses da coletividade, especialmente das comunidades indígenas, a família, a criança,
o adolescente e o idoso. [...] O MP atua também na defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis e no controle
externo da atividade policial. Desta forma, o órgão trata da investigação de crimes, da requisição de instauração de
inquéritos policiais, da promoção pela responsabilização dos culpados, do combate à tortura e aos meios ilícitos de provas,
entre outras possibilidades de atuação. Os membros do MP têm liberdade de ação tanto para pedir a absolvição do réu
quanto para acusá-lo. (Ministério Público – Funções do MP, 2013)
19 Ver Anexo 8.6 – Ata de Audiência Pública realizada em Maragogipe (2008).
17
18
57
anteriormente, foram reordenadas, sendo suprimido pontos de questionamento de acordo com
a competência institucional do ator selecionado. Não obstante, foram solicitados, de todos os
atores ligados ao Estado, documentos que comprovassem o cumprimento da Medida
Mitigadora nº 40 e a aplicação do Programa de Comunicação Social20.
ENTREVISTA ESTRUTURADA ABERTA COM CAPITALISTAS
A entrevista direcionada aos capitalistas (Estaleiro Enseada do Paraguaçu S/A) foi
desenvolvido com objetivo levantar dados (documentos e explicações), com relação ao
cumprimento, avaliação e documentação da Medida Mitigadora nº 40, e com relação a dialética
estabelecida com a comunidade e o Estado, respondendo se os objetivos previstos no Programa
de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida
Mitigadora nº 40, e se a condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o
Programa de Comunicação Social foi atendida, e em que extensão isto ocorre21.
ENTREVISTA ESTRUTURADA ABERTA COM A COMUNIDADE
A entrevista direcionada à comunidade foi desenvolvida com o objetivo de levantar dados
(documentos e explicações) com relação ao cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e com
relação a dialética estabelecida com os capitalistas (Estaleiro Enseada do Paraguaçu) e o Estado.
O objetivo é responder se os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do
EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, e se a
condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de
Comunicação Social foi atendida, e em que extensão isto ocorre.
Objetiva-se compreender de que maneira a comunidade é afetada pelo fenômeno, sendo ou
não beneficiada pelas modificações socioeconômicas ocorridas no território. Como campo de
pesquisa, foram selecionados os moradores da sede do distrito de São Roque do Paraguaçu.
Observou-se dois aspectos: proximidade com o fenômeno e significativo número de pessoas
afetadas. É importante esclarecer que a escolha da comunidade da sede do distrito ocorreu
também, porque antes mesmo de serem iniciadas as obras de construção do EEPSA, o estaleiro
operou e opera através de instalações arrendadas da Petrobras (Canteiro de Obras de São Roque
do Paraguaçu). Estas instalações ficam na sede do distrito22.
Ver Anexo 8.2 – Roteiro de entrevista estruturada aberta com gestores públicos.
Ver Anexo 8.3 – Roteiro de entrevista estruturada aberta com capitalistas.
22 Ver Anexo 8.4 – Roteiro de entrevista estruturada aberta com a comunidade.
20
21
58
FORMA DE ANÁLISE DOS DADOS
Após realizadas as entrevistas, os dados serão analisados de duas formas: apresentado as
informações dos atores no formato de citação, e ou distribuindo os dados em uma tabela. Em
ambas situações, serão procedidas quantificações, análises, observações e conclusões de acordo
com os conceitos de Análise de Conteúdo e Analise do Discurso. Com os resultados
apresentados, é revista a análise da Medida Mitigadora nº 40.
No próximo tópico é apresentada a síntese de análise da Medida Mitigadora Nº 40, e as
etapas necessárias a responder se ocorreu o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, se os
objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram
alcançados e em que extensão isto ocorre.
1.8 ANÁLISE DA MEDIDA MITIGADORA NÚMERO 40
A articulação do método de Marx – Materialismo dialético e histórico – com os métodos e
técnicas de pesquisa, aplicados aos dados levantados, conformam os instrumentos científicos
utilizados com objetivo de revelar a dinâmica de implantação do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu (EEPSA), em dialética com a comunidade e o Estado. Esta dialética é revelada a
partir da análise da Medida Mitigadora de Nº 40. Para responder a questão central, no que tange
o processo de implantação e a dinâmica da Medida Mitigadora de Nº 40, serão abordados, no
transcorrer da dissertação e na conclusão, os seguintes aspectos:
1 – Descrição dos atores sociais;
2 – Como é avaliada a implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu pelos atores
sociais;
3 – O que determina a Medida Mitigadora Número 40;
4 – Como o Estado atua na fiscalização da implantação da Medida Mitigadora Nº 40 e
que documentos possuem;
5 – A Medida Mitigadora Número 40 estabelece um Programa de Comunicação Social
(PCS) a ser implantado pelos capitalistas:
a) Levantar se ocorreu a implantação do PCS;
b) Se ocorreu, em que medida foi implementado;
c) Se ocorreu, levantar se possuem documentos sobre o mesmo;
d) Se ocorreu, como medem os efeitos do PCS junto à comunidade.
59
6 – Levantar como a comunidade percebe os atos comunicacionais do estaleiro,
estabelecido no PCS;
7 – Que mudanças sociais a comunidade percebe com a implantação do estaleiro;
8 – Como a comunidade percebe a relação com o Estaleiro; e
9 – Como a comunidade percebe a relação com o Estado.
Para efeito de lapso temporal, foi estabelecido que a análise da Medida Mitigadora tem,
compreende o período de 28 de outubro de 2010 – com a concessão da Licença de Instalação
Nº 737/2010, feita pelo IBAMA; até 4 de setembro de 2013 – data em que o Estaleiro Enseada
do Paraguaçu responde ao questionário sobre a Medida Mitigadora nº 40, e responde à
solicitação de envio de documentos concernentes ao Programa de Comunicação Social.
Observado os aspectos relacionados à Medida Mitigadora Nº 40, o que se objetiva é
analisar em profundidade:
a) Como ocorre a relação dialética entre Estado, capitalistas e a comunidade;
b) Se a Medida Mitigadora nº 40 foi cumprida;
c) Em qual extensão isto ocorre; e
d) Quais efeitos causou.
Finalizando a introdução da pesquisa, no próximo tópico é apresentada a síntese da
estrutura dos capítulos.
1.9 ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS
A dissertação é estruturada em seis capítulos com as seguintes características gerais:
Capítulo I – É apresentada a Introdução, sendo descritos de forma sucinta o fenômeno e o
envolvimento dialético dos atores – Estado, capitalistas e a comunidade – são apresentados,
também, os fundamentos epistemológicos, problema, objetivos, e hipótese, é detalhadamente
exposto o método de análises dos dados, os procedimentos operatórios para levantamento dos
dados, correlacionados os dados levantados, descrita a Medida Mitigadora Nº 40, além de
apresentado resumo bibliográfico.
Capítulo II – São apresentadas as determinações mais gerais que explicam o fenômeno,
através da análise marxista do processo de globalização e acumulação flexível, analisando como
estes elementos se articulam no intuito de estabelecer o Império no Recôncavo da Bahia. Outro
60
aspecto abordado no capítulo é com relação ao conceito de ‘Capitalismo’. Na sequência é
apresentada trajetória do surgimento e evolução do ‘Modo de Produção Capitalista’.
Examina-se a ação dos capitalistas nas modificações nos espações físicos e social, sendo
aprofundado o conceito de despossessão da massa e as implicações na comunidade de São
Roque do Paraguaçu. É analisado o conceito de Políticas Públicas e dos processos de
Accountability e Empowerment. O capítulo é concluso com uma síntese, abordando os temas
analisados.
Capítulo III – Retrocede ao momento em que os portugueses descobrem o Brasil, e passam
a dominar, dando início ao ‘amálgama do povo brasileiro’. É apresentado como a acumulação
primitiva ocorreu no Recôncavo da Bahia, e de que maneiras os fluxos capitalistas ascendentes
e descentes imprimariam características socioeconômicas na totalidade do território.
Observando que é no Recôncavo que é implantado o Estaleiro, é analisado o processo
histórico de constituição da comunidade de Maragogipe, e de que maneira a comunidade
contribuiu com o desenvolvimento capitalista no Brasil.
Na sequência, são apresentados os indicadores sociais da comunidade, e as características
do território, sendo relatada uma síntese das características históricas da comunidade do distrito
de São Roque do Paraguaçu, local de implantação e operação do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu.
A digressão permite aprofundar a perspectiva histórica do fenômeno e estabelecer ligações
diacrônicas entre os atores – Estado, capitalistas e a comunidade – permitindo análises mais
densas sobre as relações de poder, subordinação e mais-valia.
Na conclusão do capítulo é abordada a dívida histórica do Estado, com os povos
tradicionais, e analisadas as implicações dos elementos da sociedade senhorial, no
desenvolvimento capitalista.
Capítulo IV – Aborda o processo histórico de transição, no Brasil, do escravagismo, para
o modo de produção capitalista. Na sequência, é explicitado como o capitalismo se desenvolve
no país, observa-se nesse contexto, como a Política Pública foi utilizada para apoiar o
surgimento do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A. (EEPSA), e utilizando-se de documentos,
é comprovada como a Política Pública do Petróleo e Gás torna-se práxis, sendo adotada pelos
capitalistas para criação do empreendimento.
61
Também é discorrido como uma ideologia dominada pelo ‘pensamento único’ pressiona o
Estado a diminuir a interferência no mercado induzindo a adotar o neoliberalismo. O capítulo
é concluso com a apresentação dos indicadores, Gini23 e IDH24 (Índice de Desenvolvimento
Humano), sendo analisadas como as políticas dos governos FHC e Lula produziram resultados
diferentes, e de que maneira isto tem reflexo sobre os indicadores de desigualdade social e
concentração de renda no país. O capítulo é concluso com uma síntese dos conceitos
apresentados.
Capítulo V – Versa sobre o protagonismo do Estado como organizador e indutor de força
produtiva, o papel que desenvolve no surgimento do Estaleiro, no estabelecimento do
EIA/RIMA (2009) e nas condicionantes da Licença de Instalação Nº 737/2010, tendo como
consequência o estabelecimento de uma relação dialética entre os atores – Estado, capitalistas
e a comunidade.
Na sequência, é apresentada síntese da participação dos capitalistas na fundação do
Estaleiro, sendo analisadas as características da composição acionária. É observada, a partir da
perspectiva dos capitalistas, se os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do
EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, se a
condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de
Comunicação Social foi atendida.
O Capítulo também aborda a dialética entre o Estado e os capitalistas a partir da perspectiva
da comunidade, sendo apresentadas e a analisadas as respostas da entrevista estruturada aberta
com membros da comunidade. É examinado como a comunidade avalia os objetivos do
23
O Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado Gini, é um instrumento para medir o grau de concentração
de renda em determinado grupo. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos.
Numericamente, varia de zero a um (alguns apresentam de zero a cem). O valor zero representa a situação de igualdade,
ou seja, todos têm a mesma renda. O valor um (ou cem) está no extremo oposto, isto é, uma só pessoa detém toda a
riqueza. Na prática, o Índice de Gini costuma comparar os 20% mais pobres com os 20% mais ricos. No Relatório de
Desenvolvimento Humano 2004, elaborado pelo Pnud, o Brasil aparece com Índice de 0,591, quase no final da lista de
127 países. Apenas sete nações apresentam maior concentração de renda. (WOLFFENBÜTTEL, 2013) (Grifo nosso)
24 Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – O conceito de desenvolvimento humano, bem como sua medida, o Índice
de Desenvolvimento Humano - IDH, foram apresentados em 1990, no primeiro Relatório de Desenvolvimento Humano
do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, idealizado pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq e com
a colaboração e inspiração no pensamento do economista Amartya Sen. A popularização da abordagem de
desenvolvimento humano se deu com a criação e adoção do IDH como medida do grau de desenvolvimento humano de
um país, em alternativa ao Produto Interno Bruto, hegemônico à época como medida de desenvolvimento. O IDH reúne
três dos requisitos mais importantes para a expansão das liberdades das pessoas: a oportunidade de se levar uma vida
longa e saudável – saúde, ter acesso ao conhecimento – educação, e poder desfrutar de um padrão de vida digno – renda.
O IDH obteve grande repercussão mundial devido principalmente à sua simplicidade, fácil compreensão e pela forma
mais holística e abrangente de mensurar o desenvolvimento. Transformando em um único número a complexidade de três
importantes dimensões, o IDH tornou-se uma forma de compreensão e fomento da discussão e reflexão ampla sobre o
significado de desenvolvimento humano para a sociedade. (ATLAS BRASIL, 2013)
62
Programa de Comunicação Social estabelecido no EIA/RIMA (2009), se foram beneficiadas
pelo programa, e em que extensão isto ocorre.
Analisando o que foi determinado pelo Estado, através do EIA/RIMA (2009) e da Licença
de Instalação Nº 737/2010, é verificado como o Estado acompanha, documenta e fiscaliza o
processo de instalação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, observando se os pressupostos dos
conceitos de Accountability e Empowerment foram atendidos. Verifica-se, a partir da
perspectiva do Estado se os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do
EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, e se a
condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de
Comunicação Social foi atendida.
No último tópico do capítulo é apresentada uma síntese das análises, com a constatação da
supremacia do Império através da dialética da superexploração e degradação ambiental. O
capítulo é concluso ao analisar se os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social
do EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, e se a
condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de
Comunicação Social foi atendida.
No próximo capítulo é discorrido como o processo de acumulação primitiva influencia o
desenvolvimento socioeconômico do Recôncavo da Bahia e de que maneira esse processo com
fluxos de ascensão e decadência econômica, influencia na acumulação capitalista em
Maragogipe, além de observar como o processo apresenta reflexos nos indicadores estatísticos
da população. Observar-se, por fim, como o Estado responde ao ciclo de decadência econômica,
através do aprofundamento das relações capitalistas, em especial com desenvolvimento do
capital petrolífero, analisando quais as implicações decorrentes desse fenômeno.
Capítulo VI – No último capítulo da dissertação são apresentadas as conclusões, sendo
revista a questão central desta pesquisa, as contribuições do trabalho, e observadas questões
que não foram respondidas, finalizando com uma abordagem sobre a necessidade de uma nova
alteridade, uma nova forma de desenvolvimento humano que conduza ao reequilíbrio com a
natureza.
63
2 ANÁLISE MARXISTA SOBRE A GLOBALIZAÇÃO E O AVANÇO DO
IMPÉRIO NO RECÔNCAVO DA BAHIA
A acumulação perpétua a uma taxa composta depende da
disponibilidade permanente de reservas suficientes de acesso à
força de trabalho. O que Marx chama de “exército industrial de
reserva” é, portanto, uma condição necessária para a reprodução
e a expansão do capital. Esse exército de reserva deve ser
acessível, socializado e disciplinado, além de ter as qualidades
necessárias (isto é, ser flexível, dócil, manipulável e qualificado
quando preciso). (HARVEY, 2011, p. 55)
Neste capítulo é fundamentada a escolha epistemológica pela abordagem cientifica
proposta por Karl Marx, e pelos marxista David Harvey, Giovanni Arrighi, István Meszáros
Michael Hardt e Antônio Negri. Também é apresentado o conceito de ‘Capitalismo’, e uma
breve trajetória do surgimento e evolução do ‘Modo de Produção Capitalista’.
São delimitadas, a partir da perspectiva globalização, as transições do regime de
acumulação ‘Fordista’, para ‘Acumulação Flexível’, e o conceito de ‘despossessão de massas’.
Ainda, na abordagem teórica, são apresentados os conceitos de Accountability e Empowerment,
pertinentes ao campo da Análise de Políticas Públicas, como instrumentos explicativos da
realidade social em que ocorre o processo de dialética entre os atores.
Esses elementos são a base explicativa para determinar como a globalização, ou seja, como
a expansão do Império explica o surgimento de um empreendimento que utiliza elevado volume
de capital e trabalho especializado em uma comunidade marcada por relações tradicionais de
produção.
2.1 O PENSAMENTO MARXISTA E AS CRISES DO CAPITAL
A atualidade do pensamento marxista nas análises das contradições entre o capital e o
trabalho emerge mais uma vez no discurso acadêmico e midiático em decorrência,
principalmente, da sequência de crises estabelecidas nas economias centrais. A obra de Marx
torna-se seminal para compreensão e análise das contradições inerentes ao mundo burguês.
Outro importante autor a abordar as contradições do modo de produção capitalista é Harvey
(2012), que teoriza a mudança entre o modelo de Acumulação Fordista, para a modelo de
‘Acumulação Flexível’, ao explicitar que o ano de 1973 marca a mudança:
64
A profunda recessão de 1973, exacerbada pelo choque do petróleo, evidentemente
retirou o mundo capitalista do sufocante torpor da "estagflação" (estagnação da
produção de bens e alta inflação de preços) e pôs em movimento um conjunto de
processos que solaparam o compromisso fordista. Em consequência, as décadas de 70
e 80 foram um conturbado período de reestruturação econômica e de reajustamento
social e político. No espaço social criado por todas essas oscilações e incertezas, uma
série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e
política começou a tomar forma. Essas experiências podem representar os primeiros
ímpetos da passagem para um regime de acumulação inteiramente novo, associado
com um sistema de regulamentação política e social bem distinta. (HARVEY, 2012,
p. 140)
Ao analisar a citação de Harvey (2012), observa-se que a crise do capital, levou a um
processo de mudança nos meios de produção, saindo do regime ‘fordista’ para a ‘acumulação
flexível’.
Observa-se que o pensamento marxista também ressurge no Brasil com maior intensidade
em função das mudanças econômicas promovidas pelo Estado, a partir do governo Lula, em 1º
de janeiro de 2003. Diferente das economias centrais, o Brasil atravessa um ciclo de
crescimento com forte presença do Estado. Marx e Engels (1848, p. 13) expressam a tomada
de posição como algo inerente ao Estado burguês: “A burguesia, afinal, com o estabelecimento
da indústria moderna e do mercado mundial, conquistou para si própria, no Estado
representativo moderno, autoridade política exclusiva. O Poder Executivo do Estado moderno
não passa de um comitê para gerenciar os assuntos comuns de toda a burguesia.”.
A expansão capitalista no Brasil, como em todas as nações, ocorre a partir da dialética entre
os atores ensejando conflito e completariedade, o que provoca transformações mútuas. Levando
a necessidade de análises e debates sobre o processo de globalização no país, e os reflexos nas
questões locais, a partir de uma perspectiva marxista. Sobre as contradições do capitalismo,
Marx (2008, p. 264) explica: “A sociedade burguesa não é em si mais do que uma forma
antagônica do desenvolvimento.”.
Quando se observa que expansão e crise econômica são questões fecundas do próprio
Modo de Produção Capitalista (MPC), os estudos marxistas se tornam essenciais para análise
dos conflitos. Conflitos que uma parte da humanidade atravessa no momento, com a diminuição
do trabalho formal e o incremento de formas ainda mais subordinadas de trabalho25, como
explica Mészáros (2011a):
25
A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em recente relatório com dados que são bastante moderados, projetou
novos 50 milhões de desempregados ao longo de 2009. Bastaria que uma das grandes montadoras dos Estados Unidos
fechasse suas portas e teríamos milhões de novos desempregados. Na Europa, os jornais listam diariamente milhares de
novos trabalhadores sem-trabalho. O mesmo relatório da OIT ainda acrescenta que cerca de 1,5 bilhão de trabalhadores
sofrerão forte erosão salarial e ampliação do desemprego nesse mesmo período. Mas sabe-se que a contabilização mundial
65
o quadro de crise estrutural e sistêmica tem outro componente vital, dado pela
corrosão do trabalho. Depois da intensificação do quadro crítico nos Estados Unidos
e demais países capitalistas centrais, estamos presenciando profundas repercussões no
mundo do trabalho em escala global. No meio do furacão da crise que agora atinge o
coração do sistema capitalista, vemos a erosão do trabalho relativamente contratado e
regulamentado, herdeiro da era taylorista e fordista, modelo dominante no século XX
— resultado de uma secular luta operária por direitos sociais — que está sendo
substituído pelas diversas formas de “empreendedorismo”, “cooperativismo”,
“trabalho voluntário”, “trabalho atípico”, formas que oscilam entre a
superexploração26 e a própria autoexploração do trabalho, sempre caminhando em
direção a uma precarização estrutural da força de trabalho em escala global. Isso sem
falar na explosão do desemprego que atinge enormes contingentes de trabalhadores,
sejam homens ou mulheres, estáveis ou precarizados, formais ou informais, nativos
ou imigrantes, considerando que estes últimos são os primeiros a serem mais
fortemente penalizados. (MÉSZÁROS, 2011a, p. 13)
Ao analisar a citação de Mészáros (2011a), observa-se que o processo expansão capitalista
é acompanhado do aumento da taxa de mais-valia, com a deterioração das relações
capital/trabalho a favor dos capitalistas, conduzindo a humanidade a vivenciar o dilema da
mudança frente à crise que perpassa as economias centrais, e como em outras épocas, atinge de
diferentes modos às economias em rápido crescimento, ou emergentes, como a brasileira, além
de afetar os países que estão na chamada periferia do capitalismo.
A crise atual é decorrente de um movimento especulativo, algo que também não é novo no
capitalismo. Marx (1982, p.10) afirma que “ao estudar o dinheiro, tanto quando se reveste de
uma forma própria, distinta da forma natural da mercadoria, como quando se refere à sua função
como meio de pagamento, o dinheiro traz sempre a possibilidade de crise”. Harvey (2011) alerta
para o perigo que representa o estancamento do fluxo de capitais, comparando-o a função e
importância que o sangue tem no corpo humano:
O capital é o sangue que flui através do corpo político de todas as sociedades que
chamamos de capitalistas, espalhando-se, às vezes como um filete e outras vezes
como uma inundação, em cada canto e recanto do mundo habitado. É graças a esse
fluxo que nós, que vivemos no capitalismo, adquirimos nosso pão de cada dia, assim
como nossas casas, carros, telefones celulares, camisas, sapatos e todos os outros bens
necessários para garantir nossa vida no dia a dia. A riqueza a partir da qual muitos dos
serviços que nos apoiam, entretém, educam, ressuscitam ou purificam são fornecidos
é criada por meio desses fluxos. Ao tributar esse fluxo os Estados aumentam seu
poder, sua força militar e sua capacidade de assegurar um padrão de vida adequado a
de emprego não capta em profundidade o desemprego oculto, frequentemente mascarado nas estatísticas oficiais.
(MÉSZÁROS, 2011a, p. 13)
26 O conceito de superexploração procura dar conta de maneira estrutural do peculiar desenvolvimento do capitalismo nas
periferias, por seu caráter dependente e integrado, desigual e combinado, contraditório e tenso, através de dois
determinantes fundamentais: o truncamento da lei do valor e a precariedade do mercado interno. Partindo de Marx, Marini
distingue entre a exploração apoiada no aumento da capacidade produtiva e aquela apoiada na violação do valor da força
de trabalho, consistindo, esta última, na conversão do fundo necessário do consumo dos operários em fundo de
acumulação de capitais. Daí resultaria uma redução da vida útil dos trabalhadores brasileiros (ou periféricos) pelo desgaste
imposto à sua reprodução sempre incompleta. Os trabalhadores dos países capitalistas periféricos suportariam a agregação
de todas as formas de exploração, desde aquelas sob a vigência da lei do valor, como a extensão de jornadas, intensificação
do trabalho, com o aumento da produtividade, até aquelas fora da lei do valor, acarretando a redução da própria vida dos
trabalhadores. (FONTES, 2010, p. 352)
66
seus cidadãos. Se interrompemos, retardamos ou, pior, suspendemos o fluxo,
deparamo-nos com uma crise do capitalismo em que o cotidiano não pode mais
continuar no estilo a que estamos acostumados. (HARVEY, 2011, p. 7)
Ao analisar a citação de Harvey (2011) observa-se que o incremento das taxações dos
fluxos sobre o capital, fez com que o Estado adquirisse um poder econômico ainda mais
acentuado. No caso brasileiro, atuando como indutor, organizador, e ou reorganizador das
forças produtivas locais. A exemplo da implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, cujo
resultado da produção – plataformas, navios e sondas petrolíferas – são destinados como
principal contratante a empresa estatal petrolífera, Petrobras. A finalidade é ampliar a
capacidade de produção da Petrobras, com o incremento da extração de petróleo em águas
profundas, elevando a importância econômica do Brasil no jogo de ralações internacionais do
grande capital. É importante destacar que o petróleo é uma commodity precificada e demandada
globalmente, portanto, local e global encontram-se plenamente conectados.
Para reforçar a atualidade do pensamento marxista, como base epistemológica de análise
dentro do contexto apresentado, é citado um trecho da matéria: ‘Nova edição de "O Capital" e
ciclo de seminários mostram vitalidade de Marx’, publicada no jornal Folha de São Paulo, por
Cassiano Elek Machado (2013), onde afirma que: “no Brasil, ao menos, as ideias do filósofo,
economista, cientista social, jornalista e historiador vivem um de seus grandes momentos.”. A
matéria destaca o ciclo de palestras e debates sobre Marx, que ocorreu em vários Estados
brasileiros, no período entre março e maio de 2013, e contou com 20 intelectuais de diversas
áreas, incluindo personalidades acadêmicas internacionais, a exemplo de Slavojiek, Michael
Heinrich e David Harvey.
Destaca-se o fato de que o jornal é de tendência liberal, que defende como princípio a livre
iniciativa. Outro aspecto a ser notado é que o autor da matéria ao afirmar que “no Brasil, ao
menos” os debates sobre Marx adquirem importância, entra em contradição ao informar os
nomes de intelectuais estrangeiros como palestrantes. Ou seja, as ideias de Marx estão em
debate não apenas no Brasil, bem como em vários centros acadêmicos ao redor do mundo,
porque entre os clássicos da sociologia, Marx, Durkheim e Weber, é Marx quem mais se
aprofunda na análise das contradições do sistema capitalista:
A necessidade de um mercado em expansão constante para seus produtos persegue a
burguesia por toda a superfície do globo. Precisa instalar-se em todos os lugares,
acomodar-se em todos os lugares, estabelecer conexões em todos os lugares. A
burguesia, por meio de sua exploração do mercado mundial, deu um caráter
cosmopolita para a produção e o consumo em todos os países. Para grande desgosto
dos reacionários, rebaixou a base nacional da indústria até o rés do chão. As indústrias
nacionais antigas foram destruídas ou seguem sendo destruídas dia após dia. Elas são
67
desalojadas por novas indústrias, cuja introdução torna-se questão de vida e morte
para todas as nações civilizadas; por indústrias que não mais trabalham com matériaprima nacional, mas matéria-prima extraída de zonas remotas; cujos produtos são
consumidos não só no próprio país, mas em todos os cantos do globo. Em lugar das
antigas necessidades, satisfeitas pela produção do país, encontramos novas
necessidades, exigindo para satisfazê-las produtos de terras e climas distantes. No
lugar da antiga reclusão e autossuficiência local e nacional, temos conexões em todas
as direções, uma interdependência universal das nações. E tanto em produção material
como em produção intelectual. As criações intelectuais de nações individuais tornamse propriedade comum. A parcialidade e a mentalidade tacanha nacional tornam-se
sempre mais impossíveis e, das numerosas literaturas nacionais e locais, forma-se uma
literatura universal. (MARX, ENGELS, 1842, p.14-15)
É importante notar como Marx elenca na passagem citada algumas das categorias básicas
inerentes ao capitalismo: mercado em expansão constante, exploração do mercado mundial,
interdependência dos mercados com a eliminação da autossuficiência local.
Outra notícia midiática que merece destaque é a entrevista concedida à revista Veja
(COSTA, 2013) por Douglas Flint, presidente do Conselho de Administração do HSBC27 no
Brasil, quando questionado se o desempenho do Brasil, e dos emergentes, não tem desapontado
o banco. Flint respondeu: “Não, de forma alguma. É até mesmo um afronta a forma como esses
mercados vêm crescendo e se desenvolvendo ao longo da última década. Tanto que agora são
chamados de mercados de rápido crescimento – não mais de emergentes, pois eles já
emergiram. São mercados que investiram em educação e têm abundância de recursos naturais.
O que é, definitivamente, o caso do Brasil.”. Sobre o crescimento da economia completou: “O
ritmo diminuiu porque a economia vem se acomodando. Ainda assim, é um ritmo mais
acelerado do que na Europa e nos Estados Unidos. Não seria saudável para o Brasil crescer
7,5% ao ano todos os anos, pois o crescimento poderia sair do controle e impulsionar ainda
mais a inflação. Agora há uma pausa para a consolidação que faz com que não haja o
superaquecimento, mas isso não significa que o país esteja em situação ruim. Essa acomodação
que ocorre no mercado brasileiro se deve também ao impacto da crise externa. Não é suficiente
para criar pessimismo em relação ao país.”.
A afirmação parte de um protagonista com importante significado na economia brasileira28
e global. O grupo financeiro HSBC é classificado pelo REALBANKS (2012) como o segundo
maior grupo financeiro do mundo, com US$ 2,692.54 trilhões de dólares em ativos. Isto dá a
dimensão que o Brasil adquire dentro da economia global e de que maneira os grupos
27
O HSBC Bank Brasil representa no país um dos principais grupos financeiros do mundo. O Grupo HSBC é uma das
maiores organizações de serviços bancários e financeiros do mundo, com uma ampla gama de negócios na Europa, ÁsiaPacífico, Américas, Oriente Médio e África. Foi fundado em 3 de março de 1865. Em 1991, mudou a sede para Londres,
Inglaterra, onde passou a chamar-se HSBC Holdings plc. (HSBC, 2013)
28 O HSBC é o 7º maior banco do país em ativos, segundo ranking do Banco Central divulgado em 2012. (BC, 2013)
68
financeiros percebem o país nas estratégias de expansão capitalista. Diferente da visão
pessimista dos analistas midiáticos, e dos opositores do governo, os capitalistas percebem que
o Brasil entrou em um processo de crescimento econômico continuado e querem participar do
processo, melhor, querem atuar como protagonistas da expansão capitalista brasileira.
2.2 A GLOBALIZAÇÃO E A MUDANÇA NO MODO DE ACUMULAÇÃO
CAPITALISTA
Como visto anteriormente, global e local estão interconectados pela expansão capitalista,
e que é Karl Marx o principal cientista a conceituar as contradições deste modo de produção. A
seguir, são apresentados os conceitos teóricos deste modo de produção, como ele evolui no
tempo, e de que maneira as recentes mudanças no processo de globalização são explicados
através dos conceitos teóricos de mudança no MPC, do ‘Imperialismo’ para ‘Império’, e do
modo de ‘Acumulação Fordista’ para ‘Acumulação Flexível’, e justificam o surgimento do
estaleiro em São Roque do Paraguaçu.
2.3 CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DO ‘MODO DE PRODUÇÃO
CAPITALISTA’
O ‘Modo de Produção Capitalista’ (MPC) ou ‘Capitalismo’, explica Tom Bottmore (2012,
p. 75-76), é o modo de produção em que o capital, nas diferentes formas, é o principal meio de
produção. “O capital pode tomar a forma de dinheiro ou de crédito para a compra da força de
trabalho e dos materiais necessários à produção, a forma de maquinaria física (capital em
sentido estrito), ou, finalmente, a forma de estoques de bens acabados ou de trabalho em
processo.”. Qualquer que seja a forma do capital é a propriedade privada do capital nas mãos
de uma classe, a classe dos capitalistas ou burgueses29, com a exclusão do restante da população,
que constitui a característica básica do capitalismo como modo de produção. Bottmore (2012)
caracteriza o MPC nos seguintes aspectos:
A produção é para a venda e não para uso próprio, por numerosos produtores: sob esse
aspecto difere da produção simples de mercadorias; (BOTTOMORE, 2012, p. 75)
Existência de um mercado onde a força de trabalho é comprada e vendida, em troca
de salários em dinheiro, por um dado período (salário por tempo) ou por uma tarefa
específica (salário por tarefa): a existência de um mercado e da relação contratual que
ele implica está em vivo contraste com relações de trabalho características de fases
anteriores como a escravidão ou a servidão; (BOTTOMORE, 2012, p. 75)
29
Conceito utilizado por Marx e Engels, na Mensagem da Direção Central à Liga dos Comunistas, março de 1850.
69
Mediação universal (ou predominante) das trocas pelo uso do dinheiro: ao tomar a
forma monetária, o capital faculta ao seu proprietário o máximo de flexibilidade para
seu emprego; (BOTTOMORE, 2012, p. 75)
O capitalista controla o processo de produção (de trabalho). Isso implica não apenas
o controle sobre a contratação e a demissão de trabalhadores, como também sobre a
escolha de técnicas, o escalonamento da produção, o ambiente de trabalho e as
disposições para a venda do produto: o contraste, no caso, se faz com o sistema de
produção domiciliar, ou com as formas protossocialistas modernas e alternativas, tais
como a cooperativa, a empresa gerida pelos trabalhadores, as empresas de propriedade
dos trabalhadores ou do Estado; (BOTTOMORE, 2012, p. 76)
Controle das decisões financeiras: o uso universal do dinheiro e do crédito facilita a
utilização dos recursos de outras pessoas para financiar a acumulação;
(BOTTOMORE, 2012, p. 76)
Concorrência entre capitais: o controle que os capitalistas individuais detêm sobre o
processo de trabalho e a estrutura financeira é modificado pelo seu constante exercício
num contexto de concorrência entre capitais, quer estejam estes capitais envolvidos
na produção da mesma mercadoria ou de uma mercadoria parecida que pode substituíla, quer apenas se confrontem uns aos outros na luta por mercados ou empréstimos.
(BOTTOMORE, 2012, p. 76)
Marx e Engels (2011, p. 14) definem outra característica do MPC, a necessidade que a
burguesia tem de revolucionar, constantemente, os instrumentos de produção, criando
mudanças e distúrbios nas relações de produção e, com elas, nas relações sociais estabelecidas.
Esta revolução provoca distúrbios ininterruptos e conflitos, levando a incertezas e agitações
permanentes, e distinguem a época burguesa de todas as anteriores.
Estes conjuntos de características aplicadas ao Brasil definem-no como um Estado inserido
no ‘Modo de Produção Capitalista’, ou seja, no Capitalismo. Observamos, a seguir, que o
Capitalismo atravessou diferentes fases, recebendo distintas denominações em cada período. O
objetivo é traçar uma periodização histórica do MPC, e identificar em que fase do ‘Capitalismo’
o Brasil se encontra.
2.4 ARRIGHI E OS ‘CICLOS SISTÉMICOS DE ACUMULAÇÃO’
Giovanni Arrighi (2009) apresenta aprofundado estudo sobre a trajetória de surgimento do
Modo de Produção Capitalista (MPC) a partir do processo de acumulação de capitais. O estudo
denomina o processo de ‘Ciclos Sistémicos de Acumulação’, explicando que:
Serão identificados quatro ciclos sistêmicos de acumulação, cada qual caracterizado
por uma unidade fundamental do agente e estrutura primários dos processos de
acumulação de capital em escala mundial: um ciclo genovês, do século XV ao início
do XVII; um ciclo holandês, do fim do século XVI até decorrida a maior parte do
século XVIII; um ciclo britânico, da segunda metade do século XVIII até o início do
século XX; e um ciclo norte-americano, iniciado no fim do século XIX e que
prossegue na atual fase de expansão financeira. Como se vê por essa periodização
aproximada e preliminar, os ciclos sistêmicos consecutivos de acumulação se
superpõem e, embora adquiram uma duração progressivamente mais curta, todos
70
duram mais de um século: daí a ideia de “século longo”, que será tomada como
unidade temporal básica na análise dos processos mundiais de acumulação de capital.
(ARRIGHI, 2009, p. 6)
Para delimitar os ‘ciclos sistêmicos de acumulação’, Arrighi (2009) teoriza que a partir da
fórmula geral do capital apresentada por Marx (DMD’) pode-se chegar a duas dimensões de
compreensão do processo de acumulação do capital: como a lógica dos investimentos
capitalistas individuais, e como padrão repetitivo do capitalismo histórico no sistema mundial.
Para Arrighi (2009, p. 6) o principal aspecto desse padrão é a “alternância de épocas de
expansão material (fases DM de acumulação de capital) com fases de renascimento e expansão
financeiros (fases MD’)”. Nas fases de expansão material, o capital monetário movimenta uma
massa crescente de produtos (que inclui a força de trabalho e insumos da natureza, sendo que
tudo é transformado em mercadoria); “nas fases de expansão financeira, uma massa crescente
de capital monetário “liberta-se” de sua forma mercadoria, e a acumulação prossegue através
de acordos financeiros (como na fórmula abreviada de Marx, DD’). Juntas, essas duas épocas,
ou fases, constituem um completo ‘Ciclos Sistémicos de Acumulação’ (DMD’)”.
No modelo proposta por Arrighi (2009, p. 9), ele identifica que no Modo de Produção
Capitalista não é apenas uma determinada indústria ou economia nacional que se “desenvolve”,
“mas a economia mundial capitalista ao longo da existência.”. Ele explica que:
as fases DM, de expansão material, consistem em fases de mudanças contínuas,
durante as quais a economia capitalista mundial cresce por uma única via de
desenvolvimento. E veremos que as fases MD’, de expansão financeira, consistem em
fases de mudanças descontínuas, durante as quais o crescimento pela via estabelecida
já atingiu ou está atingindo seus limites e a economia capitalista mundial “se desloca”,
através de reestruturações e reorganizações radicais, para outra via. (ARRIGHI, 2009,
p. 9)
A este processo de desenvolvimento da economia capitalista em escala mundial dá-se o
nome de globalização, sendo algo inerente ao próprio Modo de Produção Capitalista, é
importante notar que o MPC surge na Europa e que ele se expande para outras partes do planeta,
em um processo constante de acumulação de capitais. Ao final de cada ciclo, o Capitalismo
emerge com maior intensidade, mudando o centro de poder, o Estado, mas mantendo as
características fundantes, exploração da classe trabalhadora e concentração do capital pelos
burgueses.
2.5 DO IMPERIALISMO AO IMPÉRIO
Michael Hardt e Antonio Negri (2010) teorizam que o capitalismo evoluiu, mudando de
estágio a partir do final da Segunda Guerra Mundial, com o advento dos organismos
multilaterais. Eles têm a função de regulamentar as relações entre as nações e no interior delas,
e terminaram por diminuir a autonomia dos Estados-nação, subordinando as decisões do
71
Estado, as decisões dos organismos multilaterais. Inserido o mundo em um processo de
economia global diferenciado, cuja mudança foi denominada de ‘Império’.
Segundo Hardt e Negri (2010, p. 12) a soberania do Estado era um dos fundamentos no
qual as potências europeias desenvolveram o ‘Imperialismo’ e a idade moderna. Eles afirmam
que, no ‘Império’, as nações são administradas por entidades reguladoras e entendem
“Império”, como algo completamente diverso de “Imperialismo”, expressando:
As fronteiras definidas pelo moderno sistema de Estados-nação foram fundamentais
para o colonialismo europeu e para a expansão econômica: os limites territoriais do
país delimitavam o centro de poder a partir do qual era exercido o controle sobre
territórios externos por meio de um sistema de canais e barreiras que, sucessivamente,
facilitavam e obstruíam o fluxo de produção e circulação. O imperialismo era, na
realidade, uma extensão da soberania dos Estados-nação europeus além de suas
fronteiras. [...] A transição para o Império surge do crepúsculo da soberania moderna.
Em contraste com o imperialismo, o Império não estabelece um centro territorial de
poder, nem se baseia em fronteiras ou barreiras fixas. É um aparelho de
descentralização e desterritorialização do geral que incorpora gradualmente o mundo
inteiro dentro de suas fronteiras abertas e em expansão. O Império administra
entidades híbridas, hierarquias e permutas plurais por meio de estruturas de comando
reguladoras. As distintas cores nacionais do mapa imperialista do mundo se uniram e
mesclaram, num arco-íris imperial global. (HARDT, NEGRI, 2010, p.12-13)
Hardt e Negri (2010, p.13) expressam que as transformações das modernas geografias
imperialistas do mundo e as realizações do mercado global marcam mudanças no modo
capitalista de produção, destacando que neste novo momento, as divisões teóricas e espaciais
dos três mundos (Primeiro, Segundo e Terceiro) ficaram tão misturadas que a qualquer
momento é possível perceber o Primeiro Mundo no Terceiro, o Terceiro no Primeiro, e o
Segundo em parte alguma. Para Hardt e Negri o mundo tem sido marcado por complexos
regimes de diferenciação e homogeneização, ora se desterritorializando, ora se
reterritorializando, ou seja:
Na pós-modernização da economia global, a produção de riqueza tende cada vez mais
ao que chamaremos de produção biopolítica, a produção da própria vida social, na
qual o econômico, o político e o cultural cada vez mais se sobrepõem e se completam
um ao outro. [...] O conceito de Império caracteriza-se fundamentalmente pela
ausência de fronteiras: o poder exercido pelo Império não tem limites. Antes e acima
de tudo, portanto, o conceito de Império postula um regime que efetivamente abrange
a totalidade do espaço, ou que de fato governa todo o mundo “civilizado”. Nenhuma
fronteira territorial confina o seu reinado. Em segundo lugar, o conceito de Império
apresenta-se não como um regime histórico nascido da conquista, e sim como uma
ordem que na realidade suspende a história e dessa forma determina, pela eternidade,
o Estado de coisas existente. Do ponto de vista do Império, é assim que as coisas serão
hoje e sempre - e assim sempre deveriam ter sido. [...] o poder de mando do Império
funciona em todos os registros da ordem social, descendo às profundezas do mundo
social. O Império não só administra um território com sua população, mas também
cria o próprio mundo que ele habita. Não apenas regula as interações humanas como
procura reger diretamente a natureza humana. O objeto do seu governo é a vida social
como um todo, e assim o Império se apresenta como forma paradigmática de biopoder.
Finalmente, apesar de a prática do império banhar-se continuamente em sangue, o
72
conceito de Império é sempre dedicado paz − uma paz perpétua e universal fora da
História. (HARDT, NEGRI, 2010, p. 13-15)
Ao analisar a citação de Hardt r Negri (2010), observa-se que a totalização do espaço global
pelo MPC é definida como ‘Império’, funcionando em todo lugar, atingindo a totalidade da
ordem social, construindo e ou reconstruído o mudo em que habita, através do biopoder30.
Assim como na relação dialética estabelecida entre o Estaleiro, a comunidade de São Roque do
Paraguaçu, e o Estado, onde o EIA/RIMA (2009, p. 7) estabelece uma série de determinações
para que uma nova ordem econômica, social e política seja construída. Expondo que impactos
positivos e negativos podem ocorrer no meio social, físico e ambiental, e que são necessárias
ações com objetivo de prevenir, mitigar, monitorar, e ou compensar os impactos negativos.
Também são propostas medidas com objetivo de potencializar os impactos positivos.
Na avaliação do EIA/RIMA (2009, p.10) se as determinações expressas no estudo forem
seguidas, deve ocorrer o “fortalecimento da atividade econômica em toda a região do baixo
curso do Rio Paraguaçu e Recôncavo Baiano, contribuindo com a renda, geração de impostos,
empregos diretos e indiretos, além de representar uma oportunidade de dinamização da
capacitação profissional no nível regional.”. Ou seja, a introdução de um fenômeno complexo
como o Estaleiro, modifica não apenas as relações estabelecidas na comunidade, mas também
em uma ampla região sociodemográfica, reconfigurando os espaços físicos e as relações sociais
em diversas dimensões.
As observações feitas Hardt e Negri (2009, p. 13), com a restrição da mão de obra
industrial, e a expansão da mão de obra comunicativa, cooperativa e cordial, estão inseridos nos
22 programas estabelecidos do EIA/RIA (2009). Também é importante observar como o
Programa de Comunicação Social, estabelecido no EIA/RIMA (2009, p, 71), que objetiva
“promover junto às comunidades das áreas de abrangência direta e indireta do
Empreendimento, processos de informação e educomunicação que promovam a difusão de uma
30
Na passagem da sociedade disciplinar para a sociedade de controle, um novo paradigma de poder é realizado, o qual é
definido pelas tecnologias que reconhecem a sociedade como reino do biopoder. Na sociedade disciplinar os efeitos das
tecnologias políticas ainda eram parciais, no sentido de que o ato de disciplinar se desenvolviam de acordo com lógicas
relativamente fechadas, geométricas e quantitativas. A disciplinaridade fixou indivíduos dentro de instituições mas não
teve êxito em consumi-los completamente no ritmo das práticas da socialização produtiva; não chegou a permear
inteiramente a consciência e o corpo dos indivíduos, ao ponto de trata-los e organiza-los totalidade de suas atividades. Na
sociedade disciplinar, portanto, a relação entre o poder e o indivíduo permaneceu estável: a invasão disciplinar de poder
correspondeu à resistência do indivíduo. Em contraste com isso, quando o poder se torna inteiramente biopolítico, todo o
corpo social é abarcado pela máquina do poder e desenvolvido em suas virtualidades. Essa relação é aberta, qualitativa e
expressiva. A sociedade, agrupada dentro de poder que vai até os gânglios da estrutura social e seus processos de
desenvolvimento, reage como um só corpo. O poder é, dessa forma, expresso como um controle que se estende pelas
profundezas da consciência e dos corpos da população - e ao mesmo tempo através da totalidade das relações sociais.
(HARDT, NEGRI, 2010, p.43-44)
73
cultura de paz e sustentabilidade, assim como a segurança das comunidades no ambiente onde
vivem e na convivência com o Empreendimento.”, tenta trazer uma resposta às contradições
do modo acumulação capitalista, desenvolvido a partir da implantação do empreendimento.
2.6 A TRANSIÇÃO DO FORDISMO PARA ACUMULAÇÃO FLEXÍVEL
David Harvey (2012a), na destacada obra ‘Condição pós-moderna, em uma pesquisa sobre
as origens da mudança cultural’, explica que os argumentos científicos propostos foram
desenvolvidos a partir do pensamento conhecido como "escola da regulamentação31". O
conceito, na prática, indica que pressões exercidas pelo Estado ou por outras instituições
(religiosas, políticas, sindicais, patronais e culturais), aliadas ao exercício do poder de domínio
do mercado pelas grandes corporações e outras instituições afetam de modo significativo a
dinâmica do capitalismo32. Harvey (2012a, p. 118) explica que as pressões podem ser diretas
(como a imposição de controles de salários e preços), ou indiretas (como a propaganda
subliminar que nos persuade a incorporar novos conceitos sobre as nossas necessidades e
desejos básicos na vida), cujo efeito é moldar a trajetória e a forma do desenvolvimento
capitalista.
Observa-se como a explicação de Harvey sobre a "escola da regulamentação" se encaixam
nos procedimentos de implantação e operação do estaleiro, com as referidas medidas
determinadas pelo Estado. Explica Harvey (2012a, p.118), “a virtude do pensamento da "escola
da regulamentação" está no fato de insistir que levemos em conta o conjunto total de relações
e arranjos que contribuem para a estabilização do crescimento do produto e da distribuição
31
Seu argumento básico, que teve como pioneiro Aglietta (1979) e como propositores Lipietz (1986), Boyer (1986a;
1986b) e outros, pode ser resumido em poucas palavras. Um regime de acumulação "descreve a estabilização, por um
longo período, da alocação do produto líquido entre consumo e acumulação; ele implica alguma correspondência entre a
transformação tanto das condições de produção como das condições de reprodução de assalariados". Um sistema
particular de acumulação pode existir porque "seu esquema de reprodução é coerente". O problema, no entanto, é fazer
os comportamentos de todo tipo de indivíduos — capitalistas, trabalhadores, funcionários públicos, financistas e todas as
outras espécies de agentes político-econômicos — assumirem alguma modalidade de configuração que mantenha o
regime de acumulação funcionando. Tem de haver, portanto, "uma materialização do regime de acumulação, que toma a
forma de normas, hábitos, leis, redes de regulamentação etc. que garantam a unidade do processo, isto é, a consistência
apropriada entre comportamentos individuais e o esquema de reprodução. Esse corpo de regras e processos sociais
interiorizados tem o nome de modo de regulamentação" (HARVEY, 2012, p. 117 apud Lipietz, 1986, 19).
32 Um exemplo desta subordinação imposta por organismos multilaterais pode ser visto ao analisar a crise estabelecida
na Grécia, quando organismos multilaterais como o FMI e BCE determinaram conjunto de medidas a serem tomadas
pelo governo grego, inclusive com o envio de projetos para aprovação no congresso nacional. Paula e Ferrari Filho (2011,
p. 315) comentam que “a crise financeira que emergiu em 2007-2008, cujos desdobramentos ainda se fazem sentir nos
dias de hoje, é, sobretudo, a crise da globalização financeira, entendida como uma tendência à criação de um mercado
financeiro global e de intensificação no fluxo de capitais entre países. Esse processo remonta a crise do sistema de Bretton
Woods e a formação do mercado de eurodólares, que, diga-se de passagem, acabou contribuindo para a
desregulamentação doméstica dos sistemas financeiros - com o fim da segmentação entre mercados - e a liberalização
dos fluxos de capitais.”.
74
agregada de renda e de consumo num período histórico e num lugar particular.”. O Programa
de Comunicação Social estabelecido no EIA/RIMA, expressa que:
A necessidade de valorização das comunidades locais, com sua diversidade cultural e
sua relação interdependente com os ecossistemas terrestres e aquáticos, assim como
sua relação com o Empreendimento em seu entorno determinou a importância da
realização de um Programa de Comunicação Social. O programa visa especialmente
articular comunicação e cultura na dinâmica da relação entre as comunidades e o
empreendimento, considerando a dinâmica da vida dos povos tradicionais, no
processo de interação com o empreendimento e na construção de novas alternativas
de desenvolvimento socioeconômico, valorizando a conservação dos ecossistemas e
a promoção da cultura da região levando em conta o seu território de identidade.
(EIA/RIMA, 2009, v. 5, p. 65)
Observando a teoria e o que preconiza o Estado, pode-se inferir que o Programa de
Comunicação Social, determinado pela Medida Mitigadora Nº 40, do EIA/RIMA 2009, está
inserido dentro do conceito da "escola da regulamentação", como uma tentativa de regular e
moldar a trajetória e a forma do desenvolvimento capitalista.
Outro conceito, trazido por Harvey (2012a, p. 118), diz respeito ao processo de mudança
do modo de acumulação. Eles estabelecem um marco temporal que vai do pós-guerra (1945),
até a crise mundial do petróleo (1973). Este período é conhecido como ‘Fordismo’ e “teve como
base um conjunto de práticas de controle do trabalho, tecnologias, hábitos de consumo e
configurações de poder político-econômico, caracterizado pelo sistema fordista-keynesiano”.
O cientista estabelece que a partir de 1973, o sistema entrou em colapso, sendo substituídas as
práticas produtivas por “novos sistemas de produção e de marketing, caracterizados por
processos de trabalho e mercados mais flexíveis”, com a ampliação exponencial da mobilidade
geográfica dos indivíduos e de rápidas mudanças nas práticas de consumo. O período também
é marcado por mudanças associadas à virada cultural do pós-modernismo. O pesquisador
pontua:
A profunda recessão de 1973, exacerbada pelo choque do petróleo, evidentemente
retirou o mundo capitalista do sufocante torpor da "estagflação" (estagnação da
produção de bens e alta inflação de preços) e pôs em movimento um conjunto de
processos que solaparam o compromisso fordista. Em consequência, as décadas de 70
e 80 foram um conturbado período de reestruturação econômica e de reajustamento
social e político. No espaço social criado por todas essas oscilações e incertezas, uma
série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e
política começou a tomar forma. Essas experiências podem representar os primeiros
ímpetos da passagem para um regime de acumulação inteiramente novo, associado
com um sistema de regulamentação política e social bem distinta. (HARVEY, 2012a,
p. 140)
Harvey (2012a, p.119) expressa que “os contrastes entre as práticas político-econômicas
da atualidade e as do período de expansão do pós-guerra são suficientemente significativos para
75
tomar a hipótese de uma passagem do fordismo para o que poderia ser chamado regime de
acumulação "flexível" uma reveladora maneira de caracterizar a história recente.”.
Segundo Harvey (2012a, p. 140), a acumulação flexível é marcada por um confronto direto
com a rigidez do fordismo, e se desenvolve a partir da flexibilização dos processos e mercados
de trabalho, dos mercados, dos produtos e padrões de consumo. Ela é marcada pelo surgimento
de setores de produção inteiramente novos, além de novas maneiras de fornecimento de serviços
financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas intensificadas de inovação comercial,
tecnológica e organizacional. O conceito de ‘Acumulação Flexível’ “envolve rápidas mudanças
dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas,
criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego, no chamado "setor de serviços", bem
como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas.”.
Como visto anteriormente (EIA/RIMA, 2009, p. 10), a implantação do estaleiro pretende
movimentar a economia da região, através da geração de empregos diretos e indiretos, além de
impactar significativamente a economia estadual. A implantação do empreendimento ocorre
em uma comunidade marcada por relações tradicionais de produção:
De uma forma geral, todas as pequenas comunidades rurais ribeirinhas, quilombolas 33
ou não, das áreas de influência direta e indireta, possuem um forte inter-relação com
a atividade de pesca e a coleta de mariscos. A atividade pesqueira e a agricultura
familiar voltada para consumo próprio são as principais atividades de subsistência da
população de comunidades como Ponta do Souza, Enseada, Salamina, Putumuju,
Capa Gato, Dendê, Guerém e Samambaia, dentre outras. (EIA/RIMA, 2009, p. 42)
O que Harvey (2012a) teoriza é confirmado na prática, quando analisadas as características
da relação dialética estabelecida ente Estado, Capitalista e a comunidade de São Roque do
Paraguaçu. Ou seja, é um setor novo da economia, que é erguido em uma localidade marcada
pelo subdesenvolvimento econômico e social, a partir de uma tomada de decisão do Estado.
Harvey (2012a, p.141) expressa que o “trabalho organizado foi solapado pela reconstrução
de focos de acumulação flexível em regiões que careciam de tradições industriais anteriores e
pela reimportação para os centros mais antigos das normas e práticas regressivas estabelecidas
nessas novas áreas.”. Alertado para falhas no modelo de acumulação flexível, no que tange o
emprego, explica que o modo de produção “parece implicar níveis relativamente altos de
33
Quilombolas são descendentes de africanos escravizados que mantêm tradições culturais, de subsistência e religiosas
ao longo dos séculos. E uma das funções da Fundação Cultural Palmares é formalizar a existência destas comunidades,
assessorá-las juridicamente e desenvolver projetos, programas e políticas públicas de acesso à cidadania. Mais de 1.500
comunidades espalhadas pelo território nacional são certificadas pela Palmares. Para localizá-las, clique no mapa para
selecionar o estado ou utilize os campos de busca abaixo, filtrando a pesquisa por estado, município e comunidade.
(FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES, 2014)
76
desemprego "estrutural" (em oposição a "friccional"), rápida destruição e reconstrução de
habilidades, ganhos modestos (quando há) de salários reais e o retrocesso do poder sindical —
uma das colunas políticas do regime fordista.”.
As afirmações de Harvey (2011) são identificadas na constituição do estaleiro, em
decorrência da falta de tradição industrial, os trabalhadores não possuem significativa
articulação sindical, o que leva a salários menores, quando comparado a outros centros
industriais com maior tempo de atuação no setor.
David Harvey (2011, p. 58) observa que as intensas inovações tecnológicas nos setores de
transporte e comunicação, ocorridas a partir de 1960, facilitaram o deslocamento dos centros
de produção. Os capitalistas buscaram desenvolver novos centros de produção em regiões com
salários baixos e fraca organização do trabalho. Outro fator determinante para o deslocamento
dos centro de produção, explica Harvey (2011, p. 60) é o “uso do poder estatal para transcender
a barreira da organização do trabalho”. Ele observa que isto tem ocorrido com certa efetividade,
desde meados da década de 1970, em muitas partes do mundo. Ele também destaca o fato do
Estado facilitar com investimentos diretos, e ou subsidiar, a mobilidade do capital “para que
possa se deslocar para onde haja condições de negócio mais vantajosas, incluindo oferta de
trabalho e organização fraca do trabalho.”.
A declaração do presidente da EEPSA, Fernando Barbosa (SICM, 2012, p. 12): “O EEP
tem protocolo com o governo do Estado da Bahia, por meio do qual este último oferece apoio
institucional ao estaleiro, como a sua inclusão no Programa Estadual de Incentivos à Indústria
da Construção Naval (PRONAVAL)”, confirma que a empresa utiliza o conceito de subsídios,
identificado por Harvey (2011).
Outro conceito identificado por Harvey (2011), o de apoio do Estado na construção da
infraestrutura para operacionalização do grande capital, pode ser confirmando na prática,
através do anúncio do governo do Estado da Bahia, ocorrido na sede da EEPSA, em 27 de julho
de 2013. Oportunidade em que o governador Jaques Wagner e o vice-governador e secretário
de Infraestrutura, Otto Alencar, assinaram ordem de serviço para construção de uma ponte sobre
o Rio Baetantã (Distrito de São Roque do Paraguaçu) e uma via de acesso à rodovia BA-534,
subtrecho Cairu-Enseada. Durante o evento, o governador declarou: “Nós vamos fazer ponte,
outras estradas complementares, temos compromisso com a água e com a energia. É um
investimento pesado do governo do Estado, que também viabilizou o terreno para o
77
empreendimento e as encomendas da Petrobras, que serão atendidas pelo estaleiro”. (Jornal
Grande Bahia, 2013)
2.7 O CAPITAL E AS MODIFICAÇÕES NOS ESPAÇOS FÍSICO E SOCIAL
A dimensão territorial do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, 150,68 hectares, além do
considerável número de trabalhadores mobilizados. Com projeção de contratação de 3.900
trabalhadores para a fase de implantação, 4.000 trabalhadores na fase de operação do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu, conferem ao empreendimento a condição de ser um agente
transformador dos meios socioeconômico, biótico, e físico, pela capacidade de mudar as
características naturais e humanas da região. (EIA/RIMA, 2009, p. 8 e 12)
Observando o aspecto transformador das forças produtivas em curso, Nicos Poulantzas
(2000, p. 33) argumenta que no processo de produção está a primazia das relações de produção
sobre as forças produtivas, e que as relações de produção e as ligações que as compõem
(propriedade econômica/posse) traduzem-se por poderes emanantes dos lugares em que essas
ligações se delineiam. A propriedade econômica “espelha o poder de destinar os meios de
produção a determinadas utilizações e de, assim, dispor dos produtos obtidos, da posse, da
capacidade de ativar os meios de produção e de comandar o processo de trabalho.”.
Poulantzas (2000, p. 37) identifica que o Estado determina o campo de lutas, incluindo as
“relações de produção; organiza o mercado e as relações de propriedade; institui o domínio
político e instaura a classe politicamente dominante; marca e codifica todas as formas de divisão
social do trabalho, todo o real no quadro referencial de uma sociedade dividida em classes.
Outro fator capaz de expressar os impactos e o interesse dos capitalistas e do Estado no
empreendimento é o fato do mesmo estar ligado a indústria do petróleo. Sob a importância do
petróleo para o capitalismo, afirma Harvey (2012b, p. 25): “quem controlar a torneira global do
petróleo poderá controlar a economia global, pelo menos no futuro próximo.”.
No mapa a seguir é demonstrado, em escala, a extensão territorial do empreendimento, bem
como a Reserva Extrativista Marinha Baía do Iguape, com extensão de 8.117,53 hectares, sendo
2.831,24 composto por manguezal e 5.286,29 em águas internas. A Reserva foi criada através
de Decreto Presidencial, assinado por Fernando Henrique Cardoso, em 11 de agosto de 2000:
78
Figura 2 – Mapa da Reserva Extrativista Marinha Baía do Iguape.
Fonte: EIA/RIMA (2009)
79
No mapa (Figura 2), o entorno da área em vermelho claro é o local de implantação do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA), classificado como Área Diretamente Afetada
(ADA), pelo EIA/RIMA (2009). Em vermelho escuro, observa-se que parte significativa do rio
Baetantã é afetada, incluído as zonas de mangue (verde escuro), comprometendo de forma
significativa o modo de vida da população local.
A figura a seguir, exemplifica a dimensão das transformações nos meios físico e
socioeconômico em transcurso no distrito de São Roque do Paraguaçu:
Figura 3 – Imagem aérea de um dos canteiros de obras do EEPSA.
Fonte: Produção Própria (2013).
Na imagem aérea (Figura 3) é perceptível o significativo número de trabalhadores
mobilizados na construção de estruturas de concreto e aço do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
O volume de trabalhadores envolvidos no processo e a dimensão das estruturas erguidas,
demonstram a escala das transformações socioeconômicas em curso.
80
2.7.1 A DESPOSSESSÃO DA MASSA
No artigo ‘Resex marinha versus polo naval na baía do Iguape’, a professora doutora do
Programa de pós-graduação em Geografia da UFBA, Cathérine Prost, aborda o conceito de
‘despossessão da massa’, o mesmo conceito tratado por Harvey (2011). Segundo Prost (2010,
p.47), as populações que historicamente vivem em estreita comunhão com a natureza, ocupando
um determinado espaço, acabam excluídas e perdem o controle sobre este espaço, mantendose à margem de direitos fundamentais, e por fim, perdendo a própria noção de identidade
sociocultural, sempre que o espaço é alterado por forças capitalistas.
A Reserva Extrativista (RESEX) Marinha Baía do Iguape, situada na Baía de Todos
os Santos (BTS), exemplifica a política federal de conservação ambiental
fundamentada no uso sustentável dos recursos naturais por populações tradicionais.
Contudo, em 2009, o governo estadual propôs a instalação de um polo naval na
extremidade sul da Resex. Dessa forma, a instância de decisão da unidade de
conservação é desrespeitada por não ter sido consultada e as comunidades pesqueiras
se veem diante da perspectiva de riscos no tocante à preservação do meio natural, base
de seu sustento. O projeto governamental, que defende uma visão desenvolvimentista
e anuncia uma elevada oferta de empregos, foi precedido de um breve estudo que não
levou em conta os potenciais efeitos sociais de tal empreendimento. Configura-se,
portanto, uma desterritorialização econômica, política e cultural – na imobilidade –
das populações tradicionais, diante da imposição da lógica global no lugar. (PROST,
2010, p.47)
Em ‘O enigma do capital’, Harvey (2011, p. 91) explica que a ‘despossessão da massa’
ocorre quando capitalistas excluem a população do acesso direto aos meios de produção (a terra,
em particular) liberando a força de trabalho como uma mercadoria no mercado. Para Harvey
(2011), a afirmação de Marx sobre a “acumulação primitiva” pode conter uma verdade essencial
inegável, “de alguma forma ou outra, a massa da população tem sido colocada em uma posição
em que tem de trabalhar para o capital para sobreviver.”. Ele alerta sobre a inclusão de
trabalhadores no sistema capitalista, afirmando:
A acumulação primitiva não terminou com a ascensão do capitalismo industrial na
Grã-Bretanha no final do século XVIII. Nos últimos trinta anos, por exemplo, cerca
de 2 bilhões de trabalhadores assalariados foram adicionados à força de trabalho
global disponível, em função da abertura da China e do colapso do comunismo na
Europa central e oriental. Em todo o mundo, aconteceu a integração das populações
camponesas até então independentes nas forças de trabalho. O mais dramático de
todos esses acontecimentos foi a mobilização das mulheres, que agora formam a
espinha dorsal da força de trabalho global. Está agora disponível uma reserva enorme
de força de trabalho para a expansão capitalista. (HARVEY, 2011, p. 91)
Harvey (2011, p. 61) alerta para a centralidade que a relação capital-trabalho tem na
dinâmica do capitalismo, e que nesta relação pode estar a origem das crises. Destaca que, na
atualidade, “o principal problema reside no fato de o capital ser muito poderoso e o trabalho
muito fraco, não o contrário.”.
81
Nas duas imagens a seguir, registradas em períodos distintos, é demonstrado como o conceito
de despossessão da massa se materializa:
Figura 4 – Imagem aérea compreendendo a sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, e a Ponta do
Corujão.
Fonte: Produção Própria (2012).
Figura 5 – Imagem aérea compreendendo a sede do povoado de Enseada do Paraguaçu, e as obras de
construção do Estaleiro, na Ponta do Corujão.
Fonte: Produção Própria (2013).
82
A primeira imagem (Figura 4), registrada em 2 de março de 2012, a Ponta do Corujão
permanece intacta, fazendo parte de uma reserva extrativista legal, sendo utilizada pelas
populações locais como forma de subsistência. Na segunda imagem (Figura 5), registrada em
23 de setembro de 2013, parte da reserva legal e do mangue são eliminados, diminuído o
território e os meios de subsistência das comunidades.
István Mészáros (2011a, p. 21) pondera sobre dois aspectos da despossessão da massa, o
elevado custo dos empreendimentos capitalistas, aliado a uma crise alimentar global,
afirmando: “alguém pode pensar numa maior acusação para um sistema de produção econômica
e reprodução social pretensamente insuperável do que essa: no auge de seu poder produtivo,
está produzindo uma crise alimentar global e o sofrimento decorrente das incontáveis milhões
de pessoas por todo o mundo”. Ou seja, a ideia de que o desenvolvimento de forças produtivas
vai resolver os problemas sociais das comunidades tradicionais, é uma falsa premissa.
Cathérine Prost (2010, p.53) alerta para o problema de despossessão da massa, explicando
que as “populações excluídas perdem o controle sobre o espaço por elas historicamente
ocupado, não garantem seus direitos fundamentais de cidadania e podem perder também a
identidade sociocultural, quando o espaço é alterado.”. Ela entende que esta situação se torna
intensa “quando se trata de populações tradicionais, que vivem em estreita comunhão com a
natureza.”.
2.8 POLÍTICAS PÚBLICAS E OS PROCESSOS DE ACCOUNTABILITY E
EMPOWERMENT
Como o Estado e as massas podem atuar para mitigar os efeitos da despossessão,
permitindo a eficácia das medidas mitigadoras? Dois conceitos do campo da Análise de
Políticas Públicas aplicados nas práxis poderiam ser instrumentos eficazes de controle e poder
do Estado e das massas, através da aplicação dos conceitos de Accountability e Empowerment34.
Estes conceitos teóricos representam compreensões científicas para os problemas e limitações
identificados na implementação das políticas públicas.
Um recente estudo realizado pelo governo da Bahia, identificou que dos 417 municípios
baianos, somente 67 tem condições de executar políticas públicas:
34
Foram mantidas as nomenclaturas em inglês para as palavras-conceito de Accountability e Empowerment em
decorrência das mesmas ainda não terem sido traduzidas para o português de forma a expressarem a extensão dos
respectivos significados.
83
No quadro atual da economia baiana configura-se um contraste nítido entre regiões e
atividades em ascensão, regiões estagnadas e regiões que sofrem perdas significativas
de capital, renda e emprego. [...]Os efeitos da concentração de capital aparecem entre
regiões e no contexto de regiões tradicionais onde se localizam novos grandes projetos
[...]A concentração de capital tem efeitos decisivos na composição do emprego, em
que há uma destruição de postos de trabalho semiqualificado e não qualificado e
identificado com tecnologias dominadas e uma criação de postos de trabalho com
novas tecnologias, que são ocupados por novos trabalhadores já qualificados,
procurando as empresas para reduzir custos e riscos de qualificação. A defasagem do
sistema local de qualificação faz com que a maior parte dos novos postos de trabalho
seja ocupada por trabalhadores vindos de fora, acentuando o efeito residual de
desemprego sobre a força de trabalho local. Com estes sintomas a geoeconomia da
Bahia passa por uma intensa transformação, em que há zonas de prosperidade em
torno de grandes empreendimentos e extensas zonas de pobreza. Pelas estatísticas
estaduais dos 417 municípios somente 67 tem condições de executar políticas
públicas. Desse mesmo número somente dez têm condições de reter sua força de
trabalho, ficando todos os outros na condição de exportadores de mão de obra. [...]O
distanciamento entre a composição dos novos Investimentos e a composição do
mercado de trabalho caracteriza uma modernização tecnológica que convive com a
permanência de formas de atraso na economia baiana em geral, fazendo com que
quaisquer novos focos de investimento atraíam trabalhadores sem condições de
qualificação para absorção. (SEDUR, 2013, p. 18-19)
Na citação anterior é possível identificar várias categorias que conformam a relação
dialética entre o Estaleiro, a comunidade e o Estado. Também é possível identificar que o
próprio Estado reconhece a dificuldade em implementar políticas públicas, que objetivem o
desenvolvimento de forças produtivas de forma inclusitiva, o que torna o estudo da dinâmica
de implantação da Medida Mitigadora nº 40 importante para determinar como o
desenvolvimento de forças produtivas ocorre, uma vez que o próprio Estado reconhece que a
concentração de capital tem efeitos na composição do emprego, e que existe uma destruição de
postos de trabalho semiqualificado e não qualificado.
Destaca-se que as medidas mitigadoras, previstas no EIA/RIMA 2009, são determinações
do Estado, que surgem a partir de estudos científicos e consultas populares, portanto pode ser
classificada como uma política pública35 de Estado para um fenômeno em particular.
35
Para Saravia (2006), a política pública envolve um fluxo de decisões públicas, orientado a manter o equilíbrio social
ou a introduzir desequilíbrios destinados a modificar essa realidade. Envolvem decisões condicionadas pelo próprio fluxo
e pelas reações e modificações que elas provocam no tecido social, bem como pelos valores, ideias e visões dos que
adotam ou influem na decisão. Pode-se dizer que é um sistema de decisões públicas que visa a ações ou omissões,
preventivas ou corretivas, destinadas a manter ou modificar a realidade de um ou vários setores da vida social, por meio
da definição de objetivos e estratégias de atuação e da alocação dos recursos necessários para atingir os objetivos
estabelecidos. (RONCARATTI; FONTENELLE, 2008, p. 5)
84
2.8.1 ACCOUNTABILITY E A NECESSIDADE DE TRANSPARÊNCIA DAS AÇÕES DO
ESTADO E DOS CAPITALISTAS
Roncaratti e Fontenelle (2008, p. 20) explicam que a partir de 1980, a ideia de controle
social e transparência no processo de políticas públicas ganha intensidade no Brasil, e que a
tradução mais aproximada na língua portuguesa para os conceitos implícitos no termo
accountability é responsabilização. O termo remete “à ideia de prestação de contas à sociedade,
ou seja, à obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de responder e
prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados. Implica, portanto, questões
de responsabilidade social, imputabilidade, obrigações e prestação de contas.”.
Celso Fraga Silva (2013, p. 6) destaca que o conceito de ‘Accountability’ refere-se à
existência de formas de atribuição de responsabilidade por ações realizadas e sua respectiva
prestação de contas. Ele expressa a obrigação que agentes públicos têm ao permitirem que a
sociedade conheça as ações, pois é através deste conhecimento que ocorre um processo de
trocas, envolvendo mecanismos de controle, punição e recompensa.
Segundo Silva (2013, p. 1) a participação social é fundamental para a boa governança,
permitindo que as instituições estatais possam obter novas e relevantes ideias, além de
informações e recursos para a tomada e acompanhamento das decisões. A participação social
amplia a contribuição do cidadão e fortalece a construção do Estado Democrático de Direito.
Elisa Larroudé (2009, p. 11) explica que é com a junção de poder e dever que se chega a
um conceito amplo e prático de accountability, ou seja de transparência e controle social. Ela
afirma que: “Pode-se considerar a accountability como uma relação em que uma parte tem o
dever de prestar contas de seus atos e decisões à outra, que, por sua vez, tem o poder de controlar
a primeira e aplicar-lhe consequências se houver impropriedades ou inadequações em relação
aos atos e às decisões da primeira.”.
Larroudé (2009, p. 18) pondera sobre o desequilíbrio entre os poderes nas mãos do Estado
e os poderes dos demais públicos interessados em demandar accountability das organizações.
“Há diversas normas que preveem os deveres das organizações para com o Estado, mas poucas
abordam sua accountability em relação a outros públicos.”.
Do conceito de accountability, decorre um questionamento: como a comunidade pode fazer
para verificar a eficácia de uma medida mitigadora, uma vez que não existe legislação
específica? Neste questionamento é que reside o ponto central do problema. A implantação da
85
Medida Mitigadora Nº 40 é de competência do Estaleiro, mas dirigida à comunidade. Então
como a comunidade pode atuar na fiscalização, e de que maneira pode acompanhar a
implementação? Ocorre que apenas o Estado tem o poder coercitivo de atuar, através da
fiscalização do Ministério Público Federal e Estadual, e do órgão licenciador IBAMA, ficando
a comunidade à margem do processo, e limitada apenas ao direito legal de requerer
informações.
2.8.2 EMPOWERMENT E A OPINIÃO PÚBLICA COMO FORMA DE EMANCIPAÇÃO
Nathalia Carvalho Moreira (et al, 2012, p. 407) citando a Organização Mundial de Saúde
(1998), expressa o conceito de Empowerment como “um processo social, cultural, psicológico
ou político através do qual indivíduos e grupos sociais tornam-se capazes de expressar
necessidades, explicitar preocupações, perceber estratégias de envolvimento na tomada de
decisões e atuar política, social e culturalmente para satisfazer necessidades.”.
Moreira et al (2012, p. 407) avalia que é necessário alterar as condições limitadoras, e
investir no empoderamento, na autonomia, nas competências e na capacidade de
autodesenvolvimento da comunidade, visando à ampliação da capacidade de ação das pessoas
para a superação da pobreza. Ela avalia que a pobreza representa um duplo caráter, “como
fenômeno que envolve dimensões objetivas de falta de recursos e também dimensões subjetivas
relativas a valores e comportamentos”, e que investir em empoderamento é uma forma de
superar a pobreza.
Uma das formas de empowerment, segundo Santos (2012, p.10), ocorre através da
formação da opinião pública, que ao assimilar as informações oriundas dos meios de
comunicação, toma conhecimento dos fatos e fenômenos que ocorrem no interior dela, levando
a própria sociedade ao “desenvolvimento da capacidade crítica de reflexão e ação dos cidadãos,
dotando-os de habilidades e capacidades que propiciem uma inserção mais efetiva no processo
político”. Isso demonstra que a partir do momento em que a sociedade toma conhecimento das
ações a ela dirigidas, um tipo de empoderamento é estabelecido. Neste processo, a comunicação
social tem destacado papel.
A Medida Mitigadora Nº 40 estabelece um Programa de Comunicação Social, ao passo em
que é implementada, ela confere poder à opinião pública. De forma diversa, a falta de
implementação ou implementação insatisfatória da Medida mantém a comunidade alienada. Na
dinâmica de análise da Medida, o conceito de empowerment permite à comunidade o
86
desenvolvimento de capacidade crítica avançada, proporcionando inserção no processo de
decisão política.
2.9 DO PENSAMENTO MARXISTA ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS, UMA SÍNTESE
Neste capítulo foi discorrido a atualidade do pensamento marxista na análise das
contradições do capitalismo, bem como na dinâmica de implantação do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu, observando de que maneira a expansão capitalista representa uma situação de
complementariedade e crise no desenvolvimento de forças produtivas.
A partir dos estudos de Giovanni Arrighi foi revista a trajetória histórica de acumulação
capitalista, com o conceito de ‘Ciclos Sistémicos de Acumulação’. Coube a Michael Hardt e
Antonio Negri (2010) explicarem como o capitalismo evoluiu, mudando de estágio, do
Imperialismo ao Império. Observando que o Império teve início a partir do fim da Segunda
Guerra Mundial, com a criação das organizações multilaterais, que tiraram poder do Estado.
Também foram revistos alguns conceitos e características do ‘Modo de Produção
Capitalista’, e de que maneira eles caracterizam o modo de produção no Brasil. As observações
de Mészáros (2011a) sobre a crise estrutural e sistêmica que ocorre no MPC, através da
precarização estrutural da força de trabalho em escala global, que se utiliza da
superexploração36 e da autoexploração do trabalho, demonstrando as contradições do sistema
capitalista.
David Harvey (2011), ao apresentar os conceitos da ‘escola da regulamentação’, e estudos
sobre o processo de transição do Fordismo para Acumulação Flexível, e de que maneira as
inovações tecnológicas influenciaram para o surgimento de novos centros de produção, além
das observações sobre o papel do Estado no desenvolvimento do capitalismo, trouxe a
explicação científica para que empreendimentos do porte do EEPSA se desenvolvam em locais
com pouca, ou nenhuma tradição de produção capitalista avançada.
Também é apresentado o conceito de ‘despossessão da massa’, contribuem para o
desenvolvimento deste conceito, Harvey (2011) e (2012a), Mészáros (2011a) e Prost (2010).
36
O modelo de acumulação de capital das sociedades dependentes latino-americanas é enfocado na sua dupla ótica, ambas
intrinsecamente articuladas: fornece fatores de produção que permitem a reprodução de capital nas economias centrais do
capitalismo e, ao mesmo tempo, condiciona as burguesias da periferia, inferiorizadas na competição pelo mercado
internacional, a induzirem em nossas formações o processo de superexploração do trabalho. Integra-se, assim, o processo
de acumulação em escala mundial e o processo de acumulação em nível nacional, com as características típicas da
extração do excedente que a caracteriza. (SADER, SANTOS, 2009, p. 31)
87
As imagens aéreas, disponibilizadas na dissertação, confirmam a extensão do empreendimento,
bem como as implicações sociais e ambientais. O conceito é observado materialmente, quando
ocorrem as modificações nos espaços físico e social, em que se desenvolve o EEPSA.
Para mitigar os efeitos da ‘despossessão da massa’, ampliando os aspectos positivos
desenhados nas medidas mitigadoras, é apresentado o campo científico das Análises de
Políticas Públicas, com recorte sobre dois conceitos, ‘Accountability e Empowerment’. Estes
conceitos são referências teóricas que ao serem aplicadas a Medida Mitigadora nº 40, e ao
Programa de Comunicação Social previsto no EIA/RIMA (2009), podem indicar falhas e
funcionalidades da política pública estabelecida no licenciamento ambiental do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu.
No próximo capítulo é discorrido como o processo de acumulação primitiva influencia o
desenvolvimento socioeconômico do Recôncavo da Bahia e de que maneira esse processo com
fluxos de ascensão e decadência econômica, influencia na acumulação capitalista em
Maragogipe, além de observar como o processo apresenta reflexos nos indicadores estatísticos
da população. Observar-se, por fim, como o Estado responde ao ciclo de decadência econômica,
através do aprofundamento das relações capitalistas, em especial com desenvolvimento do
capital petrolífero, analisando quais as implicações decorrentes desse fenômeno.
88
3 A CONSTITUIÇÃO DO RECÔNCAVO DA BAHIA: DA ACUMULAÇÃO
PRIMITIVA AO DESENVOLVIMENTO DO CAPITAL PETROLÍFERO, E
OS REFLEXOS SOBRE AS COMUNIDADES TRADICIONAIS
O capital é um processo, e não uma coisa. É um processo
de reprodução da vida social por meio da produção de
mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista
avançado estão profundamente implicadas. Suas regras
internalizadas de operação são concebidas de maneira a garantir
que ele seja um modo dinâmico e revolucionário de organização
social que transforma incansável e incessantemente a sociedade
em que está inserido. (HARVEY, 2012, p. 307)
Este capítulo busca retroceder ao momento em que portugueses descobrem o Brasil e
passam a dominar, explorar e miscigenar, dando início ao ‘amálgama do povo brasileiro’. O
Estudo parte do recorte sobre o Recôncavo da Bahia, com o processo de constituição histórica
do desenvolvimento de Maragogipe e da comunidade de São Roque do Paraguaçu.
É necessário fazer o retrocesso ao momento da descoberta (1500), porque ele está
relacionado, diretamente, como o processo de acumulação primitiva ocorrido no Recôncavo da
Bahia, local de implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (2009), fenômeno estudado a
partir da dialética estabelecida entre os atores contemporâneos – Estado, Capitalistas e a
comunidade de São Roque do Paraguaçu. A digressão permite estabelecer ligações diacrônicas
entre os fenômenos, além de aprofundar a perspectiva histórica da relação entre os atores e de
permitir análises mais densas sobre as relações de poder, subordinação e mais-valia
estabelecidas no território.
Ao retroceder no tempo e analisar as condições históricas de como práticas desumanas de
escravagismo se instituíram e de que maneira um modo de produção se estabeleceu, é possível
compreender os fatores que, atualmente, contribuem para a baixa progressão nos indicadores
de IDHM37 no país e, mais especificamente, no Recôncavo da Bahia. Mesmo sopesado que no
37
O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) é um índice que permite conhecer a realidade do
desenvolvimento humano dos municípios brasileiros. Populariza a ideia de que desenvolvimento não se resume à
perspectiva do crescimento econômico, mas sim facilita a comparação entre municípios, conduz a um diálogo mais
informado na discussão de políticas e estimula a busca por melhores desempenhos socioeconômicos entre os municípios
brasileiros. O índice não abrange todos os aspectos de desenvolvimento humano e não é uma representação da "felicidade"
das pessoas, nem indica "o melhor lugar no mundo para se viver", mas sintetiza três das mais importantes dimensões do
desenvolvimento humano. Amplia e fomenta o debate, instrumentalizando a sociedade sobre o estado da qualidade de
vida nos municípios brasileiros, estimulando a concertação de atores de forma a protagonizar atividades e políticas
inovadoras para a superação dos desafios locais rumo ao desenvolvimento humano. (ATLAS BRASIL, 2013)
89
século XXI, no Recôncavo baiano, empreendimentos do capitalismo avançado encontram-se
em operação, enquanto outros estão fase de implantação, a exemplo do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu (EEPSA). Esses elementos explicam, em parte, a dificuldade que a comunidade local
tem em ser inserida com trabalhadores no complexo industrial formado no território e ou de se
apropriarem de parte da riqueza gerada no território, auferindo ganhos sociais.
A análise permite correlacionar o processo de colonialismo, com as características
remanescentes da sociedade senhorial identificadas na comunidade de São Roque do
Paraguaçu, e que persistem em se manter ativo na região. Este processo explica, em parte, a
dificuldade que a comunidade tem em ser inserida como classe trabalhadora no processo de
implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. A análise diacrônica também
permite identificar como elementos do modo de produção escravagista persistem na sociedade
baiana, sendo que estes elementos são identificados por atores políticos e por instituições do
próprio Estado. Estas características negam a economia de mercado baseada na relação
capital/trabalho, além de evidenciarem como segmentos da sociedade baiana estão subjugadas
pelas forças capitalistas e pela negação do Estado Democrático de Direito.
No decorrer deste capítulo, esse processo histórico de acumulação será revisto, bem como
as recentes mudanças pelas quais passa a comunidade de São Roque do Paraguaçu e as
implicações dialéticas dessa relação.
3.1 O AMÁLGAMA DO POVO BRASILEIRO
Vários elementos que definem a atual sociedade brasileira encontram-se determinadas
desde o encontro (descobrimento) dos europeus portugueses com povo silvícola da terra que
seria batizada de Brasil. Escravagismo, exploração mercantil, agronegócio ancorado em
extensivas monoculturas, exploração e subordinação do povo, latifúndio, extrativismo com
degradação ambiental, desenvolvimento das cidades e vilas sem o devido planejamento,
dominação cristã, dominação cultural pela língua portuguesa e a miscigenação entre índios,
europeus e negros, estes elementos formam o amálgama do povo brasileiro e foram introduzidos
desde o momento em que aportaram os portugueses. Ao perscrutar o passado, são encontradas
as raízes do presente. Um presente que insiste em manter traços da sociedade senhorial do Brasil
Colônia.
No exato momento em que é redigido este parágrafo, uma matéria é publicada no Jornal
Grande Bahia, em 29 de janeiro de 2014, como o título ‘Deputado defende pacto contra
90
exploração do trabalho escravo na Bahia’. A matéria narra o discurso proferido na Assembleia
Legislativa da Bahia contra a exploração do trabalho análogo à escravidão, proferido pelo
deputado estadual Joseildo Ramos (PT), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, que
afirma: “Essa é uma chaga que persiste entre nós a despeito do Estado moderno, do arcabouço
jurídico legal. Nosso projeto fere de morte e mexe no bolso dos empresários que têm lucro,
afrontando a dignidade humana e o respeito ao trabalho do ser humano”.
Esse fenômeno faz com que passado e presente fiquem conectados pela prática desumana
da exploração de homens por homens, através das relações de poder. É necessário refletir que
desde as primeiras práticas escravagistas no Brasil se passaram mais de 500 anos.
Lamentavelmente, em tempos contemporâneos, essa prática que nega a economia de mercado,
e a relação capital/trabalho, persiste na sociedade brasileira e com intensidade significativa na
Bahia.
3.2 O ENCONTRO DE POVOS E O SURGIMENTO DO BRASIL
É inescapável registrar que um fato, em um dado momento, possui força histórica, por se
revestir no encontro e na miscigenação de culturas, que formaram no decorrer dos séculos o
‘amálgama do povo brasileiro’. Pero Vaz de Caminha (1500), João Capistrano de Abreu (2013)
e Alfredo Matta (2013) narram cada um a própria maneira esse encontro, que alguns
historiadores classificam como descoberta. Momento em que o navegador português Pedro
Álvares Cabral, no comando da armada do rei português Dom Manuel I, aporta ao sul da Bahia,
em 22 de abril de 1500, registrando a descoberta da terra, que seria batizada de Monte Pascoal,
Ilha de Vera Cruz, Terra de Santa Cruz e, por fim, Brasil (em 1503). A armada era composta
por 13 navios e 1500 homens. Priore e Venancio (2010) comentam sobre esse momento:
Depois de navegar por dez léguas ao longo da costa, fundearam numa baía a que se
deu o nome de Porto Seguro. A vastidão da selva, invadindo a praia, impressionou:
“as árvores são muitas e grandes”, anotava um atônito Caminha. No dia 26 de abril,
uma missa celebrada pelo franciscano Henrique Soares de Coimbra marcou os festejos
do Domingo de Páscoa. Em 1º de maio, uma cruz foi plantada. No ar, o som de araras,
maritacas, tuins e pica-paus; era “a terra dos papagaios”, terra ruidosa que, em cor de
incontáveis “plumagens”, irá figurar em vários mapas. No dia seguinte, Cabral
zarpava para Calicute. O Brasil havia sido “oficialmente descoberto”. (PRIORE,
VENANCIO, 2010, p. 17-18)
Era uma descoberta, porque os portugueses conheciam pela primeira vez o lugar e o povo
silvícola. Também era uma descoberta para os índios, que conheciam o povo português. Uma
descoberta que se reveste de encontro. Pedro Álvares Cabral permaneceu dez dias na terra
recém-descoberta e, antes de seguir viagem para as Índias, determinou que dois portugueses
91
ficassem para apreender os costumes e a língua local. Eles foram acolhidos pelos tupiniquins
da região, dando início a miscigenação cultural e racial (MATTA, 2013).
Sobre o encontro entre portugueses e silvícolas, Boris Fausto (1996, p. 20) afirma que no
momento em que “os europeus chegaram à terra que viria a ser o Brasil, encontraram uma
população ameríndia bastante homogênea em termos culturais e linguísticos, distribuída ao
longo da costa e na bacia dos Rios Paraná-Paraguai.”.
Uma narrativa bastante conhecida deste encontro é observada na carta de Pero Vaz de
Caminha (Torre do Tombo, 2012), em que é feita o registro oficial da descoberta pelos
portugueses, como consta: “Carta de Pero Vaz de Caminha sobre descobrimento da terra nova
q’fez Pedro Alves. Feito na Ilha de Vera Cruz em 1500”. Em um determinado trecho da carta,
Caminha expressa as intenções dos portugueses em converter e dominar: “Parece-me gente de
tal inocência que, se homem os entendesse e eles a nós, seriam logo cristãos. Porque eles,
segundo parece, não têm, nem entendem em nenhuma crença. Portanto se os degredados que
aqui hão de ficar aprenderem bem a fala deles e os entenderem, não duvido que eles, segundo
a santa atenção de Vossa Alteza, se farão cristãos e hão de crer na nossa santa fé, à qual praza
a Nosso Senhor que os traga, porque certamente está gente é boa e de bela simplicidade. E
imprimir-se-á facilmente neles qualquer cunho que lhe quiserem dar, uma vez que Nosso
Senhor lhes deu bons corpos e bons rostos, como a homens bons. E se Ele aqui nos trouxe, creio
que não foi sem causa.”.
Algumas categorias de análises podem ser identificadas na carta de Pero Vaz de Caminha:
a dominação ideológica através da religião; a exploração do silvícola como força de trabalho e
a subordinação aos interesses senhoriais. Estes elementos são constitutivos do ‘amálgama do
povo brasileiro’, sendo percebidos com intensidade na vida cotidiana. Eles impregnaram traços
senhoriais de dominação até a contemporaneidade, onde segmentos da sociedade, que se
constituem enquanto classe trabalhadora atuam como servidores da classe dominadora, agindo
como alienados, sem consciência de classe.
92
A imagem a seguir apresenta parte do litoral baiano por onde passaram os primeiros
navegadores portugueses:
Figura 6 – Imagem aérea do trecho denominado como Costa do Descobrimento.
Fonte: Produção Própria (2013).
Registrada na segunda década do século XXI, a imagem aérea (Figura 7) reproduz parte da
costa baiana, trecho Ilhéus/Salvador (denominada de Costa do Descobrimento38). Devido ao
nível de conservação natural do local, com parte da Mata Atlântica preservada, pode-se ter uma
ideia da paisagem avistada pelos primeiros navegadores portugueses.
3.3 CARACTERÍSTICA HISTÓRICA PRÉ-COLONIAL DO POVOAMENTO NO
RECÔNCAVO DA BAHIA
Alfredo Matta (2013, p.18) relata que no início da colonização portuguesa o território
baiano era ocupado por povos Tupis. Os Tupinambás situavam-se mais ao norte, enquanto os
Tupiniquins estavam ao sul do rio de Contas, mais próximos do litoral. Também existiam
38
O título de Patrimônio Natural Mundial para a Costa do Descobrimento foi concedido em 1º de dezembro de 1999, em
Marrakesh, no Marrocos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). A
Costa do Descobrimento tem 111.930 hectares e nela estão localizadas 23 áreas de proteção ambiental, em doze
municípios da Bahia e quatro do Espírito Santo. (IPHAN, 2013)
93
adensamentos populacionais formados pelo povo da língua Jê, os Tapuias. “Os Tapuias
habitavam o sertão, a maior parte do interior semiárido, o cerrado e alguns pontos mais
próximos do litoral, entre Ilhéus e Espírito Santo. Estes Tapuias mais próximos eram os
Aimorés.”.
Nesse período, explica Alfredo Matta (2013, p.18), os Tapuias do litoral estavam sendo
expulsos pelo Tupinambás e Tupiniquins. Quando capturados, os Tapuias, eram
frequentemente, devorados em rituais pelos Tupis. Essa característica antropofágica também
existia entre os Tapuias, cuja palavra significa ‘povo escravo’. Na relação com a terra, estava
uma das características que distingue os Tapuias dos Tupis. Os Tapuias eram caçadores e
coletores, e não conheciam a agricultura, eram nômades, habitando choupanas toscas, formando
pequenos grupos.
Os Tupis dominavam técnicas de agricultura, produzindo mandioca, milho, e amendoim
para a subsistência. Eles eram sedentários, apresentando tradições culturais mais elaboradas,
além da produção de artesanatos em cerâmica, couro e palha. Considerados também bons
construtores, os Tupis influenciaram no modo de construir e habitar, contribuindo com
formação das primeiras cidades e vilas baianas. Esses elementos fizeram com que traços da
cultura Tupi se tornassem elementos da identidade baiana contemporânea. Em decorrência
destas características, destaca Alfredo Matta (2013), os Tupis estabeleceram laços com os
colonizadores portugueses. Assim, a miscigenação entre portugueses e índios formaria o
primeiro traço do que viria a ser o povo brasileiro. Outras características seriam a dominação e
a exploração.
3.4 O PROCESSO HISTÓRICO DE EXPLORAÇÃO, POVOAMENTO E
MISCIGENAÇÃO DO RECÔNCAVO DA BAHIA
Uma nova expedição portuguesa, de Gonçalo Coelho, aportaria em 1501 com o comando
de Américo Vespúcio. A expedição batizou acidentes geográficos a exemplo do Rio São
Francisco; mais ao Sul, ao avistarem a enorme baía, deram o nome de Baía de Todos os Santos.
Permaneceram por 27 dias, tiveram contato com o Recôncavo e com os Tupinambás,
compraram 10 índios para que fossem escravizados, provavelmente Tapuias. A expedição
retornaria a Bahia em 1503, permanecendo por mais dois meses. Nesse período, explica Alfredo
Matta (2013), uma relação de trocas foi estabelecida:
94
O pau-brasil era trocado por machados, anzóis, tesouras e outras quinquilharias com
os índios. Logo, porém, os índios passaram a desejar mais. A extração da madeira
exercia um papel mediador, pois levava os índios a conhecer e participar do modo de
reprodução social que começava a ser construído, bastante eficiente e capaz de
sustentar muito mais seres humanos que as ordens sociais indígenas. A integração
sociometabólica indígena foi se dando por aproximação e concreto pertencimento das
relações de reprodução social que se construíam, e não simplesmente por guerras e
dominação. O índio percebeu logo que um machado de ferro representava cortar uma
árvore 12 vezes mais rápido. Os hábitos alimentares, técnicas de construção,
conhecimentos da terra que os índios tinham, iam se distribuindo, pouco a pouco,
segundo a ordem e organização de vida da colônia. (MATTA, 2013, p. 27)
O comércio de pau-brasil estabelecido entre portugueses e índios provou transformações
sociais e ambientais, imprimindo nos silvícolas novos práticas, que se transformaram em
valores sociais. Boris Fausto (1996) relata que as primeiras tentativas de exploração do litoral
brasileiro se basearam no sistema de feitorias, com exploração privada, mesmo sistema adotado
na costa africana:
O Brasil foi arrendado por três anos a um consórcio de comerciantes de Lisboa,
liderado pelo cristão-novo Fernão de Loronha ou Noronha, que recebeu o monopólio
comercial, obrigando-se em troca, ao que parece, a enviar seis navios a cada ano para
explorar trezentas léguas (cerca de 2 mil quilômetros) da costa e a construir uma
feitoria. O consórcio realizou algumas viagens mas, aparentemente, quando em 1505
o arrendamento terminou, a Coroa portuguesa tomou a exploração da nova terra em
suas mãos. (FAUSTO, 1996, p. 23)
Nesse período começa a ser desenvolvido um sistema de produção, com a implantação do
extrativismo em larga escala, baseado nas trocas com índios. Outra característica que marca
esses momentos iniciais de acumulação primitiva é a ação da iniciativa privada. Com a escassez
de pau-brasil na zona costeira, os europeus firmaram aliança com índios Tupinambás, que
tinham como característica o trabalho coletivo de derrubada de árvores. No interior do
continente o pau-brasil crescia disperso, o que dificultava a extração da madeira, necessitando
de conhecimento autóctone. Boris Fausto (1996, p. 23) destaca que com o domínio da técnica,
o corte do pau-brasil pode “integrar-se com relativa facilidade aos padrões tradicionais da vida
indígena.”.
A relação de exploração com os índios é aprofunda a partir de 1511, oportunidade em que
é instalada uma feitoria de pau-brasil na Baía de Todos os Santos. Através da Nau Bretoa, os
portugueses intensificam as relações de troca com os Tupinambás. Alfredo Mattos (2013)
registra que nesta época passaram a existir relatos dos primeiros brasileiros, oriundos da
miscigenação entre índios e europeus. Um pouco antes desse período, franceses também
passaram a ocupar a Baía de Todos os Santos. O bretão Paulmier Gennoville aportou em 20 de
outubro de 1504, sendo recebido por tupinambás, com os quais realizaram trocas, regressando
a Europa com carga de pau-brasil. (MATTA, 2013, 28)
95
Para ilustrar o processo de miscigenação entre índios e europeus, registra-se que em 1530,
Martim Afonso de Souza chega ao Brasil, com um galeão, duas naus e duas caravelas, e cerca
de 400 homens. Ele mantém contato, em 31 de março de 1531, com o náufrago português Diogo
Álvares Correia (Viana do Castelo, Portugal, 1475 – Tatuapara, Bahia, 5 de outubro de 1557),
que estava há 20 anos na região, tendo se casado com a índia tupinambá Paraguaçu, filha do
chefe tribal Itaparica. O náufrago foi nomeado Caramuru, tornado-se chefe local. Respeitado
pelos índios, era referência para portugueses e franceses. A esposa havia viajado com ele até a
França, foi batizada, e lá se casaram, com casamento passou a chamar-se Catarina Paraguaçu.
Com a liderança de Diogo Álvares Correia (Caramuru) ocorreu a formação de uma comunidade
brasileira, composta de tupinambás, náufragos portugueses, espanhóis e franceses, sendo um
entreposto construído entre as visitas, interações, escambos e naufrágios. Eles negociavam com
franceses, portugueses, espanhóis, e italianos, dentre outros. “Assim, nascia a comunidade que
daria suporte à futura colonização, visto que era o embrião de Salvador, futura primeira capital
do Brasil.”. (MATTA, 2013, 28)
Em 1532, Martim Afonso trava combate com franceses com objetivo de exercer a
hegemonia portuguesa, e fica decido que um processo de colonização seria iniciado. A
permanência da expedição de Martim Afonso de 1530 a 1533 representou momento de
transição entre o velho e o novo período. Boris Fausto (1996, p. 24) narra que, nesse período, o
Rei Dom João III, dividiu o Brasil em quinze quinhões, marcado por uma série de linhas
paralelas ao equador que iam do litoral ao meridiano de Tordesilhas, sendo os quinhões
entregues aos chamados capitães-donatários. Eles constituíam um grupo diversificado, no qual
havia gente da pequena nobreza, burocratas e comerciantes, tendo em comum suas ligações
com a Coroa. A Bahia é dívida em três Capitanias Hereditárias (Ilhéus, Porto Seguro e Bahia).
Com o sistema de Capitanias Hereditárias implantado, foi dado início ao processo de
formação de latifúndios no Brasil. As terras doadas pela Coroa aos donatários, administradores
das Capitanias Hereditárias, determinava a posse e não a propriedade. Mas, dentre os poderes
atribuídos aos donatários estavam a arrecadação de tributos, instalação de engenhos de açúcar,
moinhos de água, uso de depósitos de sal, monopólio da justiça, autorização para fundar vilas,
alistar colonos para fins militares e formar milícias, repasse de tributos à Coroa e poder para
doar sesmarias.
Boris Fausto (1996, p. 25) destaca que “a atribuição de doar sesmarias é importante, pois
deu origem à formação de vastos latifúndios. A sesmaria foi conceituada no Brasil como uma
96
extensão de terra virgem cuja propriedade era doada a um sesmeiro, com a obrigação raramente cumprida - de cultivá-la no prazo de cinco anos e de pagar o tributo devido à Coroa.”.
O latifúndio atendia a necessidade da centralização do controle sobre as terras e a produção,
permitindo produção de excedente com inversões a favor dos grandes comerciantes e da Coroa,
enquanto a constituição de pequenas propriedades levaria a fragmentação da produção e ao
cultivo de subsistência.
A expedição de Martim Afonso retorna a Portugal em 1533; antes de partir ele determina
que marujos iniciem experimentos de plantio de variedades oriundas da Europa e Ásia, a
exemplo da cana-de-açúcar, manga, jaca, dentre outras variedades. Com o processo de
colonização, a relativa paz com os índios é quebrada, e guerras são estabelecidas com Aimorés,
Tapuias e Tupiniquins. As guerras entre europeus e índios levou a corrosão do sistema de
Capitanias Hereditárias e ao extermínio de significativo número de índios. Para responder a
crise estabelecida na colônia e retomar a ordem, em 1549 o rei Dom João III de Portugal institui
o Governo-Geral do Brasil, tendo São Salvador como sede (atual Salvador). O sistema de
colonização que estava baseado na exploração privada das Capitanias Hereditárias, passava a
ter o Estado Português como principal ator. Boris Fausto (1996, p. 25) destaca que as
“capitanias foram sendo retomadas pela Coroa, ao longo dos anos, através de compra e
subsistiram como unidade administrativa, mas mudaram de caráter, por passarem a pertencer
ao Estado. Entre 1752 e 1754, o Marquês de Pombal completou praticamente o processo de
passagem das capitanias do domínio privado para o público.”.
3.5 A EXPANSÃO MERCANTILISTA NO RECÔNCAVO DA BAHIA
O primeiro Governador-Geral do Brasil foi Tomé de Sousa (1549-1553). A nomeação era
feita diretamente pelo rei, por período de quatro anos e contava com três auxiliares, ouvidormor, responsável pela justiça; provedor-mor, pelas finanças; e o capitão-mor, pela defesa do
litoral; juntos formavam o Conselho de Governo. Chegavam também, o primeiro bispo do
Brasil e uma dezena de escrivães. A frota partiu de Lisboa em 1º de fevereiro de 1549, e contava
com três naus, duas caravelas e um bargantim39, com aparato administrativo, militar e de
serviços, eram contabilizados cerca de mil pessoas. Alfredo Matta (2013, p. 35) explica que
esse evento cria “condição única de desenvolvimento e miscigenação de práticas culturais e
39
Antiga embarcação à vela e remo, esguia e veloz, com um ou dois mastros de galé e oito a 10 bancos para os remadores,
usada no Oriente pelos portugueses.
97
modos de reprodução social, que acabará por construir uma práxis social genuinamente
brasileira, baiana.”
Boris Fausto (1996, p. 26) explica que com Tomé de Sousa vieram os primeiros jesuítas,
“Manuel da Nóbrega e cinco companheiros, com o objetivo de catequizar os índios e disciplinar
o ralo clero de má fama existente na Colônia”. Em 25 de fevereiro de 1551, por meio da bula
‘Super specula militantis ecclesiae’, o Papa Júlio III cria a diocese de São Salvador, da Bahia,
como sufragânea (bispado dependente de um metropolitano) da Sé Metropolitana de Lisboa.
De 1552 a 1556 assume Dom Pedro Fernandes Sardinha como primeiro bispo do Brasil. A
organização do Governo-Geral representou o início da montagem da estrutura de Estado no
Brasil Colônia, com a centralização administrativa e a união entre Governo e Igreja, mantendo
São Salvador como capital da Colônia até 1763.
Segundo Boris Fausto (1996, p. 25-26), a decisão de instalar o Governo-Geral do Brasil
ocorreu concomitantemente a conjuntura de eventos. A Coroa Portuguesa enfrentava
dificuldades no campo internacional com crise nos negócios da Índia; sofrera derrotas militares
no Marrocos; e no mesmo ano em que Tome de Sousa foi enviado ao Brasil, o governo
português fechou o entreposto comercial de Flandres, por ser deficitário. A feitoria de Flandres,
também conhecida como feitoria da Antuérpia, foi fundada pouco depois da chegada de
portugueses à Índia, funcionou de 1508 a 1549 e tinha o objetivo de administrar o comércio e
distribuição dos produtos vindos do Oriente. A Coroa Portuguesa também estava sendo
pressionando pelos crescentes ganhos dos espanhóis. A descoberta da mina de prata de Potosí,
no atual Peru, elevou a taxa de acumulação da Espanha, Estado concorrencial dos portugueses.
Embora não significativos, inicialmente, os investimentos da Coroa Portuguesa no Brasil
Colônia produziram, em 1558, 2,5% das rendas, nesse mesmo período, 26% das rendas eram
provenientes do comércio da Índia.
A facilidade em navegar pela Baía de Todos os Santos possibilitou rápida expansão
comercial e formações de freguesias e vilas no Recôncavo, além de uma economia voltada à
navegação. A partir de 1549 são instalados engenhos, e em 1580, a partir de Água de Meninos
(Salvador) até a entrada do rio Paraguaçu foram contabilizados 36 engenhos em torno da baía.
Em 1557, surge Santo Amaro; a freguesia da Purificação é fundada em 1604. No século XVI
surgem Pirajá, Santiago do Iguape, Nazaré das Farinhas e, na segunda metade do século XVII
surge Cachoeira e Maragogipe (Os primeiros registros de povoamento de Maragogipe datam
de 1520). Ocorria nessas localidades uma interação entre as sedes de vilas e freguesias,
98
engenhos, aldeias indígenas e a capital, Salvador, sendo estabelecida a relação de
interdependência e prática histórica comum. Esse processo de colonização foi marcado por uma
hegemonia e dominação portuguesa baseada na violência, extermínio e no trabalho
compulsório. (MATTA, 2013)
3.6 A ESCRAVIDÃO COMO ELEMENTO DO TRABALHO COMPULSÓRIO
No processo de formação de capital primitivo, através da exploração do latifúndio e da
constituição dos engenhos, foi introduzida uma terceira raça no Brasil Colônia. Wlamyra
Albuquerque e Walter Fraga Filho (2006, p. 44 e 46) relatam com densidade como os negros
foram trazidos como trabalhadores escravos para o Brasil a partir da metade do século XVI.
Nesse período a maioria dos negros são oriundos da região da Senegâmbia (atual Guiné). A
origem destes negros é formada por diversos povos, a exemplo dos manjacas, balantas, bijagos,
mandigas, jalofos, entre outros.
A partir do final do século XVI até o século XVIII, Angola passou a fornecer mão de obra
escrava, sendo embarcados nas regiões portuárias de Luanda, Benguela e Cabinda. O comércio
baiano de escravos recepcionou, a partir de meados do século XVIII e até o fim do tráfico em
1850, negros oriundos do Golfo do Benim (sudoeste da atual Nigéria). Através do Golfo do
Benim, os traficantes baianos receberam negros de origem dagomés, jejes, haussás, bornus,
tapas e nagôs, entre outros. Sobre o número total de negros trazidos para o Brasil não se tem
registros precisos, mas Wlamyra Albuquerque e Walter Fraga Filho (2006) indicam que:
Entre o século XVI e meados do século XIX, mais de 11 milhões de homens, mulheres
e crianças africanos foram transportados para as Américas. Esse número não inclui os
que não conseguiram sobreviver ao processo violento de captura na África e aos
rigores da grande travessia atlântica. A maioria dos cativos, cerca de 4 milhões,
desembarcou em portos do Brasil. Por isso nenhuma outra região americana esteve
tão ligada ao continente africano por meio do tráfico como o Brasil. O dramático
deslocamento forçado, por mais de três séculos, uniu para sempre o Brasil à África.
(ALBUQUERQUE, FRAGA FILHO, 2006, p. 39)
A política adotada pela metrópole portuguesa de introduzir negros oriundos de vários povos
tinha a finalidade de evitar a coesão quando chegassem ao Brasil. Mas a mistura étnica, se no
primeiro momento evitou a coesão social, no decorrer do processo histórico imprimiu
características multiétnicas na identidade brasileira. Esses fatores históricos contribuíram para
a formação do ‘amálgama do povo brasileiro’, influenciando definitivamente em uma
identidade nacional multirracial.
99
Boris Fausto (2006) destaca que ao lado da empresa comercial, e da grande propriedade,
se juntava o terceiro elemento necessário a acumulação, o trabalho compulsório. No caso do
Brasil era formado por escravos – negros, sendo a imensa maioria; e índios, formando um grupo
mais reduzido, levando a um processo de acumulação primitiva diferente da Europa, que no
período anterior promovia acumulação através do servilismo. Esses elementos formaram a base
do desenvolvimento capitalista no Brasil. Sobre esse movimento, destaca Marx (2004):
O dinheiro converte-se em capital, o capital em fonte de mais-valia, e a mais-valia
transforma-se em capital adicional. A acumulação capitalista supõe a existência da
mais-valia, e esta, a da produção capitalista que, por sua vez, não se pode realizar
enquanto não se encontram acumuladas, nas mãos dos produtores-vendedores, massas
consideráveis de capitais e de forças operárias. Todo este movimento parece estar
encerrado em um círculo vicioso do qual não se pode sair sem admitir uma
acumulação primitiva (“previous acumulation”, diz adam Smith) anterior à
acumulação capitalista e servindo de ponto de partida à produção capitalista, em lugar
de ser por ela originada. (MARX, 2004, p. 11)
Ou seja, antes de ocorrer uma acumulação capitalista decorrente da relação
capital/trabalho assalariado, o processo de acumulação ocorrido nos séculos iniciais do Brasil,
foi marcado pela escravidão, servindo de ponto de partida para o desenvolvimento do
capitalismo no Brasil.
Com a implantação do Governo-Geral, organização de latifúndios, implantação de
engenhos, e a introdução do negro como força de trabalho, o processo de acumulação primitiva
pode se expandir com intensidade rumo ao Recôncavo baiano, tornando a Bahia, durante a
primeira metade do século XVI, o maior produtor de açúcar do Brasil. A chegada do GovernoGeral também marca a industrialização do Recôncavo da Bahia, a partir de 1550, com a
implantação da cultura da cana-de-açúcar e a sucessiva instalação de engenhos (unidade
agroindustrial mais complexa à época), tornando a cana-de-açúcar a primeira monocultura, o
segundo commodity de exportação do Brasil, o primeiro foi o pau-brasil, explicam Hatje e
Andrade (2009, p. 19). Este processo levou a transformação dos meios socioeconômicos, físicos
e bióticos, com acelerada destruição das matas primárias, que também foram utilizadas como
combustível vegetal, além de matéria prima para o setor de construção e reparação de
embarcações.
No final do século XVI existiam mais de 40 engenhos instalados na região, distribuídos
entre São Francisco do Conde, Santiago de Iguape e Santo Amaro, constituindo um território
reservado exclusivamente à cultura da cana. Hatje e Andrade (2009, p. 19) explicam que “As
lavouras de subsistência, especialmente a exploração da mandioca, desenvolveram-se ao sul
desta região, enquanto as plantações de fumo concentraram-se a oeste”. A ligação aquática entre
100
os diferentes pontos foi fator fundamental para a exportação do açúcar e de produtos oriundos
do sertão nordestino, além de servirem para o intenso tráfico de escravos.
No processo de colonização do Recôncavo da Bahia, a Baía de Todos os Santos40 exerceu
papel de destaque, não apenas para o desenvolvimento da Bahia, e do Brasil. As relações de
troca eram facilitadas em decorrência de vasta rede de águas, com profundidade suficiente para
navegação. A confluência dos sistemas hidrográficos com marítimo tornou a Baía de Todos os
Santos o ponto de maior navegação do Brasil colônia, chegando a receber cerca de 1400
embarcações. (HATJE, ANDRADE, 2009).
Todos esses elementos convergiram para a construção de uma nova sociedade. Alfredo
Matta (2013) comenta que no Recôncavo baiano a construção social e a cultura costeira se
desenvolveu
Ao redor dos engenhos, da conversão dos índios, do crescimento da escravidão, da
vida no ritmo das marés, da ligação constante e fácil entre localidades costeiras e
ribeirinhas, da pesca, das vilas, freguesias e arraiais, do mar e do que ele trazia ou
levava; aos poucos se foi construindo uma região de cultura mais ou menos
homogenia, cabocla, mulata, cafuza, distante é claro, de qualquer ideia de democracia
racial, visto que era uma sociedade classista e com claras hegemonias. [...] Uma
sociedade construída em função de certo branqueamento. Isso não impedia que
tradições e formas de expressão ou práticas originárias de qualquer uma das etnias
formadoras na nova realidade, fossem absorvidas e revalidadas por sujeitos de origem
de qualquer das outras etnias, visto que estava se formando uma forma regional de
reprodução social. [...] As duas grandes baías, a de Camamu e a de Todos os Santos,
assim como as ilhas em frente do Rio Una, Boipeba e Tinharé, davam esta condição
de comunicabilidade e intercâmbio. As tradições e pessoas que vão se reunindo irão
forjar da mistura de práticas ancestrais, as práticas do Recôncavo e Baixo sul. (p. 3536)
A despeito da miscigenação racial, o domínio europeu se concretizou através da língua, do
culto e das práticas religiosas, das técnicas de construção e de navegação, e da hierarquia social.
Mas a intensa presença de negros e índios proporcionou mistura cultural singular, como
expressa Alfredo Matta (2013), sobre as características da sociedade senhorial estabelecida no
Recôncavo:
Por herança ibérica a Bahia nasceu com organização societária e modo de reprodução
social, baseado na propriedade inquestionável dos fidalgos sobre os recursos da
existência necessários à vida da coletividade. Eram proprietários das terras, rios e
40
Maior Baía do litoral brasileiro, com uma extensão de 1.100 km², a Baía de Todos os Santos faz parte do litoral do atual
estado da Bahia. Em seu entorno localizam-se catorze municípios: Maragogipe, Itaparica, Vera Cruz, Jaguaripe, Nazaré,
Salinas da Margarida, São Félix, Cachoeira, Santo Amaro, Saubara, São Francisco do Conde, Madre de Deus, Candeias
e Salvador. Apresentando uma grande concentração demográfica, é a região com a mais elevada concentração
populacional do estado da Bahia, com cerca de três milhões e trezentos mil habitantes aproximadamente. [...] A Baía de
Todos os Santos apresenta, no interior, duas pequenas Baías, a de Aratu e a de Iguape. A Baía de Aratu é uma grande
enseada onde se localizam a Base Naval e o Porto de Aratu; enquanto a Baía de Iguape, localiza-se no rio Paraguaçu,
antes que suas águas cheguem à foz, na Baía de Todos os Santos. Em suas margens encontram-se o município de
Maragogipe, com os distritos de São Roque do Paraguaçu e Nagé. Enquanto o distrito de Santiago do Iguape, pertencente
ao município de Cachoeira. (EIA/RIMA, 2009, V 5, p. 226)
101
mares, e da relação como a posse de monopólios do grande comércio atlântico.
Formalmente, as práticas de subsistência só poderiam ocorrer se permitidas pelo favor
dos senhores patrimonialistas. Eram também proprietários da fé, da cultura, das
relações sociais, dos modelos estéticos, da ideologia, da criação de padrões sobre o
que era ou não recomendável. Havia uma regra simples: o candidato à fidalguia era
cristão, branco e homem, ou o mais próximo possível disso. Estabelecia-se um
branqueamento. Realizou-se então o poder baseado no prestígio: na capacidade dos
poderosos em privilegiar e favorecer os aliados e dependentes. (MATTA, 2013, p. 37)
Esse modelo de sociedade apresentava algumas características de poder, Explica Alfredo
Matta (2013, p. 37):
A propriedade dos recursos produtivos e do fundamental da economia e sociedade;
(MATTA, 2013, p. 37)
As ligações e alianças entre poderosos, o compadrio, que dava capacidade de
favorecer dependentes e aliados; e (MATTA, 2013, p. 37)
As ligações com a metrópole, que determinava a ligação mais ampla de favorecimento
e influência de um poderoso local, fiel ao direcionamento metropolitano. (MATTA,
2013, p. 37)
A propriedade dos meios de produção no Recôncavo baiano do Brasil Colônia teve
repercussões sobre o modo de vida contemporâneo dos povos que nessa região permaneceram.
Observa-se que no século XXI, mesmo com elevada produção de capital, as populações
apresentam baixo IDHM, e históricos aspectos de exclusão dos meios de produção, vivendo da
economia extrativista de subsistência. Além de se manterem à margem de avanços na educação
formal, em decorrências de políticas educacionais equivocadas, o que as impede de serem
inseridas no modernos sistemas industrias de produção. Soma-se a esses elementos, as práticas
de compadrio e as alianças estabelecidas nas relações de poder, com objetivo de manter essas
populações à margem de ganhos sociais e no controle dos meios de produção, ou seja, da terra.
Isso contribuiu para a manutenção de um subproletariado de significativa dimensão, o que
enseja um enfraquecimento na luta de classes e na fragilização da classe trabalhadora
formalmente estabelecida.
No próximo tópico é observado como o Estado atua no sentido de superar a crise, buscando
desenvolver uma nova dinâmica territorial.
3.7 A EXPANSÃO DO CAPITAL PETROLÍFERO NO RECÔNCAVO DA BAHIA
O Recôncavo da Bahia está ligado aos recentes processos de industrialização do país,
liderado pela cadeia de valor do Petróleo e Gás (P&G41). Segundo Hatje e Andrade (2009, p.
41
A existência do petróleo no país, e na Bahia, era computada desde os tempos do regime imperial. Naquela época, o
Marquês de Olinda (Pedro de Araújo Lima) cedeu o direito a José Barros de Pimentel para que pudesse realizar a extração
de betume nas margens do rio Marau (Baía de Camamu). Até as primeiras décadas do século XX, alguns estudiosos e
exploradores anônimos tentaram perfurar alguns poços de petróleo sem obter êxito. Em 1939 ocorre a primeira descoberta
102
247), as alterações socioambientais foram intensificadas a partir da metade do século XX, em
decorrência dos investimentos que o Estado realizou através da PETROBRAS, com intuito de
prospectar petróleo na região. Também concorreu para mudar o perfil econômico da região a
construção e operação da Refinaria Landulpho Alves42 (RLAM). Após a inauguração da
RLAM, “durante as três décadas seguintes, o Recôncavo Baiano foi o único produtor nacional
de petróleo, chegando a produzir um quarto das necessidades nacionais.”.
Mas, esse processo de expansão capitalista não transcorre de forma pacífica. Desde o Brasil
Colônia, o processo de ocupação das margens da Baía de Todos os Santos43 (BTS) por
comunidades tradicionais vem ocorrendo, enquanto o processo de industrialização liderado pelo
P&G impôs a essas comunidades prejuízos socioeconômicos, além de apresentar poucos
ganhos sociais. Sobre as implicações do capital petrolífero, Sevá Filho (2012) observa que tem
ocorrido ao longo de décadas uma série de ocupações capitalistas no entorno da baía, e que esse
processo tem se intensificado com o cercamento de extensos trechos terrestres litorâneos pela
especulação imobiliária urbana através da ocupação turística, pelos terminais portuários
especializados, inclusive terminais petrolíferos, e pelos estaleiros da indústria naval. Também
tem ocorrido o cercamento ou destruição de manguezais pelas marinas das residências de lazer
e pelas fazendas de camarão; além da contaminação dos estuários em decorrência da operação
de refinarias de petróleo como a RLAM.
As imagens a seguir, exemplificam o processo de cercamento na Baía de Todos os Santos:
de petróleo no Brasil, realizada pela Divisão de Fomento da Produção Mineral, órgão do Departamento Nacional da
Produção Mineral (DNPM), no poço nº 163, localizado em Lobato, no Recôncavo Baiano. A descoberta foi considerada
subcomercial. Em 1941 é descoberto em Candeias o primeiro campo comercial de petróleo, neste mesmo ano também é
marcado pelo decreto-lei nº 3.236, que resguarda à União a propriedade de todas as jazidas de petróleo e gases naturais
encontradas em território nacional. Nesta época foram descobertos campos de gás natural em Aratu e de petróleo em
Itaparica, ambos no Recôncavo Baiano. Em 1950 no distrito de São Francisco do Conde, é inaugurada a Refinaria
Landulpho Alves (RLAM), primeira unidade de refino de petróleo do Brasil. Em 1956 têm início a operação do Terminal
de Madre de Deus, o que torna possível exportar para Cubatão o excesso de petróleo produzido no estado. (MME, 2014)
42 A Refinaria Landulpho Alves - Mataripe (RELAM) começou a ser construída ainda no fim dos anos 40. [...] Com o
crescimento da produção de óleo no município de Candeias, na Bahia, o Conselho Nacional do Petróleo (CNP), um órgão
federal, decidiu investir na região. O local escolhido foi o terreno da antiga fazenda Porto Barreto, em Mataripe, às
margens da Baía de Todos os Santos. Para trabalhar no empreendimento pioneiro, vieram profissionais de todo o Brasil
e também do exterior: Estados Unidos, Inglaterra, França, Alemanha, Polônia e Itália. Em 17 de setembro de 1950, a
unidade entrava em operação, com capacidade instalada de 2,5 mil barris por dia. Sua implantação marcou o início de um
novo ciclo de desenvolvimento para a Bahia e para o Brasil. (PETROBRAS – RLAM, 2010)
43 A Baía de Todos os Santos tem hoje um complexo portuário que conta com os portos de Salvador e de Aratu (este
iniciado em 1971), com os estaleiros de São Roque do Paraguaçu e com os terminais das indústrias Usiba, da Dow
Química e do Terminal de Madre de Deus (TEMADRE), da Petrobrás, além dos pequenos portos das cidades do
Recôncavo. (CAROSO, TAVARES, PEREIRA, 2011, p. 396)
103
Figura 7 – A imagem aérea apresenta o cercamento do litoral da Baía de Todos os Santos pelos portos
Aratu e Ford, em Candeias; e o Terminal Portuário Cotegipe, em Salvador.
Fonte: Produção Própria (2012).
Figura 8 – Ocupação das margens da Baía de Todos os Santos por loteamentos imobiliários. Na imagem
aérea o condomínio Praia do Sol e o balneário de Cabuçu, em Saubara.
Fonte: Produção Própria (2013).
104
Figura 9 – Ocupação das margens da Baía do Iguape por empreendimento imobiliário privado.
Fonte: Produção Própria (2012).
Figura 10 – Ocupação das margens da Baía do Iguape pela comunidade de São Roque do Paraguaçu,
Canteiro da PETROBRAS e Estaleiro Enseada do Paraguaçu, em Maragogipe.
Fonte: Produção Própria (2013).
105
As imagens (Figuras 8, 9, 10 e 11) evidenciam os conceitos sobre despossessão da massa,
cercamento do litoral e acumulação primitiva expressos por David Harvey (2011), István
Mészáros (2011a), Catherine Prost (2010), Sevá Filho (2012) e Karl Marx (2004). Segundo
Marx (2004, p. 13), a essência do sistema capitalista está na separação radical entre o produtor
e os meios de produção. Esta separação torna-se cada vez mais acentuada e numa escala
progressiva, desde que o sistema capitalista se estabeleceu. Para que o sistema capitalista viesse
ao mundo foi preciso que os meios de produção fossem arrancados sem discussão dos
produtores, que os empregavam para realizar o próprio trabalho, sendo transferidos para os
capitalistas, cuja finalidade é a acumulação através da mais-valia. “O movimento histórico que
separa o trabalho de suas condições exteriores indispensáveis, eis a causa da acumulação
chamada “primitiva”, porque ele pertence à idade pré-histórica do mundo burguês”. As imagens
demostram como as comunidades tradicionais do Recôncavo da Bahia são, paulatinamente,
despossuídas dos meios de produção, sendo a própria natureza transferida para os capitalistas.
Sobre esses processo, Sevá Filho (2012) relata que no transcorrer de décadas, os problemas
entre o capital petrolífero e os moradores da Baía de Todos os Santos se intensificaram, com
derramamentos recorrentes de óleo e derivados pela refinaria de RLAM, e pelas operações do
terminal marítimo de Madre de Deus. Além da destruição dos criadouros de mariscos pelas
obras de gasodutos em Cairu, e Salinas da Margarida. Outro desequilíbrio socioambiental
observado foi com relação a contaminação por resíduos em decorrência da dragagem do canal
pelo estaleiro em São Roque do Paraguaçu. O Estaleiro pode ser implantando a partir da
mudança do decreto que criou a Reserva Extrativista Marinha da Baia do Iguapé (RESEX
Marinha do Iguapé44). Publicado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 11 de agosto
de 2000, “tem por objetivo garantir a exploração autossustentável e a conservação dos recursos
44
O Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, decreta a criação da Reserva Extrativista Marinha da Baia do
Iguapé, nos Municípios de Maragogipe e Cachoeira, Estado da Bahia, e dá outras providências. Art. 1º Fica criada a
Reserva Extrativista Marinha da Baia do Iguapé, localizada nos Municípios de Maragogipe e Cachoeira, Estado da Bahia,
com uma área aproximada de 8.117,53 hectares, sendo 2.831,24 hectares em terrenos de manguezais, e 5.286,29 hectares
de águas internas brasileiras, tendo por base a Folha SD-24-X-A-IV, publicada pelo Departamento de Cartografia do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. [...] Art. 2º A Reserva Extrativista Marinha da Baia do Iguape tem por
objetivo garantir a exploração autossustentável e a conservação dos recursos naturais renováveis tradicionalmente
utilizados pela população extrativista da área. Art. 3º A área da Reserva Extrativista, ora criada, fica declarada de interesse
ecológico e social, conforme preconiza o art. 2º do Decreto nº 98.897, de 30 de janeiro de 1990. Art. 4º Caberá ao Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA supervisionar a área de que trata este
Decreto, promover as medidas necessárias à formalização do contrato de concessão real de uso gratuito com a população
tradicional extrativista, para efeito de sua celebração pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, nos termos
do Decreto nº 3.125, de 29 de julho de 1999, e acompanha o cumprimento das condições nele estipuladas. Art. 5º Este
Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 11 de agosto de 2000. (CARDOSO, 2000)
106
naturais renováveis tradicionalmente utilizados pela população extrativista da área.”. Com a
redução da RESEX a população tradicional viu subtraído parte do território a que tem direito.
Sobre as implicações sociais com a mudança da poligonal que delimitou à RESEX,
Cathérine Prost (2010, p. 59) afirma: “para as populações tradicionais, a natureza não representa
apenas um amontoado de recursos, mas também um abrigo, por ser um local de moradia, um
local onde se exercem relações de solidariedade orgânica e que contém valores simbólicos que
contribuem para forjar uma identidade local. Na baía do Iguape, pode-se perceber uma
densidade social entre os pescadores e marisqueiros.”. A pesquisadora observa que a mudança
das características geográficas, a mudança na natureza do lugar, provoca transformações nos
três meios, físico, biótico e socioeconômico, desestruturando laços de solidariedade orgânica e
corrompendo a própria natureza.
David Harvey (2011) chama a atenção para o desequilíbrio que o conjunto de mudanças
acarreta na natureza. Afirma que a
“natureza” é um termo simples demais para dar conta da imensa diversidade
geográfica de formas de vida e da complexidade infinita dos ecossistemas
interligados. No esquema ampliado das coisas, o desaparecimento de uma zona úmida
aqui, de uma espécie local ali e de um determinado habitat em algum outro lugar
podem parecer triviais, bem como inevitáveis, dados os imperativos do crescimento
populacional humano, sem dizer a continuidade da acumulação do capital sem fim
com uma taxa composta. Mas é justamente a agregação de tais mudanças de pequena
escala que pode produzir problemas macroecológicos, como o desmatamento, a perda
de habitats e da biodiversidade, a desertificação e a poluição oceânica. (HARVEY,
2011, p. 67)
Ou seja, existe uma totalidade que atinge os diversos meios, físico, biótico e
socioeconômico, e que modifica e excluí as populações tradicionais. Com relação a dimensão
humana, e em especial as comunidades tradicionais, esses modelos de desenvolvimento
apresentam-se significativamente excludente. Milton Santos (1977) de forma brilhante,
expressa essa exclusão na obra ‘A totalidade do diabo: como as formas geográficas difundem
o capital e mudam estruturas sociais’:
A formação socioeconômica é realmente uma totalidade. Não obstante, quando sua
evolução é governada diretamente de fora sem a participação do povo envolvido, a
estrutura prevalecente — uma armação na qual as ações se localizam — não é a da
nação mas sim a estrutura global do sistema capitalista. As formas introduzidas deste
modo servem ao modo de produção dominante em vez de servir à formação
socioeconômica local e às suas necessidades específicas. Trata-se de uma totalidade
doente, perversa e prejudicial. (SANTOS, 1977, p.42)
O que se observa é que, a elevada produção de capital nos territórios ocupados pelas
comunidades tradicionais da Baía de Todos os Santos (BTS) não se transformou em ganhos
socioeconômicos para essas comunidades. Os indicadores de IDHM e renda per capita de seis
107
municípios – Cachoeira, Itaparica, Maragogipe, Salinas da Margarida, São Félix e Saubara –
quando comparados aos indicadores do país apontam para discrepâncias nos ganhos
socioeconômicos desses municípios, conforme apresentando na tabela a seguir:
TABELA COM INDICADORES DE IDHM E RENDA PER CAPITA EM R$
IDHM
IDHM
IDHM
Lugar
(1991)
(2000)
(2010)
Renda (1991)
Renda (2000) Renda (2010)
Brasil
0,493
0,612
0,727
447,56
592,46
793,87
Cachoeira
0,399
0,516
0,647
159,84
239,23
368,11
São Félix
0,388
0,489
0,639
161,74
223,36
299,65
Maragogipe
0,341
0,456
0,621
117,89
170,15
300,1
Salinas da Margarida
0,373
0,466
0,617
122,67
148,32
286,45
Saubara
0,352
0,502
0,617
131,35
204,5
265,17
Itaparica
0,407
0,522
0,670
138,52
257,05
476,99
Tabela 6 – Indicadores de IDHM e renda per capita do Brasil e de seis municípios da Baía de Todos os
Santos, compreendendo o período de 1991, 2000 e 2010.
Fonte: Atlas Brasil (2013)
Analisando a Tabela 6, observa-se que na varável IDHM os municípios da BTS
apresentaram média de 0,376 pontos em 1991; enquanto o Brasil apresenta 0,493 pontos,
superando os municípios em 0,117 pontos. Em 2010 os municípios da BTS apresentam média
de 0,635 pontos, enquanto o Brasil apresenta 0,727, mantendo 0,092 pontos de diferença no
IDHM. Ou seja, no transcurso de duas décadas os avanços no IDHM da região mantiveram
níveis assimétricos de disparidades quando observado os indicadores do país.
Analisando a variável renda per capita, observa-se que os municípios da BTS, em 1991,
apresentavam média de R$ 138,66, enquanto o Brasil apresentava renda de R$ 447,56. Duas
décadas após, a renda per capita média dos municípios da BTS é de R$ 332,74, enquanto o
Brasil apresenta renda de R$ 793,87. Medida as diferenças de renda per capita no período
observa-se que os moradores dos municípios da BTS mantêm a evolução da renda abaixo dos
padrões do país, apresentando diferença de renda em 1991 de R$ 308,90; e em 2010 de R$
461,13. Conclui-se que o processo de avanço do capitalismo na região do Recôncavo da Bahia
não se converte em taxa de renda para as populações locais, e que no intervalo de três décadas
a taxa de mais-valia foi acentuada, levando em consideração que no período o processo de
industrialização
no
território
foi
incrementando,
com
a
implantação
de
novos
empreendimentos.
108
A partir dos dados estatísticos, conclui-se que os moradores dos municípios de Cachoeira,
Itaparica, Maragogipe, Salinas da Margarida, São Félix e Saubara apresentam renda per capita
e indicadores de desenvolvimento humano abaixo dos indicadores do país, e que este quadro
não apresenta evolução positiva, mantendo os níveis históricos de discrepância com relação ao
país. Observa-se que a RLAM contribui com 25% de arrecadação de ICMS da Bahia, com
tendência de crescimento, as inversões de riqueza que a região produz, apresenta grave prejuízo
à comunidade local. Outro dado a ser observado, é que em 2010, em valores absolutos, a renda
precipita apresenta disparidade de R$ 152,23. Ou seja, enquanto outras regiões do país
avançaram, os moradores da região da BTS se tornaram mais pobres, em relação ao restante do
país. O que se deseja chamar a atenção é que o crescimento do capital petrolífero não significou
em ganhos sociais efetivos. (PETROBRAS – RELAM, 2010)
3.8 CARACTERÍSTICAS HISTÓRICAS DE MARAGOGIPE
Como observado anteriormente, é no período do Brasil Colônia que surge Maragogipe. O
município está localizado na Baía de Todos os Santos, numa região constituída por mangues,
baixios e tabuleiros, conhecida desde o século XVI por Recôncavo. Alfredo Matta (2013),
EIA/RIMA (2009), IBGE (2014), IPAC (2010a), IPAC (2010b), explicam que onde atualmente
está localizado o município de Maragogipe45, existia na época do Brasil Colônia uma tribo com
cerca de 200 índios, denominada ‘Marag-gyp’, que significa ‘braços invencíveis’. Assim como
outras tribos, os Marag-gyp cultivavam o solo, dominavam o arco e flecha, utilizam ‘tarayra’,
espécie de machado de pau-ferro, coletavam frutas, caçavam e pescavam, tendo fixado moradia
e abandonado a vida nômade.
A região onde os Marag-gyp construíram a aldeia, era banhada com águas abrigadas e
profundas (atual baía do Iguape) que com encontro com a terra formavam um porto natural. Em
1520, europeus fixaram residência nessa localidade, por identificarem riquezas naturais e fácil
acesso da baía a outros pontos da baía, ocorrendo o início do povoamento e da miscigenação.
Os europeus, com ajuda dos índios, iniciaram a extração de madeira, plantação de cana-deaçúcar e de mandioca, além da construção de engenhos e casas de farinha (local onde se
processa a mandioca, para transformar em farinha). (IBGE, 2014) e (IPAC, 2010a)
45
Existem algumas versões para a origem do nome deste município. A primeira seria a de que esta denominação se deu
por significar Rio dos Mosquitos, para os índios Aimorés, que se referiam ao local desta maneira, por ser cercado de
extensos manguezais, habitat bastante propício a esses insetos. Para Theodoro Sampaio, este vocábulo encontraria sua
origem na palavra Maraú-gy-pe, do tupi, referindo-se ao rio dos Maraús ou dos Maracujás. (IPAC, 2010a, p. 13)
109
Em 16 de janeiro de 1557, D. Duarte da Costa, 2º Governador-Geral do Brasil, doa a D.
Álvaro da Costa (filho do governador Duarte da Costa) as terras da sesmaria de Paraguaçu (ou
sesmaria de Paroaçu, atual Maragogipe). A doação é confirmada por ‘Alvará Régio’ datado de
12 de março de 1562. Em 20 de novembro de 1565 a sesmaria é transformada, por carta, em
Capitania, pelo Cardeal Regente D. Henrique, e em 28 de março de 1566, outra carta confirma
o ato. Em 23 de agosto de 1571, durante o reinado de D. Sebastião, a documentação é registrada
em Lisboa. Segundo IPAC (2010a, p. 16), “O território de D. Álvaro tinha quatro léguas de
costa, da parte sul do Rio Paraguaçu até a barra do Rio Jaguaripe, incluindo todas as ilhas ao
longo da costa e 10 léguas sertão adentro. Ao falecer, em 1575, D. Álvaro deixou sete filhos;
tornando-se o primogênito, Dom Duarte, o segundo donatário das terras.”.
As mudanças de status da comunidade ocorriam com intensidade devido à localização
estratégica, que levava ao desenvolvimento de intensa atividade comercial. No final do século
XVI, Maragogipe ficou conhecida como a principal localidade da Capitania do Paraguaçu
(IPAC, 2010a). Em 1640, com uma capela, construída em anos anteriores, dedicada a São
Bartolomeu, a localidade é elevada à categoria de freguesia, pelo Bispo Dom Pedro da Silva
Sampaio, por proposta do vice-rei Dom Jorge de Mascarenhas (Marquês do Montalvão),
recebendo a denominação de São Bartolomeu do Maragogipe. (IBGE, 2014)
Em 1724, o Conde de Sabugosa (na época, IV vice-rei), realiza viagem de inspeção para
conhecer cidades, vilas e freguesias. Chegando a Maragogipe, em fevereiro de 1724, os
habitantes pediram que a freguesia do São Bartolomeu do Maragogipe fosse elevada à categoria
de vila. O conde acolheu o pedido e publicou portaria em 16 de fevereiro de 1724. A vila foi
instalada pelo Ouvidor Geral Pedro Gonçalves Pereira, no dia 22 de fevereiro de 1724. Os
Maragogipanos em agradecimento pelo gesto, doaram ao Conde de Sabugos 2000 alqueires
(equivalente a 2000 bolsas ou cestas de carga de animal) de farinha de primeira qualidade, para
o sustento da tropa. Como era período de grave estiagem, a dádiva foi recebida com apreço.
Conforme Carta do Conselho Ultramarino, datada de 12 de dezembro de 1732, e Provisão
Real datada de 17 de junho de 1733, o rei de Portugal, D. José I, adquiriu a capitania de Paroaçu
(Paraguaçu), das mãos do donatário D. José da Costa, pelo valor de pagando 640S000, passando
a capitania a pertencer à Coroa Portuguesa. (IBGE, 2014)
Os movimentos pela independência do Brasil tiveram no Recôncavo Baiano certo grau de
pioneirismo, sendo registrado os primeiros levantes e revoltas contra a opressão lusitana
instalada na colônia. Maragogipe deu importantes contribuições para a libertação do Brasil.
110
Em conjunto com outras vilas do Recôncavo e do Sertão, Maragogipe participou da Junta
Conciliatória liderada por Cachoeira, o evento contou com a presença de um ‘ilustre’
maragogipano, o Conselheiro Imperial Antônio Rebouças. “Além da participação na Junta, os
maragogipanos fizeram parte do IV Regimento Milícias da Bahia, ajudando a expulsar as
canhoneiras portuguesas fundeadas no Rio Paraguaçu.”. Em virtude dos feitos para a
consolidação da Independência do Brasil, a vila de Maragogipe torna-se cidade, pela Ordem
Provincial nº 389, de 8 de maio de 1850, recebendo o título honorífico de ‘Cidade Patriótica’.
(IPAC, 2010a, p. 18)
Após ser convertida de vila a cidade, Maragogipe passa por organização política-territorial
com a publicação da Lei provincial nº 2.179, de 20 de Junho de 1881, divide o município em
quatro distritos: Maragogipe (distrito sede), Nagé, Santo Antônio de Capanema, São Roque do
Paraguaçu. Em 1926, o município passa a apresentar seis distritos: Maragogipe, Nagé,
Coqueiros, Caveiras, Santo Antônio de Capanema, e São Roque do Paraguaçu. O distrito de
Coqueiros foi criado pela Lei estadual nº 1.922, de 13 de agosto de 1926, e pelo decreto estadual
nº 8.311, de 15 de fevereiro de 1933. (IBGE, 2014)
Através do Decreto Estadual nº 11.089, de 30 de novembro de 1938, ocorrem modificações
de nomes, o distrito de Santo Antônio de Capanema passa a se chamar Capanema, Caveiras,
Guapira; e Capanema muda para Guaí. Essas mudanças de nomes foram observadas no quadro
da divisão territorial de 1944. (IBGE, 2014)
De acordo com a Lei nº 628 de 30 de dezembro de 1953, atualmente o município de
Maragogipe apresenta divisão administrativa e territorial com seis distritos: Maragogipe
(distrito sede), Coqueiros, Guaí, Guapira, Nagé e São Roque do Paraguaçu. (IBGE, 2014)
3.8.1 CARACTERÍSTICAS SOCIOECONÔMICAS DE MARAGOGIPE
O desenvolvimento socioeconômico de Maragogipe foi marcado pelos ciclos econômicos
que abrangeram o Recôncavo e o Brasil. Um processo que teve início no século XVI, através
da extração do pau-brasil, do cultivo da mandioca e da cana-de-açúcar, e com a implantação da
infraestrutura comercial através da construção de casas para processar a mandioca e transformála em farinha (casa de farinha), engenhos para produção de açúcar, além da formação de uma
incipiente estrutura naval. Esse processo de desenvolvimento socioeconômico transcorreu com
certa estabilidade até o século XIX, e utilizou o trabalho compulsório de escravos.
111
No final do século XIX, Maragogipe passa pelo primeiro período de decadência
econômica. Com uma sociedade marcada por traços senhoriais e modo de produção
escravagista, a atividade açucareira entra em declínio. O fim do trabalho escravo, aliado ao
transporte mercantil através de linhas de ferro, deslocaram os centros de desenvolvimento para
São Félix e de Nazaré, municípios que possuíam ramais de estrada de ferro. Com a crise, “as
relações comerciais de Maragogipe se restringiram ao Município de São Felipe; a comunicação
com Cachoeira e Salvador, com uso de barcos a vela e por uma unidade da Companhia Baiana
de Navegação, que não possuía a mesma agilidade dos trens de ferro.”. (IPAC, 2010a, p. 18)
No início do século XX, um novo ciclo econômico baseado na indústria fumageira começa.
No Recôncavo estavam os principais centros fabris, com indústrias de charutos espalhadas
pelos municípios de Cachoeira, 14; São Félix, 10; Maragogipe, 5; Muritiba, 6; e Salvador, com
as fábricas de tabaco Havana, Pacheco & Cia., Victória, Modelo e Liberdade. “As três grandes
fábricas de charutos, Suerdieck, Dannemann e Costa Penna, chegaram a ter dez mil
empregados, espalhados nos municípios de Cachoeira, São Félix, Maragogipe, Cruz das Almas
e Muritiba, atingindo produção anual de duzentos milhões de charutos, sendo 30% desse total
exportados para a Europa e os Estados Unidos.”. (IPAC, 2010a, p. 21)
No município de Maragogipe, filiais das fábricas de charutos Dannemann e Suerdieck são
inauguradas, impulsionando a economia local. Em 1905, a Suerdieck inaugura a primeira
fábrica de charutos com cinco trabalhadores; em 1909 passava a contar com 200; e em 1915,
eram contabilizados cerca de 700 trabalhadores. As características históricas que contribuíram
para o desenvolvimento do município foram fatores positivos para o desenvolvimento industrial
do setor, com excelentes charuteiras, rio navegável com porto natural – o que facilitava o
escoamento da produção para Salvador, e de lá para o exterior. (IPAC, 2010a)
Em 1920, com o fim da I Guerra Mundial, a fábrica é ampliada para atender a demanda
internacional. O engenheiro Emílio Odebrecht, pioneiro na construção de cimento armado nas
cidades de Recife e Salvador, projetou uma passarela de concreto interligando as fábricas,
antiga e nova, separadas pela Rua das Flores. Em 1950 a Suerdieck incorpora as empresas
concorrentes Costa Penna e Dannemann, e passa a ter o monopólio do ramo charuteiro. Em
1955 atinge ápice da produção, com a fabricação manual de 180 milhões de charutos por ano.
Nesse período eram empregados 2.052 funcionários em Maragogipe. (IPAC, 2010a)
A Suerdieck empregava 4.128 pessoas no conjunto das empresas, que trabalhavam nas
fábricas de Maragogipe, Cachoeira e Cruz das Almas; e nos depósitos de fumo em São Félix,
112
Santo Antônio de Jesus, São Gonçalo dos Campos, Castro Alves, Conceição do Jacuípe e
Salvador. Em 1956, ao completar 50 anos de fundação, a empresa inaugura o Edifício Gerard
Meyer Suerdieck, no bairro do Comércio em Salvador. O prédio possuía 4.651 metros
quadrados de área construída, dispondo de câmara frigorífica no subsolo para estocagem de
charutos. Embelezando a construção, um painel do artista plástico Caribé. (IPAC, 2010a)
Com o monopólio a empresa passou por uma fase de expansão, 15 empresas formava o
Grupo Suerdieck. Elas estavam distribuídas pelos Estados da Bahia, Rio de janeiro, Santa
Catarina e Rio Grande do Sul e no âmbito internacional, na Alemanha. O grupo econômico
dominou 85% do mercado interno de charutos, e os produtos contribuíram com a formação de
reservas nacionais obtidas através do setor agroexportador, concomitantemente ocorreu
divulgação do nome da Bahia e do Brasil para diversas partes do mundo, em uma época que
pouco se falava do país no exterior. (IPAC, 2010a)
Com a ditadura militar instalada no país, a partir de 1964, e as inversões de capital nacional
para o pagamento do serviço da dívida externa, a inflação passou a ser um componente
desestabilizador das empresas. Em 1968, com 63 anos de operação, a Suerdieck enfrenta a
primeira crise financeira, em decorrência do descompasso entre a produção e o retorno da taxa
de mais-valia. “Com a inflação em alta, o fumo sendo comprado à vista e o charuto vendido a
prazo, a empresa ficou sem capital de giro e a saída foi recorrer a um empréstimo do governo.
Com o atraso do financiamento a crise se avolumou.”. A crise da empresa afeta a vida da
comunidade, e a administração municipal, na época, 30% da arrecadação de tributos vinham da
Suerdieck. Com a crise, o controle acionário foi transferido para o grupo Melitta, empresa
multinacional com sede na Alemanha. (IPAC, 2010a, p. 25)
Em 1986 é retomado o controle da empresa por Gisela Huck Suerdieck, que cria a Agro
Comercial Fumageira. Mas, em 1992, a fábrica de Maragogipe encerra as operações, sendo
transferida para Cruz das Almas. O novo sistema de transporte rodoviário apresentava
vantagens competitivas para os capitalistas, e Cruz das Almas está localizada às margens de
uma das rodovias federais mais importantes do país, a BR-101. O fechamento da fábrica de
Maragogipe resultou no desaparecimento do maior parque charuteiro da América do Sul,
provocando declínio na economia da região. Com significativa parcela da população servindo
de mão de obra para o setor, a crise atingiu intensamente a vida da comunidade em decorrência
do desempregado, o que deu início a novo período de decadência econômica e social. (IPAC,
2010a)
113
A crise da indústria fumageira levou à redução da população urbana do município,
resultando no êxodo populacional da sede para zona rural. Parte da população migrou para
zonas pesqueiras, e para o distrito de São Roque do Paraguaçu, que em decorrência da
localização, possibilitava a participação da comunidade na pesca e na maricultura. Ao mesmo
tempo em que a crise atingia a indústria fumageira, a partir da década de 1970, Maragogipe
passou a abrir um complexo industrial da cadeia de valor P&G, na sede do distrito de São Roque
do Paraguaçu, dando início a expansão do capital petrolífero no município. (IPAC, 2010a, p.
19)
Em 1976, a PETOBRAS construiu o Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu
(COSRP), na sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, município de Maragogipe. O
Canteiro possuí área de 400 mil metros quadrados, sendo dotado de estrutura administrativa e
industrial, com setores de pré-montagem e montagem de plataformas; oficinas de estocagem,
montagem de estacas, e pinturas. Também foram construídas duas vilas, a Vila BR, composta
de moradias com estrutura condominial, sendo destinada a direção, gerência e corpo técnico,
ela tem capacidade de hospedar 200 trabalhadores. A segunda estrutura é a Vila de
Alojamentos, possuí 45 mil metros quadrados e tem capacidade para hospedar 1000. Ambas
estruturas possuem áreas de lazer, área verde, e espaço destinado a treinamento de pessoal.
(PETROBRAS – Indústria Naval, 2009)
Em 8 de agosto de 2008, o Consórcio Rio Paraguaçu (CRP) recebe registro da Receita
Federal, com CNPJ de nº 10.277.281/0001-88. A empresa foi constituída através da união dos
grupos nacionais Construtora Norberto Odebrecht S/A, Construtora Queiroz Galvão S/A e UTC
Engenharia S/A. Um mês após a formalização, em setembro de 2008, o consórcio é contratado
pela Petrobras Netherlands B.V. para a execução de serviços de engenharia, suprimentos e
construção das plataformas de perfuração auto-elevatórias P59 e P60. O valor do contrato foi
de US$ 712,5 milhões.46
3.8.2 OS IMPACTOS DO CAPITAL PETROLÍFERO NOS INDICADORES DE GINI E
IDHM DE MARAGOGIPE
Em 2010, o município de Maragogipe apresentava os seguintes dados demográficos,
segundo o IBGE (2010): 42.815 habitantes, renda per capita de R$ 300,10, IDHM de 0,621,
Gini de 0,57. Segundo o Atlas Brasil (2013) “Maragogipe ocupa a 3680ª posição, em relação
46
Ver Capítulo II – PROMINP – a organização da cadeia de valor e o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, p. 104.
114
aos 5.565 municípios do Brasil, sendo que 3.679 (66,11%) municípios estão em situação melhor
e 1.886 (33,89%) municípios estão em situação igual ou pior. Em relação aos 417 outros
municípios de Bahia, Maragogipe ocupa a 84ª posição, sendo que 83 (19,90%) municípios estão
em situação melhor e 334 (80,10%) municípios estão em situação pior ou igual.”. 63% da
população com 18 anos ou mais é economicamente ativa, e 37% está enquadrada em
economicamente não ativa. Um dos componentes em que os indicadores apontam intensas
discrepâncias entre Maragogipe e o Brasil é no campo da educação. Como observado no gráfico
a seguir:
Representação gráfica da taxa de analfabetismo
Taxa de analfabetismo - 25 a 29 anos (2010)
Taxa de analfabetismo - 25 anos ou mais (2010)
Taxa de analfabetismo - 18 a 24 anos (2010)
Taxa de analfabetismo - 18 anos ou mais (2010)
Taxa de analfabetismo - 15 a 17 anos (2010)
Taxa de analfabetismo - 15 anos ou mais (2010)
Taxa de analfabetismo - 11 a 14 anos (2010)
0
5
Maragogipe (BA)
10
15
20
25
30
Brasil
Gráfico 2 – Comparativo com indicadores de analfabetismo de Maragogipe e do Brasil.
Fonte: Atlas Brasil (2013)
Analisando os dados do Gráfico 2 o que se observa é que, com relação ao Brasil,
Maragogipe apresenta elevados índices de analfabetismo em todas as faixas etárias. Na média
dos indicadores de analfabetismo apresentados nas várias faixas etárias, o Brasil aparece com
6,23% de analfabetos; enquanto Maragogipe apresenta 15,17% de analfabetos. Na população
com faixa etária de 25 a 29 anos, 3,96% da população do Brasil é classificada como analfabeta;
enquanto em Maragogipe o percentual é de 11,46% da população.
Outro dado a ser analisado é com relação aos padrões de concentração de riqueza do
município, observando a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Foi
utilizado como instrumento de aferição o Gini, que numericamente varia de 0 a 1, sendo que 0
representa a situação de total igualdade, ou seja, todos têm a mesma renda, e o valor 1 significa
115
completa desigualdade de renda, ou seja, se uma só pessoa detém toda a renda do lugar. A
seguir são apresentados os dados do Atlas Brasil (2013) com os indicadores de Gini:
Maragogipe
0,58
0,57
0,56
0,55
0,54
0,53
0,52
0,51
Índice de Gini (1991)
Índice de Gini (2000)
Índice de Gini (2010)
Gráfico 3 – Indicadores de GINI de Maragogipe compreendendo o período de 1991, 2000 e 2010.
Fonte: Atlas Brasil (2013)
Analisando o Gráfico 3, observa-se que o GINI de Maragogipe apresenta variação de
apenas 0,01 pontos positivos no intervalo de 20 anos. Ou seja, a comunidade mante-se
estagnada do ponto de vista da concentração de renda, passando por um período de queda na
concentração de renda em 2000, de 0,03 pontos, em relação ao ano de 1991. Na década seguinte,
em 2010, a concentração de renda volta a subir, e atinge o patamar de duas décadas antes, com
aumento de 0,04 em relação a 2000. Conclui-se que a expansão do capital petrolífero, na região,
teve influência pouco significativa no padrão de vida da comunidade de Maragogipe, e que ela
tem se traduzido em um aumento dos níveis de concentração de renda na população.
A história do munícipio de Maragogipe remete à segunda década do descobrimento do
Brasil. A imagem a seguir apresenta vista aérea da sede do município, sendo registrada na
segunda década do século XXI:
116
Figura 11 – Vista aérea da sede do município de Maragogipe.
Fonte: Produção Própria (2012).
Na imagem aérea (Figura 12), observa-se que a maior parte das habitações da sede do
município Maragogipe foi edificada em torno do mangue, quase ao nível do Rio Paraguaçu. No
centro da imagem, está localizada a Igreja de São Bartolomeu. Segundo Edilece Souza Couto
e Fernanda Reis dos Santos (2013) a construção da paróquia de São Bartolomeu teve início no
século XVII (1640). Também apontam que os festejos em homenagem a São Bartolomeu
ocorrem anualmente, no mês de agosto, e que a manifestação religiosa é a mais celebrada pela
comunidade de Maragogipe. “É um dos momentos em que os sujeitos negociam conflitos,
constroem alianças, identidades e estratégias, bem como um domínio privilegiado para a
sociedade se manifestar enquanto uma coletividade diferenciada que transmite e reproduz
valores, atualiza estruturas de autoridade, num jogo de múltiplas legitimações.
3.8.3 CARACTERÍSTICAS HISTÓRICAS E SOCIOECONÔMICAS DE SÃO ROQUE DO
PARAGUAÇU
São Roque dos Paraguaçu é um dos seis distritos que compõem o município de
Maragogipe. Em 20 de junho de 1881, a Lei Provincial nº 2.179, confirmada pelo Decreto
117
Estadual nº 8.311, de 15 de fevereiro de 1933, estabelece o território como distrito do município
de Maragogipe. São Roque do Paraguaçu47, possuí 6.079 habitantes, sendo o terceiro distrito
mais populoso de Maragogipe. O primeiro é a sede do município, com 16.943; o segundo
distrito mais populoso é Guapira, com 9.363 habitantes. (IBGE, 2014)
A tabela a seguir apresenta os dados demográficos do município de Maragogipe, com a
distribuição por distrito, domicílio e sexo:
DADOS DEMOGRÁFICO DE MARAGOGIPE
População residente por situação do domicílio e sexo
Situação do domicílio
Total
Município, distrito
sede e distritos
Urbana
Sexo
Total
Sexo
Sexo
Total
Homens Mulheres
Maragogipe
Rural
Total
Homens
Mulheres
Homens
Mulheres
42 815
21 516
21 299
25 093
12 209
12 884
17 722
9 307
8 415
Coqueiros
3 811
1 907
1 904
1 877
916
961
1 934
991
943
Guaí
3 358
1 736
1 622
808
413
395
2 550
1 323
1 227
Guapira
9 363
5 009
4 354
138
ados
70 hados9 225 ocasional
4 941
4 284
16 943
8 113
8 830
14 833
7 045
7 788
2 110
1 068
1 042
3 261
1 674
1 587
2 398
1 228
1 170
863
446
417
6 079
3 077
3 002
5 039
2 539
2 500
1 040
538
502
Maragogipe
(distrito sede)
Nagé
São Roque
Paraguaçu
do
Domicílios recenseados
Total
Total
Particulares
Ocup
68
Totalocupados
Não
Fec
Uso
Vago
s
Tabela 7 – Dados demográfico referente ao município de Maragogipe e distritos.
Fonte: IBGE (2014).
Analisando a Tabela 7, observa-se que a maior parte da população do distrito de São Roque
do Paraguaçu, 5.039 habitantes, residem na sede do distrito. Posicionando a sede do distrito
como sendo o segundo maior adensamento populacional urbano de Maragogipe. (IBGE, 2014)
Não existem dados consistentes o suficiente para determinar qual a principal fonte de renda,
ou de que maneira a renda da comunidade de São Roque do Paraguaçu é distribuída 48. Mas,
pesquisa de campo aponta que a economia de subsistência, baseada no extrativismo natural é
um forte componente na composição da renda familiar da comunidade. Observa-se que parte
da população alterna as atividades de pesca e mariscagem por contratos temporários de trabalho,
47
O Decreto Estadual nº 11089, de 30 de novembro de 1938, determinou a mudança do nome de São Roque do Paraguassu
para São Roque. Em 31 de dezembro de 1943, o Decreto Estadual nº 141 modificou o nome para São Roque do Paraguaçu,
permanecendo o mesmo nome até os dias atuais. (IBGE, 2014)
48 Os dados levantados através do Censo 2010 pelo IBGE, sobre os componentes de renda, separados por cada distrito de
Maragogipe, não estavam disponíveis até fevereiro de 2014.
118
celebrados com empresas que prestam serviços à PETROBRAS, no Canteiro de Obras de São
Roque do Paraguaçu (COSRP). Com o início das operações do Consórcio Rio Paraguaçu, sendo
sucedido pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA), parte da população também foi
absorvida como trabalhadores destas empresas.
A imagem a seguir apresenta o território do distrito de São Roque do Paraguaçu:
Figura 12 – Vista aérea do território do distrito de São Roque do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2012).
A imagem aérea (Figura 13) apresenta parte do distrito de São Roque do Paraguaçu e o
ponto de encontro da Baía do Iguape com a Baía de Todos os Santos. A região é estratégica do
ponto de vista naval, em decorrência de se encontrar em uma baía abrigada, com águas
relativamente profundas. Estes elementos foram fatores que levaram os capitalistas a escolher
o local para implantar o empreendimento. (EIA/RIMA, 2009)
O centro urbano da sede do distrito é composto pela praça da Vitória e pela Igreja de São
Roque do Iguape. O comércio é formado por pequenos estabelecimentos que respondem pelos
serviços de alimentação – com duas padarias, bares, restaurantes, e mercados; hospedagem –
através de pequenas pousadas; e duas lojas de material de construção. Na praça da Vitória
ocorre uma feira de confecções, com objetivo de atender os moradores e os trabalhadores dos
119
estaleiros. Uma parcela da população é empregada nestas atividades comercias. (EIA/RIMA,
2009)
O traçado da localidade, arruamento e edificações, denotam padrão desordenado de
ocupação, com significativo número de moradias subnormais, e recorrência de ocupações de
mangue por edificações dos moradores da comunidade, conforme observa-se nas imagens a
seguir:
Figura 13 – Vista aérea da sede do distrito de São Roque do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2013)
No centro da imagem aérea (Figura 14) é perceptível a praça da Vitória e a Igreja de São
Roque do Iguape. Também fica evidente o traçado irregular das ruas da sede do distrito, sendo
que algumas ruas são de terra e não apresentam pavimento. Outra característica urbana, com
relação as edificações, é que foram erguidas sem espaços intermediários, ou seja, umas
excessivamente próximas das outras.
As imagens a seguir demonstram a ocupação do mangue pelos empreendimentos
capitalistas e por habitações:
120
Figura 14 – Imagem aérea da sede do distrito de São Roque e do povoado de Enseada do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2013)
Figura 15 – Habitações subnormais foram edificadas na zona de mangue de São Roque do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2013)
Observa-se na imagem aérea (Figura 15) que parte da zona de mangue de São Roque do
Paraguaçu foi soterrada pelos empreendimentos Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu
(COSRP) e Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA). A edificação dos empreendimentos
levou a supressão de zonas de mangue, no exato ponto em o rio Baetantã desagua na Baía do
121
Iguape. Também são responsáveis pela supressão de zona de mangue os próprios moradores da
comunidade ao erguerem edificações para moradia – conforme observa-se na segunda imagem
(Figura 16). Os habitantes destas localidades apresentam padrões socioeconômicos menos
desenvolvidos do que os que habitam o centro da sede do distrito. A ocupação irregular denota
falta de planejamento do município por parte da prefeitura, além da falta de apoio do Estado
através de política fundiária e de habitação. A construção do COSRP limitou o acesso da
população à Baía do Iguape. Outro aspecto, que se aduz da situação, é que ocorre falta ou
ineficiência na fiscalização por parte da Prefeitura Municipal de Maragogipe, Ministério
Público Estadual, Ministério Público Federal, IBAMA e Instituo Chico Mendes 49 (ICMBio),
contribuindo para o crescimento desordenado da sede do distrito e para ocupação irregular de
áreas de preservação ambiental.
A maior parte da população residente do distrito mora em habitações simples, com pé
direito baixo, edificadas uma ao lado da outra, sem espaço intermediário. Algumas habitações
apresentam
construção
mais
sofisticada,
evidenciando
uma
melhoria
de
padrão
socioeconômico. Por outro lado, foram identificadas novas construções de taipa às margens da
BR-420. Conforme observado na imagem a seguir:
49
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) é uma autarquia em regime especial. Criado
dia 28 de agosto de 2007, pela Lei 11.516, o ICMBio é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e integra o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (Sisnama). [...] Cabe ao Instituto executar as ações do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação, podendo propor, implantar, gerir, proteger, fiscalizar e monitorar as UCs instituídas pela União. [...] Cabe
a ele ainda fomentar e executar programas de pesquisa, proteção, preservação e conservação da biodiversidade e exercer
o poder de polícia ambiental para a proteção das Unidades de Conservação federais. (INSTITUTO CHICO MENDES,
2014)
122
Figura 16 – Construção de novas habitações de taipa ao lado BR-420.
Fonte: Produção própria (2014)
A Figura 17 apresenta uma casa de taipa construída em 2013. Durante a pesquisa de campo
foi constatado que novas habitações em taipa (habitações subnormais) foram construídas ao
lado BR-420, nas proximidades da sede do distrito de São Roque do Paraguaçu. A situação
evidencia que a Política de Gestão Ambiental do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA) tem
falhado no sentido de conter a expansão demográfica e habitacional desordenada.
O EIA/RIMA (2009) relata a existência das habitações em taipa nas áreas periféricas:
As residências do núcleo assim como as vilas para funcionários do Canteiro são de
padrão médio, com garagens e uma média de quatro cômodos. Mas nas áreas
periféricas, à beira da estrada de acesso à sede ou até mesmo perto do centro da cidade,
existe um grande número de casas de baixo padrão, de taipa, de um único cômodo,
com cobertura de palha ou materiais improvisados, e piso de terra batida,
evidenciando uma pobreza acentuada que pouco se beneficia da presença de um
empreendimento de grande porte, como o desenvolvido pela Petrobras. Há uma
quantidade significativa de casas de veraneio no distrito que, em grande parte,
permanece fechada dando oportunidade a casos de arrombamento e furtos.
(EIA/RIMA, 2009, v. 5, p. 85)
Observa-se que os estudos do EIA/RIMA foram realizados em 2009, enquanto as visitas a
campo foram realizadas no período de 2010 a 2014. Elas indicam que a situação com relação a
organização espacial da sede do distrito apresenta, historicamente, sinais de pobreza. O quadro
123
é agravado com a construção de novas habitações subnormais. A pesquisa de campo identificou
a ocorrência de novas construções sem o devido ordenamento e sem obedecer a um código de
obras que contribua para o crescimento ordenado da sede do distrito. O quadro evidência grave
falha nas políticas ambientais delineadas pelo Estado.
3.8.4 AS ASSOCIAÇÕES E A COMUNIDADE REMANESCENTE QUILOMBOLA EM SÃO
ROQUE DO PARAGUAÇU
Segundo o EIA/RIMA (2009, v. 5, p. 85-86), na sede do distrito de São Roque Paraguaçu,
e Enseada do Paraguaçu funcionam diversas organizações da sociedade civil, a exemplo da
Pastoral da Criança, Associação das Marisqueiras e Pescadores de São Roque do Paraguaçu,
Sociedade dos Amigos de São Roque do Paraguaçu, Centro Comunitário Paraguaçu; Delegacia
Sindical de Construção e Obras de Terraplanagem (SINTEPAV/BA); Comunidade Beneficente
Paroquial de São Roque COBEPA; Conselho de Direitos da Criança e Adolescente, Conselho
Municipal de Assistência Social e o Conselho Municipal de Saúde, com representantes de São
Roque. A comunidade também conta com um significativo número de lideranças e membros
no conselho da RESEX Baía do Iguape.
Além desta estrutura associativa, o parecer da Fundação Cultural Palmares de Nº
11/DPA/FCP/MinC/2010 emitido em 19 de março de 2010, reconhece a Comunidade
Quilombola Enseada do Paraguaçu (Cadastro Geral nº 5, Registro 462). A comunidade está
localizada ao lado da sede do distrito, no povoado de Enseada do Paraguaçu. Ela conta com 400
famílias remanescente de quilombola. Sobre a comunidade, o EIA/RIMA (2009) explica que:
Enseada do Paraguaçu é o maior remanescente quilombolas localizado na área de
estudo com aproximadamente 400 famílias, tendo a pesca e a agricultura familiar
como principal atividade econômica do local. Porém, não diferente das outras
comunidades, existem grandes conflitos fundiários decorrente da resistência dos
donos da terra por não reconhecerem aquele espaço como área remanescente de
quilombola. Segundo informações obtidas em visita ao local, três proprietários,
herdeiros do antigo dono da fazenda, dividem os interesses pela posse da terra e vêm
cobrando arrendamento às famílias há anos. (EIA/RIMA, 2009, v. 5, p. 131)
O que se observa é que o EEPSA se instala ao lado de uma comunidade tradicional, cujo
direito a terra ainda não é reconhecido pelo Estado. Não obstante, o Estado tenha desapropriado
parte do território situado ao lado do povoado de Enseada, e regularizado a posse e propriedade
da terra em favor dos capitalistas, não fez o mesmo em favor da população tradicional
remanescente de quilombola. “Três proprietários, herdeiros do antigo dono da fazenda, dividem
124
os interesses pela posse da terra e vêm cobrando arrendamento às famílias há anos.”.
(EIA/RIMA, 2009, v. 5, p. 131)
Nas imagens a seguir são visualizadas a comunidade de Enseada do Paraguaçu e a
edificação do EEPSA:
Figura 17 – Comunidade de Enseada do Paraguaçu e as obras do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2013)
125
Figura 18 – Povoado de Enseada do Paraguaçu é formado por remanescentes quilombolas.
Fonte: Produção própria (2013)
Figura 19 – Remanescentes quilombola de Enseada do Paraguaçu são afetados pela construção do
Estaleiro.
Fonte: Produção própria (2013)
126
As imagens aéreas (Figuras 18, 19 e 20) evidenciam a proximidade do empreendimento
com a comunidade de Enseada do Paraguaçu. No período em que a pesquisa foi realizada, o
acesso à comunidade ocorre através da rodovia BA-534, oriunda do município de Salinas da
Margarida. Segundo o EIA/RIMA (2009), a população de Enseada do Paraguaçu é formada por
um núcleo central, “onde está localizada uma Igreja Católica, e de uma orla com casas de
pescadores e de veraneio, de onde se pode avistar o estaleiro de São Roque do Paraguaçu, onde
trabalham alguns moradores da comunidade.”. O traçado da localidade, arruamento e casas
denotam um padrão desordenado de ocupação, com habitações subnormais. O povoado não
conta com saneamento básico e as vias de circulação internas e o acesso à rodovia estadual não
são pavimentadas.
A população da sede do povoado de Enseada do Paraguaçu conta com iluminação pública
e pontos de telefone público. As residências são servidas por rede de energia e a maior parte
delas possui antenas parabólicas para a recepção de sinal de TV. O EIA/RIMA (2009) destaca
que no período da pesquisa, em que foi elaborado o estudo, a população apresentou opinião
favorável a implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Algumas deficiências identificadas
na sede do distrito, com relação aos serviços prestados pelo Estado – saúde, educação e
segurança – também ocorrem na sede do povoado de Enseada.
Ao analisar o EIA/RIMA (2009), o parecer da Fundação Cultural Palmares (2010) observase a existência de outras 28 comunidades quilombolas nas áreas de Influência Direta (AID) e
Influência Indireta (AII), sendo que 12 comunidades possuem certificação emitida pela
instituição e outras 16 comunidades passam por processo de certificação. O parecer determina
que as 29 comunidades listadas sejam inclusas nos Programas Ambientais e no Programa de
Comunicação Social do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA).
Observa-se que apenas em um, dos três relatórios institucionais (2010 e 2013), referentes
as atividades do EEPSA, foram identificadas ações do Plano de Comunicação Social (PCS), as
ações citadas se restringem a formação de grupos de trabalho, como a capacitação dos
educomunicadores, evidenciando que os mesmos não foram contratados, e que o PCS não
atingiu os objetivos propostos no período em que a pesquisa foi realizada. A falta de
documentação comprobatória e o Relatório Institucional nº 4, de julho de 2013, emitido pelo
EEPSA, não indicam o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, do PCS e das condicionantes
expressas no parecer nº 11 da Fundação Cultural Palmares (2010). Ou seja, as atividades
concernentes ao Plano de Comunicação Social (PCS) não foram desenvolvidas junto às
127
comunidades do distrito de São Roque do Paraguaçu, do povoado de Enseada do Paraguaçu, e
nas outras 28 comunidades remanescentes quilombolas, listadas no parecer da Fundação
Cultural Palmares (2010). Conclui-se que a Medida Mitigadora nº 40 e o PCS não foi aplicado
junto as comunidades.
Colabora com esta conclusão as respostas ao questionário qualitativo, referente à pesquisa
de campo realizada na sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, em 11 de janeiro de 2014.
As respostas foram concedidas por Zelzira Ferreira Lima (76 anos), remanescente da
comunidade quilombola Buri. Segundo Zelzira, em 2009 ocorreu uma oficina em Cachoeira,
oportunidade em que participou dos três dias de curso. Ela destaca que os capitalistas se
comprometeram em auxiliar a comunidade da fazenda do Buri, mas, desde esta data nada mais
foi feito. Relatou também que há cerca de três meses cursos passaram a ser oferecidos pelo
Estaleiro. Zelzira afirmou que quando precisa se informar sobre o que ocorre no Estaleiro, ela
vai em busca de informações, explicando que “o pobre pede muito pouco e não leva nada”.
Zelzira lamentou o aumento da violência, declarando que episódios de violência eram
registrados no território.
3.8.5 O SISTEMA DE TRANSPORTE DE SÃO ROQUE DO PARAGUAÇU
Segundo o EIA/RIMA (2009) a sede do distrito conta com serviços de transporte coletivo
formado por ônibus e vans. Este serviço conecta a sede do distrito a cidade de Maragogipe,
Bom Despacho (Ilha de Itaparica), Nazaré e Salinas da Margarida. O acesso rodoviário à sede
do distrito pode ser realizado através das rodovias BR-420 e BR-534, estes dois sistemas viários
permitem a comunicação com a sede do município, e com as rodovias BA-001 e BR-242,
interligando a sede do distrito aos municípios de Salinas da Margarida e Nazaré das Farinhas.
No período em que foi realizada a pesquisa, o sistema viário apresentava graves
deficiências. O pavimento da BR-420 possuía buracos e ausência de pavimentação asfáltica em
vários trechos. O percurso com veículo automotor entre a sede do distrito e a sede do município
é estendido em cerca de uma hora, em decorrência da deficiência na pista de rolagem. Um dos
reflexos deste problema, relatado pela população de São Roque do Paraguaçu, é a dificuldade
em participar dos cursos promovidos pelo Governo do Estado, cujo objetivo é capacitar e inserir
os trabalhadores no Estaleiro. Em decorrência dos mesmos serem ministrados na sede do
município.
128
Na imagem a seguir é evidenciando o Estado crítico em que se encontra a BR-420:
Figura 20 – Rodovia BR-420, trecho Maragogipe – São Roque do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2013)
A Figura 21 apresenta trecho da rodovia BR-420 sem pavimento asfáltico e com inúmeros
buracos. O Estado de deterioração da rodovia é recorrente em vários trechos, ocasionando o
aumento do tempo de deslocamento das populações da região e o aumento da possibilidade de
acidentes.
No mapa a seguir, é visualizado com destaque (em amarelo) o sistema viário que interliga
São Roque do Paraguaçu a outras localidades:
129
Figura 21 – Mapa com as ligações rodoviárias de São Roque do Paraguaçu.
Fonte: Google Mapa (2014)
Observa-se no mapa (Figura 22) que embora existam traçados rodoviários, a deficiência no
pavimento e conservação do sistema são fatores que dificultam a integração da comunidade de
São Roque do Paraguaçu, criando empecilhos para que a comunidade tenha acesso aos serviços
prestados pelo Estado, além de dificultar as relações de trocas entre as comunidades.
Além do sistema rodoviário, outra forma de deslocamento da população é através da baía
do Iguape. Durante o processo de construção do Estaleiro Enseada do Paraguaçu os moradores
da sede do distrito e da sede do município utilizam a via aquática para chegar ao canteiro de
obras do EEPSA. O sistema de transporte aquático para quem trabalha no estaleiro funciona
com regularidade, mas a população fica dependente de serviços realizados por autônomos, para
realizar o deslocamento para outras comunidades, o que traz certa instabilidade ao fluxo de
transporte.
130
3.9 A DÍVIDA HISTÓRICA DO ESTADO COM OS POVOS TRADICIONAIS DA BAÍA
DE TODOS OS SANTOS
A pesquisa indica que ocorre uma ligação histórica entre as comunidades que habitam o
Recôncavo da Bahia, e as fases de desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Contribuem com
este debate os estudos de Alfredo Matta (2013), Boris Fausto (1996), João Capistrano de Abreu
(2013), Mary del Priore e Renato Venancio (2010), e Karl Marx (2004). Os estudos
apresentados revelam o processo histórico de formação destas comunidades e as contribuições
no desenvolvimento do capitalismo no Brasil, sendo iniciado com o processo de acumulação
primitiva através do trabalho escravo, avançando para a fase mercantil da sociedade senhorial,
percorrendo as etapas iniciais da industrialização do país com a implantação da indústria do
açúcar e fumo, avançando com a instalação dos sistemas industrial contemporâneos baseados
no capital petrolífero.
Estas contribuições históricas ao desenvolvimento do capital no Brasil, dentro do contexto
capitalista, não transformaram as comunidades do Recôncavo da Bahia em comunidades ricas,
prósperas e socialmente evoluídas. O capitalismo que se desenvolve na região, apontam os
dados levantados na pesquisa, mantêm elevadas taxas de mais-valia, com indicadores de IDHM
e GINI em níveis incompatíveis, aos indicadores de IDH e GINI apresentados no país. Para
citar apenas um dos dados apresentados nesta pesquisa, a partir Atlas Brasil (2013), tomando
como base comparativa os dados levantados em 2010, observa-se que em Maragogipe o IDHM
é de 0,621; o GINI é de 0,57; e a renda precipita é de R$ 300,10. Enquanto no Brasil, o IDH é
de 0,727; o GINI é de 0,53; e a renda precipita é de R$ 793,87. Observando que a história da
comunidade remete a segunda década do descobrimento do Brasil, e que ela contribuiu e
contribui com importante papel no desenvolvimento capitalista do país, conclui-se que a
expansão do capitalista ocorre no sentido de expropriar a comunidade da riqueza gerada. O que
explica o baixo padrão socioeconômico identificado em Maragogipe e nas áreas de influência
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu – compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da
Margarida, Saubara; Cachoeira, São Félix e Itaparica.
131
3.10 SOCIEDADE SENHORIAL E DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA
Neste capítulo foi observado como o processo de colonização e exploração de
trabalhadores através modo de produção escravagista explicam características remanescentes
da sociedade senhorial identificadas na comunidade de São Roque do Paraguaçu. Persistindo
na sociedade brasileira, com recorte no Recôncavo da Bahia, situações análogas ao
escravagismo, exploração mercantil, agronegócio ancorado em extensivas monoculturas,
exploração e subordinação do povo, latifúndio, extrativismo com degradação ambiental,
desenvolvimento das cidades e vilas sem o devido planejamento, dominação cristã, dominação
cultural pela língua portuguesa, características identificadas em São Roque do Paraguaçu.
Foi identificado que o processo de miscigenação entre portugueses e índios foi a primeira
formação do que viria a ser o povo brasileiro. Na região do Recôncavo da Bahia esta relação
sedimentou populações ligadas ao modo de produção extrativista, a exemplo do modo de vida
da comunidade de São Roque do Paraguaçu. Também contribui com a manutenção do modo de
vida extrativista, a forma como foi realizado o fim do escravagismo. Sem que ocorresse
processo de reforma agrária, os negros libertos passaram a ocupar áreas com pouca valorização,
mantendo um modo de vida extrativista.
Foi relatado que o processo de colonização foi determinante para a criação de extensivos
latifúndios, o que impediu uma diversificação da economia, ao mesmo tempo em que manteve
os traços senhoriais e o controle da produção nas mãos de poucos capitalistas. Observou-se que
a propriedade dos meios de produção no Recôncavo baiano do Brasil Colônia tem repercussões
sobre o modo de vida contemporâneo dos povos que nessa região permaneceram.
Foi discorrido que o Recôncavo da Bahia participou ativamente do processo de
desenvolvimento capitalista do Brasil, desde o processo extrativista baseado na extração do
pau-brasil; passando pela monocultura agrícola; sendo atingida pelos ciclos industriais,
primeiro com base na indústria do fumo, e depois com a implantação da indústria petrolífera.
Através das análises do Gini e IDHM foi observado que o processo de desenvolvimento
capitalista no Recôncavo baiano não foi transformado em ganhos sociais efetivos.
Também foi observado que a expansão capitalista da cadeia de valor do P&G, atinge
diretamente os moradores do município de Maragogipe, em especial de São Roque do
Paraguaçu, através das implicações socioeconômicas dos empreendimentos Canteiro de Obras
e Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Observando os indicadores sociais de Maragogipe foi
132
inferido que estes empreendimentos não se transformaram elementos favoráveis para o
desenvolvimento social local, persistindo um processo de exclusão social e empobrecimentos
crescente.
O próximo capítulo aborda a expansão capitalista no Brasil, e a disputa entre modelos de
desenvolvimento. Sendo descrita e analisada a política pública para a cadeia de valor do
petróleo e gás, e de que maneira ela contribui para que empreendimentos como o Estaleiro
Enseada do Paraguaçu possam se desenvolver. A partir dos indicadores de Gini e Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) é analisado como os modelos econômicos adotados em
diferentes momentos históricos refletiram nos indicadores sociais. O capítulo também aborda a
dimensão ideológica da expansão capitalista e os reflexos na dominação ideológica da
sociedade.
133
4 A EXPANSÃO CAPITALISTA NO BRASIL:
A DISPUTA ENTRE MODELOS DE DESENVOLVIMENTO E O SETOR
DE PETRÓLEO E GÁS
As relações entre as diferentes nações dependem do
estágio de desenvolvimento em que cada uma delas se encontra,
no que concerne às forças produtivas, à divisão do trabalho e às
relações internas. Este princípio é universalmente reconhecido.
Entretanto, não só as relações entre uma nação e outra, mas
também toda a estrutura interna de cada nação, dependem do
nível de desenvolvimento de sua produção e de seus
intercâmbios internos e externos. Reconhece-se da maneira mais
patente o grau de desenvolvimento alcançado pelas forças
produtivas de uma nação pelo grau de desenvolvimento
alcançado pela divisão do trabalho. Na medida em que esta
divisão do trabalho não é mera extensão quantitativa das forças
produtivas já conhecidas anteriormente (o aproveitamento de
terras incultas, por exemplo), qualquer força produtiva nova traz
como consequência um novo aperfeiçoamento da divisão do
trabalho. (MARX, ENGELS, 2007, p. 11 e 12)
Este capítulo aborda o processo histórico de transição, no Brasil, do escravagismo, para o
modo de produção capitalista. Na sequência, é explicitado como o capitalismo se desenvolve
no país, sendo pontuado o modelo da economia política adotado em diferentes governos,
culminando com a transição do governo FHC, marcado pelo neoliberalismo; para o governo
Lula, com a heterodoxia keynesiana e alguns pressupostos do neoliberalismo.
Dando sequência ao capítulo, é discorrido como a influência do Estado na economia,
durante o governo Lula, conduziu a uma Política Pública para o desenvolvimento da cadeia de
valor do petróleo e gás (P&G), cuja aplicação conduziu a descoberta das reservas de
combustíveis fósseis no pré-sal, e de que maneira a perspectiva de exploração dos recursos
minerais ativou e reativou vários setores da economia, a exemplo da indústria naval.
É observando, nesse contexto, como a Política Pública foi utilizada para apoiar o
surgimento de empreendimentos industriais de significativo porte, a exemplo do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu S.A. (EEPSA), e utilizando-se de documentos é comprovada como a
Política Pública do P&G torna-se práxis, sendo adotada pelos capitalistas para criação do
empreendimento. Também é discorrido como uma ideologia dominada pelo ‘pensamento
único’ pressiona o Estado a diminuir a interferência no mercado e a adotar o neoliberalismo.
134
O capítulo é concluso com a apresentação dos indicadores, Gini e IDH, sendo analisadas
como as políticas dos governos FHC e Lula produziram resultados diferentes, e de que maneira
isto tem reflexo sobre os indicadores de desigualdade social e concentração de renda no país.
4.1 BRASIL, DA ACUMULAÇÃO PRIMITIVA AO CAPITALISMO
Karl Marx (2004, p.11) explica que a produção capitalista não pode ser realizada enquanto
não se encontram acumuladas nas mãos dos produtores-vendedores, como “massas
consideráveis de capitais e de forças operárias”. Esse movimento forma um círculo,
denominado de acumulação primitiva, sendo condição anterior à acumulação capitalista. A
acumulação primitiva serve de “ponto de partida à produção capitalista, em lugar de ser por ela
originada”.
Ocorre que no processo de desenvolvimento do capitalismo no Brasil, o ponto de partida
da acumulação primitiva surge no período colonial, com o escravagismo, que organizou a
produção em significativa massa de operários (os escravos), produzindo elevado volume de
capital (café e açúcar). Mary del Priore e Renato Venancio (2010), na obra ‘Uma breve história
do Brasil’, discorrem sobre as etapas históricas de formação da nação, sublinhando o fim do
escravagismo e da monarquia, com ingresso do país no modelo republicano. Sob o processo de
mudança na organização política e econômica, Marx e Engels (1848, p.12) explicam que “cada
passo no desenvolvimento da burguesia foi acompanhado por um avanço político
correspondente”. O fim do escravagismo representou um avanço, conduzindo através de longo
processo histórico, a mudança da elite agrária escravagista em burguesia.
Essa mudança de estágio econômico do país foi processando no campo da infraestrutura e
da superestrutura. A partir dos anos de 1870, observam Priore e Venancio (2010, p. 217) que,
“conforme expressão de um intelectual da época, no “bando das novas ideias” que chegaram
ao Brasil predominavam agora aquelas afinadas ao pensamento científico [...]. O positivismo
foi uma dessas correntes. Seus partidários previam o advento da “era positiva”, em que a
sociedade - a começar pela política - funcionaria e seria regulada e controlada de maneira
científica.”.
Na infraestrutura também ocorriam transformações, na década de 1880 começaram a ser
implantadas as primeiras indústrias no Brasil. Um século antes, a Europa começara o
desenvolvimento técnico e tecnológico de máquinas fabris. A importação destes equipamentos
135
marca o início do processo de industrialização do país, explicam Priore e Venancio (2010),
alertando que:
A aparente vantagem apresentava um gravíssimo inconveniente que deixa traços até
os nossos dias: ela não estimulou o desenvolvimento de tecnologia industrial própria,
muito necessária quando se quer construir máquinas que fazem máquinas ou
simplesmente ajustar a produtividade aos padrões internacionais. Dessa maneira,
fortes laços de dependência internacional foram gerados, seja pelo fato de as novas
técnicas serem caríssimas, seja por serem alvo de monopólios zelosamente protegidos
pelas grandes indústrias estrangeiras. (PRIORE, VENANCIO, 2010, p. 235-236)
O capital necessário à implantação e expansão da indústria no país, de 1880 a 1930,
originou-se da importação de máquinas modernas custeadas pelo mundo agrário tradicional,
isso levou o Estado de São Paulo a se tornar o principal polo industrial do país. Os motivos
deste fenômeno ocorrer em São Paulo, com maior intensidade, foi devido ao processo de
acumulação primitiva estar mais avançado no Estado. Como explicam Priore e Venancio
(2010):
Tal qual ocorria em vários lugares, os fazendeiros paulistas investiam os recursos
extras da lavoura de exportação na compra de máquinas. Muitos viam nesse
investimento uma forma de complementar as atividades agrícolas. Desse modo, não
era raro fazendeiros de algodão inaugurarem fábricas de fiação e tecelagem,
pecuaristas fundarem fabriquetas de couro e cafeicultores voltarem-se para a produção
de vagões e de máquinas que beneficiavam café. Havia ainda aqueles simplesmente
interessados em diversificar os investimentos, ampliando assim as fontes de renda
familiar; homens como Antônio da Silva Prado e Antônio Álvares Penteado que, entre
fins do século XIX e início do XX, foram prósperos fazendeiros de café e, ao mesmo
tempo, fundaram vidraria e fábrica de aniagem. (PRIORE, VENANCIO, 2010, p. 237)
Com o excedente de capital vindo da lavoura, os incipientes capitalistas industriais
paulistas investiram em setores que aumentavam a eficiência da produção, possibilitando
ofertar produtos em escala crescente e preços competitivos, mantendo elevada taxa de maisvalia, mas a mudança na infraestrutura não ficou confinada à indústria. Com a Proclamação da
República, em 15 de novembro de 1889, os anos seguintes foram marcados por profundas
mudanças no Brasil. Priore e Venancio (2010, p. 217) explicam que “tal qual na maior parte do
mundo ocidental, cidades, prisões, escolas e hospitais brasileiros passam por um processo de
mudança radical, em nome do controle e da aplicação de métodos científicos; crença que
também se relacionava com a certeza de que a humanidade teria entrado em uma nova etapa de
desenvolvimento material marcada pelo progresso ilimitado.”. Estes pressupostos ensejam as
características de uma sociedade capitalista, Marx e Engels (1848) expressam que:
A burguesia não pode existir sem revolucionar, constantemente, os instrumentos de
produção e, desse modo, as relações de produção e, com elas, todas as relações da
sociedade. [...] A revolução constante da produção, os distúrbios ininterruptos de todas
as condições sociais, as incertezas e agitações permanentes distinguiram a época
burguesa de todas as anteriores. Todas as relações firmes, sólidas, com sua série de
136
preconceitos e opiniões antigas e veneráveis foram varridas, todas as novas tornaramse antiquadas antes que pudessem ossificar. Tudo o que é sólido desmancha-se no ar,
tudo o que é sagrado é profanado, e os homens são por fim compelidos a enfrentar de
modo sensato suas condições reais de vida e suas relações com seus semelhantes.
(MARX, ENGELS, 1848, p. 14)
Marx e Engels (1848) classificam como características do modo de produção capitalista os
distúrbios, incertezas e agitações decorrentes da revolução constante da produção. O ingresso
do Brasil no modo de produção capitalista também foi marcado por essas crises, e estes
pressupostos marcaram o início da República. Priore e Venancio (2010, p. 220) pontuam que o
país “conviveu com crises econômicas, marcadas por inflação, desemprego e superprodução de
café.”. Marx e Engels (1848, p. 16) compreendem que “nestas crises, surge uma epidemia que,
em todas as épocas antigas, teria parecido absurda: a epidemia da superprodução.”.
Aliado a estes elementos, Priore e Venancio (2010, p. 220) chamam a atenção que fatores
como “concentração de terras e à ausência de um sistema escolar abrangente, fez com que a
maioria dos escravos recém-libertos passasse a viver em Estado de quase completo abandono.
Além dos sofrimentos da pobreza, tiveram de enfrentar uma série de preconceitos cristalizados
em instituições e leis, feitas para estigmatizá-los como subcidadãos, elementos sem direito a
voz na sociedade brasileira.”.
A concentração de terras e a ineficiência da educação marcam até a atualidade o processo
desenvolvimento capitalista no país, criando graves empecilhos para que o Brasil torne-se uma
economia de mercado com ampla classe proletária, mantendo elevado índice de
subproletariado50, com significativa concentração de riqueza e elevados índices de desigualdade
social.
O processo de transição do Império para a República também foi marcado por influências
socialistas. Priore e Venancio (2010, p. 228-233) lembram que nessa época “começam a surgir
os primeiros defensores de projetos socialistas, organizando partidos, sindicatos e jornais”, e
que a existência da “exploração desenfreada de homens, mulheres e crianças, que por vezes
tinham de suportar jornadas de trabalho superiores a doze horas, multiplicava os casos de
rebeldia individual e, principalmente, de comportamentos autodestrutivos entre os operários.
[...] Perante os riscos da miséria, a grande maioria dos trabalhadores reagia criando associações
mutualistas”.
50
Em 1981, Paul Singer percebeu que a sobrepopulação trabalhadora superempobrecida permanente constituía, na
realidade, fração de classe, à qual denominou subproletariado, e logrou quantificá-la, concluindo tratar-se de nada menos
que 48% da População Economicamente Ativa (PEA), contra apenas 28% de proletários (dados de 1976). (SINGER,
2012, p. 19)
137
Como observado anteriormente, o capitalismo nacional surge ligado ao capitalismo
internacional através da compra de equipamentos e importação de técnicas. Com a importação
de uma práxis capitalista, surge também uma contestação socialista. A tensão entre direitos
sociais e capitalismo liberal irrompem no fim da ‘República Velha’, através da Revolução de
30. Em 3 de novembro de 1930, Getúlio Vargas toma posse e forma o governo da ‘Aliança
Liberal’, e em 1937, através do Golpe de Estado implanta, o ‘Estado Novo’, explicam Priore e
Venancio (2010). Os governos Vargas são marcados por políticas de desenvolvimento de uma
indústria nacional, e políticas sociais de apoio às classes menos favorecidas da sociedade.
É importante destacar estes aspectos, pois eles marcam o avanço capitalista no Brasil,
através do liberalismo econômico, com ação direta dos capitalistas nacionais através do capital
internacional ou através de uma doutrina heterodoxa keynesiana, sendo o Estado indutor do
desenvolvimento de força produtivas. Priore e Venancio (2010) explicam que:
De forma esquemática, é possível identificar aqueles que, de um lado, defendem o
nacionalismo econômico e a intensiva participação do Estado no desenvolvimento
industrial. Na outra posição estavam os partidários de que o segundo ciclo de nossa
industrialização devia ser comandado exclusivamente pela iniciativa privada
brasileira, associada a capitais estrangeiros. [...] Embora não fosse frontalmente
contrário aos investimentos internacionais, Getúlio era identificado à corrente
nacionalista. [...] Dentre o grupo identificado ao segundo modelo de desenvolvimento
industrial, havia uma parcela importante da elite civil, reunida em torno da UDN. De
certa maneira, a fragilidade eleitoral desse grupo era compensada pelo prestígio que
contava junto a importantes segmentos das forças armadas. (PRIORE, VENANCIO,
2010, p. 264)
Esses dois modelos se alternaram na condução das políticas econômicas do Estado
brasileiro. Um modelo baseado no Império, cuja estrutura é ligada às corporações e ao capital
internacional, com pouca regulação ou intervenção do Estado. O segundo modelo é baseado no
desenvolvimento do capital nacional e tem como principal participante o Estado, ou tem o
Estado como agente financiador do capital produtivo de longo prazo. Nesse modelo, o Estado
atua regulando as relações e promovendo intervenções. John Maynard Keynes é um dos
principais teóricos dessa corrente.
No tópico a seguir é explicitada a opção capitalista e oposição capital/trabalho através da
ideologia dominante, com a prescrição legal que marca as oposições de classes.
138
4.2 OS GOVERNOS DE GETÚLIO VARGAS E O ESTABELECIMENTO DA
IDEOLOGIA CAPITALISTA
Com a publicação da Consolidação de Leis Trabalhistas do Brasil (CLT, 1943),
promulgada durante o primeiro governo de Getúlio Vargas (3 de novembro de 1930 – 29 de
outubro de 1945) fica estabelecido um conjunto ideológico/legal que define a relação
capital/trabalho e a oposição entre classes burgueses e proletários. Sobre a divisão e o
antagonismos de classes como características do capitalismo Marx e Engels (1848, p.11)
expressam: “Nossa época — a época da burguesia — distingue-se, contudo, por ter simplificado
os antagonismos de classe. A sociedade divide-se cada vez mais em dois grandes campos
inimigos, em duas classes que se opõem frontalmente: burguesia e proletariado.”.
O argumento que é apresentado é que o processo de desenvolvimento capitalista, no Brasil,
teve início com a organização de setores produtivos, açúcar e café, na sequência, com a
implantação de ferrovias e de sistemas de energia elétrica; outro marco do desenvolvimento
capitalista é o estabelecimento de um modelo de governo republicano e democrático, com a
publicação da Constituição Federal de 24 de fevereiro de 1891 (Em 25 de março de 1824 foi
publicada a primeira constituição brasileira, denominada de Constituição Política do Império
do Brasil).
Mas, é com a publicação da CLT que o Estado define ideologicamente a relação
capital/trabalho, e a oposição burguês/proletariado. Sobre o processo de desenvolvimento
capitalista, Marx e Engels (1848, p.12) expressam: “a burguesia moderna é, ela mesma, produto
de um longo curso de desenvolvimentos, de uma série de revoluções nos modos de produção e
de troca.”. Priore e Venancio (2010) pontuam que no processo de desenvolvimento:
Por volta de 1945 a economia brasileira torna-se predominantemente industrial. A
partir dessa época, as discussões se voltam para a aceleração do processo de
desenvolvimento econômico. Pois bem, uma das soluções propostas implica a
associação com o capital internacional, enquanto a outra consiste em proteger a
economia desse tipo de intervenção, valorizando a ação do Estado como promotor da
industrialização. Entre numerosos defensores desta forma de desenvolvimento, havia
os partidários da reorganização de nosso mundo rural. Para eles, o campo brasileiro
mantinha estruturas econômicas pré-industriais, impedindo a integração da população
ai existente ao mercado consumidor. Mais ainda: nossa agricultura, baseada em
grandes propriedades e na lavoura de exportação, abastecia precariamente a cidade,
elevando o custo de vida e fazendo com que, entre os trabalhadores, sobrassem poucos
recursos para a aquisição de produtos industriais. A formação de latifúndios
improdutivos tinha outro efeito negativo: desviava capitais das atividades econômicas
mais dinâmicas. Em outras palavras, sem a reforma agrária, a economia brasileira
estaria fadada à estagnação ou então a uma crescente dependência em relação aos
investimentos estrangeiros. (PRIORE, VENANCIO, 2010, p. 272-273)
139
O desenvolvimento do setor industrial, passou por profundas repercussões sociais e
econômicas durante o segundo governo Vargas (31 de janeiro de 1951 – 24 de agosto de 1954),
coma a criação da empresa pública de capital misto Petróleo Brasileiro S. A. (PETROBRAS),
através do Decreto Nº 35.308, de 2 de abril de 1954. Com a fundação da PETROBRAS um
processo revolucionário é iniciado, algo inerente ao modo produção capitalista, como explicam
Marx e Engels (1848, p.14): “a burguesia não pode existir sem revolucionar, constantemente,
os instrumentos de produção e, desse modo, as relações de produção e, com elas, todas as
relações da sociedade.”. Se por um lado se estabelece a relação capital/trabalho, por outro o
Estado desenvolve uma indústria que tem reflexos em toda a organização da sociedade
brasileira ao longo do processo de desenvolvimento capitalista nacional, culminando, 55 anos
depois, com estabelecimento de relações contratuais com o Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
sendo a Petrobras a principal demandante de equipamentos navais pelos próximos 18 anos.
Na figura a seguir, são apresentados dados referentes aos anos de 2012 e 2013 sobre o perfil
da PETROBRAS:
Figura 22 – Perfil da estrutura da PETROBRAS e posição no mercado global.
Fonte: PETROBRAS (2013).
Analisando a (Figura 22), observa-se que a PETROBRAS se tornou uma das maiores
empresas do setor, alcançando em 2013 a sétima posição no ranking global. Estimativas
apontam uma mudança de posição para os próximos anos, podendo alcançar a quarta posição
no ranking global do setor. Contribuem para essa perspectiva positiva os investimentos em
pesquisa e exploração do pré-sal. A empresa também é uma das dez maiores empregadoras do
140
país e, segundo a revista de negócios e economia estadunidense FORBES (2013), está entre as
20 maiores companhias do mundo.
No próximo tópico é analisado como a transição do governo Vargas para Juscelino
Kubitschek marca mudanças na economia política, e como a Ditadura Militar, sob a égide do
capitalismo e da supressão de direitos, foi responsável por construir uma das sociedades mais
desiguais do planeta. O Tópico é finalizado com a retomada da democratização e a tentativa
dos governos democráticos de estabelecerem a ordem econômica através de planos que tinham
como objetivo principal debelar a inflação.
4.3 JUSCELINO KUBITSCHEK E A DITADURA MILITAR
Conciliando perfil conservador com a ampliação da classe trabalhadora, o final do segundo
governo Vargas (1954) é marcado por crise militar em decorrência do avanço do pensamento
socialista no debate político do país. Com o suicídio de Getúlio Vargas na madrugada de 24 de
agosto de 1954, ocorre o fim do ‘Estado Novo’, e novas eleições marcam a chegada ao poder
do ex-prefeito de Belo Horizonte e ex-governador mineiro, Juscelino Kubitschek51 (PSD,
mandato de 31 de janeiro de 1956 a 31 de janeiro de 1961).
As diferenças nas economias políticas entre os governos Vargas e JK, explica Priore e
Venancio (2010, p. 267-268), são marcantes. Durante os governos Vargas ocorreu a prioridade
do desenvolvimento nacional com crescimento da indústria de base, através da produção de aço
e de fontes de energia, como o petróleo e a eletricidade. “Nesse primeiro modelo, a iniciativa
estatal predomina e os recursos para o crescimento econômico advêm da agricultura de
exportação.”. O governo JK altera “essa forma de crescimento industrial, instituindo o que os
historiadores economistas chamam de tripé: a associação de empresas privadas brasileiras com
multinacionais e estatais, estas últimas responsáveis pela produção de energia e insumos
industriais.”. Priore e Venancio (2010) explicam que:
A diferença desse modelo em relação ao anterior reside no fato de os bens duráveis,
como foi o caso da produção de automóveis por multinacionais, passarem a ser o
principal setor do processo de industrialização. Graças ao investimento das empresas
estrangeiras, a nova economia brasileira tornar-se-ia mais independente em relação às
crises do setor agroexportador. No entanto, o modelo tripé tem consequências
nefastas. Por dispor de fartos recursos, a produção das multinacionais podia crescer
em ritmo mais acelerado do que a produção de base, implicando aumento das
importações de insumos industriais, fator responsável pelo progressivo
endividamento externo do Brasil. Mais ainda: para estimular a implantação dessas
51
Sobre ex-Presidentes da República acessar: http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/ex-presidentes
141
empresas, foi facilitada a remessa de lucros para as matrizes, o que implica o desvio
de valiosos recursos da economia brasileira. (PRIORE, VENANCIO, 2010, p. 268)
A economia política do governo JK amplia a dependência do capital financeiro. Porém, no
curto prazo, o modelo industrial obteve certo êxito, levando a economia a atingir, segundo
Priore e Venancio (2010, p. 268), “taxas de crescimento de 7%, 8% e até 10% ao ano.” Isso
permitiu que o governo implementasse ambicioso Plano de Metas - popularmente conhecido
como “50 anos em 5”.
O governo JK estabelece uma aliança com o Império através do aumento da dependência
do capital financeiro e do aumento da presença do capital industrial internacional,
principalmente, através da indústria automobilística, além de manter inalterada as condições do
campo, adiando a reforma agrária e mantendo os latifúndios. Mas, com o crescimento da
economia ocorreu o aumento da classe trabalhadora, e a incorporação de substantivos
segmentos sociais a economia de mercado, o debate sobre direitos sociais e o pensamento
socialista na condução das ações de Estado persiste no meio político.
Se o comércio e a indústria avançavam para o estabelecimento de uma economia de
mercado, no meio rural as condições econômicas e sociais permanecem praticamente
inalteradas. Priore e Venancio (2010) explicam que desde 1930 a ênfase dada à industrialização
levou a restrições ao crédito rural, e a uma política cambial desfavorável aos produtores
agrícolas. A propriedade rural continuava concentrada em latifúndios e formas de trabalho
semiescravo, e escravo persistiam, utilizando-se de diversos tipos de relação, a exemplo de
rendeiros, meeiros, além dos “moradores de favor” que pagam a moradia como braço cativo.
Com a influência do Partido Comunista do Brasil (PCB), em 1946, foram formadas as
primeiras ‘Ligas Camponesas’, tendo como um dos principais líderes Gregório Lourenço
Bezerra, ações do governo Vargas reprimiram o movimento. A partir de 1955 são formadas
novas Ligas Camponesas, que passam a atuar com liderança do advogado Francisco Julião
Arruda de Paula (Francisco Julião), com objetivo de retomar a luta no campo, promovendo a
reforma agrária, levando direitos sociais aos trabalhadores do campo. Sobre o governo JK,
Francisco Julião acerva:
A concentração do capital e o trabalho escravo favoreceram a construção de obras
suntuosas, castelos, igrejas e monumentos tão altos como as montanhas para refletir o
poderio das classes dominantes. Tudo isso argamassado pelo sangue e pelo suor dos
camponeses, como se fez em Brasília, cujos edifícios foram alicerçados no sacrifício
de centenas de milhares de camponeses, no quinquênio Juscelino Kubitschek, que não
teve uma palavra de esperança sequer para o campesinato, mas abriu, como nenhum
outro, as portas do País ao capital estrangeiro monopolista e espoliador de nossas
riquezas. Para defender sua fortuna, seu luxo, vaidade e vícios, os feudalistas europeus
142
faziam guerra entre eles próprios. Exigiam que os camponeses fossem morrer por eles,
além de pagarem os tributos de guerra. (JULIÃO, 2013, p. p. 2)
Observa-se que Francisco Julião tornava-se a voz do campesinato que cobrava a reforma
agrária e a democratização do campo, com a inclusão de direitos sociais, aspectos negados pela
política de Juscelino Kubitschek, mantendo à margem da relação capital/trabalho estabelecida
no país, contingente significativo da população.
O final do governo JK, em 1961, é marcado pela acessão de grupos políticos com
pensamentos opostos, sendo eleito como presidente da república, Jânio Quadros (31 de janeiro
de 1961 a 25 de agosto de 1961), através da aliança de partidos formado pelo PTN, PDC, UDN,
PR, PL. Pouco tempo após a posse, ele renuncia ao mandato, assumindo o vice-presidente João
Goulart (PDT, mandato presidencial de 7 de setembro de 1961 a 1º de abril de 1964). A escolha
do vice-presidente independia da escolha para presidente e, nesse caso, pensamentos políticos
distintos foram eleitos simultaneamente.
O governo de João Goulart significava a aproximação do país do pensamento socialista,
com o apoio às Ligas Camponesas, levando a promessa da reforma agrária e democratização
do campo a política de Estado. Mas, setores conservadores da sociedade, apoiados por setores
das forças armadas e pelo Império aplicaram o golpe de 1964, conduzindo o país a conviver
com 21 anos de ditadura militar, período marcado por intensa supressão de direitos civis. Além
de um desenvolvimento econômico ancorado no capital financeiro internacional
(PETRODOLARES), o que levara o país a adquiri uma dívida internacional, considerada por
décadas como impagável, mas que fora paga com o empobrecimento da nação, com a
constituição das favelas, e com uma das mais elevadas taxas de concentração de renda do
mundo.
Documentos oficiais do governo estadunidense, divulgados no Arquivo Nacional de
Segurança, da Universidade George Washington (KORNBLUH, 2004), comprovam o
envolvimento do governo dos EUA, durante as administrações John F. Kennedy (1960) e
Lyndon Johnson (1963) no apoio ao Golpe Militar e a implantação da ditadura no Brasil. O
documentário ‘O Dia que Durou 21 anos’, de Camilo Tavares (2013), narra com densidade o
apoio do EUA ao Golpe Militar de 1964, com envolvimento direto da Casa Branca, através da
CIA52.
Tradução do memorando da CIA sobre apoio dos EUA ao Golpe Militar de 1964. “CIA, memorando secreto da
conversação sobre reunião na Casa Branca, no dia 1º de abril de 1964. Assunto: Brasil, 1º de abril de 1964 – Este
memorando de conversação regista o elevado nível da reunião realizada na Casa Branca, entre o Presidente Johnson e
52
143
O governo estadunidense atuou nos setores militar e ideológico, com ações de propaganda
coordenadas pelo intelectual brasilianista de Harvard e Embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln
Gordon53, com objetivo de desestabilizar o governo brasileiro. Além do apoio militar e
ideológico ao Golpe, institutos de pesquisa anti-Goulart passaram a receber intenso
financiamento, a exemplo do IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democrática) e o IPES
(Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais) com objetivo de financiar pesquisas e campanhas
eleitorais de 250 candidatos a deputado federal, oito candidatos a governador e 600 candidatos
a deputado estadual, com a finalidade de dar sustentação política ao Golpe, como aponta o
documentário.
A política ortodoxa dos governos militares levou o país a retroceder nos ganhos sociais e a
manter a estrutura agrária praticamente inalterada. Serviram como verdadeiros vassalos do
Império, subordinando imensos setores da sociedade ao interesse do capital. Priore e Venancio
(2010, p. 287) destacam que entre 1977 e 1983, o número de pessoas vivendo com rendimentos
inferiores a um dólar por dia, aumentando de 17 milhões para 30 milhões pessoas. “Se no
passado a pobreza é registrada mais frequentemente no campo, dando origem a formas de
banditismo rural como o cangaço, agora ela tem a cidade como principal espaço.
Acompanhando o quadro de empobrecimento da população, a criminalidade urbana expandese rapidamente, e a ela associa-se o tráfico de drogas.”, analisam.
A supressão de direitos sociais foi aprofundada com a implantação de uma ideologia
liberal, com a refutação de qualquer pensamento ou contestação socialista. Os líderes
progressistas eram suprimidos através de arbitrárias prisões e assassinatos. A reforma agrária
foi adiada, e no campo foi implantando uma política de apoio à indústria agroexportadora, em
detrimento do campesinato, que sem apoio do Estado, migraram para os grandes centros,
formando o subproletariado nacional.
assessores estadunidenses de segurança nacional no Brasil. O vice-chefe de operações do hemisfério ocidental da CIA
Desmond Fitzgerald apresentou ao presidente Johnson as discussões sobre o progresso do golpe. O Secretário da Defesa
informou sobre os movimentos da força tarefa naval enviada ao Brasil, com armas e munições, com saída de New Jersey
para reabastecer os conspiradores do golpe, se necessário.” (KORNBLUH, 2004) (tradução própria)
53 Telegrama de Gordon ao Departamento de Estado dos EUA: “Classificados como ultra secretos, entre os documentos
enviados pelo embaixador dos EUA, Lincoln Gordon, existe um que relata a vigorosa pressão pelo envolvimento direto
de Washington, no apoio golpistas liderados pelo Chefe do Estado Maior, General Humberto Castello Branco. “Se a nossa
influência deve ser exercida para ajudar a evitar um grande desastre aqui, o que pode tornar o Brasil a China da década
de 1960, este é o lugar onde tanto eu como todos os meus conselheiros sênior acreditamos que nosso apoio deve ser
colocado”, escreveu Gordon ao alto Departamento de Estado, da Casa Branca e da CIA, em 27 de março de 1964.”
(KORNBLUH, 2004) (tradução própria)
144
4.4 A REDEMOCRATIZAÇÃO E O AVANÇO DO NEOLIBERALISMO
A influência da economia política dos governos militares ainda iria perdurar por décadas,
sobre o Estado brasileiro54, representando elevadas inversões de capitais, via pagamento do
serviço da dívida externa, em favor do Império. A dívida era decorrente do substantivo
endividamento externo, e do descontrole inflacionário. Com imensos setores da sociedade
apresentando elevados níveis de empobrecimento, as pressões populares eram crescentes e
clamava por eleições diretas. Os setores conservadores promoveram o arranjo institucional, o
que permitiu a eleição de um governo de transição, e a anistia dos crimes contra a humanidade
praticados pela Ditadura Militar.
A transição da Ditadura Militar para a democracia é marcada pela escolha, através do
Congresso Nacional, de Tancredo Neves (PMDB), presidente da república e José Sarney vicepresidente (PDS). Com a súbita morte de Tancredo, Sarney assume a Presidência da República
(15 de março de 1985 a 15 de março de 1990). Neste período, a inflação descontrolada corria
os ganhos da classe trabalhadora e empobrecia a nação. O endividamento externo, herdado dos
Governos Militares, levava o país a promover intensas inversões de capitais, ao mesmo tempo
em que impedia o Estado de atuar como indutor do desenvolvimento de forças produtivas.
Planos heterodoxos de combate à inflação marcam o período, a exemplo dos Planos Cruzados
I e II, e da moratória a dívida externa. Por curtos períodos a inflação parecia ter sido debelada,
mas novos ciclos inflacionários com deterioração das contas públicas sucediam.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, e a institucionalização das eleições
diretas para presidente, José Sarney é sucedido por Fernando Collor de Mello (PRN, 15 de
março de 1990 a 2 de outubro de 1992), sendo o primeiro presidente eleito, democraticamente,
desde 1960. Durante o início do governo a inflação continuava a apresentar elevadas taxas, e
Collor adota o receituário neoliberal de desregulamentação, privatização de setores da
economia, além da abertura de setores estratégicos ao capital internacional.
Em conjunto com o receituário neoliberal ocorreram a implantação de três planos
econômicos, com objetivo de estabilizar a inflação, os Planos Collor I e II, e o Plano Marcílio.
54
As décadas de 1960 e 1970 simbolizam o início do desequilíbrio econômico no Brasil. Naquele período, os índices de
inflação chegavam a aproximadamente 40% ao ano. [...] A década de 1980 foi marcada pela conjunção de dois fatores:
forte retração na taxa de expansão econômica e significativo aumento da inflação. A média anual, por exemplo, subiu
para 330% e, entre 1990 e 1994, para 764%. Foram pelo menos 15 anos de hiperinflação. [...] Supermercados e comércio
em geral remarcavam diariamente os preços dos produtos, que sumiam rapidamente das prateleiras e das vitrines. [...]
Esse quadro caótico se estendeu até a primeira metade dos anos 1990, forçando os governos daquele período a adotarem
sete planos de estabilização econômica em menos de dez anos. (Portal Brasil, 2012)
145
Em uma das tentativas de estabilizar a inflação, o governo promove o confisco da poupança,
mas a inflação persiste, levando o governo a perder apoio popular e político.
Denúncias de corrupção lançadas pelo próprio irmão, Pedro Collor de Mello, corroeram a
base de apoio popular e política do presidente, induzindo o Congresso Nacional a abrir processo
de impeachment. Há poucas horas de ter o mandato cassado pelo Congresso Nacional, Collor
renuncia, mas, não escapa de ter os direitos políticos cassados por oito anos.
Eleito como vice-presidente, Itamar Franco assume a Presidência da República (29 de
dezembro de 1992 a 1º de janeiro de 1995). Em 1992 a inflação alcança 1100% ao ano, e em
1993 bate recorde histórico, com inflação de 2700% ao ano. O governo de Itamar estabelece
aliança com o PSDB, partido que emergiu a partir de dissidências internas do PMDB. É
escolhido como Ministério da Fazenda, o político, intelectual e sociólogo Fernando Henrique
Cardoso.
A inflação, contida graças à política cambial ancorada no dólar e a uma redução nas
emissões monetárias, começa finalmente a cair continuamente. Fernando Henrique
Cardoso, então ministro da Fazenda, procura capitalizar para si os dividendos dessa
vitória. Em março de 1994, como candidato do PSDB, alia-se ao PFL. (PRIORE,
VENANCIO, 2010, p. 291)
O plano Real, lançado pelo governo Itamar atinge êxito, e FHC capitaliza o fato
politicamente lançando-se candidato a presidência da república, formando a aliança política
PSDB/PFL, ou seja, do centro com a direita.
No próximo tópico é analisado como a alternância na condução e orientação da economia
política do final do século XX, muda o padrão histórico de concentração de riqueza e
desemprego no Brasil.
4.5 OS GOVERNOS FHC E LULA – DICOTOMIAS NA ECONOMIA POLÍTICA
Com viés liberal, Fernando Henrique Cardoso é eleito presidente da república (PSDB, 1º
de janeiro de 1995 – 31 de dezembro de 2002), sendo celebrado pela grande mídia internacional
como intelectual condutor da reforma econômica do país. Mas, no campo interno a adoção do
neoliberalismo teve como legado baixo crescimento, crise econômica, e endividamento interno
e externo. Como se observa na seguinte citação:
O ideário neoliberal reinante em todos os continentes ganha mais força na agenda
política brasileira e assume contornos concretos em 1995, quando FHC assume a
presidência do Brasil. A partir de então, o movimento político-ideológico antes
referido se instaura na vida econômica e política nacional. O governo FHC que,
durante a campanha eleitoral de 1994 havia prometido retirar o país de sua condição
146
subdesenvolvida, na verdade terminou seu segundo mandato no ano de 2002 em uma
grande crise. [...] Na esfera econômica buscou-se recuperar o crescimento econômico
através da adoção de um cardápio de políticas de ajuste estrutural ancorado em quatro
pilares básicos: na desregulamentação bancária e financeira; na liberalização
comercial, com ampla abertura da economia do país aos produtos e bens do exterior;
na estabilização dos preços, via política cambial fixa; e na redução da participação do
Estado na economia, através de um vultoso programa de privatização de empresas
estatais. [...] Uma das principais consequências dessa política macroeconômica é que
o Estado brasileiro passou a ficar refém do capital especulativo nacional e
internacional, o qual se alimentava com as elevadas taxas de juros (as maiores do
mundo) praticadas pelo país. Com isso, essa opção política acabou gerando as
condições necessárias para que ocorresse uma hegemonia do capital financeiro sobre
a economia brasileira. [...] Dentre os principais problemas desse período destacam-se:
desequilíbrios das contas governamentais (no período entre 1994-2002 houve uma
inversão da ordem de US$ 17 bilhões na balança comercial, registrando um déficit
anual médio superior a US$ 2 bilhões e provocando um déficit anual médio ao redor
de US$ 25 bilhões, totalizando um acumulado nos oito anos de cerca de US$ 200
bilhões); elevação enorme das dívidas interna (no período FHC passou de R$ 70
bilhões para R$ 892 bilhões) e externa (atingiu R$ 250 bilhões no ano de 2002) devido
ao elevado peso do pagamento dos juros (custo médio anual de R$ 100 bilhões); dívida
líquida do setor público (cresceu de 30,4% do PIB em 1994 para 58,6% em 2002);
baixíssimo crescimento do PIB; elevação do desemprego (cresceu de 4,8% em 1994
para 8,3% em 2002); redução do poder de compra do salário mínimo (caiu de US$
110 em 1995 para US$ 80 em 2002). (PAULA, 2011, p. 136-138)
O receituário neoliberal foi incorporado como programa do governo FHC, que adotou a
desregulamentação bancária e financeira, redução da participação do Estado na economia, e a
privatização de companhias estatais, entregues a ao capital internacional. Segundo IPEA (2010)
de 1995 a 2002, período marcado pelo governo neoliberal de Fernando Henrique Cardoso, o
Brasil cresceu com taxa média de 1,9% ao ano.
O governo FHC chega ao fim, mas não consegue eleger o sucessor José Serra (PSB), foi
eleito, após a terceira tentativa um membro da classe operária, Luís Inácio Lula da Silva (PT, 1
de janeiro de 2003 a 31 de dezembro de 2010). Sobre a ascensão da oposição ao poder, Priore
e Venancio (2010) destacam:
O novo governo é, em grande parte, composto por ex-militantes de grupos
guerrilheiros, tais como Aliança Libertadora Nacional (ALN), Movimento de
Libertação Popular (Molipo), Comando de Libertação Nacional (Colina) e Vanguarda
Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), para mencionarmos apenas
algumas siglas. [...] A eleição do presidente Lula não é a ascensão de um indivíduo
isolado, é a ascensão da geração revolucionária da década de 1960. Uma vez no poder,
mutações nos antigos projetos políticos são registradas. (PRIORE, VENANCIO,
2010, p. 293)
As mutações, citadas por Priore e Venancio (2010), ocorreram principalmente no campo
da economia política, o neoliberalismo é substituído pela heterodoxia keynesiana, mas em
decorrência da crise estabelecida pelo governo FHC, e dos elevados níveis de endividamento,
o governo Lula opta por um pacto conservador, tendo como vice-presidente José Alencar (PL).
A aliança PT/PL possibilitou mudanças na condução econômica do governo, passando o Estado
147
a atuar com maior nível de intervenção e com maior protagonismo no desenvolvimento de
forças produtivas nacionais, e com a aplicação de políticas públicas de intenso impacto social,
a exemplo do Bolsa Família (BF). O resultado dessa combinação de fatores é que, durante o
governo Lula, de 2003 a 2008, a taxa média anual de crescimento foi de 4,6%. Sobre esse
aspecto, o IPEA expõe o seguinte:
O Brasil buscou ao longo desta década retomar seu padrão histórico de crescimento
econômico. Tendo apresentado uma taxa anual de 1,9% entre 1995 e 2002,
consolidou-se um novo cenário para a atividade produtiva, que passou a se expandir
à taxa média anual de 4,6% entre 2003 e 2008. Certamente contribuiu o cenário
externo benigno, mas é certo também que, no plano interno, houve a determinação
da Política Pública para garantir que o país voltasse a apresentar uma trajetória
de expansão do emprego e da renda. [...] A atuação governamental na retomada do
investimento público, cuja ampliação ano a ano desde 2005 tornou-se notória, somou
o montante de R$ 300 bilhões entre 2005 e 2009, com destaque para a
infraestrutura de petróleo e gás, energia hidroelétrica e construção civil. A expansão
do investimento vem ocorrendo ao mesmo tempo que o gasto em custeio permanece
constante como proporção do PIB; em particular, a rubrica politicamente sensível do
gasto de pessoal do governo federal manteve-se devidamente controlada no período,
como mostram os estudos realizados. [...] Adicionalmente, a política de crédito
público teve um papel estratégico entre os instrumentos postos em ação. O governo
federal passou a utilizar seus bancos públicos, notadamente o Banco do Brasil, a
Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES), para viabilizarem uma ampliação do crédito, estimulando um ciclo
de investimentos – no início da década os bancos públicos ofertavam pouco mais
de 25% do crédito total da economia, e em fevereiro de 2010 chegaram a ofertar
41% – e, dessa forma, mantendo o nível de atividade e do emprego em patamar
elevado. Somente o BNDES realizou desembolsos ao setor produtivo, com vistas
à expansão da formação bruta de capital fixo, entre 2003 e 2009, no montante
acumulado de R$ 510,3 bilhões (a preços de 2008). (IPEA, 2010, p. XIX) (Grifo
nosso)
Observado a citação anterior, pode se afirmar que a política econômica adotada durante o
governo Lula tem o Estado como indutor do crescimento, proporcionando significativa
elevação da atividade econômica e aumento do emprego formal. O IPEA (2010, p. 29) expressa
que uma das características que diferencia a política econômica dos governos FHC e Lula é a
retomada de certo nível de protagonismo estatal em matéria de gasto, mas, pondera, avaliando
que em diversos momentos do governo Lula, o “Estado se pautou por uma gestão ortodoxa do
Banco Central do Brasil (BCB)”, com a manutenção de política monetária e cambial com perfil
conservador, em detrimento de uma “visão mais heterodoxa, defendida pela direção do
Ministério da Fazenda e do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)”.
4.6 GOVERNO LULA – REFORMA GRADUAL E PACTO CONSERVADOR
O que o IPEA (2010) chama a atenção é que elementos do neoliberalismo, como metas de
inflação e taxa de juros elevadas, perduram durante o governo Lula e foram mantidas no
148
governo da sucessora, Dilma Vana Rousseff. Essa política econômica foi observada na tese de
livre docência de André Singer (2012), com título ‘Os sentidos do lulismo: reforma gradual e
pacto conservador’, no qual observa que o governo Lula buscou conciliar os interesses do
grande capital com uma ação mais intensiva do Estado.
As coalizões políticas dos governos Lula, que tiveram sequência no governo de Dilma
Vana Rousseff (PT, 1º de janeiro de 2014 –), evidenciam um pacto com setores conservadores
da sociedade, ao passo que a presença de partidos de esquerda e centro-esquerda pressionam
por reformas econômicas e políticas sociais que objetivem diminuir a desigualdade social do
país. Este bloco de poder representa uma ruptura no processo histórico de condução do Estado,
conforme pontua André Singer (2012):
O lulismo partiu de grau tão elevado de miséria e desigualdade, em país cujo mercado
interno potencial é expressivo, que as mudanças estruturais introduzidas, embora
tênues em face das expectativas radicais, tiveram efeito poderoso, especialmente
quando vistas da perspectiva dos que foram beneficiados por elas: o próprio
subproletariado. A conjuntura econômica mundial favorável entre 2003 e 2008, não
só por apresentar um ciclo de expansão capitalista como por envolver um boom de
commodities, ajudou a produzir o lulismo. No entanto, foram as decisões do primeiro
mandato, intensificadas no segundo, que canalizaram o vento a favor da economia
internacional para a redução da pobreza e a ativação do mercado interno. Lula
aproveitou a onda de expansão mundial e optou por caminho intermediário ao
neoliberalismo da década anterior — que tinha agravado para próximo do insuportável
a contradição fundamental brasileira — e ao reformismo forte que fora o programa do
PT até as vésperas da campanha de 2002. O subproletariado, reconhecendo na
invenção lulista a plataforma com que sempre sonhara — um Estado capaz de ajudar
os mais pobres sem confrontar a ordem —, deu-lhe suporte para avançar, acelerando
o crescimento com redução da desigualdade no segundo mandato, e, assim, garantindo
a vitória de Dilma em 2010 e a continuidade do projeto ao menos até 2014. (SINGER,
2012, p. 21)
O argumento que se busca desenvolver é que foi em decorrência do protagonismo do
Estado na condução econômica, que setores da economia foram desenvolvidos, enquanto os
setores que estavam estagnados ou em decadência passaram por novo ciclo de desenvolvimento
elevando a taxa de emprego, possibilitando uma melhor distribuição de renda, dois problemas
crónicos do Estado brasileiro. Enquanto no governo de FHC ocorreu uma diminuição do papel
do Estado como protagonista do desenvolvimento da indústria nacional, no governo Lula este
protagonismo é retomado com a implantação de diversas políticas, dentre elas, as Políticas
Públicas para os setores de petróleo e gás (P&G). Essa mudança de ação foi fundamental para
que empreendimentos como o Estaleiro Enseada do Paraguaçu surgissem.
No tópico a seguir é apresentada o arcabouço geral da Política Pública para o setor do
petróleo e gás, com os objetivos a serem perseguidos: desenvolvimento da industrial nacional
e crescimento inclusivo.
149
4.7 UMA NOVA POLÍTICA PÚBLICA PARA O DESENVOLVIMENTO DO SETOR DE
PETRÓLEO E GÁS
Com viés mais nacionalista, e com objetivo de incluir massas do subproletariado na relação
capital/trabalho, ao final do primeiro ano do governo Lula (dezembro de 2013), como política
pública, é criado o Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural
(PROMINP55) com objetivo de maximizar a participação da indústria nacional no setor.
Sobre a criação do PROMINP, um texto assinado por Dilma Rousseff (2003), na época
Ministra de Estado de Minas e Energia, expressa que o programa “representa o compromisso
do Governo Federal e das empresas do setor em atuarem integrados, priorizando a participação
da indústria nacional de bens e serviços nos negócios de petróleo e gás natural, criando
empregos e competências, gerando oportunidades e riquezas para o Brasil. ".
Segundo Rousseff (2003) o PROMINP iniciou as atividades com 47 projetos aprovados
pelo Comitê Diretivo do Programa. Fazem parte do comitê o governo, as empresas e entidades
de classe que atuam no setor. O programa tem como meta “desenvolver projetos de aumento
do conteúdo nacional nas áreas específicas de Exploração & Produção, Transporte Marítimo,
Abastecimento e Gás & Energia.”. Com objetivo gradual e planejado de atender as demandas,
“na ordem de U$ 41 bilhões, oriundas dos investimentos que estarão sendo realizados nos
setores de petróleo e gás, no período de 2003 – 2007.”.
Com uma Política Pública desenhada para o setor de P&G e recursos estatais destinados ao
desenvolvimento do setor, ocorre em 2007 durante o segundo governo Lula, a descoberta das
reservas do pré-sal56. Estudos apontavam para uma das maiores reservas petrolíferas mundiais,
reposicionando o Brasil no cenário internacional do petróleo. Durante palestra realizada na
cidade de Huston (EUA), a diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Magda
55
O Governo Brasileiro, através do Ministério de Minas e Energia, em articulação com as entidades empresariais da
indústria e operadoras de petróleo com atuação no Brasil, especialmente a Petrobras, lançou, em 19 de dezembro de 2003,
através do decreto nº 4.925, o PROMINP - Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural. O
Programa foi criado com o objetivo de maximizar a participação da indústria nacional fornecedora de bens e serviços, em
bases competitivas e sustentáveis, na implantação de projetos de investimentos do setor de petróleo e gás natural no Brasil
e no exterior. (Conheça o PROMINP, 2011)
56 O termo pré-sal refere-se a um conjunto de rochas localizadas nas porções marinhas de grande parte do litoral brasileiro,
com potencial para a geração e acúmulo de petróleo. Convencionou-se chamar de pré-sal porque forma um intervalo de
rochas que se estende por baixo de uma extensa camada de sal, que em certas áreas da costa atinge espessuras de até 2
Km. O termo pré é utilizado porque, ao longo do tempo, essas rochas foram sendo depositadas antes da camada de sal. A
profundidade total dessas rochas, que é a distância entre a superfície do mar e os reservatórios de petróleo abaixo da
camada de sal, pode chegar a mais de 7 Km. [...] As maiores descobertas de petróleo, no Brasil, foram feitas em 2007
pela Petrobras na camada pré-sal localizada entre os estados de Santa Catarina e Espírito Santo, onde se encontrou grandes
volumes de óleo leve. Na Bacia de Santos o óleo identificado no pré-sal tem densidade de 28,5º API, baixa acidez e baixo
teor de enxofre. São características de um petróleo de alta qualidade e maior valor de mercado. (PETROBRAS, 2013)
150
Chambriard, expressou que “a demanda de investimentos para exploração do pré-sal57 deverá
superar US$ 400 bilhões em materiais, equipamentos, sistemas e serviços, até 2020.”. (Portal
Brasil, 2012).
Com extensivas reservas minerais a explorar, foi encomendado um denso estudo pelo
BNDES (Bain & Company e Tozzini Freire Advogados, 2009) sobre a cadeia de valor do
petróleo na Noruega. O estudo serviu de base para aprimorar o modelo brasileiro para o setor
de P&G. O presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Mauro
Borges Lemos, apresenta uma síntese dos objetivos e do formato de desenvolvimento adotado
para exploração do pré-sal:
O maior desafio da economia brasileira nos próximos anos é sustentar um crescimento
inclusivo. [...] O programa brasileiro de exploração da camada pré-sal abre
oportunidades para o forte adensamento da cadeia de fornecedores de petróleo e gás,
objetivando a formação de um amplo complexo industrial e de serviços
especializados, que incorpora desde o setor naval e aeronáutico de asas rotativas
(helicópteros) até serviços intensivos em conhecimento de tecnologia da informação.
[...] Para a cadeia de petróleo e gás, interessa ao Brasil contar não somente com
uma poderosa indústria de exploração e produção de petróleo, mas também com
uma robusta indústria parapetroleira, cujo desenvolvimento e internacionalização
poderão promover um processo de upgrading tecnológico, consolidação corporativa
e ampliação do mercado das empresas brasileiras para além do mercado doméstico.
[...] Nesse contexto - em que recursos naturais, desenvolvimento tecnológico e
capacidade corporativa compõem o tripé estruturante para o desenvolvimento das
cadeias de suprimentos em energias, em especial a de petróleo e gás - a busca por
referências de políticas públicas e melhores práticas mundiais constitui-se em
importante ponto de partida. Nesse sentido, a Noruega apresenta-se como caso de
referência, na medida em que o setor de petróleo nesse país, apesar de pouca ou
nenhuma tradição prévia, atualmente detém uma participação significativa no
conjunto da economia nacional. (ABDI, 2011, p. 8) (Grifo nosso)
Na síntese apresentada por Mauro Lemos é definido como prioridade um crescimento
inclusivo58, ou seja, o processo de desenvolvimento da cadeia de valor deve ser orientado a
promover a inclusão das camadas menos favorecidas da população. Também são apresentados
os três principais pontos para desenvolvimento do setor: recursos naturais, desenvolvimento
tecnológico e capacidade corporativa, formando o ‘tripé estruturante’ da cadeia de valor. Um
processo de expansão capitalista se inicia no país como o desenvolvimento de novos setores da
57
Com a evolução das avaliações, evidenciou-se que a região denominada Pré-sal se configurava em uma das maiores
províncias petrolíferas mundiais. [...] Ao final de 2013 a produção diária de petróleo oriundo do pré-sal alcançou 360 mil
barris. Para 2017 a Petrobras projeta atingir a produção de mais de 1 milhão de barris de petróleo por dia. (PETROBRAS,
2013)
58 Crescimento inclusivo significa que todos devem participar do processo de crescimento econômico e do
compartilhamento dos benefícios. Também é um padrão de crescimento sustentável que gera novas oportunidades
produtivas. [...] O Crescimento inclusivo implica na participação e compartilhamento de benefícios. Participação sem
redistribuição torna o crescimento injusto; redistribuição sem participação social torna o processo de crescimento
excludente. (PNUD, 2013)
151
economia, além da ampliação e recuperação dos existentes, ensejando amplas oportunidades
para expansão do Império.
David Harvey (2012b) observa que o capital busca explorar condições geográficas
desiguais, atuando nas assimetrias com objetivo de ampliar a acumulação. Ele chama a atenção
para a necessidade do protagonismo do Estado na busca da defesa do interesse nacional. Como
observado a seguir:
As práticas imperialistas, do ponto de vista da lógica capitalista, referem-se
tipicamente à exploração das condições geográficas desiguais sob as quais ocorre a
acumulação do capital, aproveitando-se igualmente do que chamo de as “assimetrias”
inevitavelmente advindas das relações espaciais de troca. Estas últimas se expressam
em trocas não leais e desiguais, em forças monopolistas espacialmente articuladas, em
práticas extorsivas vinculadas com fluxos de capital restritos e na extração de rendas
monopolistas. A condição de igualdade costumeiramente presumida em mercados de
funcionamento perfeito é violada, e as desigualdades resultantes adquirem expressão
espacial e geográfica específica. A riqueza e o bem-estar de territórios particulares
aumentam à custa de outros territórios. As condições geográficas desiguais não advêm
apenas dos padrões desiguais da dotação de recursos naturais e vantagens de
localização; elas são também, o que é mais relevante, produzidas pelas maneiras
desiguais em que a própria riqueza e o próprio poder se tornam altamente
concentrados em certos lugares como decorrência de relações assimétricas de troca.
Esse é o ponto no qual a dimensão política retorna ao panorama. Uma das tarefas
essenciais do Estado é tentar preservar o padrão de assimetrias espaciais de troca que
seja vantajoso para ele. Se, por exemplo, as forças norte-americanas abrem mercados
de capitais em todo o mundo por meio das operações do FMI e da OMC, a causa é
que são esperadas vantagens específicas advindas disso para as instituições
financeiras dos Estados Unidos. Em suma, o Estado é a entidade política, o corpo
político mais capacitado para orquestrar esses processos. E provável que a
incapacidade de fazê-lo resulte na diminuição da riqueza e do poder do Estado.
(HARVEY, 2012b, p. 35)
O argumento desenvolvido por Harvey (2012b) possuí um duplo grau de intepretação. Pode
ser analisado do ponto de vista da atuação do Império em relação ao Estado. Mas também pode
ser interpretado no microcosmo das relações estabelecidas entre os capitalistas e as
comunidades locais. Nesses espaços geográficos/sociais as assimetrias estabelecidas precisam
ser contrapostas pela ação do Estado, que deve atuar fiscalizando e regulando a ação capitalista
no sentido de atender ao objetivo primaz de “crescimento inclusivo”.
No tópico a seguir é apresentada uma síntese da Política Pública para o setor P&G, e como
a aplicação dela no desenvolvimento industrial do setor naval é determinante para o surgimento
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
152
4.8 PROMINP – A ORGANIZAÇÃO DA CADEIA DE VALOR E O ESTALEIRO
ENSEADA DO PARAGUAÇU
A regulação do setor de P&G, pelo Estado, foi decisivo fator para o desenvolvimento de
uma Política Pública que favorece o desenvolvimento da indústria nacional no setor. O processo
têm início em 1999, com os primeiros licitações realizadas pela ANP. Os contratos definem
uma parcela de ‘conteúdo local’, para efetivação das licitações. Em 2004, o Estado aumenta a
regulação, estabelecendo a ‘Cartilha de Conteúdo Local59 do PROMINP’, e em 2007, cria o
‘Sistema de Certificação de Conteúdo Local’.
Com um setor mais regulado, recursos alocados, e reservas a explorar, o PROMINP é
aprimorado, e passa a atuar através de eixos estruturantes que se interrelacionam. A iniciativa
consiste em projetos anuais para quatro grandes áreas, que estão agrupadas na Indústria de
Petróleo e Gás. Conforme listados pela Bain & Company e Tozzini Freire Advogados (2009,
p. 306):
1 – Exploração e Produção (E&P);
2 – Transporte Marítimo (TM);
3 – Gás & Energia e Transporte Dutoviário (G&E e TD);
4 – Abastecimento (ABAST);
5 – Indústria de Petróleo e Gás (IND P&G).
A articulação dos diferentes setores da economia, tendo por finalidade a exploração do
Petróleo e gás, ensejou um conjunto de políticas públicas.
Na Tabela a seguir, é apresentado um organograma com a hierarquia das políticas públicas
desenvolvidas a partir do governo Lula:
O conceito de ‘Conteúdo Local’ define que a proporção dos investimentos nacionais aplicados em um determinado
bem ou serviço, corresponde a parcela de participação da indústria nacional na produção desse bem ou serviço. Assim,
quando uma plataforma ou refinaria, por exemplo, possui um alto índice de conteúdo local, significa que os bens e serviços
utilizados em sua construção são, em grande parte, de origem nacional, e não importados. (PROMINP – Conteúdo Local,
2013)
59
153
Tabela 8 – Principais políticas públicas de incentivo ao desenvolvimento da indústria de Petróleo e Gás
no Brasil.
Fonte: Bain & Company e Tozzini Freire Advogados, (2009, p. 305).
Analisando a Tabela 8 observa-se que para o desenvolvimento da cadeia de valor é adotado
conjunto de políticas, envolvendo vários ministérios, notadamente Fazenda, e Minas e Energia.
No arcabouço das políticas, o eixo central é iniciado com ‘Regime Aduaneiro Especial de
Exportação e Importação de bens destinados à exploração e à produção de petróleo e gás natural
(REPETRO60)’, cuja finalidade é incentivar e modernizar a indústria nacional de P&G através
de incentivos fiscais.
Participando da política, e com contratos celebrados, os capitalistas são habilitados a
celebrar a ‘Antecipação de Recebíveis’. Bain & Company e Tozzini Freire Advogados (2009,
p. 309) explicam que o objetivo da Política Pública é oferecer recursos financeiros com taxas
mais competitivas aos fornecedores da indústria nacional de petróleo e gás natural, através do
Crédito Mercantil e o Crédito Bancário. As operações permitem o adiantamento de até 50% do
valor do contrato, e o fornecedor pode optar por captar recursos através do Crédito Mercantil
60
O REPETRO é um regime aduaneiro especial, que permite a importação de equipamentos específicos, para serem
utilizados diretamente nas atividades de pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás natural, sem a incidência dos tributos
federais – II, IPI, PIS e COFINS, além do Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante – AFRMM. Estes
tributos permanecem com exigibilidade suspensa pelo período de utilização no regime, tendo a extinção prevista no caso
de re-exportação dos equipamentos admitidos no regime. (REPETRO, 2013)
154
ou do Crédito Bancário. O custo médio das operações é de 1,5% ao mês, e não são consideradas
como endividamento por parte dos capitalistas.
Para se beneficiar destas duas políticas, os capitalistas devem receber a certificação de
‘Conteúdo Local’, e para atender as necessidades dos capitalistas no tocante ao fornecimento
de serviços e produtos, através do PROMINP, pequenas e médias empresas (a pequena
burguesia) são capacitadas para atuarem com fornecedores, através do programa de
‘Capacitação de Fornecedores e Inserção de MPEs na Cadeia de Valor do Petróleo’. No campo
da superestrutura, o Estado desenvolve programas de formação de pessoal voltado ao setor de
P&G, suprindo a deficiência nacional no tocante à qualificação de mão de obra especializada.
Portanto, o Estado atua na formação de um mercado nacional voltado ao P&G.
Além disto, o PROMINP permite a articulação do Estado através dos entes federativos –
União, Estado e Município – no sentido de dotar as regiões, onde os empreendimentos
capitalistas se instalam, de infraestrutura, a exemplo de sistemas viários. Os recursos
geralmente estão sob a rubrica do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Um exemplo
desta relação ocorre em São Roque do Paraguaçu, onde o Governo do Estado assinou contrato
para construção de infraestrutura ligando a sede do distrito e o povoado de Enseada. Local onde
é erguido o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, conforme observado a seguir:
O governador Jaques Wagner e o [...] Otto Alencar, assinaram ordem de serviço neste
sábado (27/07/2013), em Maragogipe, no Recôncavo baiano, para construção de uma
ponte sobre o Rio Baetantã (Distrito de São Roque do Paraguaçu) e uma via de acesso
à rodovia BA-534, subtrecho Cairu-Enseada.[...] O acesso a sede do distrito de São
Roque do Paraguaçu (Maragogipe), e aos municípios de Nazaré, Salinas da
Margarida, Itaparica e Vera Cruz será facilitado com a construção da ponte, através
do novo acesso à BR-420, além da recuperação de cinco quilômetros da BA-534. A
ordem de serviço para a primeira obra, tem valor de R$ 42,4 milhões, enquanto para
a construção da rodovia serão investidos mais R$ 7,5 milhões. As assinaturas de
autorização ocorreram durante solenidade realizada no canteiro de obras do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu. “Nós vamos fazer ponte, outras estradas complementares,
temos compromisso com a água e com a energia. É um investimento pesado do
governo do Estado, que também viabilizou o terreno para o empreendimento e as
encomendas da Petrobras, que serão atendidas pelo estaleiro”, afirmo Jaques Wagner.
(AUGUSTO, 2013)
Sob a citação, o sociólogo de orientação marxista Claus Offe (1984, p. 123) acerva que
existe uma relação instrumental entre a classe capitalista, e o aparelho estatal, e que o Estado
deve “ser compreendido como o “instrumento” das classes dominantes e por elas manipulado,
de forma a realizar os interesses coletivos de seus membros.”.
Outra Política Pública que beneficiou o EEPSA, foi através do programa de ‘Capacitação
de Fornecedores e Inserção de MPEs na Cadeia de Valor do Petróleo’. Exemplo disto foi evento
155
promovido na sede da SICM, em Salvador, com objetivo de apresentar as oportunidades como
a implantação do Estaleiro para pequenas e micro empresas. Conforme observado a seguir:
As ‘Oportunidades de Negócios no Entorno do Estaleiro’ foram o tema do encontro
promovido nesta terça-feira (04/06/2013) pela Secretaria da Indústria, Comércio e
Mineração do Estado da Bahia (SICM) para discutir as possibilidades econômicas
oferecidas pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEP). [...] Promovido pelo Fórum
Regional Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte do Estado da
Bahia, o evento foi realizado no auditório da secretaria, [...] e reuniu empresários de
vários setores da indústria naval e de serviços. [...] De acordo com informações do
gerente institucional da empresa Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEP), Marcio Cruz,
durante a fase de construção o empreendimento já necessita do serviço de empresas
terceirizadas. Márcio Cruz informou que o estaleiro oferece 19 áreas de atuação para
as terceirizadas, como caldeiraria, soldagem, serviços de tubulação, logística,
transporte de carga, entre outras, além de oportunidades para fornecedores de
hortaliças, frutas e verduras para o preparo dos alimentos para os empregados. (SICM,
2013)
Como observado na citação, o Estado atua através da Política Pública no estímulo a
terceirização de serviços executados pelos capitalistas, portanto atua no fortalecimento do
Capital. Embora não seja objetivo desta pesquisa discorrer sobre os problemas de terceirização
na relação capital/trabalho, o estímulo do Estado a terceirização nas relações capital/trabalho
comprova a tese de Harvey (2012a) de que o processo de acumulação passou por transição,
indo do fordismo para a acumulação flexível. Outra importante contribuição é dada por Claus
Offe (1984, p. 123) ao observar que o Estado não favorece interesses específicos, mas que
“protege e sanciona instituições e relações sociais que, por sua vez, constituem o requisito
institucional para a dominação de classes do capital.”.
Outro benefício da Política Pública do P&G instrumentalizada a favor do EEPSA, é a
política de formação de mão de obra. Em 17 de outubro de 2012, governo da Bahia anunciou a
construção de centros de três centros para formação de mão de obra destinada ao Estaleiro
Enseada do Paraguaçu. O principal centro fica na Base Naval de Aratu, em Salvador; os dois
outros centros ficam em Maragogipe e Nazaré. Os centros de formação surgem a partir da
articulação de várias secretárias do Estado da Bahia, como observado a seguir:
Através de iniciativa da Secretaria da Indústria Naval e Portuária do Estado da Bahia
(SEINP), após articulação com a Secretaria de Trabalho, Emprego, Renda e Esporte
(SETRE) e a Secretaria de Educação (SEC) foram definidos os locais dos primeiros
Centros de Formação de mão de obra para a indústria naval. [...] Os Centros de
Formação serão unidades de ensino com o objetivo de captar a mão de obra dos
municípios ao entorno do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEP) e capacitá-la através
de qualificação profissional (SETRE) e promoção de cursos técnicos (SEC), ambas
na área naval. [...] Objetivo é oferecer às comunidades locais oportunidade de trabalho
no desempenho das funções requeridas pelo empreendimento: “A perspectiva de que
estes Centros de Formação estejam atuando em médio prazo é real e os locais para
seu funcionamento já estão sendo articulados pela nossa Secretaria”, afirmou o
156
Secretário da Indústria Naval e Portuária da Bahia, Carlos Costa, que dirige a pasta
idealizadora do projeto. (SICM, 2012)
Pose-se destacar que ao deslocar o principal centro de formação para a Região
Metropolitana de Salvador (RMS), o Estado privilegiou a população da região, em detrimento
das populações diretamente afetadas pelo empreendimento. Também fica constado que o
EEPSA foi beneficiado pela Política Pública de formação mão deobra pelo Estado.
O Estaleiro também foi beneficiado com a celebração dos contratos de fornecimento junto
a PETROBRAS e a Sete Brasil. Sobre estes aspectos, o jornalista Francisco Góes (2012) expõe
que o EEPSA assinou “carta de intenção com a Sete Brasil para construir seis navios-sonda
utilizados em perfuração de poços de petróleo, em encomenda de US$ 4,8 bilhões.”, e que a
“carta de intenção é um instrumento jurídico que permite à Sete BR e aos seus fornecedores
antecipar etapas para mitigar eventuais atrasos até a assinatura do contrato firme.”.
Com contratos celebrados, os capitalistas puderam levantar os recursos necessários à
construção do Estaleiro, através da ‘Antecipação de Recebíveis’. Os dados constam no Portal
da Transparência61, documento nº 2013OB802426, de 24 de outubro de 2013. No documento é
detalhada a operação que liberou R$ 191.501.228,50 de recursos oriundos do Tesouro Nacional.
Os recursos foram repassados ao Fundo da Marinha Mercante (FMM), que contrata como
agente financeiro a Caixa Econômica Federal. O banco estatal federal repassa os recursos, na
forma de empréstimo, para o Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A. Infere-se que os capitalistas
são beneficiados com significativo volume de recursos públicos, mesmo antes de concluírem o
empreendimento e entregarem os produtos.
Além de empréstimos de longo prazo com juros subsidiados, os capitalistas também foram
beneficiados pelo regime fiscal do programa. A publicação do Diário Oficial da União (DOU)62,
de 6 de dezembro de 2013, expressa o benefício que o Estado concedeu ao EEPSA. No
documento, a Receita Federal do Brasil, através do Ato Declaratório Executivo Nº 18, de 4 de
dezembro de 2013, declara habilitado o Estaleiro Enseada do Paraguaçu S/A a operar o regime
aduaneiro especial de entreposto aduaneiro de bens destinados à pesquisa e lavra de jazidas de
petróleo e gás natural. O benefício fiscal compreende seis contratos estabelecidos em 2012 para
construção de sondas. Os produtos, resultados de contratos celebrados pelos clientes do
Estaleiro – Petrobras e Sete Brasil – serão entregues de 2017 a 2021.
Ver Anexo 8.16 – Portal da Transparência detalha transferência de recursos da União para o Estaleiro Enseada do
Paraguaçu.
62 Ver Anexo 8.17 – Publicação do Diário Oficial da União do Ato Declaratório Executivo Nº 18 da Receita Federal.
61
157
No tópico a seguir, é discorrida a maneira como o Império opera a constituição de uma
ideologia dominante sobre o Estado e de que maneira isto tem reflexo na economia política.
4.9 O IMPÉRIO E A PRESSÃO IDEOLÓGICA ATRAVÉS DA MÍDIA
Analisando a teoria marxista, John Scott (2010, p. 81) observa, segundo a perspectiva de
Antonio Gramsci, que a classe dominante capitalista controla os trabalhadores mediante a
dominação ideológica da sociedade. Na perspectiva Louis Althusser, Scott (2010) infere que a
observação de Gramsci foi aprimorada através do conceito de “Aparelhos Ideológicos de
Estado”, onde a classe dominante atua por meio controle ideológico disseminado através da
religião, educação, sindicatos e meios de comunicação de massa. Outro teórico a trazer
importante contribuição sobre a dominação ideológica obtida através dos meios de
comunicação de massa foi Ralph Miliband (1982):
As agências de comunicação e principalmente os meios de comunicação de massa são
na realidade, não obstante a expressão de concepções dissidentes, um elemento vital
para a legitimação da sociedade capitalista. Isso não significa que a liberdade de
expressão deixa de ter significação. Mas essa liberdade deve ser colocada no contexto
econômico e político real de tais sociedades, e dentro desse contexto a livre expressão
de ideias e opiniões significa, principalmente, a livre expressão de ideias e opiniões
úteis ao sistema vigente de poder e privilégio. (MILIBAND, 1982, p. 267)
John Scott (2010, p. 81) observa que Ralph Miliband analisa o “processo de “doutrinação
conservadora” na sociedade capitalista, e de que maneira os recursos superiores que as
organizações empresariais, em comparação com as dos trabalhadores, podem devotar a essa
tarefa, e as redes pelas quais as empresas influenciam o Estado.”.
O Império pressiona através dos instrumentos de dominação ideológica com objetivo de
determinar que o Estado assuma os pressupostos da economia política do neoliberalismo. Um
dos mais importantes instrumentos de dominação ideológica é a mídia de massa. Exemplo disso
é a matéria publicada pelo jornal estadunidense ‘The Wall Street Jornal’, com o título ‘Duas
Américas Latinas bem diferentes’, redigido pelo jornalista David Luhnow (2014). A matéria
levanta debate sobre os modelos econômicos em curso na América Latina, separando os países
em dois blocos. O primeiro bloco de países é formado pelo Brasil, Argentina e Venezuela, e
tem acesso ao Oceano Atlântico, é um bloco “que desconfia da globalização e dá ao Estado um
grande papel na economia”. O segundo bloco é composto de “países de frente para o Pacífico
como México, Peru, Chile e Colômbia — adota o livre comércio e o mercado livre.”.
Descontado o viés ideológico do jornal, que atua em defesa do liberalismo econômico, o
que se observa é que o Brasil opta, a partir do governo Lula, por um modelo com forte presença
158
do Estado na condução do desenvolvimento econômico e social, atuando com redução da carga
tributária sob certos setores, aporte de capital via bancos oficiais, linhas de crédito de longo
prazo com juros baixos, e ou participando diretamente dos investimentos de longo prazo como
sócio, com a finalidade de ampliar a formação do capital nacional e do emprego formal, com a
finalidade de mitigar as desigualdades sócias. O Estado também passa a atuar na regulação do
capital internacional presente no país, e na formação de grupos capitalistas nacionais com
capacidade de concorrer no mercado global.
Essa postura vai de encontro aos objetivos do Império, que pressionas através da
infraestrutura, via mercado de capitais, diminuído o fluxo de investimentos internacionais; e
através da superestrutura, utilizando a mídia dominante, que repete o mantra da ineficiência das
empresas – públicas, mistas ou privadas construídas com recursos públicos – no processo de
competitividade global. O Império utiliza a superestrutura, classificada como “grande mídia63”,
induzindo a sociedade a acreditar que escolha econômica de um modelo heterodoxo keynesiano
não é a mais adequada para que o país avance no campo da economia política, utilizando
variados instrumentos de persuasão ideológica no sentindo de conduzir a população a aceitar e
pressionar por reformas liberais.
Em brilhante ensaio publicado pelo jornalista e sociólogo Ignácio Ramonet (1995), com
título ‘O pensamento único e os novos senhores do mundo’, é apresentada abordagem crítica a
respeito do obscurantismo e malefícios do que Ramonet (1995) denomina como ‘pensamento
único’. Assim como Hardt e Negri (2009), Ramonet (1995) entende que uma ideologia
dominante a favor do Império passou a ser desenvolvida a partir de 1944, com as conferências
de Bretton Woods, que culminaram com o Acordo Bretton Woods, cuja finalidade de
desenvolver um sistema de gerenciamento econômico internacional, através do estabelecimento
de acordos comerciais e financeiras entre os países industrializados. Com acordo celebrado,
organismos multilaterais a exemplo do Banco Internacional para Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD), Banco Mundial (BM), Fundo Monetário Internacional (FMI), dentre
outros, passavam a regular as ações do Estado com receituário liberal ancorado em empréstimos
financeiros.
63
Sendo a mídia um espaço de "mercado", todos sabemos que o acesso das pessoas é limitado aos interesses da empresa
de comunicação. Só quem tem acesso pleno nessa área da "esfera pública" de que fala Benjamin são os donos dos meios.
No Brasil eles podem ser contados nos dedos: são sete as famílias que comandam os principais veículos de comunicação
do país. No exterior, pelo menos no Ocidente, não muda muito: Um número ainda menor de agências de notícias decidem
o que é notícia e entopem as redações do mundo todo com a visão do seu próprio mundo. Certamente é um mundo
democrático, desde que se entenda por democracia "o direito pleno de uns" e não o pleno direito de todos. (CAMPOS,
2013, p. 4)
159
Com o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945, é criada a Organização das Nações
Unidas (ONU). A entidade reuniu países com ideologias distintas, capitalismo e comunismo,
mas adota viés liberal do capitalismo, o principal arcabouço ideológico é sintetizado na Carta
da ONU (1945, p. 3 e 4), que dentre outras questões, objetiva: “Estabelecer condições sob as
quais a justiça e o respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes do direito
internacional possam ser mantidos. [...] empregar um mecanismo internacional para promover
o progresso econômico e social de todos os povos.”. Ou seja, os Estados que assinaram a Carta
da ONU (1945) abdicaram da autonomia enquanto nações, com a finalidade de participar do
progresso econômico e social prometido pela entidade, ou seja, pelo capitalismo. Na hierarquia
dos atos verbais, fica evidente que o progresso social será alcançado através dos meios
econômicos, através do respeitos aos contratos celebrados.
Ramonet (1995) destaca que episódios do final do século XX, como a queda do Muro de
Berlim, a derrubada dos regimes comunistas no Leste Europeu e a desmoralização do
socialismo, levaram a doutrina do ‘pensamento único’ a ser qualificada como “novo furor
ideológico de dogmatismo moderno”. Na citação a seguir, Ramonet (1995) expressa o conceito
do ‘pensamento único’ da nova ordem econômica:
O que é o pensamento único? A tradução em termos ideológicos de pretensão
universal dos interesses de um conjunto de forças econômicas, particularmente as do
capitalismo internacional. [...] mediante financiamento, colocam a maior parte dos
centros de investigação, universidades e fundações a serviço de suas ideias em todo o
planeta. Estes se afinam com o dogma e se encarregam de propagar a boa nova. [...]
Esta é recolhida e reproduzida pelos principais órgãos de informação econômica e
principalmente pelas bíblias dos investidores e especuladores da Bolsa de Valores The Wall Street Journal, The Financial Times, The Economist, Far Eastern Economic
Reveiw, Agência Reuter, etc. - que, não por acaso, são de propriedade de grandes
grupos industriais ou financeiros. Em quase todos os lugares do planeta, faculdades
de ciências econômicas, jornalistas, ensaístas e políticos, examinam cuidadosamente
os principais mandamentos destas novas tábuas da lei e, usando como caixas de
ressonância os meios de comunicação de massas, que os reiteram até a saciedade
sabendo a ciência certa que, em nossa sociedade midiática, repetição vale por
demonstração. [...] O primeiro princípio do pensamento único: [...] o econômico prima
sobre o político. [...] Os outros conceitos-chave do pensamento único são conhecidos:
o mercado, cuja mão invisível corrige as asperezas e disfunções do capitalismo e,
muito especialmente, os mercados financeiros, cujos signos orientam e determinam o
movimento geral da economia; a competência e a competitividade que estimulam e
dinamizam as empresas levando-as a uma permanente e benéfica modernização; o
livre intercâmbio sem limites, fator de desenvolvimento ininterrupto do comércio e,
por conseguinte, da sociedade; a mundialização, tanto da produção manufatureira
como dos fluxos financeiros; a divisão internacional do trabalho que modera as
reivindicações sindicais e barateia os custos salariais; a moeda forte, fator de
estabilização; a desregulamentação; as privatizações; a liberalização; etc. Cada vez
menos Estado, uma arbitragem constante a favor dos ingressos de capital em
detrimento daqueles do trabalho. E uma indiferença a respeito dos custos ecológicos.
[...] A repetição constante, em todos os meios de comunicação, deste catecismo por
parte dos jornalistas de reverência e de praticamente todos os políticos, de direita
160
como os alegadamente “de esquerda”, confere a esta ideologia uma força de
intimidação tão grande que afoga toda a tentativa de reflexão livre e torna muito difícil
a resistência contra este novo obscurantismo. (RAMONET, 1995, p. 4-6)
O que Ramonet (1995) alerta é para a pressão ideológica exercida pelo Império através dos
mais distintos meios – da academia, aos meios de comunicação – torna inescapável a
convergência ideológica para a aceitação da doutrina neoliberal por parte da massa. Neste
aspecto é necessário densa crítica ao ‘pensamento único’.
Os conceitos expressos por Ignácio Ramonet (1995) também explicam o conjunto de
publicações positivas feitas pela mídia sobre o processo de implantação do Estaleiro Enseada
do Paraguaçu. Observa-se que praticamente inexistem publicações midiáticas que revelem os
conflitos estabelecidos junto à comunidade.
A DOMINAÇÃO IDEOLÓGICA DO CAPITAL
Retornando a análise da matéria de David Luhnow (2014), a dominação ideológica que o
Império exerce sobre o Brasil fica evidente quando observada outra passagem: “Economistas
dizem que os países da América Latina, que adotam o livre comércio, estão mais preparados
para crescer, registram maiores ganhos de produtividade e suas economias abertas têm mais
chances de atrair investimentos.”, ou seja, é como se todos os economistas fossem unânimes
em defender o neoliberalismo como a melhor forma de desenvolvimento socioeconômico. Algo
bem distante do necessário e permanente debate que ocorre na academia e nos meios
tecnocráticos sobre o modelo e processo de desenvolvimento adequado ao Estado.
Sobre este aspecto, José G. B. Filomeno (2012, p. 206), no ‘Manual de teoria geral do
Estado e ciência política’, citando Claus Offe, expressa que a diminuição progressiva e
exagerada do Estado pode ser um risco para a democracia. Offe considera a diminuição do
Estado pela diminuição do Estado um dogma, assim como a defesa cega do estatismo,
afirmando: “um Estado bom não é um Estado pequeno, mas aquele que atende com mais
eficiência aos anseios dos cidadãos.”. Ele afirma também que “o neoliberalismo quer um Estado
que interfira quase nada na economia e, se possível, cobre pouco imposto.”.
Analisando o conjunto de publicações veiculadas pela mídia, sobre o processo de
implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, conclui-se que o ‘pensamento único’ torna-se
práxis, não sendo narrados pela imprensa os conflitos subjacentes da ação capitalista, junto as
comunidades afetadas pelo empreendimento. Também não são narrados os descumprimentos
das condicionantes definidas para o empreendimento. Quando falha ocorre, o primeiro a ser
161
responsabilizado é o Estado. Os capitalistas figuram como o bom moço em filme de cowboy
americano, ‘mata vários índios e salva a donzela branca’. Ou seja, reificam um comportamento
que distancia o indivíduo da capacidade crítica. Não porque as pessoas não sejam como os
índios assassinados (os proletários), mas porque a doutrina do ‘pensamento único’ conduz a
acreditarem que são como os cowboy (capitalistas). A ilusão criada na mente das pessoas,
funciona através dos inúmeros véus controlados que conformam ‘os aparelhos ideológicos do
Estado’. Nos ensina Ramonet (1995, p. 4-6), sobre o ‘pensamento único’ como a “pretensão
universal dos interesses de um conjunto de forças econômicas, particularmente as do
capitalismo internacional.”, que agem mediante financiamento, colocando a serviço do Império
a maior parte dos centros de investigação, universidades e fundações a serviço de suas ideias
em todo o planeta”. Não apenas a mídia reifica o sistema capitalista, mas todo o sistema
ideológico atua neste sentido.
Observando a dimensão filosófica do fenômeno, infere-se que é necessária uma alteridade,
uma nova organização social, que dê conta de promover o bem-comum, e que conduza a novos
estágios de desenvolvimento social, em harmonia com a natureza, por isso, de certa maneira,
os seres humanos da contemporaneidade se tornaram os personagens da caverna de Platão:
Agora imagina a maneira como segue o Estado da nossa natureza relativamente à
instrução e à ignorância. Imagina homens numa morada subterrânea, em forma de
caverna, com uma entrada aberta à luz; esses homens estão aí desde a infância, de
pernas e pescoço acorrentadas, de modo que não podem mexer-se nem ver senão o
que está diante deles, pois as correntes os impedem de voltar a cabeça; a luz chegalhes de uma fogueira acesa numa colina que se ergue por detrás deles; entre o fogo e
os prisioneiros passa uma estrada ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está
construída um pequeno muro, semelhante às divisórias que os apresentadores de
títeres armam diante de si e por cima das quais exibem as suas maravilhas. (PLATÂO,
1997, p. 266)
Analisando a citação de Platão (1997), observa-se que o sistema capitalista molda a nossa
visão de mundo e nos impede de enxergar novas possibilidades de organização e
desenvolvimento humano. Este sistema tornou-se a caverna e as correntes do homem moderno,
ele molda com intensidade a visão do homem, conduzindo-o a enxergar apenas as sombras do
mundo em que vive.
No próximo tópico é realizada uma análise comparativa sobre os dois sistemas de economia
política adotados no Brasil, no final do século XX e início do século XXI. A análise comparativa
toma como base o Gini, e o Índice de Desenvolvimento humano (IDH).
162
4.10 A EVOLUÇÃO DO GINI
Esses dois modelos se alternaram ao longo da história democrática do país. Mas,
comparando o processo de distribuição de renda, a evolução positiva do índice Gini durante o
governo Lula aponta para aspectos positivos no processo de distribuição de renda, com lenta
redução das desigualdades sociais, conforme dados expressos no gráfico a seguir:
Gráfico 4 – Evolução do Gini no Brasil no período de 1995 a 2009.
Fonte: IPEA (2010, p. 4)
Analisando o Gráfico 4, pode-se inferir que durante o governo neoliberal de FHC, a
progressão da distribuição de renda do Brasil foi desprezível, começando em 1995 com 0.597
pontos; alcançando em 2002, 0.592, variando apenas 0.005 pontos no avanço da distribuição
de renda do país, mantendo, praticamente, inalterada a desigualdade social, e com isso
registrando baixos níveis de inclusão social.
163
Durante o governo Lula o índice Gini começa com 0.592, e avança em 2010 para 0.538,
resultando em uma melhoria da distribuição de renda de 0,054 pontos. Ou seja, comparado com
o governo FHC, e levando em consideração o índice Gini, o governo Lula conseguiu distribuir
onze vezes mais riqueza.
Embora os números do governo Lula representem um avanço significativo quando
comparados com o antecessor, uma política econômica com traços conservadores, aliada a um
reformismo gradual, impede significativos saltos no processo melhoria nos indicadores de
desigualdade social do país.
Desta análise decorre a seguinte conclusão – o avanço do processo de industrialização do
país não provocará ganhos sociais significativos se, concomitantemente, não forem realizadas
políticas sociais de significativo alcance, que visem a inclusão do subproletariado no processo
de geração de riqueza do país.
O subproletariado é detentor de saberes populares e tem maior dificuldade de se apropriar
dos ganhos sociais inerentes a expansão capitalista nos territórios por eles ocupados. Isso
decorre por diversos fatores, dos quais três se destacam:
a) Baixo índice de educação formal, o que os impede o subproletariado de ser inserido
nas modernas indústrias capitalistas, e os mantém subordinados passivamente a
uma ideologia dominante;
b) A pouca eficiência do Estado em prover o subproletariado dos necessários serviços,
além de empoderar (no conceito de Empowerment) através da educação formal, ou
através de processos comunicacionais efetivos, no sentido de desenvolver um censo
crítico mais avançado, e uma consciência social mais ampla sobre os próprios
direitos sociais; e
c) O interesse dos capitalistas em manter a reserva do subproletariado, como forma de
controlar as pressões salariais do proletariado. Auferido elevadas taxas de maisvalia.
Estes elementos operam no campo da infraestrutura e da superestrutura de forma
coordenada. O que explica, em parte, a manutenção de ganhos sociais pouco expressivos do
subproletariado. O componente ideológico da superestrutura do neoliberalismo atua no sentido
de manter o status quo. Mesmo observado que a pressão ideologia exercida pelo Império,
através da grande mídia, para que o país adote o receituário neoliberal persista, os ganhos
164
sociais do modelo das políticas econômicas dos governos Lula e Rousseff apresentam melhores
resultados para o perfil socioeconômico do país. É necessário um aprofundamento do
protagonismo social do Estado e uma regulação ainda mais intensa no sentido de corrigir a
elevada concentração de renda do país, isso resula na aceleração dos ganhos sociais com
substantiva diminuição da desigualdade social. A persistir o atual modelo, pode-se inferir que
a distribuição de renda medida pelo Gini permanecerá em queda, porém, os níveis de
desigualdade social permanecerão elevados.
O Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH – 2011), apresentado pelo Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), indica que em 2011, o Brasil passou a ocupar
a 84ª posição entre 187 países avaliados. A taxa média de crescimento do IDH do Brasil foi de
0,87%, entre 1980 a 2011. Um desempenho superior ao da América Latina (0,73%) e ao dos
países de alto desenvolvimento (0,61%). Avanço semelhante pode ser visto para o Brasil entre
1990 e 2011, quando a taxa de média de crescimento do IDH foi de 0,86%, enquanto a da
América Latina foi de 0,76% e a dos países com alto desenvolvimento foi de 0,64%. (PNUD,
2011)
Embora os números do PNUD indiquem média de crescimento em 0,87%, para o período
de três décadas (1980 a 2011), a posição do Brasil no contexto global, com a 84ª posição,
quando confrontado com a geração de riqueza, onde o país ocupa a 6º posição no ranking global,
alcançando em 2012, segundo Banco Mundial (2014), Produto Interno Bruto (PIB) de UD$
2,253 trilhão, apontam para a significativa concentração de renda com elevada desigualdade
social, além de expressarem que os indicadores possuem baixa evolução, no transcorrer do
tempo. Outro aspecto observado é que o descompasso entre posição do IDH e PIB evidenciam
o desafio do Estado em promover melhor distribuição renda com significativa redução da
desigualdade.
Como observado anteriormente, a política neoliberal acentua as diferenças sociais. A
experiência neoliberal adotada nos Estados Unidos da América (EUA) a partir do governo
Ronald Reagan (20 de janeiro de 1981-20 de janeiro de 1989), aumentou a concentração de
renda do país, elevando o contingente de pobres, no período de 1980 a 2010. O dado é apontado
no documentário estadunidense ‘Trabalho interno’ (Inside Job, 2010). Dirigido por Charles
Ferguson, o documentário aborda a crise de 2008 nos Estados Unidos, e os reflexos na
economia global, tendo como reflexo a precarização do emprego, e o aumento da exploração
da classe trabalhadora. Outro dado revelado é como a academia, o governo e o setor financeiro
165
estadunidense atuaram em conjunto no sentido de criar um dos maiores movimentos
especulativos desde a crise de 1930. O documentário serve de alerta para o que Claus Offe
(1984) classifica como o perigo do excesso de desregulamentação do Estado.
No próximo tópico são revistos os principais aspectos abordados neste capítulo, e de que
maneira eles se relacionam com o processo de implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
4.11 CAPITALISMO, DOMINAÇÃO IDEOLÓGICA E DESENVOLVIMENTO HUMANO
NO BRASIL
É observado que o Estado brasileiro alternou, ao longo do processo de desenvolvimento
capitalistas, entre políticas ortodoxas, e heterodoxas keynesianas com maior participação e
regulação do Estado. Foi observado, também, que o Império pressiona para que o Estado adote
o neoliberalismo, não apenas na dimensão da infraestrutura, como da superestrutura, onde se
desenvolve a ideologia dominante, local onde o Império tenta constituir-se como verdadeiro
maná para a fome do mundo.
Ao observar a trajetória do capital, no Brasil, pode-se constatar que ele apoia-se no Estado
para se expandir. Em determinados momentos, o Estado atua com protagonismo, a exemplo
dos governos Vargas e Lula e, em outras momentos o Império passa a atuar através do capital
internacional, durante o governo Juscelino Kubitschek (31 de janeiro de 1956 – 31 de janeiro
de 1961); através do capital financeiro, durante a Ditadura Militar (1º de abril de 1964 – 15 de
março de 1985) e durante o processo de redemocratização, com os governos Sarney, Collor e
Itamar; por meio de uma mescla entre capital industrial, internacional e financeiro, durante o
governo FHC.
Foi verificado também, que o Império mantém uma constante pressão ideológica sob os
Estados Nacionais. Esses Estados buscam através da regulamentação e de políticas fiscais e
financeiras contrapor o poder do Império e da doutrina neoliberal. Foi discorrido que na
primeira década do século XXI, o Estado brasileiro adotou conjunto de políticas com objetivo
de desenvolver a cadeia de valor do petróleo e gás, e que essa política culminou com o
surgimento de novos empreendimentos capitalistas nacionais, a exemplo do Estaleiro Enseada
do Paraguaçu.
Ficou demonstrando como empreendimentos capitalistas, como o EEPSA utilizam as
políticas públicas para se constituírem, e como o Estado promove as inversões de capital a favor
166
dos capitalistas, via transferências de recursos públicos: por meio de bancos estatais, políticas
fiscais específicas, investimentos em infraestrutura e formação de mão-de-obra.
Por fim, as análises do Gini e IDH confirmaram que as políticas adotadas na primeira
década do século XXI, durante o governo Lula, resultaram em maior distribuição de renda.
Mas, observados os indicadores de desigualdade social64, verifica-se que ocorreu queda pouco
significativa. Ou seja, embora tenha ocorrido uma maior distribuição de renda no país, os
indicadores de concentração de renda permanecem elevados, acarretando um quadro pouco
evolutivo no quesito desigualdade social.
No próximo capítulo são apresentados os atores – Estado, Capitalistas e a comunidade de
São Roque do Paraguaçu – e de que maneira é estabelecida a dialética. São apresentados os
dados e documentos levantados na pesquisa de campo e na pesquisa documental, concernentes
ao cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e ao Programa de Comunicação Social.
Observando o conjunto de dados, é analisado se os objetivos previstos no Programa de
Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida
Mitigadora nº 40, e se a condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o
Programa de Comunicação Social foi atendida, e em que extensão isto ocorre.
64
Em 2011, o IDH brasileiro chegou a 0,718 ponto, valor 0,003 ponto superior ao de 2010. O desempenho fez o país
ultrapassar a nação caribenha de São Vicente e Granadinas e alcançar a 84ª posição entre 187 países. [...] Na América do
Sul, o Brasil obteve um índice superior aos da Colômbia (0,710), Suriname (0,680), Paraguai (0,665), Bolívia (0,663) e
Guiana (0,633). Já Chile (0,805), Argentina (0,797) – ambos na categoria de IDH muito elevado –, Uruguai (0,783),
Venezuela (0,735), Peru (0,725) e Equador (0,720) ficaram à frente do Brasil. (FALLET, 2011)
167
5 A DIALÉTICA ESTABELECIDA ENTRE ESTADO, CAPITALISTAS E A
COMUNIDADE DE SÃO ROQUE DO PARAGUAÇU
“Alguém pode pensar numa maior acusação para um
sistema de produção econômica e reprodução social
pretensamente insuperável do que essa: no auge de seu poder
produtivo, está produzindo uma crise alimentar global e o
sofrimento decorrente das incontáveis milhões de pessoas por
todo o mundo”. (MÉSZÁROS, 2011a, p. 21)
Neste capítulo é revisto o conceito do Estado como indutor do desenvolvimento de forças
produtivas, e a política pública para o setor de petróleo e gás. É demonstrado como o governo
da Bahia opera para materializar o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, e de que maneira este
processo estabelece uma dialética com a comunidade de São Roque do Paraguaçu. É examinado
como ocorre o processo de licenciamento do empreendimento através da análise da audiência
pública promovida junto à comunidade. Tomando por base estes elementos, é avaliado como o
Estado desenvolve o EIA/RIMA (2009), estabelecendo a Medida Mitigadora nº 40, o Programa
de Comunicação Social.
Na sequência é apresentado o processo histórico de fundação do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu S/A, bem como a composição acionário do empreendimento, os clientes e objetivos
do empreendimento. É revista a visita da Presidente da República, Dilma Rousseff, e o papel
do Estado na criação do empreendimento. São apresentados os dados levantados na pesquisa,
concernentes ao cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e ao Programa de Comunicação
Social. É avaliado como a implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu entra em dialética
com a comunidade. Observando os dados, é analisado se os objetivos previstos no Programa de
Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se cumpriram a Medida
Mitigadora nº 40, e se a condicionante da Licença de Instalação nº 737/2010 que estabelece o
Programa de Comunicação Social foi atendida, e em que extensão isto ocorre.
Outro ponto abordado neste capítulo é com relação a dialética estabelecida entre a
comunidade de São Roque do Paraguaçu, o Estado, e os capitalistas, observando como ocorre
a atuação do Estado e dos capitalistas a partir da perspectiva da comunidade. Neste processo,
são apresentados os dados e documentos levantados na pesquisa de campo, e na pesquisa
documental sobre a Medida Mitigadora nº 40 e o Programa de Comunicação Social.
168
É realizado um retorno ao papel do Estado, com objetivo de avaliar se o Estado
acompanhou, documentou e fiscalizou o processo de implantação e operação do Estaleiro,
tomando como base o conjunto de Leis, medidas e condicionantes estabelecidas no EIA/RIMA
(2009) e na Licença de Instalação Nº 737/2010.
O capítulo é finalizado com a análise da supremacia do Império através da dialética da
superexploração e degradação ambiental, concluindo se os objetivos previstos no Programa de
Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram atendidos, se a Medida Mitigadora nº 40 foi
implementada, e se a condicionante da Licença de Instalação Nº 737/2010 que estabelece o PCS
foi cumprida.
5.1 A DIALÉTICA DO ESTADO
Neste tópico é revisto o conceito de Estado como agente indutor do desenvolvimento, e de
que maneira está atuação conduz ao desenvolvimento da política pública para a cadeia de valor
do petróleo e gás. Apropriando-se desta política pública, é observado como o Estado da Bahia
desenvolve a política para o setor da construção naval, permitindo que empreendimentos como
o Estaleiro Enseada do Paraguaçu se materializem.
Analisando a tomada de posição do Estado, é observado como o conjunto de medidas
afetam a vida da comunidade, e de que maneira a dialética é estabelecida, também é analisado
como ocorre a articulação entre as forças produtivas, que conformam o Estaleiro Enseada do
Paraguaçu; e as relações sociais de produção, estabelecidas na comunidade de São Roque do
Paraguaçu. São examinados os seguintes documentos: audiência pública, envolvendo os atores
– Estado e a comunidade, o Parecer Técnico (042/2010), o EIA/RIMA (2009), e o Programa de
Comunicação Social estabelecido no EIA/RIMA (2009).
Observando como se caracteriza o processo de licenciamento do empreendimento, é feita
uma síntese do conjunto de prescrições do Programa de Comunicação Social previsto no
EIA/RIMA (2009). O tópico é concluso com a avaliação do Estado no processo de reificação
do Império, e na manutenção das comunidades tradicionais como subproletariado e
superexploradas.
169
5.1.1 O ESTADO COMO INDUTOR DO DESENVOLVIMENTO
Com base em Karl Marx, Norberto Bobbio (1986) observa que o Estado é o ordenamento
político de uma comunidade, e nasce da dissolução da comunidade primitiva fundada sobre os
laços de parentesco, e da formação de comunidades mais amplas, derivadas da união de vários
grupos familiares por razões de sobrevivência interna (o sustento) e externas (a defesa), esse
movimento assinala o início da era moderna. Com o fim da propriedade primitiva comunal,
nasce a propriedade privada, individual. Bobbio (1986) expressa que com o nascimento da
propriedade individual nasce a divisão do trabalho e, com a divisão do trabalho, a sociedade se
divide em classes, na classe dos proprietários e na classe dos que nada têm; com a divisão da
sociedade em classe nasce o poder político, o Estado, cuja função é, essencialmente, a de manter
o domínio de uma classe sobre outra recorrendo inclusive à força, e assim a de impedir que a
sociedade dividida em classes, e se transforme num Estado de permanente anarquia.
Igualmente inspirado, Tom Bottomore (2012) explica que o Estado é a instituição que,
acima de todas as outras, tem a função de assegurar e conservar a dominação e a exploração de
classe, e que a despeito das disposições ideológicas e políticas daqueles que dirigem o Estado,
os políticos, devem forçosamente assegurar a acumulação e a reprodução do capital. Também
expressa que o Estado está subordinado e limitado por forças e pressões que lhe são externas.
Norberto Bobbio (1986) assinala que na teoria marxiana o poder principal é o econômico, na
medida em que as ideologias e as instituições políticas têm a função de garantir a persistência
de determinadas relações de produção.
Nicos Poulantzas (2000, p. 24) infere que a ligação do Estado com as relações de produção
constitui a primeira relação do Estado com as classes sociais e a luta de classes. No que tange
o “Estado capitalista, a separação relativa das relações criadas pelas relações de produção
constitui o fundamento organizacional de sua ossatura orgânica e revela sua ligação com as
classes sociais e a luta de classes sob o capitalismo.”. Segundo Poulantzas (2000):
O processo de produção é fundamentado na unidade do processo de trabalho e nas
relações de produção (elas mesmas incluindo uma dupla relação — a de propriedade
econômica e a de posse). Esta unidade é realizada pelo primado das relações de
produção sobre o processo de trabalho, frequentemente chamado de “forças
produtivas”, incluindo a tecnologia e o processo técnico. Contrariamente ao
economicismo tradicional que leva diretamente ao tecnicismo e que vê apenas nas
relações de produção a simples cristalização-envoltório-reflexo de um processo
tecnológico das forças produtivas como tais (assim, sendo importante na origem do
processo de produção a concepção das relações entre base e superestrutura reflexo), é
o primado das relações de produção sobre as forças produtivas que dá à sua articulação
a forma de processo de produção e de reprodução. Embora as forças produtivas
possuam uma materialidade própria que não se pode ignorar, elas se organizam,
170
contudo, segundo relações de produção dadas (o que não exclui nem as contradições
entre elas, nem seu desenvolvimento desigual no seio de um processo que é
consequência deste primado). Não é a passagem do moinho a vento ao moinho a vapor
que explica a passagem do feudalismo ao capitalismo. Toda obra de Marx o comprova,
apesar das ambiguidades que contém, fruto da influência da ideologia do progresso
técnico da filosofia Iluminista, que o acompanha até nos trabalhos de sua maturidade.
(POULANTZAS, 2000, p. 24-25)
Observa-se que Nicos Poulantzas (2000) analisa a relação do Estado com o sistema
produtivo como algo imanente ao próprio Estado burguês. Ele também afirma que no sistema
capitalista ocorre o primado das relações de produção sobre as forças produtivas.
Nilson Weisheimer (2008, p. 167) explica que “o processo de trabalho65 resulta da
articulação entre as forças produtivas e as relações sociais de produção. A noção de forças
produtivas corresponde aos fatores necessários à produção, como o trabalho e os meios de
produção66.”.
5.1.2 O ESTADO NACIONAL E A POLÍTICA PÚBLICA PARA O PETRÓLEO E GÁS
O Estado brasileiro que emergiu da dissolução da sociedade escravagista, na irrefreável
marcha capitalista atua no sentido de desenvolver forças produtivas, e com essa vocação, atende
o primado do interesse da classe social dominante, assegurando e conservando a dominação e
a exploração de classe. Esse fenômeno adquire práxis com o desenvolvimento da Política
Pública para a cadeia de valor do Petróleo e Gás (P&G), inscrevendo na própria Constituição
Federal a possibilidade de capitalistas participarem da exploração dos recursos minerais. Ou
seja, o Estado atua na infraestrutura constituindo base material para o desenvolvimento de
forças produtivas, ao mesmo tempo em que apresenta, na superestrutura, o marco legal que
justifica a ação.
Paulo Lima (2009) explica que através do marco legal para o P&G, estabelecido na
Constituição Federal de 1988 (CF/88), o aproveitamento do petróleo, do gás natural e dos
minerais nucleares, conforme disposto no § 1º do art. 177, impedia qualquer cessão ou
concessão por parte da União de qualquer atividade do setor petrolífero, à exceção das
atividades de distribuição. O monopólio da União era exercido, exclusivamente, pela
PETROBRAS, nos termos da Lei nº 2.004, de 3 de outubro de 1953. Mas, a Emenda
65
Por trabalho, Marx refere-se à atividade concreta, o trabalho vivo realizado pela força de trabalho humana e que é a
fonte criadora de valor, e é também em sentido abstrato, como trabalho geral socialmente realizado. (WEISHEIMER,
2008, p. 167)
66 Por meios de produção, entende-se todo o instrumento de trabalho e todos os recursos necessários à sua realização. São
exemplos de meios de produção: a terra, as fábricas, as máquinas, as tecnologias e as fontes de energia usadas na produção
de mercadorias. (WEISHEIMER, 2008, p. 167)
171
Constitucional nº 9, de 9 de novembro de 1995, flexibilizou o monopólio da União, e introduziu
a possibilidade da União contratar empresas estatais ou privadas, para exploração e a produção
de petróleo e gás natural.
Com a quebra do monopólio estatal do P&G, em 1997, o Estado passou a atuar através de
política públicas com objetivo de estimular a participação de capitalistas, mediante contratos
de concessão precedidos de licitação realizada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural
e Biocombustíveis (ANP). No tocante a cadeia de valor P&G, o Estado estabelece, através de
contrato, limites mínimos de ‘conteúdo nacional’ para a utilização de equipamentos, com
objetivo de estimular o desenvolvimento da cadeia de valor, e com isto, estimular a expansão
capitalista no segmento.
Dentre os setores estimulados, encontra-se a indústria naval. Um estudo publicado pelo
BNDES (LAGE, 2012), em comemoração aos 60 anos de atividade do banco de fomento
federal, são apresentados dados sobre o setor, o capítulo de autoria de Priscila Branquinho das
Dores, Elisa Salomão Lage, e Lucas Duarte Processi, com título ‘A retomada da indústria naval
brasileira’ destaca o período de estagnação pelo qual passou a indústria nacional naval, e de que
maneira foram implementadas políticas públicas para estimular a retomada do setor.
Dores, Lage, e Processi (2012, p. 278-279) explicam que a crise econômica mundial dos
anos 1980 e a abertura da economia à concorrência estrangeira na década de 1990 levaram a
indústria naval nacional a crise financeira, restringindo a capacidade de investimento. “O que
resultou em um parque fabril com relevante defasagem tecnológica perante os produtores
mundiais de embarcações, o que provocou a estagnação da produção naval brasileira por cerca
de vinte anos.”.
As políticas públicas adotadas a partir de 1997 e incrementadas na década seguinte, a partir
de 2002, impulsionadas pela descoberta do pré-sal em 2007, permitiu o setor de construção
naval brasileira retomar os investimentos, com reflexos na expansão e modernização da
capacidade produtiva e no aumento da produção de embarcações para atividades petrolíferas
offshore67. Os contratos expressavam que os equipamentos utilizados na cadeia de valor do
P&G, deveria atender ao critério de ‘conteúdo local’, e os navios e sondas petrolíferas se
encaixavam neste perfil. Aliado a este fenômeno, a frota naval da PETROBRAS apresenta
defasagem tecnológica e necessitava de renovação. As encomendas do setor impulsionaram a
Offshore – Palavra de origem Inglesa que expressa à parte da indústria do petróleo que compreende a prospecção,
perfuração e a exploração dos jazigos situados ao largo da costa.
67
172
indústria nacional. (BAIN & COMPANY E TOZZINI FREIRE ADVOGADOS, 2009, p. 306309)
Conforme assinala Dores, Lage, e Processi (2012, p. 275) “as empresas de petróleo e gás
efetuaram grandes encomendas aos estaleiros nacionais, enquanto a União atuou, entre outros,
com exigências de percentual mínimo de conteúdo local nas atividades de exploração e
produção e com a criação de um fundo garantidor à indústria.”. Dores, Lage, e Processi (2012)
relatam que em 1999 foi lançado o Programa de Renovação da Frota de Apoio Marítimo I
(PROREFAM I) pela PETROBRAS, oportunidade em que foram realizados contratos de
afretamento de oito anos para 22 embarcações, a serem construídas no país. Desde o lançamento
do programa até março de 2012, foram contratadas 105 embarcações de apoio marítimo. As
encomendas da Petrobras foram contratadas, principalmente, dos estaleiros Navship, STXNiterói e Wilson Sons.
A maior parte das embarcações foram ou estão sendo construídas com o apoio do BNDES,
que atua como agente financeiro de recursos do FMM para o capitalista contratante. Dores,
Lage, e Processi (2012) destacam que entre 2000, e abril de 2012, o banco federal desembolsou
cerca de R$ 5,5 bilhões nessas operações. Com relação à frota destinada a movimentação de
cargas, os incentivos se deram, principalmente por intermédio da TRANSPETRO, que lançou
nos anos de 2005 e 2008, os Programas de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro I
e II (PROMEF I e II), contratando a construção de 49 navios-tanque em estaleiros nacionais.
Outro setor naval incentivado, explicam Dores, Lage, e Processi (2012), foi o segmento de
plataformas de produção e navios-sonda. A PETROBRAS realizou, nos últimos anos, licitações
para a construção parcial ou total de 40 plataformas. As plataformas foram licitadas de forma
dispersa, e com características distintas, de acordo com cada campo. Com relação as sondas,
foi adotada uma política diferenciada, com concentração de licitações, cuja finalidade é criar
demanda em escala capaz de viabilizar investimentos em novos estaleiros. Nesse processo é
que são contratados os estaleiros Atlântico Sul, Rio Grande, Brasfels, Jurong, Mauá e Enseada
do Paraguaçu.
5.1.3 O ESTADO DA BAHIA E A POLÍTICA PÚBLICA PARA O SETOR NAVAL
Com objetivo de materializar a política pública federal, no âmbito do Estado da Bahia, o
governo estadual desenvolve uma política que se ajuste as necessidades, deficiências e
vantagens competitivas da Bahia, com a finalidade de atrair capitalistas a investir no setor. Com
173
essa finalidade, o governo da Bahia implementou o Programa Estadual de Incentivos à Indústria
de Construção Naval (PRONAVAL), e aderiu ao Regime Aduaneiro Especial de Exportação e
Importação (REPETRO). O PRONAVAL foi criado durante o governo Paulo Souto, através da
sansão a Lei Estadual Nº 9.829 de 28 de novembro de 2005. A Lei Estadual foi regulamentada
durante o governo Jaques Wagner, através do Decreto Nº 11.015, de 22 de abril de 2008.
(GOVERNO DA BAHIA, 2012, p. 24)
O artigo 1º da Lei Estadual nº 9.829/1985, que institui o PRONAVAL define como objetivo
promover o desenvolvimento do setor naval da economia baiana, “por meio de incentivos à
implantação de infraestrutura de construção naval e à montagem, fabricação, construção,
modernização, conversão e reparo de embarcações e plataformas, módulos e sistemas
destinados à exploração, produção, armazenamento e transporte de petróleo, gás natural e seus
derivados.”. (Lei Estadual nº 9.829/1985)
No Decreto Estadual Nº 11.015/1985 são detalhadas as finalidades do Programa Estadual
de Incentivos à Indústria de Construção Naval: promover o desenvolvimento do setor de
construção naval no Estado da Bahia; incentivar a implantação de infraestrutura deste
segmento; incentivar a montagem, fabricação, construção, modernização, conversão e reparo
de – embarcações, plataformas, módulos e sistemas destinados à exploração, produção,
armazenamento e transporte de petróleo, gás natural e derivados.
O Capítulo II do Decreto Estadual Nº 11.015/1985 estabelece como beneficiários do
programa “os contribuintes que desenvolvam atividades voltadas para implantação de
infraestrutura de construção naval e à montagem, fabricação, construção, modernização,
conversão e reparo de embarcações e de plataformas, módulos e sistemas destinados à
exploração, produção, armazenamento e transporte de petróleo, gás natural e seus derivados,
que atendam às exigências contidas neste Regulamento e em Resolução do Conselho
Deliberativo do DESENVOLVE68 que deferir a habilitação”. (DECRETO ESTADUAL Nº
11.015/1985)
O Capítulo III do Decreto Estadual Nº 11.015/1985 estabelece incentivos fiscais, seção e
dilação de prazo de 72 meses para o pagamento de 98% do saldo devedor mensal do ICMS,
relativo às operações próprias, gerado em razão dos investimentos dos projetos aprovados pelo
68
O Programa de Desenvolvimento Industrial e de Integração Econômica do Estado da Bahia (DESENVOLVE) foi
instituído pela Lei nº 7.980, de 12 de dezembro de 2001; e regulamentado pelo Decreto Nº 8.205, de 03 de abril de 2002.
(DOE/BA de 04 de abril de 2002)
174
DESENVOLVE. Foi dispensado de pagamento de ICMS as operações com “concreto, cimento,
aço e bens do ativo destinados à construção e reparo de dique seco e outras edificações por
empresa habilitada ao PRONAVAL”. (DECRETO ESTADUAL Nº 11.015/1985)
Além dos incentivos citados, o Governo da Bahia (SICM, 2014) aponta como vantagem
competitiva para que os capitalistas instalem as empresas no Estado, a disponibilidade de áreas
costeiras com condições físicas adequadas para a atividade naval, dispondo de 1.188 km de
litoral navegável e a maior baía tropical do mundo; tradição no setor naval; mão de obra
qualificada; tecnologia em processos e equipamentos; e flexibilidade para atender as demandas;
além e grandes incentivos para o setor. Como resultado da Política Pública, o governo da Bahia
conseguiu ativar ou reativar o setor naval através dos seguintes empreendimentos:
Retomada das atividades do canteiro de São Roque do Paraguaçu (Petrobras);
Implantação do canteiro para produção de módulos e integração de equipamentos da
empresa baiana GDK, localizado no canal de Cotegipe na Baía de Aratu, em atividade;
Implantação do Complexo Náutico Naval da Baía de Aratu para abrigar mais três
empresas de fabricação de módulos, BELOV Engenharia (BA), NIPLAN EN GENH
ARIA (SP/BA) e MULTITE K (MG) em área de aproximadamente 180 mil m 2,
requalificação e ampliação da Marina Aratu que passará a abrigar em 50 mil m2 cerca
de 1.000 embarcações de esporte e lazer, além de empresas industriais, comerciais e
prEstadoras de serviços do segmento náutico em 170 mil metros quadrados loteados,
além de mais 800 mil m2 destinados a indústria de médio e grande porte da cadeia
produtiva dos segmentos náutico e naval; Implantação do Estaleiro Corema: com
previsão de área de 250.000 metros quadrados e capacidade de construção e
recuperação de embarcações de até 12.000 t. Este projeto refere-se à construção de
um novo estaleiro na Baía de Aratu, para construção de embarcações de apoio offshore
de até 150m e investimento de R$ 107 milhões; e Implantação do Estaleiro Enseada
de Paraguaçu. (SICM, 2014)
Um dos empreendimentos que surgiram em decorrência das Políticas Públicas do Estado
foi o Estaleiro Enseada de Paraguaçu (EEPSA). Pela magnitude dos investimentos, da ordem
de R$ 2,6 bilhões, o que equivale a implantação de três indústrias automobilísticas, com custo
médio de R$ 900 milhões cada, e pela elevada mobilização de trabalhadores, com projeção de
5 mil contratados, o EEPSA se tornou um dos ícones do PRONAVAL.
Para que o estaleiro fosse implantando na Bahia, a União propôs mudanças no Decreto
Presidencial que criou, em 11 de agosto de 2000, a RESEX Baía do Iguape. Encaminhando ao
Congresso Nacional, em regime de urgência constitucional, Projeto de Lei 5892/09. Segundo
Ministro de Estado do Meio Ambiente, Carlos Minc Baumfeld (CÂMARA DOS
DEPUTADOS, 2009), o projeto objetiva ampliar a RESEX Baía do Iguape de 8,1 mil hectares
para cerca de 10 mil hectares; incluir o Convento de São Francisco do Paraguaçu (tombado em
1941 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)); corrigir
coordenadas da RESEX, lançadas no Decreto de 2000; transferir a administração da RESEX
175
para Instituto Chico Mendes (ICMBio); retirar da poligonal da RESEX áreas destinadas a
implantação e operação de estruturas industriais voltadas a construção naval. Carlos Minc
Baumfeld (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2009) afirma que “o recuo da linha demarcatória
da reserva extrativista nas proximidades do estaleiro de São Roque permitirá a regularização e
a expansão da indústria naval, impulsionando a economia local”.
Em 2009, o Congresso aprovou Decreto Legislativo modificando a RESEX. O Decreto
Legislativo foi encaminhado em 10 de agosto de 2009 para sanção do presidente da república,
Luiz Inácio Lula da Silva. Sendo publicada na forma da Lei nº 12.058 de 13 de outubro de
2009. Sobre as modificações sancionadas pelo presidente Lula, Baumfeld (2009) expressa que
o Artigo 28 da Lei nº 12.058/2009 promove a correção e mudança da poligonal que delimita a
RESEX Baía do Iguape, argumentando o seguinte:
A redefinição de limites ora proposta se justifica pela necessidade de correção do
Decreto de criação da Unidade de Conservação, uma vez que as referências descritivas
não correspondem às coordenadas geográficas citadas no Decreto. Outra justificativa
é a necessária resolução do conflito decorrente da localização do estaleiro de São
Roque, nos limites da Unidade, cujas instalações são utilizadas para manutenção e
reparo de plataformas de petróleo. A proposta de redelimitação da Reserva
Extrativista Marinha da Baía do Iguape consiste em redução e ampliação dos atuais
limites. O recuo da linha demarcatória da Reserva Extrativista nas proximidades do
estaleiro de São Roque permitirá a regularização e expansão da indústria naval,
impulsionando, assim, a economia local. Por outro lado, a ampliação pretendida
possibilitará a inclusão de um conjunto significativo de famílias, que vivem da
atividade pesqueira, como beneficiárias da Reserva Extrativista. A ampliação
propiciará, ainda, agregação à área protegida do Convento de São Francisco do
Paraguaçu, tombado em 1941 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional-IPHAN. O Projeto de Lei ora encaminhado visa conciliar a conservação da
biodiversidade, o bem estar social e o desenvolvimento econômico da região da Baía
do Iguape. (BAUMFELD, 2009)
Observa-se que nos argumentos apresentados por Baumfeld (2009) as mudanças tiveram o
objetivo de legalizar o uso de área estratégica para implantação do Polo Naval pretendido pelo
Governo da Bahia. Tentando compensar a perda de parte do território da RESEX, ocorreu a
ampliação de outras áreas no entorno da Baía do Iguape, a exemplo da região onde está
localizado o Convento de São Francisco do Paraguaçu.
Além da mudança no traçado da poligonal da RESEX, o Artigo 28 da Lei nº 12.058/2009,
§ 1º declara de interesse social, para fins de desapropriação, os imóveis rurais na área
incorporada à unidade de conservação, para os fins previstos no art. 18 da Lei no 9.985, de 18
de julho de 2000, a Lei institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC). Enquanto o § 2º, do Artigo 28 da Lei nº 12.058/2009, estabelece que a administração
da RESEX Baía do Iguape fique sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes.
176
Com a mudança da poligonal da RESEX, o Governo da Bahia publicou Decreto Estadual
Nº 11.440/2009, em 19 de fevereiro de 2009, tornando de utilidade pública, para fins de
desapropriação 2.056.065,50 de metros quadrados de área pertencente ao município de
Maragogipe, localizada no distrito de São Roque do Paraguaçu, denominada de Ponta do
Corujão, com a finalidade “de implantar a terceira etapa do Polo de Indústria Naval do Estado
da Bahia.”, ficando sob responsabilidade da SUDIC a promoção de atos administrativos e
judiciais com a finalidade de cumprir o Decreto.
O mapa a seguir apresenta a delimitação da RESEX Baía do Iguape (cor rosa tracejada);
zona de mangue (em verde escuro), e no centro da circunferência cinza a sede do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu:
177
Figura 23 – Mapa com a delimitação das áreas de proteção ambiental compreendendo a Baía de todos
os Santos e Baía do Iguape.
Fonte: EIA/RIMA (2009).
178
No mapa (Figura 23) observa-se que a circunferência cinza delimita o raio de 10 Km como
área de abrangência do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, atingindo os municípios de
Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara. Também observa-se que a delimitação da RESEX
Baía do Iguape (área rosa tracejada) excluiu a sede do distrito de São Roque do Paraguaçu, o
povoado de Enseada de Paraguaçu, e o trecho do rio Baetantã, nas proximidades da Baía do
Iguape.
Analisando o mapa (Figura 23), observa-se no trecho do rio Baetantã, próximo a Baía do
Iguape, existem extensivas áreas de mangue69. Infere-se que as áreas de mangue são áreas
utilizadas pelas comunidades tradicionais para a produção da economia de subsistência, bem
como local de reprodução de espécie animas inerentes ao próprio bioma. Ao excluir estes
trechos de preservação do bioma, ficou comprometido o modo de produção local, que é baseado
na pesca artesanal e na agricultura familiar, além de comprometer a manutenção do bioma.
Jorge Rogério Pereira Alves (2001, p. 5) explica que a relação do homem com o manguezal
é desarmônica, e que o bioma tem sido degradado pelo lançamento de resíduos sólidos,
lançamento de esgotos industriais e domésticos, desmatamento e aterros. Alves (2001, p. 5)
alerta que o resultado destas agressões ameaça a sobrevivência dos manguezais, e que caso não
sejam tomadas medidas efetivas para conservação, preservação e conscientização da
importância deste ecossistema para natureza, os manguezais tendem a se extinguir colocando
em risco o equilíbrio da zona costeira e, consequentemente, do ser humano.
O IBAMA (2014) destaca que a produção de biomassa no mangue é bastante significativa,
sendo responsável pelo sustento de centenas de famílias que vivem da pesca e coleta dos
produtos dos manguezais. “O ecossistema é considerado um recurso renovável, porém finito,
quando se leva em conta à produção natural de peixes, ostras, caranguejos, camarões, siris,
mariscos e até mel, além de proporcionar oportunidades recreacionais, culturais, científicas e
educacionais.”.
69
Jorge Rogério Pereira Alves (2001, p. 5) explica que os manguezais são ecossistemas que ocorrem nas zonas de maré;
formam-se em regiões de mistura de águas doces e salgadas como estuários, baías e lagoas costeiras. Ao longo da zona
costeira os manguezais desempenham diversas funções naturais de grande importância ecológica e econômica, dentre as
quais destacam-se as seguintes: proteção da linha de costeira; funcionamento como barreira mecânica à ação erosiva das
ondas e marés; retenção de sedimentos carreados pelos rios, constituindo-se em uma área de deposição natural; ação
depuradora, funcionando como um verdadeiro filtro biológico natural da matéria orgânica e área de retenção de metais
pesados; área de concentração de nutrientes; área de reprodução, de abrigo e de alimentação de inúmeras espécies e área
de renovação da biomassa costeira e estabilizador climático. Cabe ressaltar a importância do manguezal para o homem,
uma vez que este fornece uma grande variedade de organismos que são utilizados na pesca como moluscos, crustáceos e
peixes. A captura destes animais para comercialização e consumo permitiu ao longo dos anos a sobrevivência de inúmeras
comunidades na zona costeira e a manutenção de uma tradição e cultura próprias da região costeira.
179
O IBAMA (2014 apud Maciel, 1991) também aponta que o processo de renovação natural
do bioma é comprometido, se tornando um recurso natural não renovável, quando os “espaços
são substituídos por prédios, atracadouros, residências, portos, marinas, aeroportos, rodovias,
salinas, aquicultura, entre outros empreendimentos, além daqueles que condenam os
manguezais a meros depositários, despejos de efluentes líquidos, disposição de resíduos sólidos
ou ao extrativismo indiscriminado de produtos florestais.”
Conclui-se que o modo de vida das comunidades tradicionais é modificado pela supressão
de zonas de proteção ambiental, e pelos impactos decorrentes de processo industrial
incompatível com a natureza do local. Pode-se inferir que ao impactar o ecossistema formado
pelos mangues, as comunidades tradicionais situadas nas áreas de influência do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu têm o modo produção modificando pela implantação do
empreendimento,
comprometendo
sobrevivência
socioeconômica
das
comunidades
tradicionais. Conclui-se que a intensidade da escala de impactos vai do epicentro, Ponta do
Corujão, até as extremidades, atingindo de forma gradativa a Área de Influência Direta (AID)
– compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara; e a Área de
Influência Indireta (AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica.
Pode-se afirmar que as comunidades estabelecidas no distrito de São Roque do Paraguaçu e em
Enseada do Paraguaçu são as mais impactadas no processo de instalação e operação do
Estaleiro.
Fica evidente que o que move os capitalistas é o lucro, e que prevalece na ação do Estado
o favorecimento de interesses capitalistas com o desenvolvimento da cadeia de valor do
petróleo e gás. A articulação destas práticas subjuga as comunidades tradicionais subtendo-as
a um processo de empobrecimento, ampliando a condição de subproletariado, para na sequência
transformá-la em classe superexplorada. Dentre outros fatores, isto ocorre com a modificação
do modo de produção local, pelo recuo da linha demarcatória da RESEX Baía do Iguape, e com
a implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Este fenômeno se desenvolve
sem que sejam realizadas medidas compensatórias através da ação dos capitalistas e do Estado.
A articulação destas práticas subjuga as comunidades tradicionais submetendo a um processo
de empobrecimento, com degradação ambiental, e aumento da exploração capitalista.
180
5.1.4 O ESTADO E A DIALÉTICA ESTABELECIDA COM OS CAPITALISTAS E A
COMUNIDADE
A ação do Estado em modificar o território da RESEX e implantar o Polo Naval, ensejou
uma relação dialética com a comunidade do Recôncavo da Bahia, dentre elas, com comunidade
de São Roque do Paraguaçu. A comunidade é marcada por relações sociais de produção
baseadas no extrativismo de subsistência. O que se observa é que, a comunidade encontra-se
em um estágio quase pré-capitalista, enquanto um novo modo de produção, baseado no
capitalismo avançado, que reifica Império, é introduzido no território. Esse movimento enseja
uma relação dialética, de conflito e completariedade.
Conforme discorrido na ‘Introdução’ do presente trabalho. Marx e Engels (2011) propõem
a separação da sociedade em classes antagônicas, cabendo à burguesia o papel de transformar
as relações sociais de produção, e desta forma, a própria sociedade. Ou seja, a implantação do
Polo Naval, sucedido pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu, provoca mudanças nas estruturas
sociais, conformando novas relações de produção. Para analisar este processo, objetiva-se
aplicar o conceito de dialética, a partir da abordagem teórica marxista do primado do
materialismo, com as respectivas contradições e lutas dos contrários. Conforme explica
Leonardo Konder (1981), a acepção moderna do termo ‘dialética’ remete ao modo de pensar as
contradições da realidade, que se encontram em permanente transformação.
Tom Bottomore (2012, p. 152) afirma que na acepção de Marx, o fundamento da dialética
científica depende da compreensão das categorias econômicas como a expressão teórica de
relações históricas de produção, e que elas são correspondentes a determinada fase do
desenvolvimento da produção material. A dialética é científica porque explica as contradições
do pensamento e as crises da vida socioeconômica em termos das relações contraditórias e
particulares que as geram. Ela também é histórica porque capta as mudanças nas relações e
circunstâncias que descrevem. Georges Gurvitch (1987) observa que para atingir o
esclarecimento dialético, são necessários a aplicação de procedimentos de forma exclusiva,
concorrente, ou conjunta. Elencando-se cinco procedimentos operatórios nos quais se manifesta
o método dialético: a complementaridade dialética; a implicação dialética mútua; a
ambiguidade dialética; a polarização dialética; e a reciprocidade de perspectiva. Alguns destes
procedimentos foram vistos nos capítulos e tópicos anteriores, enquanto outros serão
observados a seguir.
181
5.1.5 O ESTADO E A DIALÉTICA ESTABELECIDA COM A COMUNIDADE A PARTIR DA
PERSPECTIVA DO LICENCIAMENTO DO ESTALEIRO
Conforme Ata de Audiência Pública realizada em Maragogipe (2008), foi realizada
audiência pública em 11 de dezembro de 2008 com objetivo de avaliar e discutir a implantação
do Polo Naval na RESEX. Os estudos indicavam que o empreendimento provoca impactos na
Baía de Todos os Santos e Baixo Paraguaçu, com raio de influência direta nos Municípios de
Maragogipe, Saubara, Salinas das Margaridas, Cachoeira e São Felix, alcançando também os
demais municípios do Recôncavo. As observações destes documentos materializam os
conceitos de Gurvitch (1987): a implicação dialética mútua; a ambiguidade dialética; a
polarização dialética; e a reciprocidade de perspectiva, conforme relato a seguir.
A Audiência Pública (1998) contou com as presenças de Ramiro Rockenbach da Silva
Matos Teixeira de Almeida, Procurador da República; Adriana Imbassahy, Promotora de
Justiça – Coordenadora do Núcleo de Defesa da Baía de Todos os Santos e Ana Vitória
Gouveia, Promotora de Justiça – Coordenadoria do Núcleo de Defesa do Rio Paraguaçu; Celio
Costa Pinto, Superintendente do IBAMA, Fabio Fabiano representando o ICMBio, Floro Freire
da SUDIC, e membros da comunidade. O Procurador da República destacou que a audiência
tinha por finalidade aplicar o ‘Princípio da Prevenção’.
O ‘Princípio da Prevenção’ ocorre nos casos em que os impactos ambientais, previamente
reconhecidos, necessitam de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o estabelecimento das
diretrizes que vão compor o licenciamento ambiental. Conforme expresso na CF/198870, e
Constituição Federal de 1988 – CAPÍTULO VI – DO MEIO AMBIENTE
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa
e manipulação de material genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos,
sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação
do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a
vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,
provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução
técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
70
182
conforme explica Frederico Amado (2011), sobre o conceito jurídico do ‘Princípio da
Prevenção’:
Por este princípio, implicitamente consagrado no artigo 225 da CRFB e presente em
resoluções do CONAMA já se tem base científica para graves danos ambientais
decorrentes de determinada atividade lesiva ao meio ambiente, devendo-se impor ao
empreendedor condicionantes no licenciamento ambiental para mitigar ou elidir os
prejuízos. [...] Ele se volta a atividades de vasto conhecimento humano (risco certo
conhecido ou concreto), em que já se definiram a extensão e a natureza dos danos
ambientais, trabalhando com boa margem de segurança. [...] Em Direito Ambiental,
deve-se sempre que possível buscar a prevenção, pois remediar normalmente não é
possível, dada a natureza irreversível dos danos ambientais, em regra. Exemplo de sua
aplicação é a exigência de estudo ambiental para o licenciamento de atividade apta a
causar degradação ambiental. (AMADO, 2011, p. 40-41)
O que se observa é que o Estado sendo normatizado por Leis, decretos e portarias realizou
a audiência pública para informar à população sobre modificações propostas e sobre os
impactados nos meios socioeconômicos, físicos e bióticos. Para mitigar os impactos prometem
um ‘desenvolvimento’ socioeconômico proporcionado com a implantação do Estaleiro, e que
este ‘desenvolvimento’ será possível através da implantação de programas de “educação básica
e profissional, apoio ao associativismo, apoio às atividades tradicionais, promoção de
tecnologias sociais, concessão de embarcações que facilite o trabalho, educação ambiental e
apoio a implantação de unidades de conservação, ou seja, mecanismos que facilitem a vida da
comunidade, e em especial das comunidades tradicionais impactas pelo empreendimento, de
forma sutil, afirmam que caso o empreendimento não seja implantando na RESEX, ele deva ser
implantando na Baía de Camamu, e que a opção pela Baía de Todos os Santos é em decorrência
da mesma possuir “melhor infraestrutura. Conforme destacado a seguir:
O Sr. FLORO FREIRE [...] a fim de explanar a situação do polo naval, afirma que não
há o interesse em mudar o paraíso que é esta cidade, mas trazer o desenvolvimento
para o local. [...] sobre o polo naval, informando que se não for implantado na Bahia,
a disputa em outros Estados é evidente. [...] Em seguida, o sr. PABLO passou a
continuar a explanação no que pertinente à definição da área, afirmando que
inicialmente pensou-se na Baía de Todos os Santos, pois a outra opção seria a Baía de
Camamu, possuindo a BTS mais infraestrutura, passando a tratar sobre as áreas
estudadas e suas peculiaridades. Dentre outros aspectos foi relatado que a área do
empreendimento atingiria a RESEX e que se deve estudar mecanismos de
compensação. [...] Prosseguiu-se a exposição tratando-se sobre a necessidade de
interação social, narrando estratégias de ação e que estão mantendo contato com
órgãos e lideranças, mas ainda não procuraram o MP, o que ocorrerá em breve. Listam
ainda oportunidades para o desenvolvimento humano, iniciando-se programas desde
agora, dentre os quais educação básica e profissional apoio ao associativismo, apoio
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,
a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira
são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do
meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à
proteção dos ecossistemas naturais.
183
às atividades tradicionais, promoção de tecnologias sociais, ou seja, mecanismos que
facilitem a vida do pescador, v.g., um determinado barco que facilite o trabalho,
educação ambiental e apoio a implantação de unidades de conservação. Relatam que
estão no início do Estado de impacto e que ainda não podem dizer tudo que vai
acontecer. Foi ainda informado pela representante da Secretaria de Indústria e
Comércio do Estado da Bahia que irá se estudar rota para tráfego dos navios e barco
dos pescadores, afirmando que nada será feito se a comunidade não quiser.
(AUDIÊNCIA PÚBLICA, 1998)
Fica evidente que o Estado promete o “paraíso na terra”, desenvolvimento humano com
preservação da natureza. Mas, efetivamente isto ocorre? As promessas feitas pelo Estado
durante audiência pública se efetivaram? A Lei (CF/1988, Art. 225) e o princípio que a rege
foram atendidos? Estas respostas são apresentadas na conclusão da pesquisa. Mas, vejamos a
seguir o que diz os membros do Estado sobre o processo de implantação do empreendimento:
Pelo representante da Superintendência da Educação no Estado da Bahia foi narrado
um pouco sobre o plano de educação profissional que é independente da instalação ou
não do polo naval e o plano iniciará em 2009. [...] Pelo IBAMA foi dito que é o órgão
licenciador do empreendimento que se pretende. Para o IBAMA é que não existe na
área de meio ambiente "janela de oportunidade”, mas sim condições objetivas. Se a
Bahia tiver condições objetivas haverá o polo, caso contrário, não haverá o polo,
ressaltando que haverá rigor e que o IBAMA não abrirá mão do rigor e antes mesmo
do IBAMA ter um parecer técnico, a decisão caberá ao Conselho Deliberativo. [...]
Pelo Sr. Fábio Fabiano - ICMBio - foi lida a resposta enviada ao Procurador da
República através do of. 707/08-DIUSP/ICMBio, ressaltando que a RESEX é de
domínio público e as terras da RESEX constituem patrimônio da União e deve atender
aos fins especificados em lei. (AUDIÊNCIA PÚBLICA, 1998)
Observando a citação anterior, destaca-se que os agentes do Estado reconhecem que a
normatização da RESEX impede a implantação do empreendimento. Caso ocorram a mudança
das condições objetivas, ou seja, na Lei que criou a RESEX, o empreendimento poderá ser
implantando. Nesse processo, o IBAMA promete rigor na fiscalização das condicionantes
determinadas para o empreendimento. Nesta relação dialética a comunidade questiona e
demonstra preocupação
afirmando que a exposição somente retratou fatos positivos, quando, em realidade, se
esconde os aspectos negativos, como aumento da criminalidade, prostituição, tráfico
de drogas, ocupação imobiliária indevida, como invasões, a questão da privatização
das águas, com delimitação de inúmeras áreas onde o pescador é impedido de passar,
v.g., como iria transitar o barco de um pescador e um navio? Foi ainda relatado que a
falta de emprego é decorrência também da omissão do Poder Público e não é o
empreendimento que irá resolver o problema, existindo grandes empreiteiras por trás
do referido empreendimento. (AUDIÊNCIA PÚBLICA, 1998)
A abordagem da comunidade durante a Audiência Pública demonstra elevado nível de
consciência social e uma efetiva e profunda análise do papel do Estado no processo de exclusão
dos direitos sociais que enfrentam, a exemplo do emprego. Além de pontuarem que existe a
supressão de áreas a que tem direito, o que reduz as áreas de extração dos recursos naturais, os
membros da comunidade também identificam que o avanço capitalista não tem refletido na
184
melhoria das condições de vida da comunidade, e que os empreendimentos terminam afetando,
negativamente, o modo de vida da população, destacando o aumento da violência, e dificuldade
de acesso aos empregos criados. Também pontuaram que as discussões sobre a implantação do
empreendimento são superficiais, ocorrendo a supressão de diversas comunidades no debate.
Estas observações são percebidas na citação a seguir:
Lenira: o polo naval trará todo tipo de violência, demonstrando preocupação,
relatando que para o pobre e negro somente restarão as "balas” resultantes do
empreendimento. [...] Eliana Carla de Santa Rita - moradora de Salinas e técnica em
pesca: querem mais respostas sobre o polo naval; Salinas possui 14 instituições de
pesca e que em momento algum foram citadas durante a explanação sobre o polo
naval. Existem pessoas que vivem muito bem pescando e mariscando, merecendo
respeito o ponto de vista e o modo de viver destas pessoas. [...] Em Maragogipe várias
pessoas dormiram na fila ainda esta semana para se inscreverem em projetos de
qualificação, será possível absorver a mão de obra local no empreendimento? Haverá
trabalho para minimizar a situação das drogas? Já foi elaborado um plano de ação para
verificar se haverá impacto ambiental? Se a comunidade não quiser o polo naval, a
SUDIC irá apoiar a comunidade noutros aspectos, inclusive sociais, ou é uma forma
de coação, os projetos virão se a comunidade apoiar o polo? Onde está o ordenamento
da pesca na região? Onde está o beneficiamento do pescado? Como se pretende
desenvolver projetos industriais dentro de territórios quilombolas? Seria possível ao
IBAMA e ICMBio viabilizar visita a outros estaleiros exibindo à comunidade os
exemplos? Relataram ainda que quanto a muitas questões, o Estado não se preocupa,
mas com o grande empreendimento sim e que o “que se diz é que tudo acaba em
"pizza” e muitas vezes há intervenção do "Estado” nos próprios órgãos ambientais,
informando preocupação quanto a tais aspectos. (AUDIÊNCIA PÚBLICA, 1998)
O que se observa é que a comunidade foi capaz de sintetizar, durante a Audiência Pública,
os principais aspectos do desenvolvimento capitalista no Recôncavo baiano. Dificuldade de
acesso à educação, estudos técnicos incompletos, exclusão das comunidades tradicionais,
conivência e privilegiamento nas relações entre o Estado e os capitalistas, ineficiência da
estrutura estatal, descumprimento das normas vigentes e debates excludentes.
Estas afirmações tornam-se ainda mais desconcertantes quanto confrontadas com a
declaração do prefeito de Maragogipe, Silvio José Santana Santos (PT), ao afirmar que as
discussões são precipitadas, avaliando que deve existir fiscalização, mas que “não se pode
simplesmente dizer que não se quer o empreendimento sem saber de fato maiores informações
e que o debate deve ser sério. Deve ser analisada a situação não apenas do pessoal da
comunidade pesqueira, mas também da cidade, que precisa de emprego e renda. É preciso ver
os dois lados.” (AUDIÊNCIA PÚBLICA, 1998). Na fala do prefeito, fica evidente o nível de
comprometimento com os interesses capitalistas, deixando de observar que a própria
comunidade relata sobre a questão do emprego, sobre o papel do Estado, além das questões
socioambientais implícitas.
185
Analisando a participação de dois representantes das instituições de Estado, Celio Costa
Pinto, IBAMA; e Fabio Fabiano, ICMBio, durante a Audiência Pública (1998), observa-se que
eles se comprometeram junto à comunidade, com o cumprimento rigoroso da Lei e do papel do
Estado em atender as demandas da comunidade. Enquanto o procurador da república Ramiro
Rockenbach destacou que o momento é de debate, e que “uma coisa é o Estado querer debater,
outra é já realizar atos, como o decreto de desapropriação, como se já fosse certa a implantação
do Polo Naval. Ainda, ressaltou ser preciso que as comunidades tradicionais sejam respeitadas
e que não há dúvida de que a comunidade se preocupa mais com o meio ambiente do que o
grande empreendedor.”.
Como resultado da Audiência Pública (1998) emergiram duas decisões:
O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado da Bahia, ao teor de
todos os fatos que envolvem o caso em exame, e mais o debatido na presente
Audiência Pública, registram, de público, o posicionamento, a ser comunicado
oficialmente ao Governo do Estado da Bahia, de que a ausência de estudos
qualificados sobre alternativa locacional implicam na adoção de medidas judiciais
para que o Polo Naval não seja implantado no local pretendido e relatado na ocasião
presente; e O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado da Bahia
registram, de público, que foram solicitados esclarecimentos ao ICMBio e ao IBAMA
quanto ao projeto em questão (o denominado Polo Naval da Bahia). (AUDIÊNCIA
PÚBLICA, 1998).
Analisando o que foi decido na Audiência Pública, conclui-se que os agentes do Estado
transferiram para o Governo da Bahia a responsabilidade de conduzir estudos mais
aprofundados sobre locais alternativos e impactos do empreendimento. Também foi decidido
que o IBAMA e ICMBio seriam notificados para que, acompanhando o processo, pudessem
prestar os esclarecimentos reivindicados pela comunidade.
Avaliando a atuação do Governo da Bahia, através da SUDIC, observa-se que foi
contratado a empresa Biomonitoramento e Meio Ambiente Ltda. (CNPJ 42.397.505/0001-81,
Registro no Cadastro Técnico Federal junto ao IBAMA nº 201664) para realizar o Estudo de
Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) do Estaleiro do Paraguaçu.
O estudo foi entregue e publicado em novembro de 2009. O Volume III apresenta os estudos
de ‘Alternativas locacionais’, sendo realizadas análises comparativas na Baía de Aratu, Ilha de
Madre de Deus e Canal do Paraguaçu, conforme a seguinte citação:
Verifica-se que as alternativas situadas na região da Baía de Aratu e em Madre de
Deus obrigariam à realização de obras que ocasionariam grandes alterações nas
condições físicas e demandariam a relocação de contingentes populacionais. Na
região do Canal do Paraguaçu, a possível localização do empreendimento na Ponta do
Buri acarretaria relocação de comunidades tradicionais. Na Ponta do Seguro,
haveriam questões com alteração na hidrodinâmica e interferência com a pesca. O
local que apresentou o menor grau de impactos negativos, considerando os ajustes
186
feitos ao projeto, foi a possível localização do empreendimento na Ponta do Corujão,
motivo pelo qual esta foi a alternativa locacional selecionada para a implantação do
empreendimento. (EIA/RIMA, 2009, v. 3, p. 19)
Analisando a citação, observa-se que o estudo atende as determinações da Audiência
Pública (1998), ao mesmo tempo em que chancela a escolha da ‘Ponta do Corujão’. Estudo
previamente realizado pelos capitalistas identificou a área como sendo a que demandaria os
menores custos de dragagem para adequar a profundidade do leito da Baía do Iguape às
necessidades técnicas do Estaleiro. O terreno selecionado também apresentava uma vantagem
adicional, é praticamente plano, o que facilita a implantação da estrutura industrial,
demandando menor custo e menor tempo no uso de máquinas para correção da topografia.
Durante a elaboração do EIA/RIMA (2009), foi realizada nova audiência pública em de
janeiro de 2010. Os resultados da audiência pública, os estudos e relatos apontados no
EIA/RIMA (2009), além das vistorias técnicas realizadas por profissionais do IBAMA, foram
objeto de análises. Os resultados, foram expostos através do Parecer Técnico nº 042/2010 –
COTRA/CGTMO/DILIC/IBAMA, Processo nº 02001.006831/200876. No documento ocorre
a seguinte alteração da nomenclatura do empreendimento “Polo da Industria Naval do Estado
da Bahia (Estaleiro Enseada do Paraguaçu). O Parecer Técnico nº 042/2010 sobre o processo
de licenciamento do empreendimento apresenta os seguintes dados históricos:
28/10/2008: o Governo do Estado da Bahia, através do Ofício n° 482/2008 da
Secretaria da Indústria, Comércio e Mineração protocolou, no IBAMA, pedido de
agendamento de reunião para apresentação do empreendimento Polo da Indústria
Naval do Estado da Bahia. (PARECER TÉCNICO Nº 042/2010, p. 1)
03/11/2008: foi aberto o processo de licenciamento ambiental do Projeto Polo da
Indústria Naval do Estado da Bahia; (PARECER TÉCNICO Nº 042/2010, p. 2)
28/11/2008: realizou-se, na sede do IBAMA, reunião técnica com a participação de
técnicos do Núcleo de Licenciamento Ambiental no Estado da Bahia (NLA/BA) na
qual o empreendedor apresentou o projeto do Polo que, à época, consistia na
implantação de três estaleiros que seriam licenciados em conjunto na localidade de
São Roque do Paraguaçu, município de Maragogipe/BA; (PARECER TÉCNICO Nº
042/2010, p. 2)
11/12/2008: por iniciativa do Ministério Público Federal e do Ministério Público do
Estado da Bahia, realizou-se, no município de Maragogipe/BA, Audiência Pública
para avaliação e discussão do empreendimento na região. Em suas considerações
finais, a ata registra o posicionamento do Ministério Público de que “a ausência de
estudos qualificados sobre a alternativa locacional implicarão na adoção de medidas
judiciais (...)”; (PARECER TÉCNICO Nº 042/2010, p. 2)
05/02/2009: a equipe técnica designada para análise do empreendimento realizou
vistoria na área proposta para implantação do empreendimento; (PARECER
TÉCNICO Nº 042/2010, p. 3)
27/02/2009: a DILIC/IBAMA encaminhou o Oficio n° 193/2009 ao Diretor de
Unidades de Conservação de Uso Sustentável do Instituto Chico Mendes para a
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), solicitando manifestação acerca da
compatibilidade entre o empreendimento em questão e os objetivos de uma Unidade
187
de Conservação de Uso Sustentável uma vez que a localização inicial encontrava-se
inserida nos limites da RESEX Marinha Baía do Iguape; (PARECER TÉCNICO Nº
042/2010, p. 3)
18/03/2009: o IBAMA, através do Oficio n°156/09/GP - IBAMA, reiterou à
presidência do ICMBio, os termos do Oficio anterior; (PARECER TÉCNICO Nº
042/2010, p. 3)
23/04/2009: a Secretaria de Indústria, Comércio e Mineração do Estado da Bahia
encaminhou, ao IBAMA, o Oficio n° 08/2009, no qual informa que o Estado da Bahia
“realizará os atos necessários para revisar as poligonais nas áreas em que se postula a
instalação dos empreendimentos da Indústria Naval.” Isto ocorre em função da
sobreposição com a área da RESEX Baía do Iguape; (PARECER TÉCNICO Nº
042/2010, p. 3)
29/09/2009: o IBAMA encaminhou, através do Oficio n° 253/2009 o Termo de
Referência definitivo para elaboração do EIA/RIMA; (PARECER TÉCNICO Nº
042/2010, p. 3)
23/11/2009: o empreendedor apresentou o EIA/RIMA do empreendimento para a
equipe do IBAMA que após realização de Check-list, elaborou a Nota Técnica n°
161/2009-COTRA/CGTMO/DILIC/IBAMA,
na
qual
demanda
alterações/complementações de uma série de itens relacionados ao meio biótico, além
da adequação do RIMA, considerado extenso e com linguagem excessivamente
técnica; (PARECER TÉCNICO Nº 042/2010, p. 3)
30/11/2009: o empreendedor protocolou nova versão de EIA/RIMA com as
adequações solicitadas; encaminhou cópia dos ofícios comprobatórios do
encaminhamento destes às Prefeituras das Áreas de Influência Direta e Indireta, bem
como às Instituições Estaduais e Federais pertinentes e informou a disponibilidade
para realização de Audiência Pública no dia 15 de janeiro de 2010; (PARECER
TÉCNICO Nº 042/2010, p. 3)
02/12/2009: o IBAMA publicou no Diário Oficial da União o edital no qual informa
sobre o recebimento do EIA/RIMA e sobre a realização da Audiência Pública no dia
18/01/2010; (PARECER TÉCNICO Nº 042/2010, p. 3)
18/01/2010: realizou-se, no município de Maragogipe, Audiência Pública com a
participação de 1313 pessoas. (PARECER TÉCNICO Nº 042/2010, p. 3)
Além do resumo sobre o histórico do processo de licenciamento do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu, o Parecer Técnico (042/2010, p. 25) traz resumo sobre a audiência pública. O evento
obedece a resolução CONAMA n° 09/198771, e ocorreu em Maragogipe, na sede da Associação
Atlética Maragogipana, em 18 de janeiro de 2010, tendo início às 18:30 e sendo encerrada às 2
horas da manhã do dia 19 de janeiro. A audiência foi conduzida pelo Coordenador de Mineração
e Obras Civis do IBAMA, Jorge Luiz Britto Cunha Reis e teve a participação de 1313 pessoas.
Após a exposição feita pelo empreendedor, foi dado aos participantes, tempo para que
formulassem perguntas ou para que fizessem a inscrição para manifestação oral, conforme
expresso na citação a seguir:
As intervenções, em 87% (oitenta e sete por cento) dos casos, versaram sobre os
impactos sociais do empreendimento. Destes, cerca de 40%, relacionavam-se a
CONAMA Resolução n° 09/1987 – Art. 1º - A Audiência Pública referida na resolução CONAMA n° 1/86, tem por
finalidade expor aos interessados o conteúdo do produto em análise e do seu referido RIMA, dirimindo dúvidas e
recolhendo dos presentes as críticas e sugestões a respeito.
71
188
questões de emprego, capacitação da mão de obra e programa de primeiro emprego
para os jovens, o que demonstra a grande preocupação da comunidade com essa
questão. Algumas perguntas fizeram referência aos impactos sobre a população
ocasionados pela grande massa de trabalhadores a se instalar nos locais. Como era de
se esperar, cerca de 10% dos questionamentos referiam-se aos impactos sobre o meio
físico e biótico. Houveram muitas manifestações de apoio ao empreendimento e
questões sobre o aproveitamento da mão de obra local nas várias fases do
empreendimento. Foi detectada, na audiência, uma preocupação com a capacitação da
população local para que os mesmos possam acessar um dos benefícios mais
importantes para a população que é o emprego. Além disso, foram feitas referências
ao acompanhamento das medidas compensatórias e mitigadoras. Os 3% restantes se
referem a manifestações não afetas aos impactos do empreendimento. (PARECER
TÉCNICO Nº 042/2010, p. 24)
Analisando a síntese da audiência pública, observa-se que a comunidade apresenta uma
adequada abordagem dos problemas que deve enfrentar com a introdução do empreendimento,
sendo que os impactos no meio socioeconômico são percebidos como mais intensos,
destacando-se os impactos de populações oriundas de outras regiões, dificuldades para que os
jovens sejam inseridos no empreendimento em decorrência das limitações de oferta de
capacitação da mão de obra, além das limitações de inserção da população local em decorrência
da pouca infraestrutura educacional do município. Em menor grau, apenas 10% dos
participantes perceberam que o empreendimento é uma oportunidade de formalização do
emprego, e manifestaram apoio a implantação do Estaleiro. Ocorreram também ponderações
sobre os impactos no meio físico e biótico.
O Parecer Técnico72 (Nº 042/2010, p. 25) conclui que no meio físico o estudo foi realizado
com baixa representatividade de dados, e o estudo de impacto ambiental das obras de
implantação do terminal portuário apresenta falhas, erros e falta de dados que comprometem a
determinação da viabilidade ou não do empreendimento, sendo que para embasar qualquer
decisão faz-se necessário a apresentação de novos estudos. No tocante ao diagnóstico do meio
socioeconômico foi considerado que o estudo permite uma síntese da realidade local, apesar da
defasagem de alguns dados. O EIA informa que os principais impactos ocorrem no meio
socioeconômico, dentre os quais, o IBAMA destacou a possibilidade concreta de atração de
grande contingente de trabalhadores para a região, e consequente pressão sobre a infraestrutura
de serviços públicos (moradia, saúde, educação), além de outras consequências de caráter
econômico, cultural e social. Os técnicos do IBAMA também entenderam que:
Apesar do EIA identificar estes impactos e propor a implementação de alguns
programas enquanto medida mitigadora, esta equipe avalia que, tomadas
isoladamente, tais proposições carecem de efetividade. Neste sentido é necessário que
sejam implementadas, em comum acordo com os demais entes públicos envolvidos,
ações que monitorem e previnam processos de ocupação desordenada de áreas (que
72
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
189
poderão ocorrer em função da atração de mão de obra para a região). É necessário
também que se avalie como se dará a desmobilização da mão de obra temporária. [...]
Desta forma, recomenda-se que seja enviado ao empreendedor ofício
solicitando a entrega de estudos complementares e adequações detalhadas ao
longo deste parecer, para que se procedam as análises pertinentes. (PARECER
TÉCNICO Nº 042/2010, p. 25-26)
Ao analisar a citação, observa-se que na avaliação técnica do IBAMA os estudos
apresentados mostram-se insatisfatório. Quatro meses após a publicação do Parecer Técnico Nº
042/2010, em março de 2010, o IBAMA concede a Licença Prévia Nº 354/2010; e em 28 de
outubro de 2010 a Licença de Instalação Nº 737/2010. Em ambos documentos são determinadas
condicionantes a serem cumpridas pelos capitalistas, além de serem determinadas a
implantação de 17 programas, com objetivo de mitigar os impactos nos meios físico, biótico e
socioeconômico. As diretrizes dos programas foram detalhadas no EIA/RIMA (2009), mas
compete aos capitalistas apresentar o cronograma e plano executivo de cada programa, de
acordo com os estudos e diretrizes previamente definidos.
Conclui-se que as audiências públicas e os debates realizados pelos agentes públicos em
nome do Estado, com a comunidade, foram insatisfatórios, permanecendo a promessa de
desenvolvimento socioeconômico com a implantação do empreendimento. Também fica
evidente que a comunidade identifica significativos impactos socioambientais no modo de
produção estabelecido, e que sem um processo de capacitação da mão de obra local serão
excluídos da promessa de desenvolvimento, não aferindo ganhos sociais e comprometendo o
modo de produção e a coesão social existente.
5.1.6 O ESTADO, O EIA/RIMA (2009) E O PROGRAMA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
Além de ter definido a melhor alternativa locacional para construção do Estaleiro, o
EIA/RIMA (2009) define três níveis de áreas que passam a receber os impactos da instalação e
operação: Área Diretamente Afetada (ADA), Área de Influência Direta (AID), e Área de
Influência Indireta (AII). Conforme observado no mapa a seguir:
190
Figura 24 – Mapa apresenta as áreas impactadas pela construção e operação do estaleiro.
Fonte: EIA/RIMA (2009).
191
No mapa (Figura 24), a mancha vermelha do mapa identifica a Área de Influência Direta
(AID), onde ocorre os maiores impactos no meio socioeconômico e em menor grau nos meios
físico e biótico. Enquanto o detalhe do mapa com vermelho tracejado apresenta impactos nos
meios físicos e bióticos, sendo denominada de Área Diretamente Afetada (ADA), sendo o local
onde o EEPSA implanta a estrutura física. O EIA/RIMA (2009) distingue e classifica os
impactos, conforme observa-se a seguir:
ADA – Para o meio físico e biótico terrestre, a Área Diretamente Afetada (ADA) foi
definida como a área na qual será implantado o empreendimento. Essa área sofrerá
intervenções diretas das atividades inerentes ao empreendimento, tais como a
supressão de vegetação, terraplanagem, implantação de linhas de energia e sistema de
abastecimento de água, canteiro de obras, construção de cais de acostagem, dique
seco, rampas, área administrativa, área de utilidades, dentre outras, além da área
destinada a Reserva Legal. (EIA/RIMA, 2009, p.13)
AID – As possíveis influências diretas ocorrerão no entorno do empreendimento na
região da ADA tanto nos meios físico e biótico como no meio socioeconômico. [...]
No meio socioeconômico, a Área de Influência Direta (AID) considerou os
municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara. Estes municípios foram
considerados como área de influência direta em função da proximidade física, sendo
Maragogipe o município de implantação do empreendimento. Também foi levado em
consideração a interação sociocultural e econômica com a área, assim como as formas
de relacionamento com o meio, através da realização de atividades voltadas para a
sobrevivência, como pesca artesanal e mariscagem. (EIA/RIMA, 2009, p.14)
AII – É a área localizada no entorno da Área de Influência Direta (AID), onde poderão
ocorrer os impactos menos significativos no meio ambiente. [...] Para o meio
socioeconômico foram considerados como Área de Influência Indireta (AII) os
municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica. Nestes municípios, as possíveis
interferências do empreendimento estão associadas às expectativas de geração de
empregos pelo empreendimento, possíveis saídas de pessoas dos locais de origem para
a área mais próxima do empreendimento, demandas de cursos de qualificação para
aproveitamento pelo projeto e outras interferências indiretas. (EIA/RIMA, 2009, p.1516)
Analisando os dados, observa-se que é na Área de Influência Direta (AID) que está situada
o campo de estudo desta pesquisa, por abranger os municípios de Maragogipe, Salinas da
Margarida e Saubara. Estes municípios são considerados como área de influência direta em
decorrência da proximidade física com o Estaleiro, destacando que é em Maragogipe que ocorre
a implantação e operação do empreendimento, sendo que, a seleção da comunidade da sede do
distrito de São Roque do Paraguaçu ocorre em função da maior proximidade física com a
primeira sede do Estaleiro (área arrendada do Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu,
de propriedade da PETROBRAS). A previsão é que no primeiro semestre de 2015 o EEPSA
transfira a sede para a Ponta do Corujão, situada ao lado do povoado de Enseada do Paraguaçu.
Portanto, objetiva-se estudar a comunidade mais próxima do fenômeno a partir da dialética
estabelecida.
192
Analisando, especificamente, a Medida Mitigadora nº 40, que prescreve o Programa de
Comunicação Social (PCS), busca-se revelar como a dialética entre os atores – Estado,
capitalistas e a comunidade – ocorre. O PCS faz parte do Plano de Gestão Ambiental (PGA) do
EEPSA, que é composto por 26 programas, cujo objetivo é dar sustentabilidade socioambiental
ao empreendimento. (EIA/RIMA, v. 8, p. 5)
Sobre a importância da Medida Mitigadora nº 40 e o PCS, Caroline Todt de Azevedo73
(2013), gerente de Sustentabilidade do EEPSA, avalia “a Comunicação como o elemento mais
transversal de qualquer sistema de gestão e de governança, por isso vejo a medida mitigadora
40 como um destaque entre as demais.”. O que Carol Azevedo (2013) expressa é que a
comunicação social é um componente inserido direta ou indiretamente nos demais programas,
além de ter a função de conectar através da linguagem os programas estabelecidos na Licença
Prévia Nº 354/2010, Licença de Instalação Nº 737/2010 e no próprio EIA/RIMA (2009).
Sobre o conceito de comunicação social e a transversalidade que exerce no contexto da
sociedade, Jorge Pedro Sousa (2006, p. 22), destacado autor português do campo da
comunicação social, expressa que a palavra comunicação significa participar, pôr em comum
ou ação comum. Essa etimologia remete a relacionar seres viventes e, normalmente, conscientes
(seres humanos), tornar alguma coisa comum entre esses seres, seja essa coisa uma informação,
uma experiência, uma sensação, uma emoção. A comunicação pode ser pensada em duas
dimensões:
A comunicação como o processo em que comunicadores trocam propositadamente
mensagens codificadas (gestos, palavras, imagens...), através de um canal, num
determinado contexto, o que gera determinados efeitos; e a comunicação como uma
atividade social, onde as pessoas, imersas numa determinada cultura, criam e trocam
significados, respondendo, desta forma, à realidade que quotidianamente
experimentam. (SOUSA, 2006, P. 22)
Estas duas dimensões da comunicação são complementares e fazem parte do processo
social, necessitado de mensagem, código, canal, emissor e receptor para que se concretizem.
Jorge Pedro Sousa (2006, p. 22) afirma que a “comunicação é indispensável para a
sobrevivência dos seres humanos e para a formação e coesão de comunidades, sociedades e
culturas.”. Sousa (2006) elenca os seguintes motivos dos atos comunicacionais:
Para trocarmos informações; (SOUSA, 2006, P. 23)
73Caroline
Todt de Azevedo, bióloga (UFBA) com mestrado pela UnB em Desenvolvimento Sustentável. Ocupo o cargo
de gerente de Sustentabilidade do EEPSA e respondo por todo o licenciamento ambiental do empreendimento,
compreendendo aqui as licenças expedidas pelo IBAMA (Brasília) e as Anuências da Fundação Cultural Palmares,
IPHAN e ICMBio.
193
Para nos entendermos e sermos entendidos; (SOUSA, 2006, P. 23)
Para entretermos e sermos entretidos; (SOUSA, 2006, P. 23)
Para nos integrarmos nos grupos e comunidades, nas organizações e na sociedade;
(SOUSA, 2006, P. 23)
Para satisfazermos as necessidades económicas que nos permitem pagar a
alimentação, o vestuário e os bens que, de uma forma geral, consumimos; (SOUSA,
2006, P. 23)
Para interagirmos com os outros, conseguindo amigos e parceiros, tendo sucesso
pessoal, sexual e profissional, algo fundamental para a nossa autoestima e equilíbrio.
(SOUSA, 2006, P. 23)
Jorge Pedro Sousa (2006, p. 23) alerta para o fato da “comunicação satisfazer necessidades,
que, de acordo com a pirâmide de necessidades de Maslow (1954), podem ser básicas (água,
comida, vestuário...), de segurança, sociais (ter amigos e ser aceite por outros), de autoestima
(ter competência, autoconfiança e conquistar o respeito dos outros) e de atualização pessoal
(desenvolver todo o nosso potencial).”
Observa-se que a comunicação tem função essencial na sociedade, e quanto mais complexa
se tornam as relações sociais, maiores são os fluxos de mensagens, sendo necessários maiores
níveis de canais e codificação para que as mensagens sejam transmitidas e corretamente
decodificadas dentro dos públicos específicos a que se destinam. Neste aspecto, o EIA/RIMA
(2009, v. 8, 65) identifica que a comunidade do Recôncavo baiano é uma formação social rica
e dinâmica,observando que a região da Baía do Iguape foi caracterizada através das dimensões
ecológica, ambiental, socioeconômica, cultural, política e jurídica. “Os estudos demonstraram
a complexidade sociocultural da região, a riqueza dos bens culturais materiais e imateriais, a
sua diversidade, o patrimônio histórico e arquitetônico, os saberes, costumes e artes das
comunidades tradicionais de pesca e quilombolas.”.
O Programa de Comunicação Social (PCS) estabelece um conjunto de diretrizes, normas,
objetivos e cronograma. Este conjunto de dados compreende as páginas de nº 65 a 82 do volume
8 do EIA/RIMA (2009), e foi elaborado por Roseane Palavizini74. O PCS tem por finalidade a
valorização das comunidades locais, com a respectiva diversidade cultural e relação de
interdependência com os ecossistemas terrestres e aquáticos, assim como sua relação com o
Estaleiro.
74Roseane
Palavizini é a responsável técnica pela elaboração do Programa de Comunicação Social, prescrito no
EIA/RIMA (2009), do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Palavizini é doutora em Engenharia Ambiental - UFSC, Mestre
em Urbanismo - UFBA, Especialista em Planejamento, Gestão e Educação Ambiental - UFBA e UCSAL, Arquiteta
Urbanista - UFBA, portadora do CREA/BA 23.878/D e CPF. 548.659.995-15. (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 82)
194
De forma geral, o PCS (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 65) objetiva articular a comunicação e
cultura na relação entre a comunidade e o empreendimento, levando consideração a dinâmica
da vida dos povos tradicionais, no processo de interação dialética, buscando desenvolver novas
alternativas de desenvolvimento socioeconômico. Também objetiva a valorização da
conservação dos ecossistemas e a promoção da cultura da região através do território de
identidade.
Segundo o EIA/RIMA (2009, v. 8, p. 65-66) a Comunicação Social é um componente
transversal, por atingir todos os processos de mobilização. Conforme exposto a seguir:
A Comunicação Social é um processo mobilizador que percorre todos os processos de
mobilização (desde o interpessoal, passando pelo comunitário até o instituições como
na implementação de políticas públicas. Portanto, comunicar é mobilizar. Esse é o
caminho de transição da democracia representativa para a democracia participativa
onde os processos decisórios e a implantação de programas de natureza sociocultural
dependem de fatores como a coesão social e grau de participação de
comprometimento das comunidades em seus territórios. A Comunicação Social deve
buscar compreender a dinâmica social em relação à cultura, ao ambiente, à economia,
às alternativas de desenvolvimento locais, assim como às formas de organização
social e política, caracterizando as redes de relações sociais e suas estratégias de
sustentabilidade. Essa caracterização deverá fundamentar as metodologias, estratégias
e ações que compõem o processo executivo deste Programa. EIA/RIMA (2009, v. 8,
p. 65-66)
O que se observa é que o EIA/RIMA (2009) dá ao Programa de Comunicação Social uma
centralidade com relação aos demais programas. É o principal responsável pela mobilização da
comunidade e, neste aspecto, promovendo a democracia participativa, ampliando os níveis de
coesão social, e as ações de sustentabilidade na relação dialética entre a comunidade,
Capitalistas e Estado e o meio ambiente.
O Programa de Comunicação Social é uma política pública, cujo executor é o setor privado.
Ela foi delineada a partir da Lei Federal nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional de
Meio Ambiente; no Decreto Federal nº 6.040/2007 que Institui a Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais e na Lei Federal nº
9.795/1999, que define a Política Nacional de Educação Ambiental. O conjunto de Leis forma
a base jurídica com a qual o PCS deve operar. (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 66)
A Lei Federal nº 6.938/1981, possui fundamento nos incisos VI e VII do artigo 23, e no
artigo 235 da CF/1988. Ela estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e
mecanismos de formulação e aplicação, além de constituir o Sistema Nacional do Meio
Ambiente (SISNAMA) e o Cadastro de Defesa Ambiental. Ela tem como objetivo a
preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar,
195
no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional
e à proteção da dignidade da vida humana.
O Decreto Federal nº 6.040/2007 institui a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Estabelecendo os seguintes conceitos:
I – Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como
tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos
naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica,
utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição; (Decreto
Federal Nº 6.040/2007)
II – Territórios Tradicionais: os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos
e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado,
no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231
da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais
regulamentações; e (Decreto Federal Nº 6.040/2007)
III – Desenvolvimento Sustentável: o uso equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da
qualidade de vida da presente geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações
futuras. (Decreto Federal Nº 6.040/2007)
A Lei Federal nº 9.795/1999 dispõe sobre a educação ambiental e institui a Política
Nacional de Educação Ambiental, sendo que a educação ambiental são processos por meio dos
quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades,
atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do
povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. A educação ambiental é um
componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma
articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e nãoformal. Cabe ao Poder Público, nos termos dos artigos 205 e 225 da CF/1988, definir políticas
públicas que incorporem a dimensão ambiental.
O conjunto de Leis, anteriormente citado, não apenas dá uma concepção jurídica ao PCS,
como normatiza várias determinantes a serem cumpridas, conforme amplamente exposto nesta
pesquisa. A seguir, são revistos os Objetivos Geral e Específicos do PCS:
OBJETIVO GERAL:
Promover junto às comunidades das áreas de abrangência direta e indireta do
Empreendimento, processos de informação e educomunicação que promovam a
difusão de uma cultura de paz e sustentabilidade, assim como a segurança das
comunidades no ambiente onde vivem e na convivência com o Empreendimento.
(EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 72-73)
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
Promover ampla comunicação educativa e interativa com as comunidades das áreas
de influência direta e indireta do Empreendimento, sobre conservação ambiental,
saúde e segurança, combate e enfrentamento à violência infanto-juvenil, combate ao
trabalho infantil, prevenção contra prostituição, DSTs e disseminação do HIV,
conflitos ambientais e de propriedade; (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 72-73)
196
Desenvolver projetos de comunicação do Empreendimento com as comunidades
da área de influência direta, difundindo informações atualizadas sobre o Estaleiro, a
prevenção de danos ambientais, perfis profissionais e qualificações exigidas para
contratação de mão de obra; oferecer a comunidade um telefone 0800 para
atendimento de queixas, denúncias e problemas ambientais; (EIA/RIMA, 2009, V 8,
p. 72-73)
Difundir junto às comunidades de pesca e colônias de pescadores das áreas de
influência direta e indireta do Empreendimento, informações periódicas sobre o
movimento das embarcações e tráfego marítimo, evitando conflitos de acesso e
mobilidade; (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 73)
Difundir junto à comunidade de Enseada informações sobre o tráfego de caminhões
nos acessos ao Empreendimento, evitando conflitos de tráfego e mobilidade.
(EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 73)
Promover ações e estratégias de comunicação direcionadas a distintos segmentos da
comunidade, como para crianças, jovens e idosos, respeitando as suas especificidades
enquanto atores sociais, favorecendo o protagonismo, a coesão social e a
autodeterminação dos cidadãos. (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 73)
O PCS também estabelece a formação e mobilização de grupos participantes:
Comunidades da área de influência direta do empreendimento: Sociedade (Territórios)
dos municípios de Maragogipe, Saubara e Salinas da Margarida. (EIA/RIMA, 2009,
V 8, p. 73)
Comunidades da área de influência indireta do empreendimento: Sociedade dos
municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica. (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 73)
Comunicadores das áreas de influência direta e indireta do empreendimento:
Comunicadores atuantes nos meios de comunicação existentes na região da baía de
Iguape (públicos, privados ou comunitários), como radialistas, jornalistas, editores,
correspondentes, comunicadores, etc., visando sua formação como educomunicadores
parceiros, comprometidos com o desenvolvimento de um processo permanente de
formação da cidadania ambiental na região e com a construção da rede de
educomunicadores da baía do Iguape; Jovens, comunicadores espontâneos,
identificados nas escolas e comunidades, com vocação natural de liderança e
comunicação social, para formação em educomunicação e construção da rede de
educomunicadores da baía do Iguape. (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 73)
O PCS deve seguir os seguintes princípios teóricos e metodológicos:
Formação Ética: promovendo uma profunda reflexão de valores, hábitos, costumes,
crenças e visões de mundo, a partir das seguintes referências: respeito a todas as
formas de vida, valorização e inclusão da diversidade de culturas e estilos de vida e
da comunicação e ação comprometidas com a cultura de paz e solidariedade entre os
seres e os povos; (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 74)
Formação Autopoiética: contribuindo para a construção de uma sociedade consciente
de sua identidade e de seus valores ontológicos, aberta para o diálogo e a interação
com a diversidade cultural, responsável na relação com a natureza e estruturada nas
bases da autonomia e da interdependência social e ambiental; (EIA/RIMA, 2009, V
8, p. 74)
Formação Complexa e Ecológica: favorecendo a construção de saberes conectados e
implicados com a realidade dos participantes e com o contexto sociocultural e
ambiental regional, estruturados de forma sistêmica, capazes de compreender a
interdependência entre ecossistemas e comunidades; entre saúde, hábitos e costumes;
entre atividades e sustentabilidade; entre viver, conviver e sobreviver com a natureza
e em sociedade, assumindo corresponsabilidades; (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 74)
197
Formação Transdisciplinar: desenvolvendo com os participantes a perspectiva do
diálogo entre diversidades de saberes e percepções, promovendo a compreensão entre
diferentes culturas e a valorização da identidade na diversidade. A formação
transdisciplinar deve promover ainda, a valorização dos saberes tradicionais e a
construção dos saberes coletivos na construção do conhecimento ambiental e da
comunicação social, assim como a inclusão do respeito à diversidade religiosa, em
uma convivência pacífica e respeitosa na construção da rede de educomunicadores da
região; (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 74)
Outro aspecto prescrito pelo PCS é a Estrutura Cognitiva dos Processos Educativos e
Educomunicativos. A estrutura envolve seis núcleos: Núcleo de Estruturação Executiva do
Programa; Núcleo de Mobilização; Núcleo de Sensibilização; Núcleo de Formação e
Desenvolvimento de Capacidades; Núcleo de Gestão Social e Governança Local; e Núcleo de
Monitoramento e Avaliação. Além do Núcleos, a Estrutura Cognitiva prescreve a Construção
dos Recursos Pedagógicos Educomunicativos, que tem por finalidade a elaboração de recursos
pedagógicos educomunicativos, a partir da realidade ambiental, cultural, social e cognitiva da
região, favorecendo a educação ambiental e a comunicação social. (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p.
75-77)
Os Módulos de Formação e Desenvolvimento de Capacidades foram descritos no PCS
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 77) que têm por finalidade entender a cultura numa dimensão
antropológica, de valores, patrimônio, costumes, saberes tradicionais, bens materiais e
imateriais e afetividade. Ele está subdividido em seis módulos:
Sensibilização para uma cultura de paz e sustentabilidade, cidadania política e
ambiental; (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 77)
Conceitos ambientais e sócio culturais, relevantes para a região; (EIA/RIMA, 2009,
v. 8, p. 77)
Legislação ambiental, gestão do patrimônio ambiental, gestão social e governança
local; (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 77)
Atividades industriais e tradicionais, e seus impactos sociais e ambientais;
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 77)
Metodologias pedagógicas e interativas de educomunicação ambiental; e
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 77)
Elaboração, gerenciamento e gestão de projetos educomunicativos ambientais,
construção da rede de educomunicadores e estruturação dos espaços
educomunicadores. (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 77)
Monitoramento e Indicadores de Avaliação também foram prescritos no PCS (EIA/RIMA,
2009, V 8, p. 79). Eles estão divididos em três tipos:
Indicadores de Processo – são avaliados a partir do cumprimento das metas definidas
para cada atividade; (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 79)
Indicadores de Resultado – são avaliados a partir do cumprimento dos objetivos
definidos no Programa; e (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 79)
198
Indicadores de Impactos, ou também chamados de Indicadores de Emergências – são
avaliados a partir de ações que emergem do processo de implementação do Programa,
sem, no entanto, estarem previstas nos objetivos ou nas metas definidas nas atividades.
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 79)
O PCS (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 80) explicita os recursos necessários para a realização
do programa, estruturando a partir dos seguintes grupos:
Profissionais especializados – os profissionais selecionados devem, em seu conjunto,
ter experiência com processos de comunicação social, educação e educomunicação
ambiental, mobilização social, projetos sociais e ambientais em geral; (EIA/RIMA,
2009, v. 8, p. 80)
Contratação de serviços gráficos e audiovisuais – os materiais pedagógicos e
educomunicativos devem ser produzidos pela equipe técnica e formatados e
reproduzidos em gráficas, tais como: manuais dos cursos de formação e
desenvolvimento de capacidades, folders e cartilhas temáticas, cartazes, vídeos
pedagógicos, programas de rádio, jornais, boletins informativos e periódicos, entre
outros; (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 80)
Veiculação de informações nos meios de comunicação – a Comunicação Social deve
contemplar a veiculação de programas educomunicativos em rádios e TVs locais,
assim como reportagens e matérias difundidas em jornais impressos e peças especiais
como folders, boletins informativos, cartazes, e outros. Apoio ao desenvolvimento de
uma rádio comunitária, acessibilidade aos meios de comunicação e inclusão digital;
(EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 80)
Equipamentos – podem ser adquiridos e depois doados para os Espaços
Educomunicadores, ou alugados para o período de desenvolvimento do Programa.
São eles: computadores, impressoras, máquinas fotográficas, mobiliário, carro, entre
outros; (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 81)
Verbas operacionais – O desenvolvimento do Programa prevê verbas para: diárias de
profissionais, aluguel de espaços para realização dos cursos, lanche para o período
dos cursos e para as reuniões com as comunidades, combustível para deslocamento,
materiais de expedientes, reprografia, verbas para veiculação de campanhas e outros
serviços. (EIA/RIMA, 2009, v. 8, p. 81)
O PCS estabelece um cronograma físico, escalonado em 6 etapas com intervalo de 60 dias
(dois meses) para cada etapa, sendo que existem etapas que ocorrem em todos os meses, a
exemplo do ‘Monitoramento e Avaliação’. Conforme apresentado na tabela a seguir:
199
Tabela 9 – Cronograma para implementação do Programa de Comunicação Social.
Fonte: EIA/RIMA (2009, v. 8, p. 81).
O cronograma físico apresentado na Tabela 9 foi projetado para atuar durante a fase de
implantação do empreendimento. Toma-se como data de início para aplicação do PCS e
cumprimento do cronograma física a concessão, pelo IBAMA, da Licença de Instalação Nº
737/2010, emitida em 28 de outubro de 2010, com validade até 28 de outubro de 2013. A licença
é passível de renovação, e estabelece no item 2.13 a implantação dos programas que fazem
parte do Plano de Gestão Ambiental (PGA), dentre eles o Programa de Comunicação Social
(PCS). O EIA/RIMA (2009, v. 8, p. 82) expressa que a responsabilidade pela contratação e
implementação do PCS é dos capitalistas.
Conclui-se que o Programa de Comunicação Social (PCS) apresentado no EIA/RIMA
(2009) objetiva atender a política pública do Programa de Gestão Ambiental. Analisando os
dados, pode-se afirmar que as prescrições estabelecidas no PCS, caso implementadas, podem
levar a efetivação de uma política pública que permita as comunidades afetadas pela
implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu auferir os ganhos sociais projetados
no EIA/RIMA (2009), mitigando os aspectos negativos do empreendimento e potencializando
os aspectos positivos. No sentido inverso, a não efetivação do Programa de Comunicação Social
200
não apenas afeta a integralidade do Programa de Gestão Ambiental previsto pelo EIA/RIMA
(2009), como tende a acrescer e a agravar os conflitos sociais nas comunidades afetadas pelo
empreendimento.
Também conclui-se que o Programa de Comunicação Social (PCS) é omisso com relação
ao processo de acompanhamento e fiscalização inerente aos conceitos de Accountability e
Empowerment. Ou seja, ao não estabelecer mecanismos de transparências e empoderamento
junto as comunidades afetadas pelo empreendimento, o PCS compromete uma eficaz
participação da comunidade local no processo de implantação e operação do empreendimento,
ao verificar que todo o processo de fiscalização está limitado ao próprio Estado, através dos
órgãos de gestão direta, indireta, e de controle. Este distanciamento entre uma política pública
que objetiva a participação da comunidade e o empoderamento da mesma, com relação ao PCS
nega o conceito de democratização, autonomia e emancipação.
Conforme observa Francisco de Assis Morais da Costa (2008, p. 9) “uma política de
comunicação ambiental baseada nos princípios da democratização, promoção da autonomia e
emancipação, se materializa quando há condições de inclusão ampla no direito à comunicação,
que significa não só poder ter acesso à informação e aos bens culturais mediatizados ou não,
mas também acesso à participação na criação e na gestão dos meios de comunicação.”.
Contrapondo a afirmação de Costa (2008) com as prescrições do PCS (EIA/RIMA (2009),
observa-se que faltam mecanismos de participação democrática no PCS.
5.1.7 O ESTADO, O IMPÉRIO E AMPLIAÇÃO DA SUPEREXPLORAÇÃO E A
MANUTENÇÃO DO SUBPROLETARIADO
Analisando o conjunto de dados, observa-se que a dialética do Estado contribui para
ampliar a dominação, ampliando a exploração. Isto ocorre através do conjunto de políticas
públicas, com a transferência de recursos financeiros do Estado, através da constituição de
novas propriedades, e da demarcação de espaços de negócios, conduzindo o Estaleiro a se
constituir em capital monopolista, uma vez que detém contratos para fornecimento
embarcações e sondas que garantem a operação da empresa, com margens significativas de
lucro. As articulações destes elementos garantem aos capitalistas a reificação do Império
Observando as prescrições legais a respeito dos direitos sociais das comunidades
tradicionais, conjugando com os dados levantados na pesquisa e a experiência de campo do
pesquisador, infere-se que as normais legais que asseguram os direitos das comunidades
201
tradicionais não passa de quimera. Na prática, o Estado atua favorecendo a superexploração das
comunidades tradicionais afetadas pelo empreendimento, mantendo-as como subproletariado e
superexplorada.
Conclui-se que a condição de subproletariado e superexplorada surge em decorrência do
próprio sistema capitalistas. Analisando a condição de subproletariado, observa-se que existe
uma tendência a ampliação das condições de empobrecimento da comunidade em decorrência
das degradação do bioma. Observando que as características educacionais da população, além
da deficiência do sistema de ensino, e da constituição histórica do capitalismo, com traços
senhoriais, absteve as comunidades tracionais do Recôncavo da Bahia de ganhos sociais
consistentes, mantendo um significativo conjunto populacional como subproletariado.
Constata-se que apenas uma pequena parcela da população é inserida como classe trabalhadora
no Estaleiro. Os poucos contratados desenvolvem atividades que necessitem de força física e
trabalho intenso. Estas categorias são as que recebem os menores salários, se configurando
como classe superexplorada.
5.2 A DIALÉTICA DOS CAPITALISTAS
Neste tópico é analisado o processo histórico de fundação do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu, sendo observado como capitalistas nacionais e internacionais se associam na
constituição de uma nova estrutura, utilizando recursos do Estado, oriundos das transferências
financeiras, concernentes as políticas públicas do P&G, e da indústria naval.
Na sequência é observando a visita da Presidenta de República, Dilma Rousseff, à sede do
distrito de São Roque do Paraguaçu, avaliando como a ação chancela a participação do Estado
na constituição do Estaleiro e contribui para a expansão do Império. O tópico é concluso com
a análise das condicionantes do Programa de Comunicação Social e do cumprimento da Medida
Mitigadora nº 40, a partir da perspectiva dos capitalistas.
5.2.1 OS CAPITALISTAS E O ESTALEIRO ENSEADA DO PARAGUAÇU
O processo de fundação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A. (EEPSA) está associado
a uma série de eventos. Eles começam com a Política Pública para o setor de P&G, tem
seguimento com a mudança na orientação econômica do governo Lula, no sentido de
desenvolver forças produtivas nacionais. Também contribui para a fundação do estaleiro as
descobertas das reservas do pré-sal, a retomada dos investimentos na indústria naval nacional,
202
a publicação de legislação estadual específica para o setor, através do Governo da Bahia. A
busca dos capitalistas pelo lucro, que nesse caso está associada a elevada taxa de mais-valia,
por compreender cerca de cinco mil trabalhadores, com utilização de avançada tecnologia. Estes
eventos se materializam a partir do segundo semestre de 2008, com a constituição do Consórcio
Rio Paraguaçu (CRP), com finalidade de atender a construção de duas plataformas (P-59 e P60) através de contrato celebrado com a Petrobras Netherlands B.V., empresa subsidiária da
estatal PETROBRAS S/A.
Com contrato de US$ 712,5 milhões, o Consórcio Rio Paraguaçu (CRP) pode se consolidar,
formando duas empresas com finalidades distintas. O Consórcio Rio Paraguaçu (CRP),
responsável pela operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA), cuja finalidade é a
construção e integração de unidades offshore, como plataformas, navios especializados e
unidades de perfuração petróleo; e o Consórcio Estaleiro Paraguaçu (CEP)75, cujo objetivo é
construir as instalações do estaleiro. As duas empresas detinham a mesma composição
acionária, a Odebrecht Participações e Investimentos S.A., com 50% das ações; OAS
Investimento S.A., com 25%, e UTC Participações S.A. (através da subsidiária CONSTRAN),
com 25%. (EEPSA, 2013).
O momento exato em que ocorre a transição do Consórcio Rio Paraguaçu (CRP) para o
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A. (EEPSA), ou seja, como ocorre o encerramento das
operações do CRP e o início do EPPSA ficaram sem resposta, apesar das consultas ao Governo
do Estado, Ministério Público, IBAMA e através da direção do próprio estaleiro. Também fica
sem resposta com que tipo de licença ambiental o CRP operou, da fundação da empresa em
agosto de 2008, até o anúncio da Licença Prévia Nº 354/201076 concedida em maio de 2010
pelo IBAMA ao Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA). Observa-se que no comprovante de
inscrição do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) fica estabelecido que o EEPSA foi
aberto em 29 de junho de 2010, com CNPJ nº 12.243.301/0001-25, e nome empresarial Enseada
Indústria Naval S.A.
Para efeito de análise, considera-se que a data de transição ocorre em 29 de junho de 2010,
e que nesta data a empresa passa a operar com a licença prévia do IBAMA, e que, portanto,
deve passar a atender as condicionantes do Impacto Ambiental e Relatório de Impacto ao Meio
Ambiente prescritos pelo governo da Bahia, em 2009, e as determinações estabelecidas pelo
75
76
Ver anexo 8.22 – Composição acionária do Consórcio Construtor.
Ver Anexo 8.13 – IBAMA – Licença Previa Nº 354/2010.
203
IBAMA na Licença de Instalação Nº 737/201077 e no Parecer Técnico Nº 042/201078. Segundo
o próprio presidente do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, Fernando Barbosa, O EEPSA foi
constituído em 2010 (SICM, 2012, p. 19). Além destes indícios de transição, todos as
publicações oficias que Governo da Bahia realizou a partir de 2010, indicam que a empresa que
operava os contratos em São Roque do Paraguaçu era o EEPSA, inclusive os contratos
referentes as plataformas P-59 e P-60.
Nas imagens a seguir são apresentadas as instalações do COSRP pertencentes a
PETROBRAS e arrendadas ao EEPSA, além das plataformas P-59 e P-60:
Figura 25 – Imagem aérea registra estágio de conclusão das plataformas P-59 e P-60.
Fonte: Produção própria (2012).
77
78
Ver Anexo 8.14 – IBAMA – Licença de Instalação Nº 737/2010.
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
204
Figura 26 – Imagem aérea demonstra estrutura Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu.
Fonte: Produção própria (2012).
As imagens aéreas (Figuras 25 e 26) explicitam a estrutura com a qual operou o Consórcio
Rio Paraguaçu (CRP), através do arrendamento de parte do Canteiro de Obras de São Roque
do Paraguaçu (CORSP) pertencente a PETROBRAS. Também demonstram que em 2 de março
de 2012 as plataformas P-59 e P-60 estavam em estágio avançado de conclusão. O
arrendamento realizado pelo CRP foi sucedido pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Com a sucessão realizada e nova composição acionária estabelecida, a EEP Participações
S.A. passa a operar com uma carteira de encomendas de US$ 6,5 bilhões, e o projeto de
construção do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. O estaleiro está sendo implantado com recursos
financeiros da ordem de R$ 2,6 bilhões. Ele foi projetado para consumir 36 mil toneladas de
aço por/ano, trabalhando em regime de turno único, o que permite ampliar a capacidade de
consume de aço/ano e, consequentemente, a produção. O empreendimento ocupa área de 1,6
milhão de metros quadrados, dos quais 400 mil metros quadrados foram destinados à
preservação ambiental. Quando finalizada a construção, foram projetadas geração de 15 mil
empregos diretos indiretos, com capacidade de processar, em turno único, 36 mil toneladas de
aço por ano. (EPPSA, 2013)
205
A empresa objetiva estimular o desenvolvimento de ampla cadeia de fornecedores,
“promovendo uma política responsável de desenvolvimento e contratação de mão de obra
local”, resultando em um “novo ciclo econômico no Recôncavo Baiano”. O Estaleiro Enseada
do Paraguaçu foi concebido para estar entre os mais eficientes e modernos do mundo, e tem a
pretensão de se tornar um marco na indústria naval brasileira por reunir “alta tecnologia, gestão
focada em resultados e consistente política de sustentabilidade”. (EPPSA, 2013)
Analisando o conjunto de dados apresentados, e levando em consideração a pesquisa de
campo, pode-se inferir que o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, quando concluso a construção
das instalações própria, se configura em uma das mais modernas industrias navais no mundo,
no que tange os aspectos de infraestrutura, tecnologia e acesso marítimo.
Quando observada a dinâmica de implantação e operação do empreendimento observa-se
que um processo histórico de alienação e empobrecimento, nas comunidades afetadas pelo
empreendimento se repete. Este processo ocorre com frequência, quando analisadas a
implantação da RELAM, em Candeias; e do Canteiro de Obras em São Roque do Paraguaçu.
Ou seja, enquanto uma infraestrutura capitalista se ergue, utilizando avançadas técnicas e
tecnologias do capitalismo, permanece no entorno, de forma excludente, auferindo poucos
ganhos sociais, acrescidas de conflitos no campo da violência e ambiental, as populações que
tradicionalmente vivem nestas localidades.
A imagem a seguir ilustra a estrutura do estaleiro:
Figura 27 – Representação gráfica da estrutura do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Fonte: Jornal Grande Bahia (2013).
206
A Figura 27 é uma representação gráfica das instalações do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu. Pode-se observar que o empreendimento foi projetado para construir,
simultaneamente, duas embarcações de grande porte. Também, a imagem permite inferir que
toda a área foi esterilizada, ou seja, dentro do complexo industrial inexistem áreas verdes. O
que demonstra o significativo impacto ambiental direto em uma área que era utilizada,
regularmente pelas, comunidades tradicionais como forma de produção da subsistência.
Além da construção e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (Figura 27), a EEP
Participações S.A opera o Estaleiro Inhaúma. O Estaleiro Inhaúma foi arrendado pela Petrobras,
sendo operado pela EEP Participações S.A, ele fica localizado no bairro do Caju, às margens
da Baía da Guanabara, na cidade do Rio de Janeiro. Quando o estaleiro estiver operando em
capacidade plena, a previsão é que sejam gerados cerca de cinco mil empregos. Além da
revitalização de suas instalações do Estaleiro Inhaúma, a EEP Participações S.A “está
realizando para a Petrobras a conversão de quatro navios petroleiros nos cascos das futuras
plataformas P-74, P-75, P-76 e P-77, que serão destinadas às áreas da Cessão Onerosa, no présal da Bacia de Santos.”. As plataformas foram projetadas com capacidade de produção até 150
mil barris de petróleo por dia, e de comprimir sete milhões de metros cúbicos de gás natural por
dia. (EPPSA, 2013)
O INGRESSO DA KAWASAKI
Em 4 de maio de 2012, a japonesa Kawasaki Heavy Industries Ltda. (KHI) juntou-se a
Odebrecht, OAS e UTC, como acionista e parceiro tecnológico. O ingresso da multinacional
estrangeira fez com que ocorresse uma reorganização societária, dando surgimento a EEP
Participações S.A., empresa controladora do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A (Enseada
Industria Naval S.A.). A nova composição acionária do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A.
ficou distribuída da seguinte forma: 70% do capital é controlado EEP Participações S.A.
(Odebrecht, 50%; UTC, 25% e OAS, 25%.) e 30% do capital pertence a Kawasaki Heavy
Industries. No ato de formalização do ingresso da Kawasaki, estiveram presentes: Satoshi
Hasegawa, presidente da KHI; Nobumitsu Kambayaschi, vice-presidente executivo da KHI;
João Argollo, Diretor da UTC Engenharia; Fernando Barbosa, diretor-presidente do EEPSA;
Norberto Odebrecht, presidente de honra da Odebrecht S.A.; Marcio Faria, líder empresarial da
Odebrecht Engenharia Industrial; Agenor Medeiros, diretor da OAS; e Ricardo Pessoa,
Presidente da UTC. (EEPSA, 2013), (KAWASAKI, 2013) e (ODEBRECHT NOTÍCIAS,
2012)
207
Com a entrada da Kawasaki como acionista em 2012, a EEPSA buscou suprir e ampliar os
ganhos tecnológicos. A participação da empresa japonesa garante um processo de transferência
tecnológica, e assegura condições e prazos para a entrega de equipamentos navais de alta
complexidade.
O processo de transferência tecnológica contempla o treinamento de
profissionais do EEPSA nas plantas industriais e centros de tecnologia e formação da Kawasaki
no Japão. Este processo também inclui consultorias em diversas áreas da construção naval.
(EPPSA, 2013) e (KAWASAKI, 2013)
No acordo de transferência tecnológica, assinado em 2012, ficou estabelecido que cerca de
100 profissionais, oriundos do Brasil, devem fazer intercâmbio em um dos estaleiros da KHI
no exterior, com a finalidade de atuarem profissionalmente, além de agirem como
multiplicadores do conhecimento no EEPSA. Outro grupo, formado por cerca de 50
profissionais da KHI passam a trabalhar no EEPSA, com objetivo de treinar e supervisionar os
trabalhadores na Bahia. Com sede em Kobe, além de navios, a Kawasaki fabrica motocicletas,
trens, aviões, projeta e constrói plantas industriais, robôs para uso industrial e equipamentos
aeroespaciais. (SICM, 2013, p. 67)
O relatório da Odebrecht S.A. (POLIDORO, 2013, p. 5879) informa que estão previstos R$
2,6 bilhões de investimento por parte dos acionistas do EEPSA e, que, ao final de 2013, a
empresa contava com R$ 6,5 bilhões em encomendas de clientes, sendo que R$ 1,7 bilhão são
oriundos de contratos firmados com a PETROBRAS e R$ 4,8 bilhões da Sete Brasil.
O relatório também aponta o EBITDA, sigla que significa em Inglês ‘Earnings Before
Interest, Taxes, Depreciation and Amortization’ (lucros antes de juros, impostos, depreciação e
amortização), apontando o montante de R$ 27 milhões, no exercício fiscal de 2012.
Observa-se que os capitalistas operaram, através do Estaleiro Enseda do Paraguaçu, em
2012, com receita bruta de R$ 164 milhões e obtendo lucro de R$ 27 milhões. Ou seja, em 2012
os capitalistas auferiram uma margem de lucro bruto de 16,5 %, sendo recompensados com
elevada taxa de mais-valia, uma vez que a empresa opera com incentivos fiscais e
financiamento governamental. Em contraposição à pesquisa de campo, não foram identificados
ganhos socioeconômicos na comunidade de São Roque do Paraguaçu.
79
Ver Anexo 8.19 – Relatório da Odebrecht S.A. sobre o Estaleiro Ensedada do Paraguaçu (2013).
208
A seguir são apresentados os perfis dos capitalistas, sócios do EEPSA, e dos clientes do
estaleiro. Os capitalistas são formados por grupos industriais com expressiva participação no
Império.
ODEBRECHT
A Odebrecht Participações e Investimentos S.A. é uma organização de origem brasileira
com atuação nos setores de infraestrutura, energia, saneamento, química e petroquímica,
transporte e logística, agroindustrial, imobiliário, defesa e tecnologia. É a maior exportadora
brasileira de serviços e uma das maiores multinacionais do Brasil, com atuação em 93 países.
Em 1981, foi criada a Odebrecht S.A., holding da Organização é responsável pelo
direcionamento estratégico e pela manutenção da unidade filosófica, assegurada pela prática da
Tecnologia Empresarial Odebrecht (TEO). (EEPSA, 2013) e (ODEBRECHT – ESTRUTURA
EMPRESARIAL, 2012)
OAS
A OAS Investimento S.A. é uma das maiores empresas de engenharia do Brasil, ela está
presente em mais de 20 países. Atua na construção de estradas, barragens, hidrelétricas, portos
e aeroportos e também investindo em setores como infraestrutura, saneamento ambiental,
incorporação imobiliária, energia e concessões de serviços públicos – como vias urbanas,
rodovias, metrôs e aeroportos. (EEPSA, 2013)
UTC
A UTC Participações S.A. possui atuação global, sendo uma das maiores empresas
brasileiras de Engenharia Industrial. Destaca-se por obras de grande porte nos segmentos de
óleo e gás, petroquímica, energia, siderurgia, papel e celulose, mineração e manutenção
industrial. (EEPSA, 2013)
KAWASAKI
A Kawasaki Heavy Industries Ltda. (KHY) foi fundada como estaleiro, em 1878, no Japão.
A empresa expandiu as atividades para segmentos como construção e transportes, atuando
também como fabricante de motocicletas, trens, aviões, plantas industriais, robôs para uso
industrial e equipamentos aeroespaciais. Está presente no Brasil desde 1973. (EEPSA, 2013) e
(KAWASAKI, 2013)
209
CLIENTES DA EEPSA
Em de 11 de julho de 2013, a EEPSA registrava como clientes a Petrobras e a Sete Brasil.
A Petrobras é a maior empresa nacional e a quinta maior empresa do mundo no setor de energia.
Ela está presente em 28 países e atua em praticamente toda a cadeia de valor do P&G, além das
áreas de biocombustíveis, energia eólica e hidroelétricas A empresa é referência na prospecção
de combustíveis fósseis em águas profundas, sendo protagonista na descoberta dos recursos
minerais na região do pré-sal, de onde projeta extrair 5 bilhões de barris de petróleo e gás
natural. Atualmente (11 de julho de 2013), o EEPSA está trabalhando para a Petrobras na
conversão de quatro navios petroleiros nas plataformas P-74, P-75, P-76 e P-77. (Petrobras –
Quem somos, 2013) e (EPPSA, 2013)
A Sete Brasil é especializada na gestão de ativos, sendo a principal parceira nas operações
de perfuração de poços de óleo e gás em águas ultraprofundas no país. Com encomendas de 28
sondas de perfuração (navios-sonda e sondas semi-submersíveis) e uma carteira de recebíveis
de mais de US$ 80 bilhões para os próximos 20 anos, a empresa ocupa o primeiro lugar em
contratos de afretamento no mundo, possuindo a maior frota privada de navios no segmento. A
Sete Brasil é constituída de capital 100% nacional, sendo a primeira empresa a construir esse
tipo de embarcação para a exploração do pré-sal no país, desenvolvendo e retendo tecnologia
no Brasil. Atendendo à encomenda da Sete Brasil, o EEPSA está construindo seis navios-sonda
que serão empregados nas operações no pré-sal. Quatro navios-sonda serão operados pela OOG
(Odebrecht Óleo e Gás) e dois pelas empresas Etesco/OAS, parceiras da Sete Brasil. (sete brasil,
2013) e (EPPSA, 2013)
CAPITALISMO E EXCLUSÃO
Observa-se que a articulação dos capitalistas (proprietários do Estaleiro e clientes), com o
empreendimento e a finalidade de produção, encontra-se condicionada ao próprio Império, ou
seja, condicionada ao sistema capitalista, conduzindo trabalhadores de diferentes partes do
mundo a entrarem em competição desigual, uma vez que o objetivo dos capitalistas é com o
lucro, sendo a classe trabalhadora subordinada ao interesse do capital em ampliar a taxa de
mais-valia.
O que se infere é que a articulação de capital Estatal, com capital nacional e internacional
apenas reforça um sistema excludente de produção. Michael Hardt e Antonio Negri (2010, p.
245) afirmam que “a procura de capital constante adicional (sobretudo, mais e mais novos
210
materiais) impele o capital para um imperialismo caracterizado pela pilhagem e pelo roubo.”.
O que se observa em São Roque do Paraguaçu é que a comunidade foi desterritorializada, tendo
o modo de produção modificado pelo empreendimento. Os capitalistas aliados ao Estado
promoveram uma verdadeira pilhagem de uma propriedade cuja função era destinada a um
modo de produção baseado na cultura de subsistência.
Ao implantar o empreendimento, os capitalistas subtraíram da comunidade o próprio
processo histórico com o qual se desenvolveram, devolvendo-lhe uma promessa de
desenvolvimento com inclusão social. Observando os dados da pesquisa pode-se afirmar que
isto não passa de quimera, não passa de uma falsa promessa de desenvolvimento.
No próximo tópico é apresentada a visita da Presidenta da República ao Estaleiro, e
analisando como a ação do Estado chancela a participação no processo de expansão do
capitalismo. Também são apresentados e analisados dados numéricos sobre o Estaleiro,
compreendendo o volume de capital do empreendimento e o número de trabalhadores
mobilizados. São discorridos os tipos de equipamentos industrializados e relatados o volume e
valores de contratos celebrados entre o Estaleiro e os clientes. Por fim, é apresentada e analisada
a entrevista concedida por uma liderança política local, sobre o processo de implantação do
Estaleiro e os reflexos na comunidade.
5.2.2 OS CAPITALISTAS, O ESTADO, E A CELEBRAÇÃO DA ALIANÇA COM O ESTADO
Em 13 de julho de 2012, em Maragogipe, na sede do distrito de São Roque do Paraguaçu,
na parte do Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu (COSRP) arrendado ao EEPSA,
ocorre um evento pontuado por momentos distintos, com objetivo de celebrar a consolidação
das operações estabelecidas entre o Estado – Governo Federal e Governo da Bahia, os
capitalistas reunidos no EEPSA, e os clientes e parceiros comerciais PETROBRAS e SETE
Brasil. O evento contou com a presença de Dilma Rousseff, Presidenta da República; Jaques
Wagner, governador da Bahia; Helena Chagas, ministra-chefe da Secretaria de Comunicações
da Presidência da República; Edison Lobão, ministro de Minas e Energia; Paulo Passos,
ministro dos Transportes; José Sergio Gabrielli, secretário estadual de Planejamento; Carlos
Costa, secretário estadual da Indústria Naval e Portuária; James Correia, secretário estadual da
Indústria, Comércio e Mineração; Walter Pinheiro, senador; Maria das Graças Foster,
presidenta da Petrobras; João Carlos Ferraz, presidente da Sete Brasil; Fernando Barbosa,
presidente do EEPSA; Marcelo Odebrecht, presidente da Odebrecht; Nobumitsu Kambayashi,
211
vice-presidente da KHI; Leo Pinheiro, presidente da OAS; Ricardo Pessoa, presidente da UTC
Engenharia, dentre outras personalidades ligadas ao governo e ao setor privado.
O evento foi marcado por três momentos distintos. No primeiro momento, a presidenta
Dilma Rousseff destacou em discurso os investimentos e a postura do Estado. O segundo
momento foi pontuado pelo batismo da plataforma P-59, e o terceiro pelo lançamento da pedra
fundamental do EEP. Com o gesto, Estado e capitalistas davam início simbolicamente à
construção.
No discurso da presidenta Dilma Rousseff, fica evidenciando o nível de comprometimento
do Estado com o empreendimento, conforme trecho a seguir:
Eu sei que aqui tem muita gente que foi treinada pelo Prominp. Porque é importante
perceber que, quando a gente cria uma indústria naval, nós temos de capacitar os
nossos trabalhadores. E eu quero dizer para vocês que o grande compromisso com o
meu governo não é só fazer a plataforma, é garantir que os trabalhadores e as
trabalhadoras sejam capacitados e possam enfrentar trabalhos. [...] Eu quero
compartilhar com vocês uma grande preocupação que nós devemos ter com nosso
país, que é garantir, para este país, um desenvolvimento que beneficie as pessoas.
Podem dizer o que quiserem, mas um desenvolvimento só merece esse nome se
beneficiar a cada um dos brasileiros e das brasileiras. [...] Ao mesmo tempo, eu quero
dizer a vocês que parcerias como essa, como a construção dessa sonda, como o que
significa a volta para o Brasil de estaleiros, que estavam desaparecidos do nosso
cenário desde 1980. Parcerias como essa, entre uma empresa como a Petrobras e esses
estaleiros e essas pessoas de empresas que construíram essa sonda serão a nossa busca.
Nós iremos tratar de fazer concessões em várias áreas e assegurar uma taxa crescente
de desenvolvimento e de investimento para o nosso país. (ROUSSEFF, 2012)
Ao analisar o discurso da presidenta Dilma Rousseff fica evidente o comprometimento do
Estado com os capitalistas, cabendo ao Estado o papel de capacitar a mão de obra e incentivar
o investimento através da transferência de recursos públicos e do estabelecimento de contratos
entre empresas públicas e privadas, assegurando a expansão capitalista a uma taxa constante.
Sobre o discurso da presidenta, Norberto Bobbio (1986, p. 74) observa que “com o nascimento
da propriedade individual nasce a divisão do trabalho, com a divisão do trabalho a sociedade se
divide em classes, na classe dos proprietários e na classe dos que nada têm, com a divisão da
sociedade em classe nasce o poder político, o Estado, cuja função é, essencialmente, a de manter
o domínio de uma classe sobre outra.”. Ou seja, o Estado ao privilegiar a relação de poder,
perpetua a dominação.
O segundo momento ocorreu com o batismo da plataforma P-59. O equipamento foi
construído através de contrato com a PETROBRAS, que investiu cerca de US$ 360 milhões na
construção da plataforma, composta por casco flutuante de 11 mil toneladas, com três pernas
retráteis independentes e 145 metros de altura cada. Uma segunda plataforma, a P-60, idêntica
212
P-59, foi entregue em 24 de outubro de 2012. Os contratos de construção das duas plataformas
foram assinados em setembro de 2008 com o Consórcio Rio Paraguaçu. As unidades fazem
parte do Programa de Aceleração do Crescimento I (PAC I) do Governo Federal. As obras
geraram cerca 2.100 empregos diretos no ápice da construção, dos quais 50% formados por
trabalhadores oriundos do Recôncavo Baiano, 25% de São Roque, 15% de outros locais da
Bahia e 10% de outros Estados. Segundo comunicado da Petrobras (2012), há 30 anos que este
tipo de plataforma não era produzida no Brasil. (PETROBRAS, 2012)
O terceiro momento, lançamento da pedra fundamental do Estaleiro, não ocorreu no
Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu (COSRP), mas na cidade vizinha, Salinas da
Margarida. A mudança foi necessária porque para ter acesso ao terreno onde está sendo
construído o Estaleiro, na Ponta do Corujão, localizado ao lado comunidade de Enseada
Paraguaçu, é necessário utilizar a Rodovia BA-534 que passa por Salinas. Não existe ligação
viária entre a sede do distrito de São Roque do Paraguaçu e a comunidade de Enseada. Mas, em
27 de julho de 2013, o governador Jaques Wagner assinou ordem de serviço para construção
da ponte sobre o rio Baetantã, ao custo de R$ 42,4 milhões, interligando a sede do distrito ao
povoado de Enseada e interligando as rodovias BR-534 a BR-420. Também foram autorizados
investimentos no sistema viário da ordem de R$ 7,5 milhões. (JORNAL GRANDE BAHIA,
2012)
Durante o lançamento da pedra fundamental foram apresentados alguns números do
empreendimento: três mil empregos diretos durante a construção, e cinco mil quando o EEP
entrar em operação, com capacidade total para processar até 36 mil toneladas de aço por ano.
Os investimentos totalizam R$ 2 bilhões e o estaleiro ficaria pronto no segundo semestre de
2014, do total, R$ 1,5 bilhões seriam financiados pelo Estado e R$ 500 milhões pelos
capitalistas. Publicações posteriores atualizaram o valor para R$ 2,6 bilhões e previsão de
inauguração em março de 2015. Os números sobre geração de emprego são as mais díspares
possível. Mas, durante o primeiro encontro com a imprensa, ocorrido em 5 de setembro de
2013, promovido pelo EEPSA, o Estaleiro informou que, oficialmente, em julho de 2013 o
EEPSA e o CEP contavam com 7.113 trabalhadores, destes 2.945 trabalhavam como
contratados do EEPSA, 781 eram subcontratados através de empresas terceirizadas. Enquanto
2.832 eram contratados pelo Consórcio Construtor (CEP) e 554 eram subcontratados através de
empresas terceirizadas. O ponto máximo de contratação foi previsto para janeiro de 2014, sendo
213
que a partir desta data, os trabalhadores, mobilizados para construção do Estaleiro seriam
dispensados gradativamente. (JORNAL GRANDE BAHIA, 2012), e (PRESS TRIP, 2013)
O gráfico a seguir, indica a cidade de origem dos trabalhadores mobilizados para o CEP:
Gráfico 5 – Percentual da cidade de origem dos trabalhadores do Consórcio Construtor.
Fonte: Press Trip (2013)
O Gráfico 5 indica que 43% dos trabalhadores do Consórcio Construtor (CEP) são oriundos
de Maragogipe, enquanto 22% são oriundos de Salinas da Margarida, outros 6% são oriundos
de Salvador e Nazaré. Com relação aos contratados pelo EEPSA não foram apresentados dados,
apenas ocorreu o informe que 60% eram oriundos de Maragogipe. Foi solicitado que o EEPSA
apresentasse relatório detalhado sobre as contratações, os dados foram negados pela empresa
sob a alegação de se tratar de informação sigilosa.
A EEPSA informou que no Relatório Institucional nº 480 os dados solicitados poderiam ser
vistos. Analisando o Relatório Institucional do EEPSA (2013, ed. 4, p. 8), identificou-se que a
80
Ver Anexo 8.20 – Relatório Institucional nº 4 do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA, 2013)
214
fonte do dado não era o Estaleiro mas o Serviço Estadual de Intermediação para o Trabalho
(SINEBAHIA). Ele aponta que de janeiro a abril de 2013, 3.304 pessoas foram contratadas.
Elas são oriundas das localidades impactadas pelo Estaleiro. Ocorre que o relatório não informa
quantas pessoas foram contratadas e de quais localidades. Apenas, limita-se a informar que
foram feitos cadastros através de agência de empregos do governo.
Com relação aos produtos resultados do processo industrial do Estaleiro, observa-se que o
empreendimento foi projetado para atuar na construção naval produzindo:
Unidades de perfuração – Construção de sondas de perfuração offshore,
principalmente para exploração em águas profundas, como a do petróleo na camada
pré-sal. (EEPSA, 2013)
Unidades de produção – Construção e conversão de plataformas fixas e flutuantes,
além da construção e integração de seus módulos. (EEPSA, 2013)
Navios especializados – Construção de navios para apoio offshore, como PLSV,
MPSV e Construction Support Vessels (Construção de Embarcações de Apoio).
(EEPSA, 2013)
Reparo naval – Focado no atendimento dos mesmos tipos de embarcações do
programa de construção: unidades de perfuração, unidades de produção e navios
especializados. (EEPSA, 2013)
Em fevereiro de 2014, o EEPSA informava que detinha encomendas de seis navios sonda
para operação no pré-sal, com lâminas d’água de três mil metros de profundidade. Destes,
quatro navios são fabricados em parceria com a Odebrecht Óleo e Gás – Ondina, Pituba,
Boipeba e Interlagos – sendo entregues até 2018. Em parceria com a Etesco/OAS, o estaleiro
entrega, em 2020, os navios Itapema e Comandatuba. As encomendas totalizam U$ 4,8 bilhões.
(EEPSA, 2013)
Os investimentos realizados pelo Estado e pelos próprios capitalistas, através do EEPSA,
provocaram transformações na comunidade de São Roque do Paraguaçu. Uma das pessoas que
avaliou as transformações foi o deputado federal Luiz Alberto Silva dos Santos (Luiz Alberto,
PT-BA). Ele expressou as mudanças ocorridas na comunidade de São Roque do Paraguaçu:
Não mudou ainda aquilo que a população precisa, acho que a vinda, agora consolidada
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, já tínhamos um Estaleiro que é da PETROBRAS,
que foi cedido para um consórcio utilizar. Agora com a construção do novo Estaleiro,
eu acredito que o poder público terá um olhar mais apurado sobre as necessidades do
distrito. Até porque esse distrito de São Roque do Paraguaçu vem paulatinamente
crescendo muito em termo de população residente, e precisa de muita infraestrutura,
pavimentação, saneamento, saúde, a questão da segurança pública. (JORNAL
GRANDE BAHIA, 2012)
Observado o discurso de Luiz Alberto, entende-se que ele reconhece o crescimento
populacional induzido pela expansão capitalista, mas destaca que o Estado não tem feito os
investimentos necessários para garantir a estabilidade social da comunidade. Outra questão
215
levantada, foi com relação a inserção da população negra como força de trabalho no Estaleiro,
Luiz Alberto avaliou que existe a
necessidade de implementar uma política de inclusão, que leve em consideração a
questão de raça e gênero aqui nesse empreendimento. É fato que aqui vai gerar muito
emprego, vai dinamizar a economia, gerar renda, mas s e a gente não tomar medidas
concretas que permitam a inclusão desse setor que historicamente esteve fora da vida
social e econômica no nosso país, eles continuarão fora. [...] Eu tenho discutido muito
nesse programa chamado PROMINP, da necessidade de estabelecer critérios que
facilitem o acesso de jovens negros na formação e na capacitação dessa mão de obra
para que eles possam ter acesso aqui a esse emprego. (JORNAL GRANDE BAHIA,
2012)
Observa-se que o deputado federal também reconhece a necessidade da correção dos
programas de formação de pessoal, com intuito de incluir a população negra como trabalhadores
no Estaleiro em postos que sejam melhor remunerado, afirmando que o PROMINP precisa
reavaliar essa conjuntura em relação à comunidade local.
ENTRE A INTENÇÃO POLÍTICA E A REALIDADE SOCIAL
Na fala dos atores políticos, Dilma Rousseff e Luiz Alberto, fica evidente que o Estado é
um poder de classe, e que este poder serve ao capitalismo. A retorica dos atores políticos remete
a uma ideia de desenvolvimento que não se reflete na realidade social. Sobre este aspecto,
comenta István Mészáros (2011b, p.124) “o capital é seu próprio sistema de comando, de que
é parte integrante a dimensão política, ainda que de modo algum parte subordinada.”.
Enquanto o discurso político de Dilma Rousseff e Luiz Alberto apontam para a
dissimulação de uma ideia de desenvolvimento da classe trabalhadora, a prática materializa
novas e excludentes formas de relações de produção. Analisando o conjunto de dados
discorridos neste tópico, pode-se confirmar o que argumenta Nicos Poulantzas (2000, p. 3132): “O índice de ideologização do discurso e também das práticas materiais do Estado é
portanto flutuante, variável e diversificado segundo as classes e frações de classe às quais se
dirige o Estado e sobre as quais age. A verdade do poder escapa, frequentemente, às massas
populares, não porque o Estado a esconda, mascare expressamente: sim, porque, por razões
infinitamente mais complexas, as massas não conseguem compreender o discurso do Estado às
classes dominantes.”.
Outra abordagem sobre o papel do Estado no processo de expansão capitalista identificado
no texto é sintetizado por István Mészáros (2011b, p.124) ao afirmar que “o Estado moderno –
na qualidade de sistema de comando político abrangente do capital – é, ao mesmo tempo, o prérequisito necessário da transformação das unidades inicialmente fragmentadas do capital em
216
um sistema viável, e o quadro geral para a completa articulação e manutenção deste último
como sistema global.”.
Nicos Poulantzas (2000, p. 32) fazendo uma releitura de Marx, afirma que “o papel
decisivo do Estado nas relações de produção e na luta de classes já está presente em sua
formação, portanto em sua reprodução.”. Analisando o conjunto de dados apresentados, podese afirmar que o sistema atua no sentido de ampliar o poder do Império e, desta forma as, taxas
de mais-valia. O resultado deste processo tem degenerado o meio ambiente e desestabilizado a
natureza, provocando desequilíbrio ambiental em uma intensidade que compromete a
sobrevivência da humanidade. As respostas capitalistas não têm sido traduzidas em ganhos
sociais efetivos, muito menos em um ambiente saudável e harmônico entre ser humano e
natureza. Ao analisar o processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
estas premissas se tornam uma materialidade.
No próximo tópico é analisado se os capitalistas cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, se
os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram
alcançados e em que extensão isto ocorre.
5.2.3 OS CAPITALISTAS, O PROGRAMA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, E A MEDIDA
MITIGADORA Nº 40
Com objetivo de atender as condicionantes da Licença de Instalação Nº 737/2010, e os
programas prescritos no EIA/RIMA (2009), o Estaleiro Enseada do Paraguaçu apresenta como
política socioambiental as seguintes diretrizes gerais:
Preservar e valorizar a riqueza natural, histórica, cultural e social das regiões onde
atua é parte integrante da política de sustentabilidade do EEP. Seu foco primordial
está nas pessoas e em sua interação com o empreendimento, o ambiente físico, com a
cultura, as crenças e tradições. [...] Com uma estratégia de atuação que parte do
atendimento rigoroso das licenças e anuências vigentes – indo além delas sempre que
possível –, o EEP se compromete em deixar um legado permanente para as regiões
onde desenvolve suas atividades. Por isso, investe no diálogo com as comunidades
localizadas em suas áreas de influência, incentivando sua participação ativa e
desenvolvendo uma relação de confiança e transparência com todos os seus
stakeholders. Esta relação está baseada na gestão sustentável dos estaleiros e no
desenvolvimento integrado das áreas dos entornos. [...] O EEP realiza estudos
ambientais, sociais e culturais nas regiões de seus empreendimentos, buscando
mapear e desenvolver ações que gerem impactos socioambientais positivos,
incentivem a economia local e consolidem o compromisso de longo prazo com essas
populações. [...] O EEP também estabelece um canal permanente de comunicação
com a sociedade local para a construção coletiva de propostas que visem minimizar
os problemas identificados. A diversidade socioambiental e a força da cultura de raízes
africanas do Recôncavo Baiano inspirou uma política de sustentabilidade diferenciada
e integrada às atividades desenvolvidas em Maragogipe. (EEPSA, 2013)
217
Observa-se que a empresa apresenta, de forma sucinta, os mesmos compromissos
socioambientais determinados no EIA/RIMA (2009) e na Licença de Instalação Nº 737/2010
expedida pelo IBAMA. Compromissos que os capitalista assumiram junto ao Estado e a
sociedade ao aceitar participarem na constituição da empresa e na construção de equipamentos
navais, utilizando recursos públicos e área de preservação ambiental. Pergunta-se:
a)
O Estaleiro Enseada do Paraguaçu cumpriu com os objetivos prescritos no
Programa de Comunicação Social?
b)
E se cumpriu, em que extensão o fez?
Para responder as perguntas, é observada como os capitalistas cumprem a Medida
Mitigadora Nº 40, e o que está estabelecido Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA
(2009), bem como ocorre a relação dialética com os atores – comunidade e Estado81.
A seguir é apresentada entrevista estruturada aberta com capitalistas. Elas foram
produzidas por Caroline Azevedo (2013), sendo selecionadas as perguntas e respostas que
respondem ao problema de pesquisa82. Os dados são apresentados e analisados em grupos, a
partir dos conceitos de Análise de Conteúdo e da Análise do Discurso.
1º CONJUNTO DE DADOS ANALISADOS:
Como avalia a importâncias das condicionantes governamentais do EIA/RIMA, no tocante
aos aspectos socioeconômicos?
Considero de extrema importância todas elas, no entanto, com o desenvolvimento dos
trabalhos e convívio com as comunidades e suas realidades, entendo ser necessário
revisitar todo tempo estas exigências pelo caráter dinâmico que ela traz e
complementá-las com projetos estruturantes e participativos que permitam um
“enraizamento” de resultados maior beneficiando as próprias comunidades. Esta
complementação foi trazida, mais recentemente, com a instauração do setor de
Responsabilidade Social que tem como foco gerar resultados concretos a partir de
ações e projetos de ocupação e renda nas comunidades do entorno voltados para a
cadeia de suprimento do EEP, a exemplo do fortalecimento das cooperativas locais.
81
Para efeito de lapso temporal, foi estabelecido que a análise da Medida Mitigadora nº 40 têm início a partir de 28 de
outubro de 2010, com a autorização da Licença de Instalação Nº 737/2010, concedida pelo IBAMA; até 4 de setembro
de 2013, data em que o Estaleiro Enseada do Paraguaçu responde ao questionário sobre a Medida, e responde à solicitação
de envio de documentos concernentes ao Programa de Comunicação Social.
82 Foram dispensadas as perguntas e respostas consideradas irrelevantes, ou de pouca relevância para alcançar os objetivos
da pesquisa.
Algumas respostas foram utilizadas para esclarecer pontos da pesquisa documental, ou pontos obscuros da pesquisa.
Sendo que as mesmas fazem parte do conjunto de dados disponibilizados em pontos diversos da pesquisa.
As perguntas foram elaboradas no sentido de evidenciarem uma práxis dos capitalistas. Revelando se o que está prescrito
no PCS foi atendido pelos capitalistas, e em que extensão isto ocorre. Levando a conclusão do cumprimento ou
descumprimento da Medida Mitigadora Nº 40.
As solicitações do cronogramas de execução, resultados das avaliações e cópia de documentos, objetivaram a
comprovação material das afirmações apresentadas pelos capitalistas. Estes dados foram sonegados pelos capitalistas.
218
Este setor surge como complemento ao setor de sustentabilidade já atuante
localmente.
Como o Estaleiro Enseada do Paraguaçu avalia a importância da Medida Mitigadora
Número 40?
Considero a Comunicação como o elemento mais transversal de qualquer sistema de
gestão e de governança, por isso vejo a medida mitigadora 40 como um destaque entre
as demais.
A Medida Mitigadora Número 40 estabelece um ‘Plano de Comunicação Social’. O
Estaleiro elaborou o plano?
O EEP elaborou um Programa de Comunicação Social, o qual foi avaliado e aprovado
pelo IBAMA e consta no escopo do Plano Básico Ambiental do Estaleiro - PBA. O
referido Programa traz uma linguagem mais contemporânea e alinhada com a
legislação vigente sugerindo a instauração de uma rede de educomunicadores que
possam expandir e percolar nos territórios das áreas de influência direta e indireta do
empreendimento, todos os insumos de comunicação necessários para esclarecimentos
de dúvidas sobre o projeto, divulgação de treinamentos e capacitações voltados para
a indústria naval, cadastramento de currículos, campanhas e distribuição e capacitação
em Educação Ambiental por meio de materiais especializados (cartilhas, programas
de rádio, informe, pesquisa de opinião, rodas de conversa, Centro de Referência e
Ouvidoria etc.).
Se elaborou o ‘Plano de Comunicação Social’, poderia disponibilizar o plano e o
cronograma de atividade?
Por envolver segurança da informação e por conta da natureza da composição
acionária do EEP, o documento não poderá ser liberado.
No conjunto das respostas fica evidente que os Capitalistas afirmam que cumpriram o que
está previsto no PCS. Entretanto, quando requeridos documentos que confirmem as afirmações,
eles alegam sigilo, declarando “envolver segurança da informação e por conta da natureza da
composição acionária do EEP, o documento não poderá ser liberado.” (AZEVEDO, 2013).
Ocorre que o PCS foi estabelecido com base no conjunto de Leis e condicionantes que conforma
uma política pública para o meio ambiente. Elas prescrevem várias determinantes a serem
cumpridas, conforme observa-se a seguir:
O Parecer Técnico nº 042/201083 determina que “os materiais de divulgação deverão ser
apresentados ao IBAMA para aprovação e deve constar o nome do IBAMA e a
informação de que o programa trata do cumprimento de uma condicionante do processo
de licenciamento.”. (Grifo nosso)
No Decreto nº 6.040/2007, Art. 1º fica estabelecido que “as ações e atividades voltadas
para o alcance dos objetivos da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
83
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
219
Comunidades Tradicionais deverão ocorrer de forma intersetorial, integrada, coordenada,
sistemática e observar os seguintes princípios: IV - o acesso em linguagem acessível à
informação e ao conhecimento dos documentos produzidos e utilizados no âmbito da
Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais.”. (Grifo nosso)
Na Lei Federal nº 9.795/1999, Art. 4ª prescreve que “são princípios básicos da educação
ambiental: II - a garantia de democratização das informações ambientais.”. (Grifo nosso)
Observa-se que a legislação prescreve a publicização e o acesso público aos documentos,
e que a normatização do empreendimento estabelece o controle público dos documentos através
da verificação, aprovação e arquivamento dos documentos referentes ao PCS, no IBAMA. Estes
aspectos foram desconsiderados pelos capitalistas na tentativa de ocultar documentos, com a
finalidade de prevalecer a afirmação de que cumpriram o PCS. Mas, a negativa de acesso aos
documentos evidencia justamente o contrário, ou seja, o descumprimento da Lei, dos objetivos
do PCS, e do conceito inerente a palavra ‘comunicação’, que é dar conhecimento.
Analisados os dados, pode-se afirmar que os capitalistas ao não apresentarem documentos,
nem dados passíveis de verificação material, optaram por sonegar informação de caráter público
e de interesse social. Conclui-se que ocorre o descumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e
dos objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009)84.
Os dados analisados são consistentes o suficiente para poder afirmar que os capitalistas
descumprem com os compromissos assumidos com a sociedade e com o Estado no que tange o
Plano de Gestão Ambiental do EIA/RIMA (2009)85 e a Licença de Instalação Nº 737/201086.
2º CONJUNTO DE DADOS ANALISADOS:
Se elaborou o ‘Plano de Comunicação Social’. Quais objetivos foram alcançados e quais
objetivos não foram alcançados?
Para atendimento ao Programa de CS [Comunicação Social] desenvolvemos um Plano
de Trabalho com a cronologia de ações e de produção de peças de comunicação.
Muitas ações foram realizadas e outras tantas estão em franca implantação.
Quais atividades de comunicação foram desenvolvidas, qual o cronograma, quais objetivos
foram alcançados e quais objetivos não foram alcançados?
Os dados analisados compreendem o período de 28 de outubro de 2010 – data em que é concedida a Licença de
Instalação Nº 737/2010; até 4 de setembro de 2013 – data em que os capitalistas respondem a entrevista aberta estruturada.
85 Ver Anexo 8.9 – EIA/RIMA (2009, v. 8) – Programa de Gestão Ambiental (PGA).
86 Ver Anexo 8.14 – IBAMA – Licença de Instalação Nº 737/2010.
84
220
Algumas ações foram já iniciadas e se mantém dentro de sua periodicidade e outras
estão em desenvolvimento. Ocorreram mudanças recentes na Área, centralizando os
integrantes da Comunicação dentro do canteiro e com fusão das equipes existentes a
fim de otimizar a execução do Plano de Trabalho, ampliar seu alcance, gerar peças
que possam ser utilizadas dentro do canteiro (para os integrantes) e nas comunidades
a fim de ter um alinhamento das informações propagadas. Também aqui funcionará a
sede da Rede de Comunicação Social de onde partiriam seus agentes para os trabalhos
presenciais em campo tanto de CS como de educação ambiental (sinergia entre
Programas).
Seria possível disponibilizar cópias das peças do ‘Plano de Comunicação Social’, ou das
atividades de comunicação do EEPSA?
Por envolver segurança da informação e por conta da natureza da composição
acionária do EEP, as peças não poderão ser liberadas. Alguns arquivos estão
disponíveis para download no site do EEP. De todo modo, informamos que
encaminhamos informes diversos trabalhados ao longo do tempo abordando
diferentes temas que foram considerados prioritários para comunicação como:
Supressão Vegetal da área do empreendimento, resgate de fauna e flora locais,
construção da Estrada Cairu/Enseada, dragagem de aprofundamento para construção
do dique seco e cais do EEP etc.
As respostas dos capitalistas sucinta o seguinte questionamento: Como documentos que
objetivam prestar contas do cumprimento da Medida Mitigadora Número nº 40, podem ser
sigilosos em decorrência da natureza acionária do empreendimento? Para cumprir o que
estabelece a Medida Mitigadora Número nº 40 é necessário que o Estaleiro atue junto à
comunidade, ou seja que atue de forma pública. Além de não ter amparo legal, a resposta mostra
elevado grau de descompromisso social dos capitalistas para com a comunidade e o Estado.
A justificativa de que a composição acionária, com participação de capital estrangeiro, é
fator para descumprir a Lei, sonegando documentos de caráter público, também não possui
amparo legal, conforme observado a seguir:
Lei nº 4.131, de 3 de setembro de 1962, Art. 2º prescreve que “ao capital estrangeiro que
se investir no País, será dispensado tratamento jurídico idêntico ao concedido ao capital
nacional em igualdade de condições, sendo vedadas quaisquer discriminações não previstas na
presente lei.
A CF/1988 estabelece no Art. 5º que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
O que está expresso na Lei é que independente da origem do capital ou do indivíduo, tudo
que ocorrer no âmbito do Estado Nacional deve respeitar o ordenamento jurídico do país, não
ocorrendo exceções, e que todos estão sob a égide da Lei.
221
Ao sonegar os documentos, o Estaleiro Enseada do Paraguaçu e os sócios capitalistas
descumprem a Lei, o ordenamento jurídico do país, além de romperem com os compromissos
estabelecidos com a sociedade e com o Estado, através das determinações contidas no processo
de licenciamento do Estaleiro.
Os capitalistas, ao responderem ao questionário, também utilizam do recurso discursivo da
tergiversação. Ou seja, enquanto os questionamentos são direcionados à Medida Mitigadora
que concerne o meio socioeconômico, os capitalistas respondem com ações voltadas aos meios
físico e biótico.
Analisados os dados, pode-se afirmar que os capitalistas ao não apresentarem documentos,
nem dados passíveis de verificação material, optaram por sonegar informação de caráter público
e de interesse social. Conclui-se que ocorre o descumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e
dos objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009)87.
Os dados analisados são consistentes o suficiente para poder afirmar que os capitalistas
descumprem com os compromissos assumidos com a sociedade e com o Estado, no que tange
o Plano de Gestão Ambiental do EIA/RIMA (2009)88 e a Licença de Instalação Nº 737/201089.
3º CONJUNTO DE DADOS ANALISADOS:
O EEPSA poderia relacionar o que identificou como ‘expectativas indevidas’ por parte dos
moradores da localidade; e de que maneira o ‘‘Plano de Comunicação Social’ mitigou estas
expectativas?
A expectativa que se formou com a chegada do novo empreendimento em relação às
vagas disponibilizadas foi imensa, gerando muitos ruídos e disseminação de
informações equivocadas. Esta propagação equivocada, que se dá fora do alcance do
empreendimento, foi tratada pela CS com o cuidado expresso em todos os
atendimentos presenciais e reuniões com poder público municipal e com as lideranças
comunitárias, além dos informes. O objetivo foi esclarecer que:
1. Inicialmente, seria uma curva crescente de vagas voltadas a construção civil onde
o foco seria a contratação de mão de obra local distribuindo as vagas pelas áreas de
influência direta do empreendimento (Maragogipe, Salinas e Saubara) e indireta
(Cachoeira, São Fêlix e Itaparica) além de Santo Amaro, Nazaré e Santo Antônio de
Jesus.
2. Que todos os interessados e que já tivessem formação nesta área de construção civil
deveriam se cadastrar via SINE (parceira entre EEP e Governo do Estado) para
facilitar a sistematização dos dados e o melhor atendimento à demanda do EEP ao
longo do tempo.
Os dados analisados compreendem o período de 28 de outubro de 2010 – data em que é concedida a Licença de
Instalação Nº 737/2010; até 4 de setembro de 2013 – data em que os capitalistas respondem a entrevista aberta estruturada.
88 Ver Anexo 8.9 – EIA/RIMA (2009, v. 8) – Programa de Gestão Ambiental (PGA).
89 Ver Anexo 8.14 – IBAMA – Licença de Instalação Nº 737/2010.
87
222
3. As pessoas interessadas em vagas que não tivessem habilitação para o trabalho em
construção civil deveria se inscrever nos cursos ofertados pelo EEP voltados para o
atendimento de suas demandas, a exemplo do PROMIMP, ACREDITAR e
PRONATEC, todos gratuitos e acontecendo nas localidades vizinhas ao
empreendimento.
4. Uma vez contratado, estas pessoas inicialmente designadas para construção civil
teriam oportunidade de um novo momento de capacitação voltado para a indústria
naval a fim de mitigar os impactos da desmobilização da obra.
5. As prefeituras foram devidamente informadas e atuaram como parceiras na
disseminação das informações corretas sobre este tema.
6. Diante da necessidade de chegar tais informações até as localidades mais remotas,
uma caravana levando o SINE móvel chegou até localidades como Salamina
Putumuju, Cairu, Conceição, Encarnação e a sede de Salinas da Margarida,
Capanema, Coqueiros, Nagé, São Roque, Enseada, sede de Saubara, Cabuçu, Bom
Jesus dos Pobres, todas elas demandantes de maiores esclarecimentos sobre como
faziam para se candidatar a uma vaga e quais os cursos ofertados pelo EEP.
7. Percebemos que com esta atuação efetiva da CS, revertemos o cenário de
dúvidas/insatisfação e conseguimos números expressivos de inscrição tanto no SINE
como nos cursos oferecidos pelo EEP.
O EEPSA poderia informar quais temas foram objeto de conflitos com a comunidade local,
até a presente data?
1. Vagas de emprego;
2. Compensação por dragagem.
Do total de trabalhadores do Estaleiro quantos por centro são oriundos das localidades
diretamente afetadas pelo Estaleiro? Do total de trabalhadores do Estaleiro quantos por centro
são oriundos de Maragogipe? Do total de trabalhadores do Estaleiro quantos por centro são
oriundos de São Roque do Paraguaçu? O EEPSA teria os dados consolidados com os seguintes
números: total de trabalhadores (homens e mulheres); local de origem dos trabalhadores, com
os respectivos números; faixas salariais dos trabalhadores.
Cerca de 60% são comprovadamente locais, mas temos a meta de aumentar
continuamente este percentual visando obter o máximo de integrantes filhos das
localidades vizinhas.
Cerca de 40%.
Os 40% citados acima são da cidade de Maragogipe, incluindo São Roque. O EEPSA
teria os dados consolidados com os seguintes números: Total de Trabalhadores
(homens e mulheres); Trabalhadores; Trabalhadoras; Locais de origem e ou residência
dos trabalhadores, com os respectivos números; Faixas salariais dos trabalhadores e
local de origem dos trabalhadores, bem como sexo.
Sobre documentos: Buscar o Relatório Institucional no site do EEP.
Poderia disponibilizar a documentação sobre a Medida Mitigadora Número 40?
Por envolver segurança da informação e por conta da natureza da composição
acionária do EEP, os documentos não poderão ser liberados.
223
Analisando o conjunto das respostas, fica evidente a tentativa dos capitalistas de
transferirem a responsabilidade do PCS para o Estado, conforme observado no frase destacada
a seguir: “As prefeituras foram devidamente informadas e atuaram como parceiras na
disseminação das informações corretas sobre este tema.” (AZEVEDO, 2013).
O PCS prescreve que são os capitalistas que devem disseminar as informações sobre
oportunidades de vagas de trabalho, além de serem responsáveis pela promoção de cursos.
Conforme observado a seguir:
Promover ampla comunicação educativa e interativa com as comunidades das áreas
de influência direta e indireta do Empreendimento, sobre conservação ambiental,
saúde e segurança, combate e enfrentamento à violência infanto-juvenil, combate ao
trabalho infantil, prevenção contra prostituição, DSTs e disseminação do HIV,
conflitos ambientais e de propriedade. [...] Desenvolver projetos de comunicação do
Empreendimento com as comunidades da área de influência direta, difundindo
informações atualizadas sobre o Estaleiro, a prevenção de danos ambientais, perfis
profissionais e qualificações exigidas para contratação de mão de obra; oferecer a
comunidade um telefone 0800 para atendimento de queixas, denúncias e problemas
ambientais; (EIA/RIMA, 2009, V 8, p. 72-73)
Observando o conjunto de dados, fica evidente que as respostas apresentadas pelos
capitalistas, quanto confrontadas pela falta de documentação e pelos objetivos prescritos no
PCS apontam que no período estabelecido pela pesquisa – 28 de outubro de 2010, a 4 de
setembro de 2013 – o PCS não foi cumprido pelos capitalistas.
Analisando os dados do Relatório Institucional do EEPSA (2013, ed. 4, p. 8), observa-se
que foram cadastrados no Serviço Estadual de Intermediação para o Trabalho (SINEBAHIA),
de janeiro a abril de 2013, 3.304 pessoas, oriundas das localidades impactadas pelo Estaleiro.
Ocorre que o relatório não informa quantas pessoas foram contratadas e de quais localidades.
Apenas limita-se a informar que foram feitos cadastros através da agência de trabalho do
governo.
Outra análise realizada a partir dos dados do Relatório Institucional do EEPSA (2013, ed.
4, p. 11), é que até 26 de julho de 2013, data de emissão do relatório, o Estaleiro não implantou
a rede de educomunicadores prevista no PCS do EIA/RIMA (2009). O Relatório (2013, ed. 4,
p. 11) informa apenas que ocorreu o “Planejamento da Rede de Comunicação Social do EEP,
composta por agentes de comunicação popular distribuídos pelos municípios do entorno,
ampliando a capacidade de disseminação das informações de interesse público, e garantindo,
ao mesmo tempo, um mecanismo de diálogo e governança com as comunidades.”. Não
informando se ocorreu a contratação dos educomunicadores, quais atividades desenvolvidas e
224
quais os objetivos alcançados. Conclui-se que a rede de educomunicadores não foi implantada
no período em que a pesquisa foi desenvolvida.
Os dados apontam para a falta de materialidade e concretude nas informações
procedentes do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, portanto, conclui-se que as informações
sobre cumprimento do Programa de Comunicação Social por parte dos capitalistas são
improcedentes.
Analisados os dados, pode-se afirmar que os capitalistas ao não apresentarem
documentos, nem dados passíveis de verificação material, optaram por sonegar
informação de caráter público e de interesse social. Conclui-se que ocorreu o
descumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e dos objetivos previstos no Programa de
Comunicação Social do EIA/RIMA (2009)90.
Os dados analisados são consistentes o suficiente para poder afirmar que os capitalistas
descumpriram com os compromissos assumidos com a sociedade e com o Estado no que
tange o Plano de Gestão Ambiental do EIA/RIMA (2009)91 e a Licença de Instalação Nº
737/201092.
O DESCUMPRIMENTO DA MEDIDA MITIGADORA Nº 40 E LUCRO COMO OBJETIVO
Ao analisar o conjunto de dados apresentados no tópico, fica evidente que os capitalistas
descumpriram a Medida Mitigadora nº 40, não alcançado os objetivos previstos no Programa
de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009). Isto ocorre porque o objetivo dos capitalistas é
maximizar o lucro. O que é incompatível com políticas públicas que objetivam a melhoria dos
indicadores sociais através de um conjunto de ações que permitam mitigar os aspectos negativos
e potencializar os aspectos positivos do empreendimento.
Existe um custo financeiro para efetivação do PCS, envolvendo a contratação de pessoal
(educomunicadores), produção de materiais informativos, montagem de infraestrutura, custos
com transporte, alimentação e manutenção do programa. Ao suprimirem estes custos, o
resultado é um aumento da margem de lucro dos capitalistas. Enquanto os capitalistas
aumentam o lucro, a população permanece alienada, empobrecida, vilipendiada, obliterada nos
valores socioeconômicos com a qual se desenvolveram. A não aplicação do PCS segrega
Os dados analisados compreendem o período de 28 de outubro de 2010 – data em que é concedida a Licença de
Instalação Nº 737/2010; até 4 de setembro de 2013 – data em que os capitalistas respondem a entrevista aberta estruturada.
91 Ver Anexo 8.9 – EIA/RIMA (2009, v. 8) – Programa de Gestão Ambiental (PGA).
92 Ver Anexo 8.14 – IBAMA – Licença de Instalação Nº 737/2010.
90
225
substancialmente o empreendimento capitalistas e as comunidades da Área de Influência Direta
(AID) – compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara; e da
Área de Influência Indireta (AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira, São Félix e
Itaparica.
As comunidades implicadas na área de influência do empreendimento não são beneficiadas
com a implantação do empreendimento, além de terem o modo de produção modificado. A
análise deste fenômeno permite afirmar que estas comunidades tendem a uma ampliação dos
fatores de desagregação social, com incremento da violência e perda dos espaços naturais com
os quais se desenvolveram.
A totalidade em que se insere as populações tradicionais no processo de exclusão social
foram anteriormente analisadas por Milton Santos (1977, p.42) ao expressar que “a formação
socioeconômica é realmente uma totalidade. Não obstante, quando sua evolução é governada
diretamente de fora sem a participação do povo envolvido, a estrutura prevalecente — uma
armação na qual as ações se localizam — não é a da nação, mas sim a estrutura global do
sistema capitalista. As formas introduzidas deste modo servem ao modo de produção dominante
em vez de servir à formação socioeconômica local e às suas necessidades específicas. Trata-se
de uma totalidade doente, perversa e prejudicial.”. Existe uma totalidade perversa, que oblitera
e submete as comunidades tradicionais, localizadas no entorno do Estaleiro a problemas sociais
novos, ou pouco enfrentados anteriormente. O sentido em que opera o capital é sempre o
mesmo, o mantra é o lucro através da mais-valia, e o resultado é a exclusão social.
No próximo tópico são analisados quatro documentos concernentes à Medida Mitigadora
nº 40 e ao PCS. Observa-se que três documentos foram adquiridos através de consulta ao
Estado, e um documento foi entregue pelos capitalistas, após a resposta a entrevista estruturada
aberta.
5.3 ANÁLISE DOS DOCUMENTOS CONCERNENTES À MEDIDA MITIGADORA Nº
40
Neste tópico são analisados quatro documentos concernentes à Medida Mitigadora nº 40 e
ao PCS. A fonte dos documentos foi o Governo do Estado da Bahia, através da SEINP. Dentre
os documentos disponibilizados, três foram selecionadas em decorrência de estarem implicados
diretamente com o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40.
226
1–
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A. Plano Estratégico Interativo de Comunicação
Social – Elaborado pela ETHOS-HUMANUS Consultoria, em novembro de 2010,
sob encomenda da EEPSA.
2–
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A., Boletim de Interação Social, Etapa II,
Programas Socioambientais, Ano II, Nº 02, Dezembro de 2010. – Elaborado pela
ETHOS-HUMANUS Consultoria, sob encomenda da EEPSA.
3–
Estaleiro Enseada do Paraguaçu S.A., Relatório Institucional. Diretoria de Relações
Institucionais e Sustentabilidade. Edição nº 4. Emissão: 26/07/2013. Referência:
Julho 2013.
O 4º documento analisado foi obtido diretamente dos capitalistas, em 5 setembro de 2013,
durante o Press Trip, encontro com a imprensa, na sede das instalações administrativas do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu, localizada na Ponta do Corujão. Observa-se que o documento
foi obtido após o envio das respostas ao questionário estruturado, 4 de setembro de 201393,
sendo que o documento ‘Navegando Juntos – Ano 1, Edição nº 1, Setembro/2013’, emitido pelo
Estaleiro Enseada do Paraguaçu, foi produzido e apresentado em 7 de setembro de 2013.
4–
Boletim informativo do Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEP) e do Consórcio
Enseada do Paraguaçu (CEP) Plano Básico Ambiental (PBA) - Programa de
Comunicação Social. Ano 1, Edição, nº 1, Setembro de 2013.
5.3.1 O ESTALEIRO E O PLANO ESTRATÉGICO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
A elaboração do Plano Estratégico Interativo de Comunicação Social (PEICS, 2010)
objetivou atender as condicionantes Plano de Gestão Ambiental (PGA). Os capitalistas
contrataram a ETHOS-HUMANUS Consultoria para elaborar o plano, com objetivo de cumprir
a Medida Mitigadora Nº 40, prescrita no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA
(2009) e nas condicionantes da Licença de Implantação (2010). Observa-se que o nome de
Roseane Palavizini configura como responsável pela coordenação do PEICS (2010), pois ela
também foi responsável técnica pela elaboração do Programa de Comunicação Social do
EIA/RIMA (2009), ou seja, ela trabalhou para o Estado através da empresa Biomonitoramento
e Meio Ambiente Ltda. (BMS); e na sequência trabalhou para os capitalistas, através do
ETHOS-HUMANUS Consultoria. Isto poderia ter configurando como uma vantagem em
Os dados analisados compreendem o período de 28 de outubro de 2010 – data em que é concedida a Licença de
Instalação Nº 737/2010; até 4 de setembro de 2013 – data em que os capitalistas respondem a entrevista aberta estruturada.
93
227
decorrência do rigor técnico/científico identificado na produção do PCS. Mas, o que se observa
é justamente o contrário.
Analisando o Plano Estratégico Interativo de Comunicação Social (PEICS, 2010),
composto de 64 páginas, observa-se que todos os objetivos, conceitos técnicos e
determinações legais, previstos no PCS, foram postos de lado, para que emergisse um
documento que se restringe a estruturar superficialmente uma rede educomunicadores.
Inexistem no plano a descrição da quantidade de educomunicadores a serem contratados, em
quais localidades deveriam residir e atuar, por qual período deveriam desempenhar as funções,
quais instrumentos devem utilizar para atingir os objetivos do PCS, quais as etapas a serem
cumpridas e em quais períodos deveriam ser cumpridas, como deveriam abordar a população
para transmitir as informações do Estaleiro, concernentes aos compromissos socioambientais
estabelecidos, sob quais Leis deveriam pautar a atuação, como deveriam proceder para avaliar
o resultado do trabalho de campo.
Observa-se que o Parecer Técnico nº 042/201094 determina que: “os materiais de
divulgação deverão ser apresentados ao IBAMA para aprovação e deve constar o nome
do IBAMA e a informação de que o programa trata do cumprimento de uma
condicionante do processo de licenciamento.”.
Segundo o IBAMA (2010 b, p. 23) o Programa de Comunicação Social do EEPSA “tem
objetivos específicos condizentes com a necessidade de informar a população sobre o que é o
empreendimento, os riscos previstos os possíveis impactos e benefícios de forma que a
população esteja sempre informada sobre todas as fases da construção e operação.”. E que um
“projeto executivo deverá ser apresentado com a proposta detalhada com metas e ações
discriminadas, caracterizando-se o público a ser atingido e o tipo de mídia a ser utilizada para
esse público.”. Ou seja, cabe ao Estaleiro Enseada do Paraguaçu apresentar um Plano de
Comunicação estabelecendo as características de público, mídia, cronograma de Programas de
Educação Ambiental a serem informados.
O IBAMA (2010 b, p. 23) determina que “na fase de implantação a comunicação se faça
massiva com informações sobre o estaleiro, os possíveis impactos ao meio ambiente e a
sociedade do entorno e os cuidados que as populações residentes nas áreas mais atingidas
devem ter.”. E que “os materiais de divulgação deverão ser apresentados ao IBAMA para
94
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
228
aprovação e deve constar o nome do Ibama e a informação de que o programa trata do
cumprimento de uma condicionante do processo de licenciamento.”.
O IBAMA (2010 b, p. 23 e 24) também estabelece que no processo de “capacitações o
projeto do curso deve conter a ementa, tipo de público, objetivo, carga horária e material de
apoio. Chamamos a atenção que o programa de comunicação social deve ter como público
preferencial as populações das comunidades do entorno do empreendimento.”, além de
determinar que o “Programa de Educação Ambiental como um programa que deve compor o
PCS, cumprindo o objetivo relativo à promoção da Educação Ambiental Difusa.”.
Ao analisar o Plano Estratégico Interativo de Comunicação Social (2010) elaborado pelo
Estaleiro Enseada do Paraguaçu com o que foi definido no processo de licenciamento
ambiental, através do Parecer Técnico nº 042/2010 emitido pelo IBAMA; da Licença de
Instalação Nº 737/2010; do Programa de Comunicação Social (PCS); e da Medida Mitigadora
nº 40 do EIA/RIMA (2009) conclui-se que Plano Estratégico Interativo de Comunicação Social
(2010) é caracterizado por graves deficiências no planejamento, não permitindo atingir os
objetivos prescritos PCS e na Medida Mitigadora nº 40. Isto fica ainda mais evidente quando
observado que ao invés de uma rigorosa exposição sob o conjunto de Leis que dizem respeito
aos direitos sociais das populações tradicionais e remanescentes quilombolas, optou-se por
preencher sete páginas do PEICS (2010) com letras de músicas, outras 22 páginas não possuem
conteúdo relevante, sendo formada por capas, índices e páginas em branco. Neste aspecto,
deixa-se de atender o conceito de Empowerment, deixa de empoderar os educomunicadores
responsáveis pela multiplicação da informação junto à população, sob aspectos dos direitos
sócias prescritos na Lei e acordados através das licenças ambientais e dos programas
socioambientais detalhados no EIA/RIMA (2009).
Na imagem a seguir é apresentado como ocorre a articulação dos elementos que compõem
Plano de Gestão Ambiental (PGA):
229
Gráfico 6 – Organograma do Plano de Gestão Ambiental (PGA).
Fonte: Giordano Campos Bazzo (2013, p. 19).
Giordano Campos Bazzo (2013, p. 34) apresenta no (Gráfico 6 um organograma com a
convergências e divisão dos elementos que compõe o Plano de Gestão Ambiental (PGA).
Observa-se que compete ao educomunicadores fazer a mediação entre o Programa de
Comunicação Social (PCS) e os Programas de Educação Ambiental (PEA) e os demais
programas do PGA, atuando na divulgação de ações e nas ações educacionais. Na elaboração
do Plano Interativo de Comunicação Social (2010) estes elementos deveriam estar devidamente
articulados e esquematizados de forma que a implementação das atividades alcance os objetivos
prescritos de forma mais ampla no PCS, atendendo à Medida Mitigadora nº 40, ao Plano de
Educação Ambiental (PEA) e, desta forma, ao Plano de Gestão Ambiental – responsável por
englobar o PCS e o PEA.
Analisando o organograma de BAZZO (2013), o que se observa é que o Plano Estratégico
Interativo de Comunicação Social (2010) não organiza o conjunto de ações a serem
implementados pelos educomunicadores, deixando de promover a adequada interligação do
PCS com o PEA. Trata-se, basicamente, de um programa superficial de formação de
educomunicadores e, mesmo neste aspecto, com graves deficiências técnicas e científicas. Não
230
se empodera os educomunicadores com o conhecimento das condicionantes do EIA/RIMA
(2009), e do conjunto de Leis que concede direitos sociais as comunidades tradicionais,
Também, analisando o documento, não se identificam canais de interação direta entre a
comunidade e o Estaleiro, como citado no PCS, a exemplo da implantação do telefone 0800.
Os conceitos de Accountability e Empowerment são postos de lado com a finalidade de alienar
a comunidade dos direitos sociais e do conhecimento necessário a inserção e ou convivência ao
novo modo de produção.
Francisco de Assis Morais da Costa (2008, p. 7-9), na obra ‘Educomunicação
socioambiental: comunicação popular e educação’, publicada pelo Ministério do Meio
Ambiente, aborda dois objetivos da educomunicação para as políticas de meio ambiente:
“estimular e difundir a comunicação popular participativa no campo da Educação Ambiental
brasileira, com o fim de fortalecer a ação educadora coletiva pela sustentabilidade; e contribuir
para a elaboração e a implementação de uma Política Nacional de Comunicação e Informação
Ambiental.”.
Costa (2008, p. 9) salienta que “uma política de comunicação ambiental baseada nos
princípios da democratização, promoção da autonomia e emancipação, se materializa
quando há condições de inclusão ampla no direito à comunicação, que significa não só
poder ter acesso à informação e aos bens culturais mediatizados ou não, mas também
acesso à participação na criação e na gestão dos meios de comunicação.”. (Grifo nosso)
Analisando os pressupostos da educomunicação, com o que prescreve o Plano Estratégico
Interativo de Comunicação Social (2010), infere-se que o programa de comunicação
apresentado pelos capitalistas não foi desenvolvido de acordo com o que determina o PCS do
EIA/RIMA (2009), e nem está de acordo com os conceitos de educomunicação previstos pelo
Ministério do Meio Ambiente.
A imagem a seguir reproduz a capa, e as páginas 3, 9 e 19 do Plano Estratégico Interativo
de Comunicação Social (2010):
231
Figura 28 – Reprodução de 4 páginas do Plano Estratégico Interativo de Comunicação Social.
Fonte: ETHOS-HUMANUS Consultoria (nov. de 2010).
232
A Figura 28 exemplifica o conjunto de dados disposto no Plano Estratégico Interativo de
Comunicação Social (2010). Observa-se que o mesmo não atende ao que prescreve o Parecer
Técnico nº 042/201095: “os materiais de divulgação deverão ser apresentados ao IBAMA
para aprovação e deve constar o nome do IBAMA e a informação de que o programa trata
do cumprimento de uma condicionante do processo de licenciamento.”.
Conclui-se que o programa de comunicação apresentado pelos capitalistas é incompatível
com o Programa de Comunicação Social previsto no EIA/RIMA (2009). Também conclui-se
que o conceito de educomunicação não é adequadamente abordado no documento. Um exemplo
de falha do documento é que falta o detalhamento das comunidades afetadas pelo
empreendimento, agrupando as comunidades através das unidades territoriais96, e na sequência
apresentando um calendário, semestralizado ou anualizado, de ações a serem desenvolvidas
nestas comunidades, bem como formas de mobilização, e métodos avaliativos.
5.3.2 O ESTALEIRO E O BOLETIM SOBRE OS PROGRAMAS SOCIOAMBIENTAIS
O segundo documento analisando é uma publicação que sintetiza as ações de alguns dos
Programas Socioambientais prescritos no EIA/RIMA (2009). O documento é composto por
duas páginas, e foi disponibilizando pela SEINP. O boletim informativo foi produzido sob
encomenda do Estaleiro, pelo ETHOS-HUMANUS Consultoria com objetivo de cumprir
condicionante do EIA/RIMA (2009) e da Licença de Implantação (2010).
A imagem a seguir reproduz as duas páginas do Boletim Informativo (2010):
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
Área de Influência Direta (AID) – compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara; e
na Área de Influência Indireta (AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica.
95
96
233
Figura 29 – Boletim Informativo sobre execução de Oficina de Comunicação Social.
Fonte: Estaleiro Enseada do Paraguaçu (jul. de 2013)
234
Analisando a Figura 29, observa-se que o mesmo não atende ao que prescreve o Parecer
Técnico nº 042/201097: “os materiais de divulgação deverão ser apresentados ao IBAMA
para aprovação e deve constar o nome do IBAMA e a informação de que o programa trata
do cumprimento de uma condicionante do processo de licenciamento.”. Conclui-se que o
documento não atende ao que foi determinando no processo de licenciamento pelo IBAMA.
Outro dado observado a partir da análise da Figura 29 são as informações referentes a
atividades com a finalidade de cumprir as condicionantes da Licença de Instalação Nº
737/201098. Dentre as informações publicadas, consta que ocorreu em dezembro de 2010, uma
oficina para formação de educomunicadores e agentes multiplicadores da informação:
Realizada em três módulos nos municípios de Itaparica, São Félix e Maragogipe, nos
dias 14, 21 e 28, respectivamente, a Oficina de Comunicação Social reuniu 43
comunicadores, educadores, lideranças ambientais e gestores públicos locais. [Com]
objetivo de construir uma rede de informação e comunicação, que assegure o diálogo
entre comunidades, e destas com o Empreendimento. [Tendo como] resultado que a
construção da concepção e do Plano de Implantação da Rede Comunitária de
Comunicação Socioambiental do baixo Paraguaçu. Foram identificadas como
informações prioritárias para veiculação as questões ambientais, sociais e culturais da
região, assim como aquelas relativas ao Estaleiro Enseada do Paraguaçu. (EEPSA,
2010, p.2)
Observa-se que o Estaleiro iniciou o processo de formação da rede de educomunicadores,
buscando atender as condicionantes e a Medida Mitigadora nº 40.
Uma segunda análise do documento, permite afirmar que os capitalistas deram início ao
cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, ou seja, fizeram uma seleção de pessoas e as
capacitaram para serem educomunicadores. O que leva ao seguinte questionamento: Por que
um documento público foi sonegado pelo Estaleiro, para que fizesse parte da pesquisa?
A análise do documento suscita os seguintes questionamentos:
a)
Os educomunicadores foram contratados?
b)
A rede de educomunicadores foi implantada?
c)
Se foram contratados. Quais atividades os educomunicadores desenvolveram?
d)
Os cursos foram ministrados?
e)
Se foram ministrados os cursos previstos no PCS. Quais cursos foram ministrados,
quais públicos atingiu, e em quais períodos ocorreram?
97
98
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
Ver Anexo 8.14 – IBAMA – Licença de Instalação nº 737/2010.
235
f)
Ocorreu interação entre as comunidades e, em especial, entre a comunidade de São
Roque do Paraguaçu e o Estaleiro?
g)
Quais produtos da comunicação foram implementados?
Para responder a estas perguntas, um depoimento revelador sobre o processo de
implantação da rede de educomunicadores foi colhido na sede do distrito de São Roque do
Paraguaçu, durante pesquisa qualitativa, em 2 de outubro de 2013. A fonte das informações foi
o líder comunitário, pescador e técnico em solda metalúrgico naval, Antônio Bomfim (2013),
oportunidade em que comenta:
Esse programa que foi desenvolvido pelo próprio estaleiro. Se não me falha a
memória, pela ETHOS-HUMANUS. Foi um programa chamado de Rede de
Comunicação. Onde nós trabalhamos toda região do Recôncavo, ilha de Itaparica,
Salinas, Nazaré das Farinhas, todo Maragogipe, até aqui mesmo em São Roque. Eu
estava dizendo que se tivessem colocado esse programa em prática, não tinha havido
tanta paralização como houve, porque a gente teria como comunicar à comunidade as
coisas que estavam acontecendo e o que iam acontecer, e nós que ficamos com agentes
colaboradores, praticamente fomos esquecidos. Agora que foi retomada a condição de
a comunidade estar comunicando as coisas que estão acontecendo e que vão acontecer
dentro do processo do estaleiro. (BORGES, 2013)
Observa-se na afirmação de Antônio Bomfim (2013) é que ele participou do curso
ministrado pelo ETHOS-HUMANUS e que o curso não foi implantado. A rede de
educomunicadores não foi posta em prática, e as pessoas capacitadas para atuarem como
educomunicadores não foram contratadas. Ele avalia que uma ou duas pessoas que participaram
da Oficina de Comunicação Social foram contratados pelo Estaleiro, não para atuar como
educomunicadores, mas em outras atividades do Estaleiro.
Antônio Bonfim (2013) afirma que a falta da rede de educomunicadoress criou uma série
de dificuldades para a comunidade no relacionamento com o Estaleiro, levando a mobilização
da comunidade e ao protesto, com a paralização das atividades do Estaleiro. Relata que
ocorreram “diversas paralizações na pista de Salinas, aqui na pista de São Roque, onde a
população paralisavam a pista, e ônibus e alimentação não passavam.”, ele explica também que
“a insatisfação da comunidade era pela falta de comunicação, das coisas que estavam
acontecendo, vindo profissionais de fora para dentro da localidade e os filhos daqui mesmo não
estavam sendo fichados na obra. Então, pela sua insatisfação a própria comunidade tomou a
decisão de parar diversas vezes, não foi uma, nem duas, nem três vezes.”.
De forma objetiva, Antônio Bonfim (2013) declara que nos anos de 2011, 2012, até julho
de 2013, o Estaleiro “não tinha comunicação direta com a comunidade para dizer realmente o
que estava acontecendo, e o que estava a acontecer. Eu estava cobrando com a colega, que nós
236
fizemos tantos esforços para que essa rede da comunicação fosse formada, e acabou não se
colocando em prática, não ocorreu a participação na parceria com a comunidade.”. Antônio
Bonfim (2013) ponderou que após julho de 2013 o Estaleiro passou a ter maior preocupação
com a comunicação.
Analisando o conjunto de dados, conclui-se que o Estaleiro Enseada do Paraguaçu não
comprovou o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e não implantou e operou o Programa
de Comunicação Social, deixando de atingir objetivos prescritos.
5.3.3 O ESTALEIRO E O RELATÓRIO INSTITUCIONAL Nº 4
O terceiro documento analisando é o Relatório Institucional do EEPSA (2013, ed. 4),
emitido em 26 de julho de 2013. O relatório é um documento público produzido pelo Estaleiro
com objetivo de cumprir condicionante do EIA/RIMA (2009) no sentido de informar a
comunidade sobre as atividades dos capitalistas. Analisando o documento observa-se que até
26 de julho de 2013, data de emissão do relatório, o Estaleiro não implantou a rede de
educomunicadores prevista no PCS do EIA/RIMA (2009), e que também não cumpriu com os
objetivo do programa, deixando de cumprir a Medida Mitigadora nº 40. O Relatório (2013, Ed.
4, p. 11) informa apenas que ocorreu o “Planejamento da Rede de Comunicação Social do EEP,
composta por agentes de comunicação popular distribuídos pelos municípios do entorno,
ampliando a capacidade de disseminação das informações de interesse público, e garantindo,
ao mesmo tempo, um mecanismo de diálogo e governança com as comunidades.”. Não
informando se ocorreu a contratação dos educomunicadores, quais atividades desenvolvidas e
quais os objetivos alcançados. Conclui-se que a rede de educomunicadores não foi implantada
no período em que a pesquisa foi desenvolvida, e que os objetivos do PCS não foram
alcançados, descumprindo a Medida Mitigadora nº 40.
A figura a seguir reproduz parte do Relatório Institucional do EEPSA (2013, ed. 4):
237
Figura 30 – Reprodução da página 11 do Relatório Institucional nº 4.
Fonte: Estaleiro Enseada do Paraguaçu (jul. de 2013)
238
Analisando os dados contidos na Figura 30, observa-se que o Estaleiro Enseada do
Paraguaçu não informa sob o cumprimento dos objetivos do PCS e do PEA. Ou seja, a ausência
de informação indica que o Programa de Educação Ambiental não foi executado no período em
que a pesquisa foi realizada. Também indicam que não ocorreu a contratação dos
educomunicadores e que o Programa de Comunicação Social não foi implantado. Conclui-se
que ocorreu o descumprimento da Medida Mitigadora nº 40.
Analisando a íntegra do documento, observa-se que o mesmo não atende ao que prescreve
o Parecer Técnico nº 042/201099: “os materiais de divulgação deverão ser apresentados ao
IBAMA para aprovação e deve constar o nome do IBAMA e a informação de que o
programa trata do cumprimento de uma condicionante do processo de licenciamento.”.
Conclui-se que o documento não atende ao que foi determinando no processo de licenciamento
pelo IBAMA.
Observa-se que os capitalistas buscam impregnar nos poucos produtos de comunicação que
apresentam um discurso de sustentabilidade, calcado na democratização da informação e na
participação da social. Ocorre que o discurso é uma quimera, ou seja, não passa de discurso
vazio. A prática dos capitalistas é na condição contrária ao discurso que pregam, sonegado
informações, descumprindo prescrições, e não atingindo os objetivos previstos, no que tange o
processo de interação e inserção das comunidades. O resultado é uma população alienada do
modo de produção, tendo como consequência, a ampliação dos níveis de pobreza e
desagregação social, com incrementos dos indicadores de violência.
5.3.4 O ESTALEIRO E O JORNAL INSTITUCIONAL
O quarto e último documento analisado é o boletim informativo ‘Navegando Juntos – Ano
1, Edição nº 1, Setembro/2013’, emitido pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
A imagem a seguir reproduz a capa e a página nº 2 do jornal institucional ‘Navegando
Juntos’:
99
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
239
Figura 31 – Reprodução de páginas do jornal institucional ‘Navegando Juntos”.
Fonte: Estaleiro Enseada do Paraguaçu (Set. de 2013).
240
Analisando a Figura 31 e o conjunto de páginas com as informações contidas no boletim
informativo ‘Navegando Juntos – Ano 1, Edição nº 1, de Setembro de 2013’, observa-se que o
mesmo é caracterizado como produto de comunicação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu
(EEP) e do Consórcio Enseada do Paraguaçu (CEP), e tem por finalidade atender o Plano Básico
Ambiental (PBA), através do Programa de Comunicação Social. Analisando a íntegra do
documento, observa-se que o mesmo não atende ao que prescreve o Parecer Técnico nº
042/2010100: “os materiais de divulgação deverão ser apresentados ao IBAMA para
aprovação e deve constar o nome do IBAMA e a informação de que o programa trata do
cumprimento de uma condicionante do processo de licenciamento.”. Conclui-se que o
documento não atende ao que foi determinando no processo de licenciamento pelo IBAMA.
Dando sequência a análise do boletim informativo, observa-se que o mesmo é composto
de sete matérias, com os seguintes títulos: Um estaleiro de oportunidades para a Bahia, Vento
favorável aos negócios, Contrata-se cozinheira, Computador – um item popular, Carteira
assinada é realidade, Encurtando caminhos, e Obras a todo vapor. Analisando o conjunto de
matérias, observa-se que as elas não atingem o que está prescrito no PCS como obrigação dos
capitalistas. Estas obrigações foram prescritas no EIA/RIMA, (2009, v. 8, p. 72-73): “Promover
ampla comunicação educativa e interativa com as comunidades das áreas de influência direta e
indireta do Empreendimento, sobre conservação ambiental, saúde e segurança, combate e
enfrentamento à violência infanto-juvenil, combate ao trabalho infantil, prevenção contra
prostituição, DSTs e disseminação do HIV, conflitos ambientais e de propriedade”. Nenhuma
das matérias da primeira edição do jornal cumpre o que determina o PCS do EIA/RIMA (2009).
Outro elemento publicado no boletim informativo ‘Navegando Juntos – Ano 1, Edição nº
1, Setembro/2013’, como elemento que possibilite a interação do empreendimento com a
comunidade é o espaço denominado 'Fala comunidade' onde é informado que se trata de espaço
destinado à comunidade, para que possam fazer o encaminhamento de dúvidas, sugestões,
elogios e críticas. Os capitalistas informam que o canal adequado é através da Internet,
utilizando e-mail ‘[email protected]’. Eles observam que “as melhores perguntas
serão publicadas, mensalmente, na seção “Fala Comunidade” do Jornal navegando Juntos.
Observa-se que o EIA/RIMA (2009, v. 8, p. 72-73) estabelece que os capitalistas devem
desenvolver “projetos de comunicação do Empreendimento com as comunidades da área de
influência direta, difundindo informações atualizadas sobre o Estaleiro, a prevenção de danos
100
Ver Anexo 8.12 – IBAMA – Parecer Técnico nº 042/2010.
241
ambientais, perfis profissionais e qualificações exigidas para contratação de mão de obra;
oferecer a comunidade um telefone 0800 para atendimento de queixas, denúncias e problemas
ambientais.”. O PCS prescreve a disponibilização de um telefone com direito a chamadas
gratuitas, com a finalidade de promover a interação entre a comunidade e o Estaleiro.
Analisando os dados, infere-se que a disponibilização de uma linha telefônica 0800 não
excluí outras formas de comunicação, mas, estas devem ser acrescidas à disponibilidade do uso
do telefone. Além deste elemento, analisando o conjunto de matérias com os respectivos
conteúdos, observa-se que não ocorreram as informações sobre os cursos que deveriam ser
promovidos pelo Estaleiro junto às comunidades afetadas pelo empreendimento101. Não ocorre
a difusão de informações atualizadas sobre o Estaleiro, sobre a prevenção de danos ambientais,
perfis profissionais e qualificações exigidas para contratação de mão de obra. Infere-se que os
capitalistas não atingiram os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do
EIA/RIMA (2009), descumprindo a Medida Mitigadora nº 40.
Analisando o conjunto de dados apresentados no tópico, fica evidente o posicionamento
dos capitalistas no descumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e nos objetivos prescritos pelo
PCS no EIA/RIMA (2009). Resultado em uma ampliação da taxa de mais-valia, e na ampliação
da subordinação das comunidades, transformando-as ou mantendo-as como elementos do
subproletariado.
No próximo tópico é analisado a dialética estabelecida com o Estado e os capitalistas, a
partir da perspectiva da comunidade de São Roque do Paraguaçu.
5.4 A DIALÉTICA DA COMUNIDADE
Neste tópico são analisadas as 16 entrevistas qualitativas abertas, envolvendo oito homens
e oito mulheres, com faixa etária média de 45 anos. As entrevistas ocorreram na sede do distrito
de São Roque do Paraguaçu, em dois momentos distintos – 2 de outubro de 2010 e 11 de janeiro
de 2014. Foram selecionados para entrevista os membros da comunidade102 com perfil social
que coincidia com o perfil do público alvo a ser alcançado pelo Programa de Comunicação
Social do EIA/RIMA (2009). Outro aspecto observado na seleção dos membros da comunidade
é que fossem formadores de opinião, e ou interlocutores legítimos da comunidade.
Área de Influência Direta (AID) – compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara; e
na Área de Influência Indireta (AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica.
102 Ver Anexo 8.4 – Roteiro de entrevista estruturada aberta com a comunidade.
101
242
Após a realização das entrevistas, as respostas foram agrupadas em duas categorias de
análise distintas:
1 – A comunidade de São Roque do Paraguaçu e a dialética estabelecida com o Estado;
e
2 – A comunidade de São Roque do Paraguaçu e a dialética estabelecida com os
capitalistas.
A separação das categorias permite análises distintas e aprofundadas sobre atuação do
Estado e dos capitalistas a partir da perspectiva da comunidade. Os dados foram analisados com
base nos conceitos de dialética, Análise de Conteúdo e Análise do Discurso.
5.4.1 A COMUNIDADE DE SÃO ROQUE DO PARAGUAÇU E A DIALÉTICA
ESTABELECIDA COM O ESTADO
A partir da entrevista estruturada aberta com os membros da comunidade, objetivou-se
analisar os resultados da dialética estabelecida com Estado, extraindo categorias que
respondam:
1 – Como é percebida pela comunidade a presença do Estado?
2 – Quais as alterações percebidas pela comunidade com a implantação do Estaleiro?
As avaliações feitas pelos membros da comunidade foram reagrupadas em um conjunto de
citações, uma síntese, que corresponde ao conjunto de informações obtidos. Na sequência são
apresentadas análises que correspondem não apenas a citação, a síntese, mas ao conjunto de
dados levantados. Conforme observado a seguir:
Os serviços prestados pelo Estado são péssimos. Tem horas que me pergunto: e tem
prefeito aqui?
O Estado presta o pior serviço possível. São vários itens: falta segurança pública,
educação e saúde, as estadas que praticamente não existem. A prefeitura continua
cometendo os erros de antigamente. Nada faz.
A prefeitura de Maragogipe praticamente aqui é nada. A prefeitura aqui não está
fazendo nada.
Os serviços prestados pelo Estado são regulares. De 2009 a 2013 o Estado passou a
fazer alguma coisa, a exemplo de saneamento e calçamento.
Os serviços prestados pelo Estado são regulares. Precisa melhorar os serviços de
segurança, saúde e principalmente educação.
Falta na educação mais investimentos. Está precisando de ampliação porque a
quantidade de alunos tem aumentado.
243
Os serviços de saúde deixam a desejar bastante. O posto mesmo, as vezes a pessoa vai
fazer o curativo e não tem material.
O sistema rodoviário é péssimo. Pouco tempo depois que começou a construção do
Estaleiro piorou muito, pelo movimento de caçambas.
O acesso rodoviário é péssimo.
A rua do jeito que está, dá uma chuvinha e começa a lama. Eles começam um trabalho
e não terminam.
A população aumentou, como também aumentou o número de invasões e habitações
de taipa.
Ocorreu o aumento de invasões, com construções de casas de taipa [moradias
subnormais em locais inadequados].
Aumentou a violência, inclusive com casos de prostituição.
Aumentou a violência, em matéria de drogas, aumentou muito. Há 11 anos atrás que
eu vim morar aqui e a coisa mais difícil era ouvir falar em violência, tinha pouco, mas
agora aumentou, e muito. Muita gente estranha morando aqui.
Analisando os dados referentes às entrevistas qualitativas com membros da comunidade,
com recorte sobre a dialética com o Estado, observa-se que a comunidade critica a qualidade
dos serviços prestados pelo Estado nos setores de: saúde, educação, segurança, saneamento
básico, pavimentação e moradia identificando nestas categorias graves deficiências. Analisando
o que aponta a comunidade na entrevista, com relação aos governos do Estado e Federal
observa-se uma visão menos crítica, em decorrência do programa de transferência de renda
federal, Bolsa Família, e em decorrência dos investimentos em saneamento básico. Por outro
lado, com relação aos serviços prestados pela Prefeitura Municipal de Maragogipe, nos setores
de: educação, saúde, e manutenção da infraestrutura municipal (praças e vias), as críticas são
unânimes. A deterioração do sistema rodoviário é atribuída pelos entrevistados ao intenso
tráfico de veículos pesados com destino ao empreendimento capitalista. A segurança é um item
que preocupa a comunidade, principalmente o envolvimento de jovens com uso drogas.
Observa-se que a população não identifica que a questão da segurança pública é de
responsabilidade do Governo do Estado.
A análise das entrevistas também revelou que a comunidade enfrenta dificuldades com
relação ao acesso aos serviços bancários e as comunicações. A sede do distrito conta com uma
agência dos correios que não funciona com regularidade. O único caixa eletrônico, de
propriedade do banco estatal, Caixa Econômica Federal, instalado na praça da Vitória em 2013,
não funciona. No quesito telefonia, o quadro é melhor, a sede do distrito conta com sistema de
telefonia a cabo e rede móvel. Segundo o EIA/RIMA (2009, v. 5, p. 84), em julho de 2009 eram
registrados 288 telefones fixos instalados no distrito. Destes, 286 estavam em serviço, sendo
262 individuais e 24 públicos. O distrito também conta com serviço de telefonia móvel.
244
Ao analisar o conjunto de dados da entrevista qualitativa, conclui-se que a baixa qualidade
dos serviços prEstados pelo Estado compromete a qualidade de vida da comunidade. Observase que os investimentos previstos no EIA/RIMA (2009), que deveriam ser executados pelo
Estado, a exemplo da melhoria do sistema viário e da oferta de habitações subsidiadas para a
comunidade, não ocorreu.
Os dados levantados e analisados confirmam os dados do estudo apresentado no
EIA/RIMA (2009, v. 5, p. 84). O EIA/RIMA (2009) relata que a população apresentou críticas
com relação à segurança e a violência, declarando que falta policiamento preventivo. Com
relação à saúde, o serviço médico implantando no distrito não atende adequadamente a
população, sendo necessário deslocamentos para a sede do município, e para as cidades de São
Félix e Cachoeira. Observa-se que a sede do distrito de São Roque do Paraguaçu conta com
uma unidade do Programa de Saúde da Família (PSF). Conforme avaliação da comunidade, ele
funciona precariamente, sendo comum a ausência dos profissionais na unidade. Observa-se que
a unidade de saúde deveria contar com equipe de profissionais de saúde, composta por médico,
odontólogo, enfermeiros e agentes comunitários, e deveria funcionar diariamente (de segundafeira a sexta-feira). Destaca-se que o PSF é mantido através dos recursos do Governo Federal,
repassados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para a Prefeitura Municipal de Maragogipe.
A qualidade da educação é outro fator criticado pela comunidade. Segundo o EIA/RIMA
(2009, v. 5, p. 85) o distrito conta com estabelecimentos públicos que atendem da pré-escola ao
ensino médio. As principais unidades de ensino são: Escola Municipal Mario Gordilho Pereira,
Escola Municipal Antonio Virgílio de Medina, Escola Municipal Desembargador Oscar Dantas
e a Escola Estadual Kleber Pacheco Carlos. Através do programa Todos pela Educação
(TOPA), o Governo do Estado promove a educação de jovens e adultos. Mas, conforme
resultados do IBGE (CENSO, 2010), 11,46% da população de Maragogipe é classificada como
analfabeta, o que indica a necessidade do avanço do programa TOPA. Observa-se que uma das
principais críticas da comunidade é com relação a qualidade do ensino, e não com relação à
estrutura das escolas.
Outro problema apontado pela comunidade, no quesito educação, foi o fato dos cursos
promovidos pelo Estado, através do PROMINP, ocorrerem na sede do município. Isso
dificultou a participação dos membros da comunidade e a subsequente inclusão como
trabalhadores do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
245
Identificou-se que um dos benefícios que o Estado concede à comunidade, ocorre através
do programa federal Bolsa Família. O Governo Federal promove a transferência de renda
diretamente às famílias em condição de pobreza e extrema pobreza, conforme Lei nº 10.836 de
2004. Segundo dados levantados no Portal da Transparência (2014), os membros da população
de Maragogipe inclusas no Programa Bolsa Família receberam R$ 12.837.498 em 2013, sendo
beneficiadas 8194 pessoas, com repasse médio anual de R$ 1.566 por pessoa cadastrada.
Observa-se que cada indivíduo corresponde a uma família beneficiada103.
Dentre os compromissos assumidos pelo Estado está o de prover a sede do distrito com
sistema de esgotamento sanitário. Em março de 2013, o Estado iniciou investimentos, através
da EMBSA, no sistema de esgotamento sanitário da cidade Maragogipe e nas sedes dos
distritos. O valor total dos investimentos é da ordem de R$ 19 milhões, e a previsão de
inauguração do sistema é em setembro de 2014. Segundo o EIA/RIMA (2009) a EMBSA
também é “responsável pela captação, tratamento e distribuição de água, cuja qualidade é
considerada boa pelos moradores consultados. O ponto de captação fica localizado no rio dos
Paus.”.
Observando os dados da entrevista qualitativa, e os dados apresentados no EIA/RIMA
(2009, v. 5, p. 84) avalia-se que existem poucas opções de lazer. Uma das opções é a praia de
areia branca localizada na margem oposta ao povoado de Enseada do Paraguaçu, às margens
do rio Baetantã. O local conta com barracas de madeira e palha, que são ocupadas regularmente
por moradores do distrito, com a finalidade de comercializarem bebidas e alimentos. Identificase que o local não conta com água potável, iluminação e pavimentação. Outra opção de lazer
está situada na sede do distrito, em uma pequena faixa pavimentada, com cerca de 200 metros,
em frente ao rio Paraguaçu. O local conta com água potável, energia e pavimentação, mas a
urbanização irregular da localidade torna-o pouco aprazível.
Outra forma de lazer, apontada pelos moradores, é a prática de esporte. Observando os
dados da entrevista qualitativa, e os dados apresentados no EIA/RIMA (2009, v. 5, p. 86), os
membros da comunidade avaliaram que o distrito possui poucas quadras para práticas
esportivas, e que a maioria das quadras encontra-se com elevado grau de degradação. Também
encontram-se degradadas as quatro praças da sede do distrito, com bancos e ajardinamento
deteriorados. Positivamente, como elemento de socialização, ocorrem os festejos religiosos. A
103
Durante a pesquisa não foi possível definir quantos membros da comunidade, e qual o volume de recursos oriundos
do programa Bolsa Família foram repassados exclusivamente a moradores do distrito de São Roque do Paraguaçu.
246
colonização portuguesa, com a influência dos jesuítas sedimentou na comunidade local, ao
longo de séculos, intensos traços religiosos, sendo a religião um elemento de sociabilidade e,
união dentro da comunidade. O novenário da Festa de São Roque do Paraguaçu ocorre no mês
de agosto, mobiliza a comunidade. Outro evento religioso que mobiliza a população é a festa
de São Bartolomeu, padroeira de Maragogipe, também celebrada no mês de agosto. Em 2013,
foi lançado o sítio oficial na Internet, com endereço: http://www.festadesaobartolomeu.com.br/,
com objetivo de difundir e congregar a comunidade.
COMPREENSÃO DA PROBLEMÁTICA SOCIAL
Analisando os dados, observa-se que a comunidade de São Roque do Paraguaçu apresenta
elevado grau de coesão social em torno dos valores históricos, bem como adequada
compreensão social com relação aos problemas que enfrenta.
Verifica-se que a comunidade criticou com ênfase a precariedade com a qual os serviços
são prestados pelo Estado, principalmente no tocante à qualidade do ensino público, avaliado
como péssimo ou ruim por todos os entrevistados. Este elemento dificulta a inserção de
membros da comunidade no estaleiro, em decorrência da utilização de avançada tecnologia, o
que enseja uma classe trabalhadora com educação formal e técnica adequadas à inserção no
empreendimento.
Avaliando a qualidade dos serviços de segurança e saúde, observa-se que foram
qualificados como de baixa qualidade, por todos os entrevistados. A comunidade também foi
unanime em apontar a Prefeitura Municipal de Maragogipe como principal responsável pela
baixa qualidade dos serviços prestados pelo Estado.
Conclui-se que o Estado não cumpriu com o que determina o estudo do EIA/RIMA (2009),
no que tange os investimentos necessários à infraestrutura local, na parte viária, e nos setores
de habitação, educação, e segurança. Observa-se, também, que o Estado não atuou no sentido
de monitorar as alterações ocorridas na comunidade, em decorrência da implantação do
Estaleiro. Conclui-se que a atuação do Estado é ineficiente, e que essa ineficiência contribui
para a manutenção dos baixos indicadores de desenvolvimento humano na comunidade, para
ampliação do subproletariado e, de forma consequente, para ampliação da taxa de mais-valia
dos capitalistas.
247
5.4.2 A COMUNIDADE DE SÃO ROQUE DO PARAGUAÇU E A DIALÉTICA
ESTABELECIDA COM OS CAPITALISTAS
A partir da entrevista estruturada aberta com os membros da comunidade, objetivou-se
analisar os resultados da dialética estabelecida com os capitalistas, extraindo categorias que
respondam:
1 – Como é percebida pela comunidade a relação com os capitalistas?
2 – Ocorreu a implantação do PCS?
3 – A Medida Mitigadora Nº 40 foi cumprida?
4 – Se a Medida Mitigadora Nº 40 foi cumprida, em que extensão isto ocorre?
As avaliações feitas pelos membros da comunidade foram reagrupadas em categorias de
análise, compreendendo: o nível de conhecimento sobre o Estaleiro Enseada do Paraguaçu; se
educomunicadores mantiveram contato; se participaram dos cursos previstos no PCS (cursos
promovidos pelo Estaleiro); se foram informados sobre ofertas de vagas de emprego; se
tomaram conhecimento sobre a existência do telefone (0800); e como avaliavam a comunicação
do Estaleiro com a comunidade. As categorias de análise foram distribuídas e apresentadas em
uma tabela, com a síntese das perguntas e respostas. Na sequência foram procedidas as análises
dos dados levantados.
O processo de análise da entrevista estruturada aberta, com membros da comunidade em
dialética com os capitalistas, é concluso com a análise da citação de um dos membros da
comunidade. A citação do membro da comunidade foi selecionando em decorrência do mesmo
ser uma representação legítima da comunidade, por participar da vida comunitária, inclusive
como membro do Conselho da Baía do Iguape, e por ter participado, ativamente, dos debates
sobre o processo de instalação e operação do Estaleiro.
A seguir é resumido na Tabela a síntese das entrevistas realizadas com membros da
comunidade:
248
Pergunta
Se
Resposta
conhecem
o
Estaleiro 100% informou conhecer superficialmente, apenas a
Enseada do Paraguaçu?
aparência externa do empreendimento
Se receberam visita de um 100%
educomunicador?
informou
jamais
ter
recebido
visita
de
educomunicadores.
Se participaram de cursos 100% informou que jamais foram oferecidos os cursos [Os
promovidos pelo EEPSA?
cursos estão prescritos no Programa de Comunicação
Social].
Se foram informados sobre 100% informou ter dificuldade em ter acesso a informações
vagas de emprego oferecidas sobre emprego.
pelo EEPSA?
100% informou que buscam junto a lideranças da
comunidade e pessoas que estão empregadas no EEPSA,
informações sobre vagas de emprego.
Se
tomaram
conhecimento 100% informou que jamais foi divulgada a existência de
sobre a existência do telefone número (0800) por parte do Estaleiro.
(0800)
do
cuja 100% achou estranha a pergunta.
finalidade é ser um canal de
comunicação
EEPSA,
com
a
comunidade?
Questionados como avaliam a Os entrevistados avaliariam entre péssima, ruim e regular.
comunicação do EEPSA em Na média, os entrevistados avaliaram que a comunicação
relação a comunidade.
do Estaleiro com a comunidade é ruim.
Tabela 10 – Síntese da entrevista aberta com membros da comunidade sobre a relação dialética com
os capitalistas.
Fonte: Produção própria.
249
Analisando o conjunto de dados apresentados e resumidos na Tabela 10, infere-se que
100% dos entrevistados conhecem superficialmente o Estaleiro; 100% dos entrevistados não
recebeu visita, ou foi contatado por educomunicadores; 100% dos entrevistados não participou
de cursos, e ou lhe foram ofertados os cursos previstos no PCS; 100% dos entrevistados
informaram não ter acesso sobre informações com ofertas de emprego e que tem graves
dificuldades em conseguir a informação e ou acesso a membros da administração do Estaleiro
que possam responder sobre o assunto – observa-se que os entrevistados foram unanimes em
relatar dificuldade de inserção como trabalhadores do Estaleiro, observa-se também que alguns
membros da comunidade relataram que possuíam experiência profissional comprovada com
registro em carteira de trabalho e não conseguiam inserção no empreendimento –; 100% dos
entrevistados informaram que o telefone 0800 não foi disponibilizado para a comunidade; e
com relação a qualidade da comunicação do Estaleiro para com a comunidade, classificaram
como ruim.
Conclui-se que os capitalistas descumpriram na integralidade o Programa de Comunicação
Social previsto no EIA/RIMA (2009), e que a Medida Mitigadora Nº 40 não foi cumprida,
incorrendo no descumprimento da Licença de Instalação Nº 737/2010.
A VOZ DA COMUNIDADE
Dentre os membros da comunidade selecionado para conceder entrevista qualitativa, está
uma das personalidades mais ativas da comunidade de São Roque do Paraguaçu, João Costa
(2014), 41 anos, servidor público, trabalhador rural, líder comunitário e membro do Conselho
da RESEX Baia do Iguape. A citação do ator social resume a dialética estabelecida na relação
da comunidade com o Estado e com os capitalistas:
Houve alguma parceria. Houve algum acréscimo de desenvolvimento. Mas para São
Roque, para gente mesmo, moradores daqui, a coisa ainda tem deixado muito a
desejar. Porque você anda aqui, você vê falta de segurança, e não tem assistência
social. Falta responsabilidade social, tanto da empresa como do poder público. São
Roque é muito mal assistido em todos os aspectos. [...] Se for colocar aí, em bom,
ruim e regular, eu vou deixar no regular ainda. Porque eles têm que estar mais na
comunidade, eles têm que realmente abrir as portas da empresa para gente. A coisa é
muita obscura. A informação era para ser mais precisa. A gente defende o estaleiro.
Eu fui uma das pessoas que enchia o ônibus como pessoas daqui para defender a
implantação do empreendimento. Agora o que a gente quer, e o que a gente espera, é
que esse empreendimento venha valorizar a nossa comunidade. A gente aceitou eles
aqui. Agora que venha ter respeito pela nossa comunidade e valorizar onde eles estão.
[..] Eu ainda acho o estaleiro distante. [...] Na minha opinião a comunicação tem
deixado a desejar. Ela era para ser mais ativa, porque ela só surge na hora dos conflitos.
(COSTA, 2014)
250
Analisando a citação, observa-se que a comunidade mantém uma posição proativa em
relação ao Estaleiro, e espera que o empreendimento cumpra, junto à comunidade, a promessa
de desenvolvimento e inclusão social. Promessa que até a conclusão da pesquisa de campo não
tinha sido cumprida. Compromissos celebrados pelos capitalistas junto à sociedade e ao Estado
que não foram executados. Observando o conjunto de dados, conclui-se que a comunidade de
São Roque do Paraguaçu avalia negativamente o processo de implantação e operação do
Estaleiro, indicando que os objetivos do Programa de Comunicação Social, não foram
atendidos, sendo descumprida a Medida Mitigadora nº 40 e a condicionante da Licença de
Instalação Nº 737/2010 que estabelece o PCS.
Verificando o conjunto de dados, afirma-se que a implicação direta do descumprimento do
PCS por parte dos capitalistas é que a comunidade não é beneficiada pela instalação e operação
do empreendimento, e que com o descumprimento dos objetivos previstos no PCS, determina
o descumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e da condicionante da Licença de Instalação
Nº 737/2010 que estabelece o PCS. Como resultando deste processo, afirma-se que ocorreu o
descumprimento do Plano de Gestão Ambiental (PGA), acarretando no descumprimento da Lei
Federal nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente; na Lei Federal
nº 9.795/1999, que define a Política Nacional de Educação Ambiental; e no Decreto Federal nº
6.040/2007, que Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais.104
A UTOPIA DA COMUNIDADE E A OPRESSÃO DO IMPÉRIO
Outra característica capitalista, verificada no processo de instalação do Estaleiro Enseada
do Paraguaçu, é confirmada através do conceito desenvolvido por David Harvey (2012. P. 140)
sobre a ‘acumulação flexível’: “a acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões
do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por
exemplo, um vasto movimento no emprego no chamado “setor de serviços”, bem como
conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas.”. A
implantação do Estaleiro, conforma um empreendimento completamente novo em uma região
subdesenvolvida na perspectiva do capitalismo.
O poder do capital é exercido como uma verdadeira força opressora em nossa era em
decorrência à rede estreitamente entrelaçada de suas mediações de segunda ordem – que
104
Ver Capítulo IV – O Estado, o EIA/RIMA (2009) e o Programa de Comunicação Social, p. 168.
251
emergiram de contingências históricas específicas ao longo de muitos séculos. Foram sendo
fundidas durante a consolidação do conjunto do sistema, produzindo assim um imenso poder
sistêmico de discriminação em favor do modo de intercâmbio reprodutor do capital que se
desdobrava aos poucos e contra todas as possibilidades contrárias de controle sociometabólico.
É assim que, ao longo de toda a sua constituição histórica, o capital se tornou, de longe, o mais
poderoso (uma “bomba de extração”, segundo Marx) extrator de excedentes conhecido da
humanidade. (MÉSZÁROS, 2011b, p. 199)
No próximo tópico é analisado como o Estado atua na fiscalização da Medida Mitigadora
nº 40, nas condicionantes da Licença Ambiental do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, sendo
observado os reflexos da atuação do Estado na expansão do Império e superexploração das
comunidades tradicionais.
5.5 O ESTADO E A FISCALIZAÇÃO DA MEDIDA MITIGADORA Nº 40 E AS
CONDICIONANTES DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL
Neste tópico é observado como o Estado atuou na fiscalização da Medida Mitigadora nº
40, no cumprimento dos objetivos prescritos no PCS do EIA/RIMA (2009), e na fiscalização
das condicionantes da Licença de Instalação Nº 737/2010, com recorte no Programa de
comunicação Social.
Foram procedidas entrevistas qualitativas junto ao Governo do Estado da Bahia, através da
SEINP; Ministério Público Federal; Ministério Público Estadual e IBAMA. Os atores
selecionados fizeram parte da Audiência Pública (2008) em Maragogipe, e estão diretamente
envolvidos com o processo de licenciamento e acompanhamento do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu. O objetivo da pesquisa foi levantar informações e documentos que comprovassem:
a)
Se e como o Estado atua na fiscalização do Estaleiro,
b)
Se o Programa de Comunicação Social foi implantado?
c)
Se foi implantado, em que extensão ocorreu?
A analises dos dados permite concluir se a Medida Mitigadora nº 40 foi implementada, e
em que extensão isto ocorre.
252
5.5.1 A SECRETARIA DA INDÚSTRIA NAVAL E PORTUÁRIA DA BAHIA E O
ACOMPANHAMENTO DO EIA/RIMA (2009)
Foram realizados contatos telefônicos com a Secretaria da Indústria Naval e Portuária da
Bahia (SEINP), no primeiro semestre de 2013, e encaminhados e-mail com questionário
qualitativo e solicitação de documentos que comprovassem o cumprimento da Medida
Mitigadora Nº 40, e a aplicação do Programa de Comunicação Social previsto no EIA/RIMA
(2009). Os questionamentos e documentos objetivam responder:
a)
Como a SEINP atua na fiscalização do Estaleiro;
b)
Se Programa de Comunicação Social foi implantado? e
c)
Se foi implantado, em que extensão ocorreu?
Em 12 de agosto de 2013 o questionário foi respondido. Dentre as repostas concedidas, foi
apresentado documento que relata a missão da SEINP. Na citação a seguir é apresentada seleção
do trecho em que a entidade faz referência ao EEPSA:
O trabalho da Secretaria Extraordinária da Indústria Naval e Portuária (SEINP)
envolve atuação em três áreas: naval, náutica e portuária. A secretaria foi criada com
o objetivo de dar mais agilidade às ações do Governo do Estado da Bahia que visa
implantar empreendimentos naquelas áreas com ênfase na articulação com o Governo
Federal, instituições envolvidas com os assuntos e com o empresariado nacional e
estrangeiro. A estratégia do governo estadual baseia-se no seguinte tripé: Obras para
o Canteiro da Petrobrás, localizado em São Roque do Paraguaçu, implantação do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu e dos canteiros destinados à construção de módulos
de plataformas de petróleo na Baía de Aratu. Consórcio São Roque do Paraguaçu – O
governo tem buscado junto a Petrobrás obras que permitam a utilização permanente
do Canteiro de São Roque do Paraguaçu, que hoje abriga a construção de duas
plataformas de perfuração para águas rasas (P-59 e P-60), cuja geração de emprego,
em torno de duas mil pessoas, é da maior importância para a região do Recôncavo
Baiano. A preocupação do governo é garantir junto a Petrobrás que novos
empreendimentos sejam alocados a São Roque permitindo a sua continuidade e a
manutenção dos empregos na região. Estaleiro Enseada do Paraguaçu – A segunda
ponta do tripé, significa a implantação, no Recôncavo baiano, do Estaleiro Enseada
do Paraguaçu. O empreendimento reúne as empresas Odebrecht, OAS e UTC
Engenharia num investimento que pode atingir 2 bilhões de reais, dotando o Estado
de um moderno estaleiro, capacitado para construir plataformas de petróleo de todos
os tipos, empregando quatro mil pessoas durante a construção e 3.500 na sua
operação. (SEINP, 2013)
Observa-se que a SEINP foi criada com a finalidade de ser um elemento de conexão dos
interesses do Estado da Bahia no setor naval, atuando como elemento de ligação entre as
políticas públicas do Governo Federal para o setor naval, os interesses dos capitalistas em atuar
no segmento, e os interesses do Estado da Bahia em ampliar a base de arrecadação tributária, e
gerar aumento do emprego formal através da expansão capitalista. A SEINP também expressa
que dentre os principais pontos que deve atuar, ‘tripé’, dois são ligados ao EEPSA. Afirmando
253
no primeiro ponto do tripé, que atuou na intermediação dos interesses capitalistas junto a estatal
PETROBRAS, com a finalidade de conseguir contratos para o Consórcio São Roque do
Paraguaçu. O segundo ponto com o qual deve atuar é no sentido de implantar o Estaleiro
Enseada do Paraguaçu S/A em São Roque do Paraguaçu. A justificativa do Estado no apoio aos
capitalistas se dá, segundo a SEINP, em decorrência da necessidade de geração de emprego no
Recôncavo baiano.
Observando a citação, conclui-se que o Estado age na defesa dos interesses da burguesia,
organizando o setor produtivo em detrimento dos interesses capitalistas, ampliando o número
de indivíduos como classe trabalhadora. Também conclui-se que o Estado não manifesta o
devido rigor no tratamento social das comunidades tradicionais impactadas pelo
empreendimento, limitando-se a justificar a atuação no sentido de criar postos de trabalho
formal.
Retornando às respostas concedidas por e-mail pela SEINP, a entidade explicou que a
responsabilidade em acompanhar a aplicação da Medida Mitigadora nº 40 e o Programa de
Comunicação Social é de competência do IBAMA. Imiscuindo-se de ter a responsabilidade de
acompanhar como os empreendimentos que ela apoia, impactam nos meios físico, biótico e
socioeconômico.
Embora a função pela fiscalização das medidas mitigadores e do licenciamento sejam de
competência do IBAMA, órgão da administração direta do Governo Federal, é dever do Estado
da Bahia acompanhar o cumprimento das condicionantes, para que sejam atingidos os objetivos
prescritos no EIA/RIMA (2009). Observando-se que o EIA/RIMA (2009) foi um estudo
encomendado pelo Governo da Bahia, ou seja, a base de dados com o qual os empreendimentos
devem se pautar para atingir os objetivos delineados meios físico, biótico e socioeconômico é
de interesse do próprio Governo do Estado, portanto, caberia ao Estado da Bahia e, mais
especificamente, a entidade que organiza o setor, manter uma base de dados atualizada sobre
como os capitalistas têm atuado e de que maneira os empreendimentos fomentados pelo Estado
tem se desenvolvido. Inclusive no sentido de cobrar do IBAMA, entidade ligada a outra esfera
de poder, a devida fiscalização, agindo desta forma na defesa do interesse da sociedade.
Conclui-se que a SEINP, ao não manter uma base de dados, deixou de cumprir com as
competências inerentes ao Governo da Bahia, prescritas na Constituição Estadual da Bahia,
estabelecidas na Seção II:
254
IV - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a
integração social dos setores desfavorecidos; (CEB/1989)
V - elaborar e executar planos de ordenação do território estadual e de
desenvolvimento econômico e social; (CEB/1989)
VIII - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas,
preservando as florestas, a fauna e a flora; (CEB/1989)
XIV - proteger os monumentos, paisagens naturais notáveis e sítios arqueológicos e
impedir a evasão, destruição e descaracterização de documentos, obras e outros bens
de valor histórico, artístico e cultural; (CEB/1989)
Observando o conjunto de parágrafos da Seção II da Constituição do Estado da Bahia
(1989), pode-se inferir que ao deixar de acompanhar o processo de licenciamento dos
empreendimentos, a SEINP descumpre a CEB (1989), contribuindo no sentido inverso, ou seja,
de ser a coautora de impactos nos meios físicos, bióticos e socioeconômicos, decorrentes da
expansão capitalista da qual é participante direta. Ao final, como os capitalistas perseguem o
lucro, a supressão do cumprimento de medidas mitigadoras e condicionantes do licenciamento
ambiental levam a ampliação das margens de lucro, está margem de lucro é amplificado ao
custo da supressão de direitos sociais, o que em parte explica porque no Recôncavo da Bahia,
ocorre elevada produção de capital, com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Concluindo a análise das informações concedidas por e-mail pela SEINP, observa-se que
a entidade disponibilizou a íntegra do EIA/RIMA (2009), o Plano Estratégico Interativo de
Comunicação Social (2010), e três boletins informativos produzidos sob encomenda do
Estaleiro pelo ETHOS-HUMANUS Consultoria. Mas, estes dados não foram enviados como
parte do cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, ou seja, não estavam organizados com a
finalidade de acompanhar o cumprimento dos objetivos prescritos no EIA/RIMA (2009), eram
dados que estavam à disposição da SEINP e que ela repassava105. A SEINP não apresentou
documentos que comprovem o cumprimento da Medida Mitigadora Nº 40, ou depoimentos que
indiquem o cumprimento da medida e implementação do PCS. Os dados indicam que não
ocorreu o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, não tendo sido implantado o Programa de
Comunicação Social, conforme previsto no EIA/RIMA (2009).
Ver Capítulo IV – O Estaleiro, as condicionantes do Programa de Comunicação Social e o cumprimento da Medida
Mitigadora nº 40, p. 192.
105
255
5.5.2 O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, A FISCALIZAÇÃO DO EIA/RIMA (2009) E
O CUMPRIMENTO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL
Foram realizadas duas entrevistas qualitativas presenciais com o procurador da república
Marcos André Carneiro Silva. As entrevistas ocorreram na sede do Ministério Público Federal
(MPF) em Feira de Santana, em 26 de fevereiro de 2013 e 8 de julho de 2013. Elas objetivaram
responder:
a)
Como o MPF atua na fiscalização do Estaleiro;
b)
Se Programa de Comunicação Social foi implantado? e
c)
Se foi implantado, em que extensão ocorreu?
A primeira entrevista objetivou levantar dados qualitativos sobre o processo de instalação
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S/A e a função da entidade no processo. Oportunidade em
que Marcos Silva (2013) declara:
O Ministério Público Federal vem acompanhando esse processo de instalação do
Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Nós temos participado de diversas reuniões com
representantes da empresa e essas reuniões são coordenadas pelo Ministério Público
Estadual então é um esforço comum entre o Ministério Público Estadual e Federal. A
gente tem discutido periodicamente os efeitos da confissão do estabelecimento. A
gente tem tido muita preocupação em fazer com que o Estaleiro adote todas as
medidas previstas e mesmo as que não estejam previstas de forma a minorar o máximo
possível os efeitos sobre a população, mas, é muito difícil anular, os efeitos sempre
vão existir. Nas últimas reuniões que nós tivemos o Estaleiro quer que não se use mais
a expressão Polo Naval, porque eles alegam que originalmente iriam existir várias
empresas, vários estaleiros, daí o nome Polo Naval. A Odebrecht um estaleiro, a OAS
outro estaleiro e outras empresas poderiam construir, esse era o plano inicial. Depois
de algum tempo eles mudaram os planos e atualmente só existe um estaleiro em
construção, que é o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, então essa denominação Polo
Naval foi abolida, já que só existe um estaleiro, que é resultado de um consórcio, de
uma reunião de empresas que tinham interesse de construir estaleiros na região. O
Estaleiro Enseada do Paraguaçu é resultado dos esforços da Odebrecht, da OAS, da
empresa chamada UTC, que administra o aeroporto de Viracopos, em Campinas e um
parceiro internacional que é a Kawasaki, então em vez dessas empresas construírem
cada uma um estaleiro, elas se uniram e está em construção apenas um. Apesar disso
é um investimento que envolve bilhões de reais e prevê a criação de milhares de
empregos diretos e indiretos em uma região que é extremamente frágil, tem muitos
mangues, que é um ecossistema muito sensível a mudança. Mangues estes que já
vinham sofrendo efeitos da barragem, com a construção da Pedra do Cavalo e mais
recentemente houve mudanças na operação, a forma como ela vem sendo
administrada aumentou a salinização e piorou os efeitos do mangue. É uma região que
além de ser frágil vinha sofrendo um problema grande, que a gente estava tentando
trabalhar mas, não tinha solução, que é o controle da salinização das aguas daquela
região em virtude da barragem Pedra do Cavalo e agora ainda tem que lidar com os
efeitos da construção desse estaleiro. Sobre o ponto de vista social, é uma cidade
pequena, Maragogipe se quer tem um esgotamento sanitário desenvolvido, a
EMBASA a anos executa um contrato, a gente vem acompanhando a construção do
esgotamento sanitário e há uma série de problemas na execução desse contrato. Uma
cidade sem esgotamento, uma região que já sofria os efeitos da barragem Pedra do
256
Cavalo e agora vai ter que lidar com um aumento populacional súbito, porque a
geração de mais empregos significará mais pessoas morando na região e a cidade de
forma alguma está preparada para receber tantas pessoas. São vários desafios que
temos que lidar, por isso temos feito reuniões constantes com o Estaleiro Enseada do
Paraguaçu, tentando achar formas que possam minorar os efeitos de tamanhos
desafios que está pela frente. A construção de um estaleiro que prevê a criação de
milhares de empregos em uma área já fragilizada, pequena, sem esgotamento
sanitário, rua acanhada, enfim, há necessidade de reorganizar o plano diretor, fazer
um planejamento, a prefeitura também, o Ministério Público Estadual tem feito
reuniões. (SILVA, 2013)
Observa-se que o MPF reconhece os impactos que a expansão capitalista provoca nas
comunidades tradicionais, e nos meios físicos e biótico. Mas, afirma que a responsabilidade por
conduzir o inquérito civil de implantação do empreendimento é de competência do Ministério
Público Estadual (MPE). A transferência da competência do inquérito da esfera federal para a
estadual foi feita em decorrência do MPE ter criado, através do ato nº 181/2007, o Núcleo de
Defesa da Baía de Todos os Santos (NBTS). Dentre as justificativas apresentadas está o
“interesse da Instituição na adoção de políticas e programas, visando ao restabelecimento do
equilíbrio ambiental, através de conjunto articulado de ações governamentais e nãogovernamentais, da União, do Estado da Bahia, e dos municípios baianos que integram a região
da Baía de Todos os Santos” (BRITTO, 2007).
Dando continuidade à entrevista qualitativa, o procurador da república Marcos Silva (2013)
relata as experiências que teve durante o processo de implantação do EEPSA e no convívio
direto com a comunidade:
O Estaleiro Enseada do Paraguaçu fica no distrito de São Roque, mas, ele fica em uma
área rural, e essa área é justamente onde está instalada uma comunidade com mesmo
nome, chamada Enseada. Você vê que o estaleiro se apropriou do nome de uma
comunidade que existe e está instalada no mesmo local. Essa comunidade é de
marisqueiros e se auto declara remanescente de quilombo, existe, inclusive, um
procedimento aberto no INCRA, para estudar essa comunidade e elaborar um relatório
técnico de identificação e delimitação do território e daí fazer a demarcação do
território dessa comunidade. Esse processo se arrasta no INCRA há dois anos a
comunidade tem que conviver com o Estaleiro. No começo foi muito difícil, eu estive
lá há um ano, na época a comunidade tinha várias queixas, sobretudo, com relação ao
impacto desse empreendimento para as atividades habituais. Muitos alegavam ter
dificuldades para mariscar, porque o Estaleiro está situado em uma área onde eles
estavam acostumados a atravessar para praticar suas atividades. Nessa época [início
de 2012] o Estaleiro permitia que os marisqueiros atravessassem, apesar da área ser
toda cercada, eles abriam os portões, a pessoa se identificava e eles deixavam
atravessar para ir mariscar do outro lado da região. Quando as obras se intensificaram,
por questão de segurança, eles proibiram a passagem por dentro do canteiro. O
Estaleiro alega que é questão de segurança, porque ali passa trator, enfim, não é a área
mais segura para que marisqueiros transitem. Para compensar isso, eles
disponibilizaram um barco para os marisqueiros contornarem a área e exercer as suas
atividades. Em uma das reuniões que eu tive expliquei que essa solução não era
perfeita, talvez fosse a única possível, mas não era perfeita, porque o pessoal da
comunidade alega, que em alguns períodos o mar fica revolto e eles tem receio de
utilizar esse barco para atravessar para o outo lado. Mas foi a única solução
257
disponibilizada pelo Estaleiro. [...] Porque na hora que a gente chega é uma praia de
areia, não é área de mariscagem, não é uma área onde eles podem exercer as atividades
deles. Essa área de praia é o que restou, na qual eu cheguei e acredito que eles usem
também para entrar e sair, mas ali não resolve o problema deles, eles não estão
isolados do ponto de vista físico, eles podem entrar e sair eles estão isolados do ponto
de vista econômico, eles estão isolados para poder exercer suas atividades. É como se
fosse construído uma barreira entre o local que você costuma trabalhar, entre a
Procuradoria e minha casa existisse um Estaleiro Enseada do Paraguaçu através do
qual eu não pudesse atravessar se não através de barco, rodeando tudo. Mas, existem
outros problemas também. (SILVA, 2013)
Analisando a citação, observa-se que a implantação do Estaleiro impactou no modo de vida
da comunidade, limitando a produção de subsistência e o deslocamento da comunidade.
Também observa-se que o Governo do Estado foi ágil o suficiente para desapropriar parte da
Ponta do Corujão transferido a propriedade para os capitalistas, enquanto os moradores
tradicionais da Ponto do Corujão, remanescentes da Comunidade Quilombola Enseada do
Paraguaçu106, permanecem subordinados aos interesses dos capitalistas proprietários das terras
da região. Também observa-se que o Ministério Público Federal atuou de forma pouco incisiva
no sentido de obrigar o Governo do Estado ou a União a promover a regularização fundiária,
permitindo que a comunidade se torne proprietária legal das terras que historicamente ocupam.
Sobre as mudanças nos meios físicos, bióticos e sociais, o procurador Marcos Silva (2013)
faz um instigante relato:
Eu me recordo da última audiência pública em que eu estive presente, de um pescador,
ter feito um depoimento muito bonito. Contando que ele morou ali a vida toda
[Povoado de Enseada do Paraguaçu], que era um lugar onde os avós dele moravam e
que ele, até então, vivia em comunhão com a natureza e não queria sair dali, porque
ele achava um bom lugar para criar os filhos, porque estava sempre em contato com
a natureza e achava importante passar essa noção pros filhos. Com a construção do
Estaleiro foi feita uma estrada de terra, bastante utilizada por caminhões, levando
materiais de construção e etc., e que os filhos dele sofrem problemas respiratórios,
que nunca tiveram antes, por consta da poeira que gera. Ele conta ainda que a noite
ele se sente inseguro em sair, coisa que ele nunca sentiu antes, insegurança, ele passou
a sentir agora. Porque ele conta que diversos caminhões contratados de forma avulsa,
ou seja, não são caminhões do próprio Estaleiro, são pessoas que prestam serviço a
empresa. A noite essas pessoas, que ele não confia, estacionam esses caminhões na
frente da casa dele e fica uma fila de caminhões estacionados, com pessoas que
oriundas de vários lugares do país, para uma região que antigamente era pacata, onde
os filhos deles menores costumavam andar a qualquer hora do dia ou da noite
tranquilamente. Agora não andam mais, porque existe uma fila de caminhões e de
gente do Brasil todo, esperando a vez de carregar os caminhões para o Estaleiro. É um
impacto para a vida dessa pessoa, que nunca imaginou que naquele lugar rural, em
contato com a natureza, de repente, uma mudança drástica na vida que ele vinha
levando fosse ocorrer. Isso é só um depoimento que eu achei emblemático, mas há
diversos outros nesse mesmo sentido. Atualmente o Estaleiro está realizando a
dragagem, realmente a de se reconhecer um esforço para minorar os efeitos dessa
dragagem, eles cadastraram diversas famílias, de diversas comunidades pesqueiras
que durante o período de dragagem ficaram impedidos de pescar, esse é outro efeito
social. E eles pagaram e vem pagando uma indenização a cada uma dessas famílias,
106
Ver Capítulo IV – As associações e a comunidade remanescente quilombola em São Roque do Paraguaçu, p. 214.
258
foram milhares de famílias cadastradas. O Estaleiro vem atraindo diversas outras
empresas para região, já era previsto que isso acontecesse, empresas formais e
informais. Foi autuada recentemente uma pedreira, que não era para existir no local,
mas pessoas resolveram extrair pedras sem autorização e a há relatos de que está
extração é para fornecer para o Estaleiro. (SILVA, 2013)
Ao analisar a citação, observa-se que o relato de Marcos Silva apresenta uma síntese da
drástica mudança no modo de vida que a comunidade de São Roque do Paraguaçu e, mais
especificamente, do povoado de Enseada do Paraguaçu, atravessa.
Com relação a segunda entrevista qualitativa, quando foram apresentados os
questionamentos concernentes ao cumprimento da Medida Mitigadora Nº 40 e os objetivos
prescritos no Plano de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009), o procurador Marcos Silva
(2013) informou que não tinha conhecimento sobre o assunto, reafirmando que o inquérito
estava sob os cuidados no NBTS, sendo responsáveis pelo inquérito o promotor de justiça Audo
da Silva Rodrigues, presidente do inquérito, e a promotora de justiça Cristina Seixas Graça,
coordenadora do NBTS. Marcos Silva encaminhou, por e-mail, o parecer da Fundação Cultural
Palmares107 de Nº 11/DPA/FCP/MinC/2010 emitido em 19 de março de 2010, documento que
apresenta as comunidades quilombolas afetadas pelo empreendimento.
Conclui-se que o Ministério Público Federal108 tem conhecimento sobre os problemas que
a comunidade atravessa, mas atua de forma pouco contundente no sentido de fazer prevalecer
os objetivos prescritos no EIA/RIMA (2009) e na licença ambiental, transferindo
responsabilidades e competências para o Ministério Público Estadual. Ao proceder desta
maneira, a entidade descumpre a Lei Complementar nº 75, que define atribuições e
competências, dentre elas, o de preservar o meio ambiente e os interesses sociais e difusos.
Também conclui-se que o MPF não apresentou documentos que comprovem o cumprimento da
Medida Mitigadora Nº 40, ou depoimentos que indiquem o cumprimento da medida e
implementação do PCS. Portanto, as evidências indicam que não ocorreu o cumprimento da
Medida Mitigadora nº 40, não tendo sido implantado o Programa de Comunicação Social,
conforme previsto no EIA/RIMA (2009).
Ver Capítulo IV – As associações e a comunidade remanescente quilombola em São Roque do Paraguaçu, p. 214.
O Ministério Público Federal faz parte do Ministério Público da União, conforme a Lei Complementar nº 75, de 20 de
maio de 1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União. A lei define no
artigo 1º – O Ministério Público da União, organizado por esta lei Complementar, é instituição permanente, essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais
e dos interesses individuais indisponíveis. Art. 5º São funções institucionais do Ministério Público da União: I – a defesa
da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses sociais e dos interesses individuais indisponíveis. Art. 39. Cabe
ao Ministério Público Federal exercer a defesa dos direitos constitucionais do cidadão.
107
108
259
5.5.3 O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, A FISCALIZAÇÃO DO EIA/RIMA (2009)
E O CUMPRIMENTO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL
Foram realizadas duas entrevistas qualitativas presenciais com os promotores de justiça –
Audo da Silva Rodrigues, Titular da Regional Ambiental de Feira de Santana, que envolve a
região do Baixo Paraguaçu; e Cristina Seixas Graça, coordenadora do Núcleo da Baía de Todos
os Santos (NBTS). A primeira entrevista ocorreu com Audo Rodrigues, na sede do MP em Feira
de Santana, no dia 27 de fevereiro de 2013. A segunda entrevista ocorreu com Cristina Graça
na sede do NBTS/MP, em Salvador. Acompanhando a segunda entrevista, esteve presente o
promotor Audo Rodrigues. Segundo Cistina Graça (2013) “compete ao Ministério Público
verificar se a licença está sendo cumprida adequadamente, verificar que tipos de impactos estão
ocorrendo e se estão sendo mitigados ou não. Se ocorre a regularidade da implantação a partir
de uma licença ambiental, ou se há impactos que extrapolam a própria licença.”. Dentro das
competências do Ministério Público, as entrevistas objetivaram responder:
a)
Como o MP atua na fiscalização do Estaleiro;
b)
Se Programa de Comunicação Social foi implantado? e
c)
Se foi implantado, em que extensão ocorreu?
ENTREVISTA COM PROMOTOR DE JUSTIÇA AUDO RODRIGUES
A primeira entrevista objetivou levantar dados qualitativos sobre o processo de instalação
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu S/A e a função da entidade no processo. Oportunidade em
que Audo Rodrigues (2013) declara:
Nós pegamos a situação em andamento, com o início das obras de construção do
estaleiro e, sobretudo com a necessidade primordial, a nível de Ministério Público
Estadual, em verificar os impactos ambientais que por ventura estivessem sendo
ocasionados por causa da construção. Desde uma fase inicial, quem tem sido uma fase
muito crítica, a nível de dragagem do local que já começou desde o final de dezembro
[2012], para a construção do dique seco e aprofundamento das áreas próximas. [...]
Como também temos mantido diversos atendimentos, reuniões constantes com a
empresa, a nível de celebração do termo de Ajustamento de Conduta, que é o que nós
buscamos, para que essa empresa venha a verificar toda uma sistemática de
compensação ambiental difusa, no tocante aos impactos não só ambientais como
principalmente sociais em toda a região de Maragogipe, São Roque do Paraguaçu. [...]
Quem promoveu a audiência pública foi o próprio estaleiro, que fazia parte das
condicionantes pedidas a licença ambiental. Nós participamos de duas audiências
públicas, 12 de novembro e 19 de novembro, uma em São Roque do Paraguaçu e outra
em Maragogipe. Eu participei da primeira, não participei da segunda, outro colega foi.
A população foi chamada a discussão, para conhecer o projeto, para opinar em
algumas situações, para que se demonstrassem quais seriam os riscos, isso se chegou
a uma compensação inicial que foi dada de forma individual aos pescadores e
260
marisqueiros, que acabaram sendo prejudicados temporariamente com a sua atividade
comercial. (RODRIGUES, 2013)
Observando as declarações de Audo Rodrigues, infere-se que o Ministério Público
demonstram ter pouco domínio sobre a complexidade e influência que o empreendimento causa
nos meios físicos, bióticos e socioeconômicos, embora o EIA/RIMA (2009) apresente com
consistência os impactos, determine medidas e programas a serem seguidos. Também, observase que existe uma preocupação com relação ao repasse de valores à comunidade. Mas, com
relação aos Programa de Gestão Ambiental do Estaleiro, não são apresentados posicionamentos
sobre o cumprimento.
Retornando a entrevista qualitativa, Audo Rodrigues avalia de que maneira os capitalistas
estão cumprindo as condicionantes do licenciamento e colaborando com a entidade:
O que a gente observou de início foi que a própria licença tinha como imposição ao
Estaleiro cursos que foram dados ao pessoal naquela localidade, a capacitação de
moradores locais e tudo mais. A gente tem observado que vai precisar ter uma
mobilização daqui para frente constante e uma preocupação não só do Ministério
Público, mas principalmente do poder executivo, tanto municipal, quando estadual,
porque a fase inicial de instalação do empreendimento ela demanda uma preocupação
com os problemas futuros, desde uma questão de saneamento básico a uma questão
de segurança pública. A empresa vem custeando os planos municipais de saneamento
básico em diversos municípios daquela localidade que serão efetivamente impactados.
Há uma preocupação com o saneamento básico, com a segurança pública. Você deve
ter conhecimento de como funciona a segurança pública no Estado, a situação caótica
que a gente está vivendo e isso impõe que haja uma preocupação muito grande na
própria localidade. Recentemente eu tive uma reunião com o secretário de segurança
pública, com a empresa também, porque as manifestações públicas que estavam
ocorrendo por causa da compensação financeira, de algumas pessoas que não estavam
sendo agraciadas e se julgavam no direito, isso demandou no fechamento de pistas,
ameaças. A coisa estava a cada dia mais grave e precisou tomar uma providência,
deslocar policiamento especializado para lá, para que fosse dada uma atenção melhor
ao conflito existente. A gente já sabia que isso ia acontecer, nem todas as pessoas iriam
ser agraciadas, não iria agradar a todo mundo. As comunidades mais distantes que se
sentem prejudicadas, infelizmente, precisamos de algum dado técnico que demonstre.
Se os estudos comprovassem para a gente, não só apresentados pela empresa, mas que
a outra empresa que está monitorando dissesse, essa cidade está sendo afetada, lógico
que a gente iria compelir a empresa que também fosse feita essa compensação. A gente
fica limitado também não só a uma questão social, mas a uma questão técnica, tem
que ver até que ponto podemos avançar e determinar o que está acontecendo. Não se
fala em questão ambiental, o crescimento do país em situação de natureza é visível, a
gente tem que ter um pensamento de sustentabilidade, o que se busca lá é isso, crescer
com sustentabilidade, respeitando essa situação. Até agora as coisas tem corrido
dentro de uma normalidade. (RODRIGUES, 2013)
Observando a citação de Audo Rodrigues, pode-se afirmar que a compensação financeira
gerou conflito, os programas de educação ambiental permaneceram como promessa, não sendo
cumpridos até a data da entrevista. Mas, o MP avalia como positiva a atuação dos capitalistas,
no sentido de recepcionarem as demandas apresentadas pela entidade. Por outro lado, o MP
avalia que o Estado, Prefeitura Municipal de Maragogipe e Governo da Bahia, devem ter uma
261
atuação mais efetiva no sentido de dotar a comunidade de São Roque do Paraguaçu com a
infraestrutura necessária.
Audo Rodrigues finaliza a entrevista qualitativa afirmando existir uma confiança por parte
da comunidade no trabalho desenvolvido pelo Ministério Público. O Audo Rodrigues (2013)
explica que “Há uma confiança muito grande, isso foi demonstrado e eles perceberam, no
trabalho do Ministério Público, no tocante a preservar os direitos e garantias dessa população.
Infelizmente, como todo processo desse grande porte, ele vai agradar a muitos, como também
vai desagradar a tantos outros.”.
ENTREVISTA COM PROMOTORES DE JUSTIÇA CRISTINA SEIXAS GRAÇAS E AUDO
RODRIGUES
A segunda entrevista qualitativa objetivou levantar dados e documentos que
comprovassem o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, e os objetivos prescritos no
Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009).
Questionada sobre o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e os objetivos prescritos no
PCS do EIA/RIMA (2009), a promotora Cristiana Graça (2013) respondeu:
Essa licença, ela envolve EIA/RIMA bastante intenso. Então, nem todos os programas
ou todas as condicionantes desse EIA/RIMA estão isoladas, elas sempre estarão
atreladas a outras condicionantes. Então considerando que a área envolve 22
comunidades tradicionais a metodologia de comunicação foi a metodologia escolhida
pelo IBAMA que é o licenciador e pelo empresário, então, assim, em princípio a gente
a gente não se envolve com essa discussão dessa condicionante. O Ministério Público
está se envolvendo muito com a discussão das condicionantes de mitigação e impactos
ambientais e socioeconômicos, então essa discussão da comunicação fica por conta
efetiva do empreendedor com as comunidades e o órgão ambiental. [...] Apesar de que
é obvio durante o processo de investigação e de acompanhamento do impacto, do
estudo da implantação do empreendimento a gente possa estar avaliando se a
comunicação está se fazendo adequada ou não para que as comunidades possam ter
seus direitos atendidos e etc., a gente tem visto que eles tem usado muito mídia escrita.
(GRAÇA, 2013)
Analisando a resposta de Cristina Graça (2013), fica evidente que a promotora de justiça
desconhece os aspectos mais essenciais do EIA/RIMA (2009) e do Plano de Gestão Ambiental,
além de desconhecer a centralidade que o Programa de Comunicação Social exerce como
elemento mobilizador e transversal junto aos programas de educação ambiental previstos para
as comunidades tradicionais, sendo justamente o elemento transversal capaz de unificar a
política pública dentro do Plano Gestão Ambiental. Observa-se também que Graça (2013)
desconhece que a política pública desenhada pelo Estado para o meio ambiente, concede
262
centralidade ao PCS no sentido de efetuar os elementos transversais e mobilizadores, utilizando
de elementos da educomunicação como forma de atingir os objetivos.
Também, Cristina Graça (2013) equivoca-se ao imputar ao IBAMA e aos empreendedores
a responsabilidade pela elaboração do PCS. Conforme relatado no transcorrer desta pesquisa,
foram os estudos cientificados que levaram a definição da Medida Mitigadora nº 40 e do
Programa de Comunicação Social. Estes estudos foram sistematizados e apresentados no
EIA/RIMA (2009), por iniciativa do Governo do Estado da Bahia, tendo como demandante a
União, através de Ministério Público Federal e da legislação ambiental que estabelece rito
próprio para este tipo de licenciamento. A competência pela fiscalização da Medida Mitigadora
nº 40 e do PCS é do IBAMA, e cabe aos capitalistas a apresentação de um plano de comunicação
executivo, tendo como base as prescrições do PCS do EIA/RIMA (2009), e sendo da
competência do MP o acompanhamento, em nome da sociedade civil, do cumprimento do
EIA/RIMA (2009) e da licença de instalação.
Revendo o conceito expresso na Medida Mitigadora Nº 40 (EIA/RIMA, 2009, p.79), ela
prevê a implantação do Programa de Comunicação Social; objetivando informar a comunidade
sobre as reais necessidades de contratação; visando evitar expectativas indevidas e fluxos
migratórios; possuindo caráter preventivo; eficácia alta, sendo de responsabilidade dos
capitalistas e devendo ocorrer nas fases de implantação e operação. Ou seja, a medida e o
programa tem caráter central no sentido de mitigar os impactos, inclusive sendo extensivo as
duas fases do empreendimento, implantação e operação. Ou seja, as afirmações de Cristina
Graça (2013) são inconsistentes com os dados apresentados. Continuando com a análise da
resposta da promotora, destaca-se o fato da mesma afirmar: “a gente tem visto que eles têm
usado muito mídia escrita.”. Conduzindo ao seguinte questionamento: que mídias são estas?
Onde estão os documentos que comprovem o uso das mesmas?
Audo Rodrigues interveio na entrevista e confirmou que existem vários panfletos. Cristina
Graça (2013) emendou, afirmando: “mídia escrita, então eles têm de uma certa forma atendido
aquilo que está no plano de comunicação, entendeu? Agora se essa comunicação é eficiente ou
não é eficiente, na verdade diz respeito ao que foi licenciado pelo órgão ambiental talvez eu
não possa te ajudar muito nessa sua pesquisa porque a gente não tem essa observação no
procedimento.”. O pesquisador, ao verificar o inquérito, constatou a existência de três
documentos que se caracterizaram por anúncios das duas reuniões promovidas pelos capitalistas
com a presença do MP e da comunidade, com informações sobre o processo de dragagem e
263
indenização. Os documentos não se caracterizam como elementos prescritos no PCS, em
decorrência dos mesmos não atuarem em conjunto com outras medidas, agindo de forma isolada
com objetivo de atender apenas a uma única medida mitigadora. Conclui-se que nenhuma
evidência concreta do cumprimento do Plano de Comunicação Social foi apresentada pelos
promotores.
Na imagem a seguir, são apresentadas páginas de um comunicado feito pelo EEPSA e
apenso ao inquérito do MP:
Figura 32 – Fotocomposição a partir de 3 imagens de folhetos apensos no inquérito do MP sobre o
EEPSA.
Fonte: Produção própria (2013).
Observando Figura 32, formado pela reprodução de três páginas, conclui-se que as únicas
peças de comunicação apensas ao inquérito sobre o processo de implantação do Estaleiro
Ensedada do Paraguaçu, até a data da pesquisa de campo (26 de julho de 2013), dizem respeito
ao processo de dragagem e indenização dos pescadores e marisqueiras. Ocorre que este é apenas
um dos elementos do PGA, e uma parcela pouco significativa de um processo mais amplo de
Comunicação Social previsto para o empreendimento.
264
Conclui-se que o Ministério Público Estadual tem conhecimento sobre os problemas que a
comunidade atravessa, mas tem dificuldade em acompanhar o eficaz cumprimento do
EIA/RIMA (2009) e da Licença de Instalação Nº 737/2010 do Estaleiro, atundo de forma pouco
contundente no sentido de fazer prevalecer os objetivos prescritos no EIA/RIMA (2009) e na
licença ambiental, transferindo responsabilidades e competências para o IBAMA e para outras
instâncias do próprio MP. Ao proceder desta maneira, a entidade descumpre a Lei nº 8.625109,
que define atribuições e competências, dentre elas, a preservação do meio ambiente e os
interesses sociais e difusos. Também conclui-se que o MP não apresentou documentos que
comprovem o cumprimento da Medida Mitigadora Nº 40, ou depoimentos que indiquem o
cumprimento da medida e implementação do PCS. Portanto, as evidencias indicam que não
ocorreu o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40, não tendo sido implantado o Programa de
Comunicação Social conforme previsto no EIA/RIMA (2009).
5.5.4 O IBAMA, A FISCALIZAÇÃO DO EIA/RIMA (2009) E O CUMPRIMENTO DO
LICENCIAMENTO AMBIENTAL
Concluindo os eixos de investigação sobre o cumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e
os objetivos prescritos no EIA/RIMA (2009), um questionário qualitativo foi encaminhado, por
e-mail em 10 de setembro de 2013, ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (IBAMA). Também ocorreram contatos telefônicos, com objetivo de
esclarecer e reafirmar a necessidade dos dados e das respostas ao questionário. O objetivo era
obter cópias de documentos referentes à Medida Mitigadora Nº 40, além de respostas aos
seguintes pontos:
a)
Como o IBAMA atua na fiscalização do Estaleiro;
b)
Se Programa de Comunicação Social foi implantado? e
c)
Se foi implantado, em que extensão ocorreu?
109
Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre
normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências, prescreve: Art. 1º – O
Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Art. 25º – Além das funções previstas
nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público: a) para a
proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e
homogêneos.
265
Apesar das várias tentativas de obter os documentos e respostas ao questionário qualitativo,
o IBAMA alegou dificuldades burocráticas para não responder ao questionário e para não
apresentar os documentos. No e-mail de 12 de setembro de 2013, Michelle Borba de Senna,
Analista Ambiental (NLA/SUPES/BA – IBAMA | e-mail: [email protected]),
responde que:
Prezado Carlos Augusto, Para esclarecimento, informo que todos os processos de
licenciamento ambiental de competência federal são iniciados em Brasília e poderá
ou não ocorrer o repasse de sua condução para os núcleos estaduais, à critério da
Diretoria de Licenciamento Ambiental - DILIC, independente da unidade da
federação na qual o empreendimento se localize. O empreendimento em questão,
Estaleiro Enseada do Paraguaçu, encontra-se sob responsabilidade da Coordenação de
Portos, Aeroportos e Hidrovias - COPAH, pertencente à Diretoria supracitada, no
IBAMA Sede. Por este motivo, a demanda solicitada foi encaminhada aquela
instância, atualmente competente para dirimir os questionamentos colocados.
Ressalto a orientação passada pelo colega Thiago Abreu, técnico responsável pelo
processo, em resposta encaminhada ao senhor, para direcionar seu questionamento ao
SIC - Serviço de Informação ao Cidadão, canal através do qual o IBAMA concentra
as solicitações baseadas na Lei de Acesso à Informação, com o devido respeito aos
prazos previstos na mesma. (SENNA, 2013)
Observando a resposta da servidora pública do IBAMA, Michelle Borba de Senna
(2013)110, infere-se que o dado é desprovido de consistência, analisando que o processo de
licenciamento foi iniciado com a Audiência Pública em Maragogipe (1998)111, e que o evento
é pré-condição para a mudança da RESEX e implantação do Estaleiro. Também observa-se que
no evento esteve presente o representante do IBAMA, superintendente Célio Costa Pinto.
Conforme os dados analisados, fica demonstrado que a unidade do IBAMA, na Bahia,
desconhece o processo de licenciamento ambiental de um dos maiores empreendimentos em
curso no Estado e no país. Conclui-se que a entidade não cumpriu a missão de acompanhar,
documentar e fiscalizar o empreendimento.
Avaliado que, o IBAMA, ao justificar que os documentos são de competência da unidade
do IBAMA em Brasília, objetivou dissimular a falha da instituição com relação ao dever
institucional de fiscalizar o empreendimento. Observa-se que os dados foram requisitados com
base na Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527112, de 18 de novembro de 2011). Ela regula
110
A resposta de Michelle Senna (2013) também apresenta-se com elevado grau de inconsistência. Observando que, o
processo de licenciamento do Estaleiro Enseada do Paraguaçu começou com a audiência pública, ocorrida em 11 de
dezembro de 2008, oportunidade em que esteve presente Célio Costa Pinto ([email protected],
[email protected]), superintendente do IBAMA na Bahia. Mesma pessoa para quem o questionário foi
encaminhado, por e-mail no dia 10 de setembro de 2013. O e-mail foi retransmitido, por Célio Costa Pinto para as
seguintes pessoas e endereços eletrônicos: Thiago Abreu ([email protected], [email protected]), e
Michelle Senna (2013). Observa-se que um processo de licenciamento que contou desde o primeiro momento com a
presença de um servidor público do IBAMA da Bahia, sendo o mesmo superintendente do órgão.
111 Ver Anexo 8.6 – Ata de Audiência Pública realizada em Maragogipe (2008).
112 Lei de Acesso a Informação (LAI) – Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 – Regula o acesso a informações
previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a
266
o direito dos cidadãos terem acessos a informações e documentos públicos, abrangendo todos
as instâncias de poder da União, o acesso aos dados independe de justificativa. A Lei no artigo
11, § 1º, ressalta que, nos termos do art. 32, I, da mesma lei, “constitui conduta ilícita que
ensejam responsabilidade do agente público ou militar, recusar-se a fornecer informação
requerida nos termos desta Lei, retardar deliberadamente o seu fornecimento ou fornecê-la
intencionalmente de forma incorreta, incompleta ou imprecisa.”. Observando a Lei nº 12.527 e
a resposta concedida pelo IBAMA, conclui-se que a entidade obstruiu acesso a informações de
interesse da sociedade.
Uma nova tentativa de obter os dados for feita. Em 3 de outubro de 2013 o pesquisador
protocolou requerimento de informações, solicitando os mesmos dados do questionário
encaminhado por e-mail, ou seja, foram requeridas cópias de documentos e respostas referentes
ao cumprimento da Medida Mitigadora nº 40. Observa-se que o documento foi protocolado na
sede do IBAMA em Salvador, recebendo o nº 02006.002525/2013113. Foi endereçado ao
superintendente do IBAMA na Bahia, Célio Costa Pinto, autoridade responsável pelo órgão em
no Estado da Bahia.
Com relação ao requerimento nº 02006.002525/2013, os documentos e respostas não foram
fornecidas pelo IBAMA ao pesquisador. Conclui-se que o IBAMA obstruiu o direito da
sociedade ser informada, descumprindo a Lei nº 12.527, e que o órgão descumpriu com as
prerrogativas legais da própria instituição, que é a de fiscalizar o processo de licenciamento,
preservando os interesses difusos da sociedade. Infere-se que a ausência de dados leva a
conclusão de que a Medida Mitigadora nº 40 não foi atendida, e não foram cumpridos os
requisitos previstos no Programa de Comunicação Social, descrito no EIA/RIMA (2009) e na
Licença de Instalação Nº 737/2010.
Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei no 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei no 8.159,
de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. A Presidenta Da República faço saber que o Congresso Nacional decreta
e eu sanciono a seguinte Lei: Capítulo I – Disposições Gerais – Art. 1º: Esta Lei dispõe sobre os procedimentos a serem
observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações previsto no
inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal. Parágrafo único.
Subordinam-se ao regime desta Lei: I - os órgãos públicos integrantes da administração direta dos Poderes Executivo,
Legislativo, incluindo as Cortes de Contas, e Judiciário e do Ministério Público; II – as autarquias, as fundações públicas,
as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União,
Estados, Distrito Federal e Municípios.
113 Ver Anexo 8.21 – Cópia do requerimento de informações encaminhado ao IBAMA.
267
5.6 A SUPREMACIA DO IMPÉRIO ATRAVÉS DA DIALÉTICA DA
SUPEREXPLORAÇÃO E DEGRADAÇÃO AMBIENTAL
Analisando o capítulo, observa-se que a dialética estabelecida contribui para reificar o
Império, através da conservação e ampliação das comunidades tradicionais como classe
subproletariada, para em momento seguinte convertê-las em classe superexplorada. A
normatização do Estado, teoricamente a superestruturada do Estado, deveria dar conta da
problemática das contradições do desenvolvimento capitalista. Mas, o que se verifica é que o
Estado atua para ampliar o Império, promovendo transferência financeiras e desenvolvendo
circuitos de produção que se configuram em capitais monopolistas.
Analisando a atuação do Estado, observa-se que os conceitos de Accountability e
Empowerment são desprezados. Porque eles conferem poder às comunidades afetadas pelo
fenômeno, o poder de conhecer a realidade e interferir nela. Analisando as contradições
contidas na práxis do Estado, observa-se que emergem duas possibilidades de mudança. A
primeira possibilidade de mudança surge da necessidade de uma nova alteridade, de um
desenvolvimento que supere o sistema capitalista. Neste aspecto, observando o atual estágio de
desenvolvimento do Império, infere-se que a globalização impede que países, como o Brasil,
adotem novas formas de desenvolvimento, em decorrências da relação estabelecida com o
sistema. Conclui-se que, no atual estágio de desenvolvimento, uma nova alteridade permanece
como utópica.
A segunda possibilidade de mudança emerge com maior capacidade de concretude em
decorrência das características do próprio sistema capitalista. Para superar as condições de
subproletariado e superexploração é necessário reformar o Estado. Reformar no sentido de
prevalecer a norma legal. Para alcançar este objetivo é necessário que um amplo processo
educacional empodere as comunidades, transformando os indivíduos em atores sociais plenos,
capazes de interferir na realidade em que estão inseridos. Este processo levaria ao rompimento
dos traços senhorias, que ligam a sociedade contemporânea ao processo de exploração
escravagista desenvolvido no Brasil Colônia. Outro aspecto a ser reformado ocorre na estrutura
interna do Estado, sendo necessário que o Estado reformule a doutrina do corpo funcional,
desenvolvendo no serviço público uma ideal de servir a sociedade, no intuito de emancipá-la.
Neste aspecto, processos de Accountability precisam ser implementados na prática.
268
Analisando o processo de implantação e operação do Estaleiro, com os dados da pesquisa,
e com análises empíricas comparativas de outros empreendimentos que se desenvolvem na Baía
de Todos os Santos, provenientes da experiência de campo do pesquisador, conclui-se que o
fenômeno tende a repetir um processo histórico de manutenção de um moderno centro de
produção capitalista, conjugado com uma periferia superempobrecida.
Observa-se que na prática, a justificativa da política pública, ou seja, de que é uma forma
de inclusão e desenvolvimento social, não tem se materializado. Isso explica o fato de o Brasil
ser um dos principais países a contribuir com a expansão do Império, ao mesmo tempo em que
mantem as contradições internas irreconciliáveis, expressas nos indicadores de IDH e Gini.
Contradições que para o sujeito urbano se materializa quando observa a condição dos que vivem
nas favelas, e os que habitam os sofisticados bairros das cidades brasileiras. Contradições que
se materializam nas comunidades tradicionais, com a implantação de modernos
empreendimentos capitalistas, que resultam na desestruturação do modo de vida, com a
degradação ambiental, mantendo e ampliando a condição de classe subproletariada, para em
um segundo momento se tornarem superexplorados.
Estas afirmações tornam-se verossímeis ao concluir que os objetivos previstos no Programa
de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) não foram alcançados, a Medida Mitigadora nº
40 não foi implementada, e a condicionante da Licença de Instalação Nº 737/2010 que
estabelece o PCS foi descumprida.
269
6 CONCLUSÕES
O que é mais provável que aconteça agora é uma série de
crescentes concentrações de capital em todas as atividades direta
ou indiretamente vinculadas ao projeto. O crescimento
econômico que se vale do capital concentrado a serviço de uma
estrutura capitalista gera pobreza. Esta pobreza será
estruturalmente diferente da atual porque a economia pobre
nativa perderá sua independência com relação ao circuito da
economia urbana. Certamente as atividades do circuito inferior
não desaparecerão por completo, uma vez que a pobreza será
agravada ao invés de erradicada; essas atividades, entretanto,
tornar-se-ão dependentes dos interesses e atividades do circuito
superior. (SANTOS, 1977, p.37)
A questão central desta pesquisa é revelada através da análise materialista dialética e
histórica do processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. O estudo
fundamenta-se na dialética estabelecida entre os atores – Estado, capitalistas e a comunidade,
sendo explicada a partir das observações da Medida Mitigadora nº 40. A hipótese apresentada
é de que: na relação entre os atores prevalece os interesses da atuação conjunta entre capitalistas
e o Estado Nacional, em detrimento das populações locais, de tal modo que no processo de
implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu não sejam cumpridas as
condicionantes legais estabelecidas no EIA/RIMA (2009), através da Medida Mitigadora nº 40.
Isto ocorre por três motivos:
1 – Correlação de forças entre os atores, Estado e capitalista;
2 – Desconhecimento da população local, em decorrência do descumprimento da
Medida Mitigadora, e da falta de Accountability e Empowerment; e
3 – Cumplicidade dos órgãos estatais que deveriam fiscalizar o cumprimento das
Medidas Mitigadoras.
Na realização do estudo, objetivou-se manter distanciamento e neutralidade com a
finalidade de produzir resultados científicos consistentes com a realidade material. Ao concluir
a análise do conjunto de dados, e conjugá-los com a experiência de campo do pesquisador,
torna-se inescapável afirmar que o drama da exclusão social é rizomático. Um drama humano
de tamanha amplitude que no primeiro contato ele é perceptível de forma empírica. A percepção
inicial é aprofundada, na medida em que as relações sociais de produção são desveladas pelo
método dialético e histórico. O que permite identificar na relação capital/trabalho um processo
270
de superexploração da classe trabalhadora no Recôncavo baiano. Este processo tem início com
a implantação do capitalismo mercantilista do Brasil Colônia, com o uso da classe trabalhadora
como mão de obra escrava; até a contemporaneidade, com a manutenção de parcelas
significativas da população na condição de subproletariado, sedimentando com intensidade
singular, na estrutura social baiana, elementos da sociedade senhorial.
Identificou-se que o drama da exclusão social é parte de um sistema que subjuga
historicamente as comunidades tradicionais, no intuito de ampliar a taxa de mais-valia, com a
finalidade de alimentar o ‘Império’, ser de fome insaciável. Estes elementos são identificados
a partir da manutenção de relações de produção análogas à escravidão, da manutenção de
parcela significativa da população com baixo nível educacional e, neste aspecto, a população
de Maragogipe é um lamentável exemplo, sendo identificado que, em 2010, 11,46% da
população era formada por pessoas analfabetas. O indicador percentual de analfabetismo aponta
para uma dramática realidade social, analisada e apresentada sob os seguintes aspectos:
1–
Historicamente, a população contribuiu com o desenvolvimento capitalista do
Brasil, sendo-lhes negadas as contrapartidas do Estado – educação, saúde, moradia
e condições dignas de subsistência enquanto agrupamento humano;
2–
O elevado nível de analfabetismo, conjugado com uma educação formal deficiente,
são fatores impeditivos de inclusão de parcelas significativas da comunidade, como
classe trabalhadora de empreendimentos que utilizam avançada tecnologia, a
exemplo do Estaleiro Enseada do Paraguaçu;
3–
A deficiência educacional conduz a construção a alienação, o que contribui para
que os processos de accountability e empowerment não sejam efetivados na prática,
sob a perspectiva da comunidade;
4–
A exclusão do modo de produção, submete as comunidades afetadas pelo
empreendimento a um processo secular de exclusão social, com deterioração dos
padrões de coesão social, sendo incrementados os indicadores de violência; e
5–
Os poucos indivíduos inclusos, como classe trabalhadora do empreendimento
capitalista, tendem a repetir o processo histórico de classe superexplorada. Uma vez
que possuidora de baixo nível de educação formal, são selecionados a ocupar postos
de menor remuneração, e uso intensivo de força física.
Ao analisar o processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
observa-se que ele faz parte de uma estrutura mais ampla, que faz parte da infraestrutura e da
271
superestrutura do capital. Portanto, está inserido, ao mesmo tempo em que conforma e amplia
o processo de globalização. Observa-se que a implantação do empreendimento atende ao
pressuposto da expansão constante dos produtos e mercados, sendo os mesmos, elementos
inerentes ao modo burguês de produção. Também conclui-se que o Estaleiro é um instrumento
do processo de expansão do Império. Confirma-se, assim, que o capitalismo é um modo de
produção que não está limitado por determinado espaço, ele ocupa todos os lugares, e estabelece
conexões para todos os lugares.
Analisando s características societárias do empreendimento, composta por capital estatal
(empréstimos subsidiados de longo prazo), e capital privado nacional e internacional, além do
uso de matérias-primas oriundas de várias partes do globo, matérias-primas necessárias para
que ocorra a manufatura dos produtos do Estaleiro – notadamente embarcações de significativo
porte – materializa-se a conexão entre local e o global, inserindo o empreendimento no processo
do capitalismo global. Conectando as comunidades diretamente afetadas pelo empreendimento,
no processo de globalização, consumando a reificação do Império.
A implantação do empreendimento enseja completariedade e conflito. Se por um lado,
novas oportunidades de emprego ligadas a relação capital/trabalho se materializam, por outro,
ocorre elevado custo socioeconômico para as comunidades tradicionais afetadas pelo
empreendimento, sendo atingidas as populações residentes em seis municípios do Recôncavo
baiano. Estas populações estão situadas na Área de Influência Direta (AID) – compreendendo
os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara; e na Área de Influência Indireta
(AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica.
Observa-se que ao desenvolver um modo de produção baseado no uso intenso do trabalho
e da tecnologia, ou seja, baseada no capitalismo avançado, em uma região marcada pela
economia de subsistência, é estabelecido o primeiro conflito, envolvendo modos de produção
distintos. Deste fenômeno decorre novos problemas: Como resolver a problemática das relações
sociais de produção? Como inserir as populações tradicionais no empreendimento? E ou, como
estabelecer uma relação de troca, suficiente a preservar o modo tradicional de vida? Como
implantar e operar o empreendimento, produzindo ganhos sociais nas comunidades tradicionais
afetadas?
Ao buscar solucionar o problema criado pelo capitalismo, o Estado determina um conjunto
de Medidas Mitigadoras com a finalidade de potencializar os aspectos positivos do fenômeno,
e mitigar os aspectos negativos. Estas medidas foram objeto de estudo, sendo prescritas através
272
do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto do Meio Ambiente (EIA/RIMA, 2009)
e na Licença de Instalação Nº 737/2010, pelo Estado. Elas foram delegadas para serem
implementadas pelos capitalistas, tendo o Estado o como fiscalizador do cumprimento das
Medidas Mitigadoras.
Ao analisar a Medida Mitigadora nº 40, e o Programa de comunicação Social estabelecido
no EIA/RIMA (2009) e na Licença de Instalação Licença de Instalação Nº 737/2010,
confirmou-se vários aspectos da teoria marxista. Dentre elas, destaca-se a materialização de
uma perversão social, com dupla dimensão, socioeconômica e socioambiental. Confirmou-se
que os capitalistas ampliam as taxas de mais-valia baseado em elevado custo social e ambiental.
Observando que a métrica do capitalista é o lucro, e que o lucro é central em todas as etapas
do processo de produção, afirma-se que por mais capital que acumulem, não importam os custos
sociais disto, os capitalistas buscam sempre mais, com a finalidade de alimentar o insaciável
‘Império’. Desta premissa decorre a primeira constatação, existe uma incompatibilidade entre
as atividades capitalistas e as finalidades sociais das Medias Mitigadoras estabelecidas no
Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA, 2009) promovido
pelo Governo da Bahia, e na Licença de Instalação Nº 737/2010, concedida pelo IBAMA.
A segunda constatação decorre do processo de despossessão do território. Ao modificar a
natureza do lugar para implantar o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, ocorreu a supressão legal,
e a destruição de extensos trechos do bioma pertencente a baía do Iguape, áreas utilizadas pela
comunidade local como forma de produção da vida. A destruição do bioma afeta o modo de
vida da população em várias dimensões – históricas, sociais, econômicas, e de equilíbrio com
a natureza. Uma destruição que não cessa com a implantação do estaleiro, ela tende a se
intensificar com novas estruturas necessária ao funcionamento do empreendimento, a exemplo
da construção de pontes, rodovias, habitações, estabelecimentos comercias, além de novos
empreendimentos capitalistas de menor porte. Estas estruturas são necessárias ao suprimento
do Estaleiro e trazem o potencial contaminador do meio ambiente. Ao concretizá-las, os
capitalistas reconstroem o mundo, a própria imagem, a imagem do capital.
A implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu modifica o espaço territorial,
contribui para a degradação da natureza, e coloca em risco a vida das comunidades tradicionais
afetadas pelo empreendimento, rompendo os laços históricos que ligam estas comunidades à
natureza do lugar. Verifica-se que a introdução de um novo modo de produção na comunidade
de São Roque do Paraguaçu, conformou um modo antagônico de produção, com o modo de
273
produção preexistente, ampliando os conflitos sociais, condicionando a vida em sociedade às
novas condições materiais impostas, introduzindo novos relacionamentos, e uma dependência
crescente, conduzindo a formação socioeconômica na direção de uma mudança estrutural.
Deste processo decorre mudanças qualitativas nas relações sociais de produção preexistentes,
tendo como resultado o empobrecimento, a ampliação da violência e a desagregação social.
Analisando a constituição histórica da propriedade em que é erguido o Estaleiro Enseada
do Paraguaçu, a terra (Ponta do Corujão) destinada legalmente a ser um manancial natural de
produção extrativista para as comunidades tradicionais da baía do Iguape – principalmente dos
moradores do povoado de Enseada do Paraguaçu, e da sede do distrito de São Roque do
Paraguaçu – observa-se que foi modificada, passando a pertencer, enquanto posse e
propriedade, aos capitalistas.
Enquanto capitalistas ampliam o domínio sobre a terra, condição primária para acumulação
de riqueza, ao lado do empreendimento, os moradores do povoado de Enseada do Paraguaçu,
moradores históricos das terras que ocupam, não possuem a propriedade das terras e imóveis
que habitam por gerações. Literalmente, o Estado foi instrumentalizado no sentido de ampliar
o poder dos capitalistas, enquanto mantém as populações tradicionais excluídas de direitos
essenciais a vida, e ao desenvolvimento do trabalho, ou seja, o direito à terra. Enquanto ocorre
o crescimento econômico concentrado na estrutura do Império, a pobreza se generaliza nas
comunidades afetadas pelo empreendimento.
O impacto negativo do empreendimento poderia ser mitigado, diminuído, com o
cumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e das prescrições do Programa de Comunicação
Social contidas no EIA/RIMA (2009). Mas, os resultados da pesquisa indicam que a Medida
Mitigadora nº 40 não foi cumprida, e o Programa de Comunicação Social (PCS) não foi
implantado, ocorrendo o descumprimento de condicionante da Licença de Instalação Nº
737/2010. Conforme previsto pelo EIA/RIMA (2009), com a implantação do empreendimento
e implementação das Medidas Mitigadoras, as comunidades deveriam ser beneficias com o
desenvolvimento de alternativas socioeconômicos com a diversificação e o aumento do
emprego formal; redução dos fluxos migratórios, com concentração de pessoas oriundas das
populações afetadas pelo empreendimento; valorização da conservação dos ecossistemas;
valorização da economia extrativista com a diminuição de membros da comunidade inseridas
no extrativismo que passam a ser inseridas de forma direta ou indireta no processo de
desenvolvimento da região; ao mesmo tempo em que, os que permanecem na economia
274
extrativista também são beneficiados, por receber capacitação através do Programa de Gestão
Ambiental (PGA); através da promoção da cultura local; melhoria da infraestrutura pública da
região; redução das taxas de violência em decorrência de uma cultura de paz que dissemina pela
aplicação do PCS; melhoria nos níveis de educação formal e técnica, com redução da taxa de
analfabetismo; melhoria nas condições de habitação em decorrência dos ganhos
socioeconômicos dos membros da comunidade afetados, positivamente, de forma direta ou
indireta pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu, e através dos investimentos do Estado.
Analisando os aspectos positivos que a implantação do Estaleiro poderia provocar, com os
resultados obtidos pela pesquisa, afirma-se que os possíveis ganhos sociais delineados com a
implantação e operação do Estaleiro, são substituídos por uma realidade material conformada
por uma avançada estrutura capitalista, que se desenvolve ao lado de comunidades tradicionais
empobrecidas por um sistema capitalista que degrada o ambiente e promove a alienação e
superexploração das relações sociais de produção.
Outra conclusão decorrente da análise dos dados é que o Estado descumpriu a legislação
vigente, deixando de documentar, acompanhar e fiscalizar o cumprimento da Medida
Mitigadora nº 40, com os respectivos objetivos prescritos no PCS, culminando com o
descumprimento de condicionante da Licença de Instalação Nº 737/2010. As instituições
analisadas no âmbito do Estado – Governo do Estado da Bahia, através da SEINP; e Governo
Federal, através do Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, e IBAMA – não
cumpriram a legislação e o dever institucional de fiscalizar o Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
permitindo que os capitalistas economizassem milhões de reais, com a não-implementação da
Medida Mitigadora nº 40, e do respectivo Programa de Comunicação Social, permitindo que os
capitalistas alimentassem o Império através da ampliação da taxa de mais-valia. Tem-se como
resultado a ampliação substancial das margens lucro, nos 36 meses em que a pesquisa foi
realizada. Lucro obtido ao custo da alienação e empobrecimento das comunidades tradicionais.
Observa-se que cerca de quatro dezenas de trabalhadores, oriundos das comunidades
afetadas pelo empreendimento, foram selecionados e capacitados para atuarem como
educomunicadores. Mas, cumprindo o ritual de alimentar o Império com o lucro, estes
trabalhadores não foram contratados. Observa-se que em decorrência deste dramático corte de
pessoal, os capitalistas puderam ampliar a taxa de mais-valia. O que aparenta ser um simples
corte de pessoal, assume a perversa forma de redução de custos operacionais para os
capitalistas. Custos previamente avaliados e inseridos na operação do Estaleiro.
275
Em decorrência do corte de trabalhadores, os capitalistas puderam economizar com a
compra de equipamentos e produtos, e com a não oferta dos serviços necessários a implantação
do PCS. O resultado foi a alienação da classe trabalhadora, e a ampliação de margens de lucro
não previstas inicialmente. Eis a magia dos elevados lucros dos capitalistas, cuja perversão é
alimentada com o custo social dos que mais necessitam do apoio do Estado e das classes
detentores do poder.
Sem a implementação do PCS, cursos deixaram de ser ofertados, e oportunidades de
desenvolvimento socioeconômico, advindos dos processos de educomunicação, deixaram de
ser efetivados, levando ao descumprimento do Plano de Gestão Ambiental previsto no
EIA/RIMA (2009). Ele prescreve 26 programas de educação ambiental e 54 Medias
Mitigadoras, sendo que 12 medidas são de competência do Governo do Estado e 42 dos
capitalistas. O descumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e dos objetivos do Programa de
Comunicação Social compelem as comunidades afetadas pelo empreendimento a exclusão
social ampliada. Uma vez que as relações de produção foram modificadas, ocorre o acréscimo
populacional, implicando na ampliação no número de moradias subnormais, aumento da
violência e da prostituição, além da perda de espaço territorial destinada à economia de
subsistência.
Observando as falhas do Estado, através da análise da atuação da SEINP, IBAMA e dos
Ministérios Públicos Federal e Estadual, no que tange o acompanhamento, documentação e
fiscalização das Medidas Mitigadoras e condicionantes do licenciamento, confirma-se a teoria
marxista que qualifica o Estado como um escritório de negócios da burguesia.
Revendo os conceitos de Accountability e Empowerment observa-se que as falhas poderiam
ter sido mitigadas se estes conceitos fossem implementados, inserido a sociedade como
componente do processo de fiscalização do empreendimento, e empoderando através da
educação e do acesso aos meios de comunicação. Mas, o que a pesquisa revela é justamente o
contrário. A sociedade, quando procura o Estado para que o mesmo preste contas das ações em
curso, é tratada com desrespeito. Infere-se que os servidores públicos atuam como verdadeiros
vassalos destes novos senhores dos tempos modernos, os detentores do capital, reforçando as
características da sociedade senhorial que persistem em coexistir no Brasil do século XXI.
A atitude dos servidores públicos, apenas reforça o papel do Estado em servir ao capital,
falta-lhes a consciência de classe e, até mesmo, a compreensão do papel social que têm e da
missão com à qual se comprometeram em realizar. Ao analisar o arcabouço jurídico do país, e
276
em especial do conjunto de Leis que regulamenta a implantação e operação do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu, observa-se um sistema avançado de direitos e deveres. Mas, este
arcabouço jurídico apenas existe no campo das ideias, se quer pode ser classificado como
superestrutura. Na prática, as instituições de Estado se apresentam de forma ineficiente no
cumprimento da prescrição legal. O jogo de interesses dos capitalistas em auferir lucro,
prevalece na ação do Estado, bem como na atuação dos servidores públicos.
Ao verificar os dados da pesquisa fica demonstrado que a Medida Mitigadora nº 40, os
objetivos do PCS, e as condicionantes da Licença de Instalação foram negligenciados pelo
Estado. O que possibilitou o aumento significativo da taxa de mais-valia e lucro dos capitalistas.
Outro aspecto que foi evidenciado é o afastamento destas instituições, ao não atender as
necessidades da comunidade de São Roque do Paraguaçu.
As afirmações da comunidade com relação as deficiências no setores de habitação,
educação, saúde, segurança, acessibilidade viária, além do não cumprimento da Medida
Mitigadora nº 40 – que tem entre outras atribuições, detinha a função de educar e preparar a
comunidade no convívio com o novo modo de produção – apontam para a atuação de um Estado
que serve ao interesse capitalista e não aos setores menos favorecidos da sociedade.
O nível de deterioração em que se encontra a estrutura pública na região afetada pelo
Estaleiro, aliada a uma falta de conhecimentos dos direitos sociais por parte da comunidade,
evidencia grave falha na missão institucional do Estado, principalmente da SEINP, IBAMA,
Ministério Público Federal e Estadual, e da Prefeitura de Maragogipe. Esse fenômeno não
ocorre apenas no período em que o Estaleiro passou a ser implantado e operado no distrito de
São Roque do Paraguaçu, mas ao longo de séculos. Em decorrência da precariedade das
estruturas públicas identificadas na região, observa-se que um conjunto de medidas, articuladas
no sentido de prevalecer os direitos sociais, deveriam ter sido implementadas pelo Estado para
que a situação pudesse ser revertida ou mitigada.
O resultado da pesquisa demonstra afastamento institucional das instituições de Estado, em
relação as camadas sociais que mais necessitam de apoio, além do descompromisso por parte
dos servidores públicos, observando que Leis prescrevem inúmeros direitos a serem atendidos
com relação as comunidades tradicionais, mas na prática o Estado utiliza o poder em benefício
da classe dominante.
Conclui-se que não ocorreu intervenções por parte do Estado, no sentido de prevalecer as
determinantes da política pública delineada para o empreendimento, levando ao
277
descumprimento da Medida Mitigadora nº 40 e de condicionantes da Licença de Instalação Nº
737/2010. Os dados analisados são consistentes o suficiente para generalizar as afirmações,
expandido para as demais comunidades situadas áreas afetadas pelo Estaleiro.
Os dados apresentados nesta pesquisa também indicam que o Estado adota uma política de
transferência de recursos do setor público para os capitalistas, justificando o desenvolvimento
de forças produtivas, com a implementação de políticas públicas que favoreçam o setor do
Petróleo e Gás (P&G), e o desenvolvimento da cadeia de valor. A contrapartida desta política
pública de transferência de recursos seria a ampliação do desenvolvimento social. Mas, ocorre
justamente o contrário, as inversões de capital promovidas pelo Estado em favor dos
capitalistas, tem permitido a manutenção do status quo, e a ampliação da exploração, enquanto
as comunidades tradicionais permanecem excluídas dos ganhos sociais prometidos.
Conforme dados levantados nesta pesquisa, o Estaleiro Enseada do Paraguaçu foi
beneficiado pelo Estado com milionários repasses financeiros, efetuados através da antecipação
de recebíveis de contratos. O que se observa é que historicamente o conflito entre o
desenvolvimento de forças produtivas lideradas por capitais privados, ou controlada pelo
Estado, percorre a história do Brasil, desde as primeiras décadas do descobrimento,
oportunidade em que formas alternadas de exploração foram introduzidas. Ou seja, em dado
momento eram capitalistas que financiavam a exploração, em outro era a Coroa Portuguesa, e
em outros momentos ocorria uma situação em que o Estado aliava-se a segmentos do setor
privado para promover a exploração.
Analisando as primeiras duas décadas do século XXI, observa-se que o Estado opta por um
modelo de desenvolvimento em que lidere o processo tendo como aliado os capitalistas. Mas,
a estrutura capitalista sedimentada no país, principalmente após o Golpe Militar de 1964,
impede que o poder do Estado de regular o capitalismo se efetue na prática, mantendo a
superexploração da classe trabalhadora, através de elevadas taxas de mais-valia, obtidas com a
manutenção de significativas parcelas da população como subproletariado. Isso resulta em
baixos indicadores de desenvolvimento socioeconômico (IDH), e elevados indicadores de
concentração de renda (GINI).
Os resultados da pesquisa são consistes, podendo-se generalizar a seguinte afirmação: o
Estado necessita de uma reforma institucional interna, no sentido de promover uma práxis no
interior do corpus, fazendo prevalecer a norma legal e, desta forma, promovendo o avanço
socioeconômico esperado pela sociedade. Neste tocante, o Estado se mantém com a vocação,
278
de servir ao capitalismo, mas de forma diferente, promovendo o sempre adiado
desenvolvimento socioeconômico, conforme inscrito na Constituição Federal de 1988 – com
fundamento na dignidade da pessoa humana, deve construir uma sociedade livre, justa e
solidária; erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.
Analisando a prescrição constitucional, observa-se que elas permanecem como ‘sonho de
uma noite de verão’, porque na prática, o Estado atua na perversa reificação do Império, que no
Brasil adquire densidade diabólica, em decorrência das discrepâncias sociais em que vive parte
significativa da população e, neste caso especifico, parte significativa da população que reside
nas áreas de influência do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
Identifica-se que mesmo reformado no corpus e promovidas melhorias sociais, o Estado
permanece imutável na vocação em reificar a exploração. Em decorrência da própria formação
do Estado, que atua através do determinismo econômico nas configurações das relações de
produção e na luta de classes, portanto conseguinte, na reprodução do sistema.
Constata-se que é necessária uma alteridade, uma nova organização social, que dê conta da
promoção do bem comum, que leve o ser humano à luz. Porque, de certa maneira, somos como
os personagens da caverna de Platão. Apenas conseguimos enxergar as tênues sobras projetadas
pelo aparato ideológico do capitalismo. O sistema capitalista, o Império, molda a nossa visão
de mundo e nos impede de enxergar novas possibilidades de organização e desenvolvimento
humano. Este sistema tornou-se a caverna e as correntes do homem moderno.
Nota-se que na adensada análise do capitalismo, apresentada neste estudo, é inescapável
afirmar que se trata de um modelo que exaure os recursos naturais, e coloca em risco a vida do
planeta. Torna-se necessário, premente, romper as correntes, sair da caverna em direção à luz,
e refletir sobre novas formas de desenvolvimento, sobre novas formas de práticas sociais, nos
ensinava Platão há mais de dois milênios. Este é o primeiro passo na busca pela alteridade, que
permitirá a manutenção da vida no planeta.
A conclusão final do trabalho é que os objetivos prescritos no Programa de Comunicação
Social do EIA/RIMA (2009) não foram atendidos, que o PCS não foi aplicado, e que a Medida
Mitigadora nº 40 prevista no EIA/RIMA (2009), e a condicionante da Licença de Instalação nº
737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social, não foram cumpridas pelos
capitalistas que conformam o Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Conclui-se, também, que a
hipótese foi confirmada, ou seja, na relação entre os atores prevalece os interesses da atuação
conjunta entre o Estado e os capitalistas, em detrimento das populações locais, de tal modo que
279
no processo de implantação e operação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu não sejam
cumpridas as condicionantes legais estabelecidas no EIA/RIMA (2009), através da Medida
Mitigadora nº 40. Isto ocorre por três motivos:1 – Correlação de forças entre os atores, Estado
e capitalista; 2 – Desconhecimento da população local, em decorrência do descumprimento da
Medida Mitigadora, e da falta de Accountability e Empowerment; e 3 – Cumplicidade dos
órgãos estatais que deveriam fiscalizar o cumprimento das Medidas Mitigadoras.
Observa-se que o resultado da pesquisa compreende o período de 28 de outubro de 2010 –
data em que é concedida, pelo IBAMA, a Licença de Instalação Nº 737/2010; e vai até 4 de
setembro de 2013 – data em que os capitalistas respondem a entrevista sobre a Medida
Mitigadora nº 40 e respondem à solicitação de envio de documentos concernentes ao Programa
de Comunicação Social previsto no EIA/RIMA (2009). Também observa-se que a parte da
pesquisa de campo, concernente à comunidade, ocorreu na sede do distrito de São Roque do
Paraguaçu. Infere-se que os dados coletados e as análises procedidas são suficientes para
afirmar que o Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) não foi implantado, os
objetivos não foram atingidos, ocorrendo o descumprimento da Medida Mitigadora nº 40
prevista no EIA/RIMA (2009), e o descumprimento da condicionante da Licença de Instalação
nº 737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social, pelos capitalistas que
conformam o Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
na Área de Influência Direta (AID) –
compreendendo os municípios de Maragogipe, Salinas da Margarida e Saubara; e na Área de
Influência Indireta (AII) – compreendendo os municípios de Cachoeira, São Félix e Itaparica.
Ou seja, os objetivos previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009), a
Medida Mitigadora nº 40 prevista no EIA/RIMA (2009), e a condicionante da Licença de
Instalação nº 737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social, foram descumpridos
na totalidade das áreas de influência do Estaleiro Enseada do Paraguaçu.
280
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Infere-se que a principal contribuição do trabalho é a análise materialista de um fenômeno
em ato, contribuindo com a revisão de categorias teóricas com a análise do fenômeno,
permitindo que teoria e materialidade sejam revistas a partir do método dialético e histórico, o
que conduz a resultados com elevado grau de precisão.
Observa-se que a partir desta pesquisa é possível o desenvolvimento de novas pesquisas.
A seguir são citados alguns exemplos:
1 – Ampliar o estudo, com a análise de outras Medidas Mitigadoras, e programas
ambientais determinados para o fenômeno;
2 – A partir de estudos complementares, compreender a dinâmica do Plano de Gestão
Ambiental definido para o fenômeno, e as implicações junto as comunidades
afetadas pelo fenômeno;
3 – A partir das categorias teóricas revistas, é possível ampliar o estudo para outros
empreendimentos capitalistas inseridos na mesma categoria, ou que se
desenvolvam na Baía de Todos os Santos;
4 – Ampliar os estudos a partir do recorte de raça;
5 – Tomando como base o mesmo marco teórico, é possível a análise comparativa de
fenômenos similares, que ocorram em diferentes países;
6 – Produzir novas análises a partir do conjunto de documentos em anexo.
Analisando o conjunto de dados é possível inferir que novas questões emergem a partir da
pesquisa. A seguir são citadas algumas destas questões:
1 – Quais as implicações do presente estudo com relação as demais Medidas
Mitigadoras, e programas ambientais concernentes ao fenômeno;
2 – Como a falha da implementação de elementos do Programa de Gestão Ambiental,
compromete a renovação do licenciamento do empreendimento;
3 – Abordando a questão racial. Como as comunidades remanescentes de quilombolas,
a exemplo do povoado de Enseada do Paraguaçu, estão sendo afetadas;
4 – Quais as contribuições do negro, no Recôncavo da Bahia, enquanto classe
trabalhadora superexplorada pelo capital, observando os reflexos do processo
histórico na dinâmica presente,
281
5 – Como o poder público local, Prefeitura de Maragogipe, atua no sentido de corrigir
os problemas históricos identificados na pesquisa; e
6 – Como se configura a dinâmica de atuação do Instituto Chico Mendes no processo
de implantação e operação do Estaleiro.
Observa-se que a pesquisa não conseguiu dar conta de algumas questões. Ao pesquisar o
fenômeno não foi possível levantar dados que esclarecessem como se constituiu a relação entre
Petrobras, através do Canteiro de Obras de São Roque do Paraguaçu; os capitalistas
proprietários, Consórcio Rio Paraguaçu; e os capitalistas proprietários do Estaleiro Enseada do
Papaguça. Também não foi possível revelar com que tipo de licenciamento e condicionante o
Consórcio Rio Paraguaçu operou. Observando que foram locadas as instalações de propriedade
da Petrobras em São Roque do Paraguaçu.
A pesquisa não conseguiu levantar dados que pudessem esclarecer como, e se ocorreu o
encerramento das operações do Consórcio Rio Paraguaçu, e qual a relação com o início das
operações do Estaleiro Enseada do Papaguça. Nota-se que os mesmos grupos capitalistas atuam
nas duas empresas, e que as empresas utilizam as mesmas instalações da Petrobras. Observa-se
que o sócio capitalista internacional Kawasaki passa a fazer parte do processo, no segundo
momento, quando é fundando o Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Estas investigações podem
aprofundar as análises do papel do Estado no processo de constituição do Estaleiro Enseada do
Paraguaçu, e como esta relação conforma globalização, e a expansão do Império.
282
A alteridade necessária
Ao examinar a dimensão social do problema, desenvolvido a partir da análise das novas
relações de produção, observa-se que os ensinamentos platônicos apontam a necessidade de
uma alteridade, uma forma de desenvolvimento que nos conduza ao reequilíbrio entre ser
humano e natureza.
Enquanto esta nova forma de organização social não se desenvolver, “para o pobre e negro
somente restarão as ‘balas’ resultantes do empreendimento. ”, afirma Lenira (1998), durante a
audiência pública realizada em Maragogipe, ao avaliar expetativas de desenvolvimento com a
implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu. Outra visão do problema é respondida na
entrevista qualitativa, pela remanescente de quilombola Zelzira (76 anos, 2014) ao declarar: “o
pobre pede muito pouco e não acha nada.”.
As avaliações dos membros das comunidades afetadas pelo empreendimento, sintetizam a
dinâmica das relações sociais de produção impostas, confirmando a teoria marxista ao expressar
que o processo de produção capitalista é um modo de produção que subjuga, excluiu as
comunidades tradicionais, e compromete o futuro da humanidade ao exaurir os recursos
naturais.
283
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296
8 ANEXOS
Nos anexos estão relacionados alguns dos principais documentos que serviram de base para
a pesquisa. A inclusão destes anexos, no corpo da pesquisa, objetiva comprovar,
documentalmente, elementos da análise utilizados no trabalho acadêmico, além de servir como
base de dados para futuras pesquisas.
297
8.1 NOTA EXPLICATIVA SOBRE A PESQUISA APRESENTADA AOS GESTORES
PÚBLICOS
Foram encaminhados por e-mail, para os gestores públicos e para os capitalistas (Estaleiro
Enseada do Paraguaçu), carta de anuência da UFRB, assinada pelo orientador da pesquisa, com
pedido de cooperação. Com relação ao Estado, foram procedidas entrevistas presenciais junto
ao MPF e MP/BA. Com relação a SEINP e IBAMA os questionários foram encaminhados por
e-mail, e no caso do IBAMA, também foi encaminhado na forma de protocolo, entregue na
sede da empresa.
Estado e Capitalistas não se recusaram, formalmente, a responder o questionário na forma
de entrevista gravada. Mas, sempre alegavam justificativas, postergando de forma indefinida
uma posição sobre a pessoa autorizada a conceder a entrevista, o local, data e hora. Ocorreram
exceções, com relação ao Estado, elas serão reveladas no transcorrer da pesquisa.
Compreende-se que evitar um contato direto entre pesquisador e entrevistado foi uma
forma de controlar o conjunto de informações que são reveladas na pesquisa. A seguir são
apresentados os questionários.
MODELO DA NOTA EXPLICATIVA SOBRE O ROTEIRO DE ENTREVISTA
ESTRUTURADA ABERTA COM GESTORES PÚBLICOS
O objetivo da pesquisa é analisar a dinâmica de implantação da Mediadora Mitigadora Nº
40, prevista no EIA/RIMA (2009).
Medida mitigadora nº 40, definida como – Nome da medida: Programa de Comunicação
Social. Descrição: Informar a comunidade sobre as reais necessidades de contratação, visando
evitar expectativas indevidas e fluxos migratórios. Componente ambiental afetado: Fluxos
migratórios. Fase de implantação da medida: Implantação e Operação. Caráter: Preventiva.
Eficácia: Alta. Agente: Consórcio de empresas. Cronograma: Nas fases de implantação e
operação. (EIA/RIMA, 2009, p. 79)
Para compreender melhor os objetivos, apresenta-se texto explicativo:
Parte-se das análises do Estudo de Impacto Ambiental (EIA), analisados no Parecer
Técnico Nº 042/2010, elaborado pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis). Com recorte na observação e análises das implantações das
298
medidas mitigadoras propostas no que tange os impactos sobre o meio socioeconômico.
Conforme observado a seguir:
EIA informa sobre os principais impactos ao meio socioeconômico, dentre os quais,
destacamos a possibilidade concreta de atração de um grande contingente de trabalhadores para
a região e consequente pressão sobre a infraestrutura de serviços públicos (moradia, saúde,
educação), além de outras consequências de caráter econômico, cultural e social. Apesar do
EIA identificar estes impactos e propor a implementação de alguns programas enquanto medida
mitigadora, esta equipe avalia que, tomadas isoladamente, tais proposições carecem de
efetividade. Neste sentido é necessário que sejam implementadas, em comum acordo com os
demais entes públicos envolvidos, ações que monitorem e previnam processos de ocupação
desordenada de áreas (que poderão ocorrer em função da atração de mão de obra para a região).
É necessário também que se avalie como se dará a desmobilização da mão de obra temporária.
(EIA/RIMA, 2009, p. 25)
O IBAMA relacionou 42 impactos (positivos e negativos) ao meio socioeconômico, dentre
os quais destacamos: “Aponta-se, como impacto negativo, a possibilidade de que a implantação
do empreendimento venha a gerar uma “concentração de habitações subnormais na periferia
dos centros urbanos, principalmente no entorno do distrito de São Roque do Paraguaçu e
Enseada (Maragogipe) e distrito de Cairu em Salinas da Margarida...”. (EIA/RIMA, 2009, p.
26)
Como medidas mitigadoras, o Parecer Técnico indica “a contratação de mão de obra local
e a implementação dos Programas de Comunicação Social (que informe sobre os perfis
demandados para os empregos) e de Valorização da produção local (na perspectiva de geração
de empregos indiretos).”. (EIA/RIMA, 2009, p. 26)
No EIA/RIMA (2009) é apresentado estudo elaborado pela Biomonitoramento e Meio
Ambiente LTDA, empresa contratada pela SUDIC (Superintendência de Desenvolvimento
Industrial e Comercial), órgão do governo da Bahia. No estudo são estabelecidas 54 medidas
mitigadoras, compreendendo os meios físicos, bióticos e socioeconômicos.
Após análises das medidas mitigadoras, foram identificadas 10 medidas socioeconômicas,
que se relacionam com os impactos apontados no Parecer Técnico do IBAMA e que estão
conectadas diretamente ao Programa de Comunicação Social, ou seja, sendo listadas as medidas
mitigadoras: 19, 29, 30, 31,40, 45, 48, 50, 52 e 54. (EIA/RIMA, 2009, p. 74-81)
299
Em decorrência da transversalidade do Programa de Comunicação Social, previsto no
EIA/RIMA (2009, v. 8, p. 63-83), opta-se por analisar em profundidade o cumprimento dos
objetivos prescritos no programa. Com está análise objetiva-se determinar se os objetivos
previstos no Programa de Comunicação Social do EIA/RIMA (2009) foram alcançados, se
cumpriram a Medida Mitigadora nº 40, e se a condicionante da Licença de Instalação nº
737/2010 que estabelece o Programa de Comunicação Social foi atendida, e em que extensão
isto ocorre. A partir desta análise, objetiva-se revelar como ocorre a dialética entre os atores –
Estado, capitalistas e a comunidade.
300
8.2 ROTEIRO DE ENTREVISTA ESTRUTURADA ABERTA COM GESTORES
PÚBLICOS
1–
Qual a função e qual a participação do Governo da Bahia na implantação do Polo
Naval?
2–
No que se constitui o Polo Naval do Recôncavo?
3–
O que levou o governo da Bahia a implantar o Polo Naval do Recôncavo?
4–
Como se concluiu que São Roque do Paraguaçu é melhor local para implantação
do Polo Naval do Recôncavo, e mais adequado?
5–
Como avalia a importância do empreendimento para o Estado e para o país?
6–
Ao invés de Polo Naval o que temos é uma empresa atuando como Estaleiro, a ideia
de Polo foi descartada? Quais fatores determinaram a mudança?
7–
Quais as atribuições do Governo da Bahia e da SEINP na constituição do Estaleiro
Enseada do Paraguaçu?
8–
Como o Governo da Bahia analisa os impactos sociais da implantação do Estaleiro
junto à comunidade de São Roque do Paraguaçu?
9–
De que maneira o governo da Bahia atua com relação à questão da infraestrutura
do distrito de São Roque do Paraguaçu, uma vez que o impacto populacional é
significativo?
10 – O
governo se comprometeu com algum tipo de compensação junto à população?
Se sim, quais?
11 – De que maneira o
12 – Quais
governo da Bahia tem avaliado as audiências públicas?
aspectos ficaram evidenciados nas audiências públicas, e quais destacaria?
13 – Através
do EIA/RIMA foram estabelecidas diversas condicionantes. Como o
governo da Bahia afere se a EEPSA cumpre as condicionantes?
14 – O
governo da Bahia apresentou novas condicionantes sociais para o
empreendimento? Se sim, quais?
15 – Como
as condicionantes governamentais do EIA/RIMA, no tocante aos aspectos
socioeconômicos estão sendo implantadas, na avaliação do Governo da Bahia?
16 – Como
a SEINP acompanha a implantação da medida mitigadora do EIA/RIMA nº
40?
17 – Que informações
sobre a implantação da medida foram colhidas pela SEINP?
301
18 – Em
que estágio a Medida Mitigadora nº 40 se encontra e quais as etapas foram
executadas?
19 – Existe cronograma de execução?
Se existe poderia disponibilizar?
20 – Com relação ao Programa de Comunicação Social, também previsto no EIA/RIMA,
que informações vocês tem sobre o programa?
21 – A
modificação acionária passou por aprovação do governo da Bahia?
22 – O
que motivou as mudanças societárias do estaleiro?
23 – Por
que foi necessário vender parte do capital acionário do estaleiro à Kawasaki?
24 – De
que maneira a presença de uma multinacional estrangeira contribui para que o
empreendimento funcione?
SOLICITAÇÃO DE CÓPIAS DOS SEGUINTES DOCUMENTOS:
a)
Relatórios sobre o processo de implantação, principalmente na questão social,
Pacto e termos de conduta instituído entre os entes, governo, setor privado e poder
judiciário;
b)
O EIA/RIMA do Estaleiro Enseada do Paraguaçu, completo;
c)
Documentos que tem relação com as questões sociais dos moradores do distrito de
São Roque do Paraguaçu;
d)
Ata das audiências públicas;
e)
Documentação sobre a implantação da Medida Mitigadora nº 40.
302
8.3 ROTEIRO DE ENTREVISTA ESTRUTURADA ABERTA COM CAPITALISTAS
1–
Qual o seu nome completo, qual cargo ocupa na organização e que funções
desempenha?
2–
Como avalia a importâncias das condicionantes governamentais do EIA/RIMA, no
tocante aos aspectos socioeconômicos?
3–
Como o Estaleiro Enseada do Paraguaçu avalia a importância da Medida
Mitigadora Número 40?
4–
A Medida Mitigadora Número 40 estabelece um ‘Plano de Comunicação Social’.
O Estaleiro elaborou o plano?
5–
Se elaborou o ‘Plano de Comunicação Social’, poderia disponibilizar o plano e o
cronograma de atividade?
6–
Se elaborou o ‘Plano de Comunicação Social’. Quais objetivos foram alcançados e
quais objetivos não foram alcançados?
7–
Quais atividades de comunicação foram desenvolvidas, qual o cronograma, quais
objetivos foram alcançados e quais objetivos não foram alcançados?
8–
Seria possível disponibilizar cópias das peças do ‘Plano de Comunicação Social’,
ou das atividades de comunicação do EEPSA?
9–
O EEPSA poderia relacionar o que identificou como ‘expectativas indevidas’ por
parte dos moradores da localidade; e de que maneira o ‘‘Plano de Comunicação
Social’ mitigou estas expectativas?
10 – O
EEPSA poderia informar quais temas foram objeto de conflitos com a
comunidade local, até a presente data?
11 – Do
total de trabalhadores do Estaleiro quantos por centro são oriundos das
localidades diretamente afetadas pelo Estaleiro?
12 – Do
total de trabalhadores do Estaleiro quantos por centro são oriundos de
Maragogipe?
13 – Do
total de trabalhadores do Estaleiro quantos por centro são oriundos de São
Roque do Paraguaçu?
14 – O
EEPSA teria os dados consolidados com os seguintes números: Total de
trabalhadores (homens e mulheres); local de origem dos trabalhadores, com os
respectivos números; faixas salariais dos trabalhadores.
15 – Poderia disponibilizar
a documentação sobre a Medida Mitigadora Número 40?
303
16 – Como
avalia o processo de implantação do Estaleiro?
17 – Como
se concluiu que São Roque do Paraguaçu é melhor local para implantação
Estaleiro Enseada do Paraguaçu, e o mais adequado?
18 – Inicialmente
foi planejado um Polo Naval, mas o que está em construção é um
Estaleiro. A ideia do Polo foi descartada? Quais fatores determinaram a mudança?
19 – Como
analisa o papel do governo da Bahia e do governo federal no processo de
implantação do estaleiro?
20 – Como
analisa o papel dos Ministérios Públicos Federal e Estadual no processo de
implantação do estaleiro? E de que maneira eles contribuem para a implantação do
empreendimento?
21 – Como avalia a infraestrutura, de responsabilidade pública, do distrito de São Roque
do Paraguaçu?
22 – Que
melhorias na infraestrutura, de responsabilidade pública, do distrito de São
Roque do Paraguaçu apontam como necessárias?
23 – Poderia
explicar melhor a relação entre Consórcio Rio Paraguaçu, Estaleiro
Enseada do Paraguaçu S/A, Estaleiro Enseada do Paraguaçu Participações S/A e
Estaleiro Inhaúma. Poderia situar datas de criação e operação, e ligações entre as
empresas, bem como composições acionárias?
24 – A
modificação acionária passou por aprovação do governo da Bahia?
25 – De
que maneira a presença de uma multinacional estrangeira contribui para que o
empreendimento funcione?
26 – Com
relação à locação do Estaleiro da Petrobras pela EEPSA:
27 – Quando o EEPSA fechou o contrato de uso do estaleiro da Petrobras, em São Roque
do Paraguaçu?
28 – Quando
iniciou as operações no Estaleiro da Petrobras?
29 – Até quando
30 – Quando
vão utilizar as instalações do Estaleiro da Petrobras?
pretendem operar dentro das próprias instalações do EEP?
304
8.4 ROTEIRO DE ENTREVISTA ESTRUTURADA ABERTA COM A COMUNIDADE
1–
Ocorreram processos de transmissão de informação e educomunicação promovido
pelo Estaleiro Enseada do Paraguaçu (EEPSA)?
2–
Se ocorreram. Qual ou quais tomou conhecimento e de forma tomou
conhecimento?
3–
A partir dos processos comunicacionais, ocorreu a difusão de uma cultura de paz,
segurança, combate e enfrentamento à violência infanto-juvenil?
4–
A partir dos processos comunicacionais, ocorreu a difusão de uma cultura de
sustentabilidade, conservação ambiental, sobre os conceitos de conflitos ambientais
e de propriedade?
5–
A partir dos processos comunicacionais, ocorreu a difusão de uma cultura de saúde,
prevenção contra prostituição, doenças sexualmente transmitíeis (DSTs), e sobre
prevenção a AIDS?
6–
A partir dos processos comunicacionais, ocorreu a difusão sobre as etapas do
processo de construção do Estaleiro?
7–
Se ocorreu a difusão sobre as etapas de construção do Estaleiro. Com que
frequência a informação era difundida e de que maneira a informação é transmitida?
8–
A partir dos processos comunicacionais, ocorreu a difusão sobre o perfil
profissional e a qualificações exigida para contratação de mão de obra pelo
Estaleiro?
9–
Se ocorreu a difusão sobre a necessidade de contratação de mão de obra pelo
Estaleiro. Com que frequência a informação era difundida e de que maneira a
informação é transmitida?
10 – A
partir dos processos comunicacionais, ocorreu a difusão do número de telefone
0800 para que a população possa apresentar queixas, denúncias, e ou problemas
ambientais relacionados ao Estaleiro?
11 – Às
comunidades de pesca e colônias de pescadores receberam informações
periódicas sobre o movimento das embarcações e tráfego marítimo, com objetivo
de evitar conflitos de acesso e mobilidade?
12 – Participou
de algum programa desenvolvido pelo estaleiro que busca-se
desenvolver os conceitos de protagonismo social, coesão social, e ou
autodeterminação cidadã?
305
13 – Participou
14 – Se
de algum programa desenvolvido pelo estaleiro?
participou do programa. Qual ou quais foram, e de que maneira tomou
conhecimento sobre o programa?
15 – Com
que frequência e de que maneira toma conhecimento sobre o que ocorre no
Estaleiro?
16 – De que maneira a construção do Estaleiro modificou a sua vida, de sua família e da
comunidade?
17 – Como o Governo da Bahia tem atuado na sede do distrito São Roque do Paraguaçu?
18 – Como avalia a relação do Governo da Bahia e a comunidade da sede do distrito São
Roque do Paraguaçu?
19 – Quais
deficiências e ou serviços que o Governo da Bahia presta a comunidade da
sede do distrito São Roque do Paraguaçu?
20 – Como
a Prefeitura de Maragogipe tem atuado na sede do distrito São Roque do
Paraguaçu?
21 – Como
avalia a relação da Prefeitura de Maragogipe e a comunidade da sede do
distrito São Roque do Paraguaçu?
22 – Quais
deficiências e ou serviços que a Prefeitura de Maragogipe presta a
comunidade da sede do distrito São Roque do Paraguaçu?
23 – Existe
algum documento, em sua posse, produzido na forma de informação pelo
Estaleiro Enseada do Paraguaçu, e divulgado na comunidade?
Os questionário são aplicados na forma de entrevistas gravadas por equipamento
eletrônico, por dois motivos:
a)
Em decorrência da comunidade apresentar baixos níveis de educação formal, o uso
da oralidade permite com que o entrevistado possa utilizar o instrumento de
comunicação, fala, que usualmente e com habilidade própria domina;
b)
Com objetivo de apreender em maior extensão aspectos da relação dialética da
comunidade com o fenômeno, revelando a partir da subjetividade dos entrevistados,
como se configura está dialética no âmbito material. Como expressar Foucault
(2011. P. 10) “o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os
sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nós
queremos apoderar.”. Por usar o recurso da oralidade, o recurso natural domínio
por parte do entrevistado, as possibilidade de apreensão de um discurso que revele
306
as contradições e complementariedade entre a comunidade o Estado e os
capitalistas tornam-se maiores.
O questionário é aplicado até o ponto de saturação. A análise das respostas devem conduzir,
no âmbito da comunidade, a responder os seguintes questionamentos:
a)
Como é percebida pela comunidade a presença do Estado?
b)
Quais as alterações percebidas pela comunidade com a implantação do Estaleiro?
c)
Como é percebida pela comunidade a relação com os capitalistas?
d)
Ocorreu a implantação do PCS?
e)
A Medida Mitigadora Nº 40 foi cumprida?
f)
Se a Medida Mitigadora Nº 40 foi cumprida, em que extensão isto ocorre?
307
8.5 TABELA EXPLICITA O MODELO DE ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
A tabela a seguir demonstra o modelo de análise aplicado de acordo com o conteúdo da
entrevista qualitativa.
MODELO DE ANÁLISE DE DADOS DAS ENTREVISTAS QUALITATIVAS
Questão
Resposta
Análise dos dados (PRODUÇÃO PRÓPRIA)
Resultado – Análise de Conteúdo
Resultado – Análise do Discurso
Observações:
308
8.6 ATA DE AUDIÊNCIA PÚBLICA REALIZADA EM MARAGOGIPE (2008)
309
310
311
312
313
8.7 EIA/RIMA – MEDIAS MITIGADORAS (2009, P. 74 A 81)
314
315
316
317
8.9 EIA/RIMA (2009, V. 8) – PROGRAMA DE GESTÃO AMBIENTAL (PGA)
318
319
8.10 EIA/RIMA (2009, V. 8) – PROGRAMA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL (PEA)
320
321
8.11 EIA/RIMA (2009, V. 8) – PROGRAMA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL (PCS)
322
323
8.12 IBAMA – PARECER TÉCNICO Nº 042/2010
324
325
326
8.13 IBAMA – LICENÇA PREVIA Nº 354/2010
327
328
329
330
8.14 IBAMA – LICENÇA DE INSTALAÇÃO Nº 737/2010
331
332
333
8.15 FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES – PARECER Nº
11/DPA/FCP/MINC/2010
334
335
336
337
8.16 PORTAL DA TRANSPARÊNCIA DETALHA TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS DA
UNIÃO PARA O ESTALEIRO ENSEADA DO PARAGUAÇU
338
8.17 PUBLICAÇÃO DO DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO DO ATO DECLARATÓRIO
EXECUTIVO Nº 18 DA RECEITA FEDERAL
339
8.18 EEPSA – LANÇAMENTO DA PEDRA FUNDAMENTAL EM JULHO DE 2012
340
341
8.19 RELATÓRIO DA ODEBRECHT S.A. SOBRE O ESTALEIRO ENSEDADA DO
PARAGUAÇU (2013)
342
8.20 RELATÓRIO INSTITUCIONAL Nº 4 DO ESTALEIRO ENSEADA DO
PARAGUAÇU (EEPSA, 2013)
343
344
345
8.21 CÓPIA DO REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES ENCAMINHADO AO IBAMA
346
8.22 COMPOSIÇÃO ACIONÁRIA DO CONSÓRCIO CONSTRUTOR
347
8.23 DIÁRIO DE PESQUISA
RELATÓRIO DE ATIVIDADES DA PESQUISA
Este relatório se constitui em diário de atividades de pesquisas realizadas por Carlos Augusto
Oliveira da Silva. Com objetivo de desenvolver dissertação com tema ‘O Capitalismo e o Recôncavo da
Bahia: análise do processo de implantação do Estaleiro Enseada do Paraguaçu’. A dissertação é
componente para obtenção do grau de Mestre em Ciências Sociais, na Área de Concentração de
Desigualdades e Desenvolvimento, condido através do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.
Data
Atividade
Observação
De 15/06/2011 a
Coleta de dados de fontes secundárias.
Atividade com objetivo de apresentar
15/10/2011
Pesquisa na Internet através de fontes
projeto de pesquisa para a seleção do
oficiais, Governo Federal e Governo
PPGCS da UFRB.
da Bahia, Pesquisa bibliográfica sobre
o processo de implantação Polo Naval
do
Recôncavo
(PROST,
2010).
Pesquisa bibliográfica sobre Marx.
Levantamento de dados no IBGE.
30/12/2011
Visita à comunidade de São Roque do
Objetivo foi observar a vida noturna no
Paraguaçu e diálogo informal com
final de semana em São Roque do
moradores.
Paraguaçu.
Foi observado que os principais pontos de
encontro eram os bares e praças e que
exista significativo número de mulheres
jovens circulando.
26/02/2013
27/02/2013
Entrevista
semiestruturada
com
Em 26 de fevereiro de 2013, em Feira de
Marcos André Carneiro Silva sobre as
Santana, na sede do Ministério Público
audiências públicas realizadas sobre o
Federal, Carlos Augusto entrevistou o
processo de implantação do Estaleiro
Procurador da República Marcos André
Enseada do Paraguaçu.
Carneiro Silva.
Entrevista semiestruturada com Audo
Em 27 de fevereiro de 2013, em Feira de
da Silva Rodrigues sobre as audiências
Santana, na sede do Ministério Público
públicas realizadas sobre o processo de
Estadual, Carlos Augusto entrevistou o
implantação do Estaleiro Enseada do
Promotor de Justiça do Estado da Bahia,
Paraguaçu.
Audo da Silva Rodrigues, Titular da
Regional Ambiental de Feira de Santana,
que envolve a região do Baixo Paraguaçu.
348
02/03/2012
Voo para realização de fotos aéreas e
Foram realizadas 211 fotos por Carlos
reconhecimento aéreo de São Roque
Augusto. O piloto do avião foi Leônidas
do Paraguaçu e Maragogipe.
Miranda. Tempo de voo de 2 horas, partido
de Feira de Santana.
15/06/2012
A
convite
da
Assessoria
de
Durante discurso a presidenta afirmou que
comunicação da PETROBRAS estive
a retomada da indústria naval brasileira foi
presente em Maragogipe, distrito de
decisão do presidente Lula
São Roque do Paraguaçu, no EEPSA,
para acompanhar o ato oficial de
batismo da plataforma P-59 , pela
presidente
da
república,
Dilma
Rousseff .
15/06/2012
Durante
evento
de
batismo
da
Luiz
Alberto
destacou
a
deficiente
plataforma P-59, realizei entrevista
infraestrutura pública existente no distrito
semiestruturada
de São Roque do Paraguaçu.
com
o
deputado
federal Luiz Alberto Silva dos Santos
(PT/BA), que tem como base política a
região de Maragogipe.
15/06/2012
Conversa informal com Yolanda Oliva
Yolanda Oliva da Silva teceu severas
da
críticas às condições de saneamento básico
Silva,
proprietária
de
um
restaurante de frutos do mar, em São
e abastecimento de água.
Roque do Paraguaçu. Yolanda de
Salvador, subúrbio ferroviário, mora
há seis anos no distrito de São Roque.
04/03/2013
Solicitação de entrevista e dados.
Contato por telefone e e-mail com Marcelo
Gentil | Assessoria de Comunicação do
Estaleiro | (071) 3502-4770 | (071)97215536
|
[email protected]
Contato por telefone e e-mail com João
Paulo Carvalho | Assessoria de Odebrecht
|
(071)3206-1504
|
[email protected]
05/03/2013
Solicitação de entrevista e dados.
Contato por telefone e e-mail com Candra
Maria
Rocha
Martins
De
Almeida,
Assessora de Comunicação, Secretaria
Extraordinária da Indústria Naval e
349
Portuária – SEINP, Governo do Estado da
Bahia, [email protected],
(71)3115-7979, (71) 9198-2606
08/03/2013
Contato por telefone e e-mail com
Solicitação de entrevista e dados.
Candra Martins de Almeida, Assessora
de Comunicação da SEINP.
14/03/2013
Contato por telefone e e-mail com
Resposta: Comentei com Carlos Costa o
Candra Martins de Almeida, Assessora
assunto e vamos marcar a partir do dia
de Comunicação da SEINP.
26/03, depois do evento. Te mantenho
informado e trataremos a melhor data
15/03/2013
Candra
Martins
de
Almeida,
Documentos
conformam
relatórios
e
Assessora de Comunicação da SEINP
estudos sobre a implantação o Estaleiro,
enviou documentos da SEINP para
abrangendo
Carlos Augusto.
Salinas da Margarida. Além de revista
Maragogipe,
Saubara
e
publicada em agosto/setembro-2012, pelo
Governo da Bahia.
08/07/2013
Entrevista com procurador do MPF,
Reunião ocorreu em Feira de Santana, na
Marcos André Carneiro Silva sobre o
sede do Ministério Público Federal, Carlos
Programa de Comunicação Social
Augusto entrevistou o Procurador da
previsto no EI/RIMA e a Medida
República Marcos André Carneiro Silva.
Mitigadora Número 40.
Não tinha informações a acrescentar. Com
relação ao PCS, disse que desconhecia e
que a competência pela fiscalização era do
MPE.
Enviou cópia do parecer da Fundação
Cultural Palmares sobre comunidades
remanescentes de quilombos. Documento:
Parecer N. 011 /DPA/FCP/MinC /2010, de
19 de março de 2010.
08/07/2013
Solicitação de dados e entrevista a
Foi feito contato telefônico e por e-mail.
Marcelo Gentil Espinheira e Caroline
Aguardando posição do EEPSA.
Todt de Azevedo sobre o EEPSA, além
de encaminhamento de solicitação de
cooperação.
10/07/2013
Contato
telefônico
com
Marcelo
Marcelo Gentil informou que a Caroline
Gentil, e reenvio questionário e a
Azevedo estava afastada da empresa por
solicitação de cooperação para o
problemas de saúde e que a mesma iria
EEPSA, nas pessoas de Marcelo
retornar ao trabalho em julho. Pediu novo
Gentil, Caroline Azevedo, com copia
prazo para responder ao questionário.
350
para
João
Paulo
Carvalho,
da
Odebrecht.
11/07/2013
Carlos Augusto enviou para Candra
Candra Martins pediu que um tempo para
Martins de Almeida, Assessora de
que pudesse conseguir as respostas e
Comunicação da SEINP questionário
apresentar cópias dos documentos.
estruturado. Também manteve contato
Deixou subentendido que a SEINP não
por telefone.
tinha informações sobre o ‘Plano de
Comunicação’.
18/07/2013
Candra
Martins
de
Almeida,
Documentos conformam os seis volumes
Assessora de Comunicação da SEINP
do EIA/RIMA (2009), sobre o processo de
enviou documentos da SEINP para
implantação do EEPSA. Com relação as
Carlos Augusto.
respostas ao questionário, pediu novo
prazo.
25/07/2013
Tentativa de contato telefônico com
No mesmo dia (25/07) Marcelo Gentil
Marcelo Gentil Espinheira, da EEPSA.
respondeu por e-mail: “Estou no canteiro e
Renvio de E-mail sobre as informações
não pude atender sua ligação. Retornarei
solicitadas anteriormente.
em seguida. De todo modo, adianto que
nossa gerente de Sustentabilidade teve um
problema de saúde e retornou somente no
dia de ontem. Seu assunto está sendo
apurado por ela, que nos dará retorno. ”
25/07/2013
Contato
telefônico
Azevedo da EEPSA.
com
Caroline
Caroline Azevedo relatou problemas de
saúde. Informou sobre articulação para
montagem da rede de comunicadores e que
a EEPSA atrasou a contratação dos
comunicadores.
dificuldade
em
Explicou
aplicar
que
tinha
ferramentas
comunicacionais devido à ausência, ou
pouca
presença
de
veículos
de
comunicação. Informou que o Estaleiro
contratou 60% do pessoal da região.
Pediu que diante das informações que
passará, refizesse o questionário.
Deixou subentendido que a empesa não
tinha
elaborado
um
‘Plano
de
Comunicação’.
351
26/07/2013
Entrevista com os promotores públicos
Entrevista tensa por parte de Cristina
Audo da Silva Rodrigues e Cristina
Seixas. O promotor Audo Rodrigues
Seixas Graça, na sede do Ministério
buscou manter uma postura mais tranquila
Publica do Estado da Bahia, no Bairro
e falava pontualmente.
Nazaré, em Salvador, ocorrida no dia
Quando Cristina Seixas foi questionada
26 de julho de 2013, no Núcleo da Baía
sobre a Medida Mitigadora 40 ela disse
de Todos os Santos (NBTS). Os
desconhecer o conteúdo da medida, pediu
promotores são os responsáveis pelo
para que relatasse o conteúdo e como
inquérito do Estaleiro Enseada do
cheguei até ela. Questionando inclusive a
Paraguaçu.
condição de pesquisador.
Tentou a todo momento se colocar em uma
postura de superioridade intelectual. A
entrevista foi gravada em áudio.
Na sequência confessou desconhecer o
‘Plano de Comunicação’ definido pela
medida.
Apresentou duas cópias de informativos,
apensos ao inquérito do Ministério Público
sobre o processo de implantação do EEPS.
Os informativos tinham objetivo de
mobilizar as comunidades para a audiência
pública, produzidos pela EEPASA. Pontou
que existiu significativa presença de
pessoas na audiência pública.
Ponderou que só ocorreu uma única
audiência, o que considerava muito pouco.
Tentou dividir a responsabilidade sob o
acompanhamento
das
medidas
socioeconômicas com o promotor de
Maragogipe. O que pareceu estranho, uma
vez que existe um único inquérito. Que é
presidido
por
Audo
Rodrigues
e
coordenado por Cristina Seixas.
Primeiro negou que a fiscalização da
aplicação
fossem
das
Medidas
atribuição
do
Mitigadoras
MPE,
depois
confirmou que eram.
Ao final da entrevista, Cristina Seixas me
perguntou
se
poderia
selecionar
os
352
conteúdos do inquérito do MPE, que
diziam respeito à parte de comunicação do
estaleiro. Argumentou que o equipamento
que fazia cópias estava quebrado e que o
tempo estava curto.
Mais uma vez a postura me pareceu
inadequada, uma vez que, com base na
Lei, requisitei a cópia completa do
inquérito. Poderei que o melhor era aceitar
o que ela me oferecia no momento. Para
em data futura, caso se mantiver a
dificuldade de cópias, manter contato com
o Procurador do Ministério Público do
Estado, relatar o ocorrido e requisitar
entrega imediata da cópia dos documentos
sob pena de denunciar a funcionária
pública ao MPF por descumprir à ‘Lei de
Acesso a Informação’.
30/07/2013
Envio de novo roteiro de entrevista
Roteiro estruturado enviado por e-mail.
estruturada para a representante do
Estaleiro
Enseada
do
Paraguaçu,
Caroline Azevedo, com cópia para o
assessor de comunicação do Estaleiro,
Marcelo Gentil.
04/09/2013
Caroline Azevedo responde, em nome
Capitalistas
enviam
por
e-mail
as
do Estaleiro Enseada do Paraguaçu,
respostas a entrevista estruturada aberta.
por e-mail a entrevista estruturada
aberta.
05/09/2013
A convite da EEPSA Carlos Augusto
Fui entregue por Marcelo Gentil em
visitou o empreendimento, em São
material
Roque do Paraguaçu, e participou da
apresentação sobre o empreendimento.
‘Press
Foram procedidos questionamentos sobre
Trip’,
apresentação
do
empreendimento para imprensa.
o
impresso,
empreendimento
parte
e
oficial
da
apresentadas
questões sobre a forma com a qual a
EEPSA respondeu o questionário.
05/09/2013
Carlos Augusto realizou pesquisa
Visita a sede do distrito de São Roque do
participante ao observar conformação
Paraguaçu.
de moradias em condições suburbanas,
além de verificar as deficiências
353
urbanas e sociais da sede do distrito de
São Roque do Paraguaçu.
Alugando uma embarcação de um
pescador local, navegou pela Baía do
Iguape e em trecho do rio Baetantã.
23/09/2013
Ao lado do piloto Leônidas Miranda,
Carlos Augusto realizou fotos aéreas
Carlos Augusto realizou sobrevoo na
compreendendo o EEPSA, e a região de
região do distrito de São Roque do
São Roque do Paraguaçu.
Paraguaçu, com objetivo de realizar
imagens aéreas e capturar a atual fase
de desenvolvimento do EEPSA e a
influência no meio ambiente.
02/10/2013
Visita a São Roque do Paraguaçu para
Carlos
Augusto
proceder investigação da realidade
comunidade,
empírica e entrevistas qualitativas.
Paraguaçu
realizou
navegou
e
fotos
pelos
Baetantã.
da
rios
Foram
entrevistados e realizadas gravações com
os três atores sociais da comunidade.
A pesquisadora Rosimeire Guimarães
acompanhou
o
pesquisador
Carlos
Augusto durante a visita.
13/11/2013
Ao lado do piloto Leônidas Miranda,
Carlos Augusto realizou fotos aéreas
Carlos Augusto realizou sobrevoo na
compreendendo o EEPSA, e a região de
região do distrito de São Roque do
São Roque do Paraguaçu, a sede do
Paraguaçu, com objetivo de realizar
município de Maragogipe e parte do litoral
imagens aéreas e capturar a atual fase
da banhado pela Baía de Todos Os Santos.
de desenvolvimento do EEPSA e a
influência no meio ambiente.
11/01/2014
Visita à sede do distrito de São Roque
Carlos
do Paraguaçu. Com objetivo de
qualitativas
proceder,
documentos junto à comunidade de São
junto
à
comunidade,
entrevista qualitativa e levantamento
de
documentos
concernentes
Augusto
realizou
e
entrevistas
levantamento
de
Roque do Paraguaçu.
ao
cumprimento da Medida Mitigadora nº
40 e aos objetivos prescritos Programa
de comunicação Social.
354
Carlos Augusto
E-mail: [email protected]
E-mail: [email protected]
Telefones:(75)3623-0168 | (75)9135-2572
Rua Barão de Cotegipe, Nº 878
1º Andar, Sala 101 | Bairro Centro
Feira de Santana | Bahia | Brasil | CEP 44001-550
355
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O Capitalismo e o Recôncavo da Bahia: análise do processo de