Eis que faço novas todas as coisas
Ter, 30 de Abril de 2013 12:49
Os dias que antecederam a eleição do Santo Padre o Papa Francisco foram repletos de
especulações, seja em torno do nome do futuro Papa, seja na busca da novidade ou da
renovação da Igreja. Muitos viam a necessidade de um Papa "progressista", entendido como
um Pontífice que viesse a mudar os rumos da Igreja em direção a conceitos e práticas
divergentes da perspectiva evangélica, marcada pelo seguimento de Jesus Cristo, acolhimento
do mistério da Cruz e serviço humilde aos mais pobres. E tantas vozes se calaram ou deram
razão ao fato de o Espírito Santo ter tomado de novo a palavra, tirando "da manga" a grande
surpresa que tem sido o Papa. Discursos breves, centrados no essencial da mensagem cristã,
gestos significativos, acolhimento, abraços, tudo apontando para a fidelidade a Jesus Cristo,
proposta de bondade e ternura, braços abertos que expressam misericórdia e perdão.
A Igreja continua a mesma e sempre nova, capaz de se reformar com a chave da conversão
que abre as portas dos corações. A novidade vem de dentro e não se conforma com a
mentalidade corrente. A Igreja será sempre acompanhada pela provocação positiva da Carta
dos Romanos: "Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando vossa
maneira de pensar e julgar, para que possais distinguir o que é da vontade de Deus, a saber, o
que é bom, o que lhe agrada, o que é perfeito" (Rm 12, 2). Papa Francisco é revolucionário
porque ama, sem mudar uma vírgula que seja do Evangelho, do Catecismo ou do ensinamento
moral da Igreja!
Já na Igreja primitiva, o crescimento da Igreja acontecia quando passava por muitos
sofrimentos e perseguições (Cf. At 14.21-27). Sua vida se caracterizava pelo anúncio da
Palavra, testemunho da caridade e das ações maravilhosas do Senhor, orações e jejuns e
atividade missionária. O Apóstolo São Paulo empreendeu as grandes viagens, quando formava
novas Comunidades e constituía os servidores aos quais confiava estas mesmas agregações
de cristãos. A Igreja suscitava a fraternidade e as pessoas nela se sentiam acolhidas e
amadas. Dali para frente e até hoje, onde uma Comunidade cristã se reúne na caridade,
abre-se um oásis verdejante, onde as pessoas podem saciar sua sede de vida verdadeira.
A compreensão de comunidade para a fé cristã deriva da vida e dos ensinamentos de Jesus,
assimilados pelos apóstolos e pelas primeiras comunidades. Na base da experiência
comunitária, proposta por Jesus, está a experiência da “comunhão”. Jesus inicia seu ministério
chamando discípulos para viverem com ele (cf. Mc 3,14). Todo o itinerário do discípulo, desde
o chamado, é sempre vivido na comunhão com o Mestre, que se desdobra na comunhão com
os outros. A dimensão comunitária é fundamental na Igreja, pois se inspira na própria
Santíssima Trindade, a perfeita comunidade de amor. Sem comunidade, não há como viver
autenticamente a experiência cristã. A dimensão comunitária da fé cristã conheceu diferentes
formas de se concretizar historicamente, desde a Igreja Doméstica até chegar à paróquia na
acepção atual (Cf. Tema central da 51ª Assembleia geral da CNBB, n.42-43), ou a proposta da
Paróquia como "comunidade de comunidades", que tem sido encaminhada na maioria das
dioceses do Brasil. Bem vivida, a dimensão comunitária da fé cristã transforma as pessoas e o
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mundo.
A fonte da novidade está no alto, lá no Céu, na vida da Santíssima Trindade. Serão
autênticas as comunidades cristãs e será confiável a vida de cada cristão quando refletirem a
vida de Deus. De fato, quando Jesus abre a alma para anunciar o "seu" mandamento (Jo
13,31-35; Jo 15,12-17) não se limita a propor uma convivência pacífica e respeitosa entre as
pessoas, mas quer que nos amemos uns aos outros "como" Ele nos amou. Não basta a
benevolência ou, quem sabe, a filantropia, ou ainda o respeito à liberdade dos outros e à
diferenças. Ele pede um pacto de amor mútuo, com pessoas dispostas a darem a vida uma
pelas outras. Esta, sim, é a novidade, esta é a revolução para nosso mundo. Com este amor
autêntico, vindo do Céu, vem também a verdade, a justiça e todos os valores do Reino de
Deus.
Homens e mulheres que fazem esta escolha são portadores de um tempo novo, em que
Deus vem morar no meio do seu povo, para enxugar todas as lágrimas. Virá, sim, o tempo em
que a morte não existirá mais e não haverá mais luto, nem choro, nem dor, porque terá
passado o que havia antes (Cf. Ap 21,1-5). Quem aceitar dar o primeiro passo nesta direção
não precisará esperar muito, pois verá, desde agora, florescer o jardim de Deus em torno de si.
Basta começar, sem muitas palavras, com gestos simples e significativos, sem medo da
ternura e da bondade, espalhando a misericórdia e o perdão.
Aquele que é o "homem novo", que realiza as bem-aventuranças e atrai irresistivelmente as
pessoas de todos os tempos, o que não deixa ninguém acomodado, este, sim, dirá: "Eis que
faço novas todas as coisas" (Ap 21,5). Diante dele o Espírito e a Esposa, que é a Igreja, dizem:
Vem, Senhor Jesus! Quem tem sede da novidade, venha, e quem quiser, receba de graça a
água da vida! (Cf. Ap 22,17).
Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém
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