ESTADO DA PARAÍBA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gab. Des. Leôncio Teixeira Câmara ACÓRDÃO APELAÇÃO CRIMINAL No 046.200.9.001601-8/002 — Comarca de Solânea/liB RELATOR: Desembargador Leôncio Teixeira Câmara APELANTE: Rodrigo Dias de Souza ADVOGADO: Manoel Gomes Monteiro (OAB/PB 4.522) APELADA: Justiça Pública APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. APELAÇÃO DEFENSIVA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. FRAGILIDADE DA CONDENAÇÃO. VÍTIMA QUE NÃO RECONHECE O ACUSADO. PROVAS QUE NÃO SE HARMONIZAM PARA EMBASAR __UMA CONDENAÇÃO. FALTA DE CERTEZA DE PROVIMENTO. AUTORIA. 11V 1)11810 PRO REO. ABSOLVIÇÃO. 1. Nenhuma pena pode ser aplicada sem a mais complet.a. certeza da falta. A pena, disciplinar ou criminal, atinge 'a dignidade, a honra e a estima da pessoa, ferindo-é gravemente no plano moral, além de representar a perda de bens ou interesses materiais. 2. Ainda que se admitisse ser muito provável — não leria prudente empregar esse adjetivo — a autoria do réu, .ito não seria - base suficiente para a formação do juízq ;de certeza buscado, pois o que é muito provável em um sentido, ainda é provável, ainda que menos, no sentido oposto. A probabilidade pertence ao pantanoso terrenq da dúvida, que precede o solo firme da certeza VISTOS, relatados e discutidos estes autos de ap ação criminal, acima identificados, ACORDA a egrégia Câmara Criminal do Tr . unal de Justiça do Estado da Paraíba, à unanimidade, em dar provimento ao r urso,' em desarmonia com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça. RELATÓRIO Perante a Comarca de Solânea/PB, Jos,é 3ailson Serafim da Silva, conhecido como "Jajá" e Rodrigo dias de Sousa, conhecido "Leo", ambos já Apelação Criminal no 046.2009.001601-8/002 r, qualificados na inicial, foram denunciados como incursos nas penas do art. 157, § incisos I e II. Além do delito de roubo majorado, foi imputado ao acusado Rodrigo, o* .ciglito tipificado no art. 311 do CP. • . .,, • Ultimada a instrução criminal, o magistrado sentencianfe julgou procedente a denúncia condenando os acusados nas iras do art. 157, § 2°, incisos I e II do CP, fixando a pena definitiva de 8 (oito) anos e 8 (oito) meses de reclusão, áer cumprida em regime fechado e 27 (vinte e sete) dias-multa, à razão de 1/30 (um tr:inta avos) salário mínimo vigente à época dos fatos (fls. 169-176). Quanto ao delito estampado pelo art. 311 do CP, :foi o acusado Rodrigo absolvido. Inconformada, a defesa do incriminado Rodrigo Dias Sousa interpôs apelação pugnando a aplicação do princípio do in dublo pro reo' e consequente absolvição (fls. 186-206). Após as contrarrazões ministeriais, em parecer, a Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do apelo (fls. 226-228). É o relatório. VOTO Antes de analisarmos a pretensão recursal, entendarnoS caso: Narra a peça acusatória que, no dia 20 de setembro .de 2009, por volta das 18h, nas imediações do Sítio Barrocas, no município de Solânea/PB, a vítima trafegava com sua motocicleta HONDA POP, placas MY0-8372/RN, de cor preta, .ano 2008, ocasião em que começou a ser perseguida pelos acusados. réus encontravam-se em uma moto HO IOA Os réus vermelha, quando iniciaram a perseguição à vítima, com o fim de lhe subtrair a motocic ta. Apavorado com os disparos, Gutembergue Pereira Costa, vítima, abandonou a moto e fugiu dos acusados, que consumaram, roubo, levando consigo a res furtiva. bertO ntão, o Feito o breve relato da infração praticada, passo à . análise . da inconformidade recursal quanto à pretensão de ser o inculpado absolvido. / A existência do fato está consubstanciada !na Auto de Prisão em Flagrante (fls. 6-10), Auto de Apreensão (fl. 14) e Auto de Entrega (fl. 17).. Quanto à autoria do delito, vê-se que não há no caderno processual provas robustas que apontem para o apelante Rodrigo como sendo um dos . que participou da infração. Vejamos: 45 Apelação Criminal no 046.2009.001601-8/002 Gutemberg Roberto Pereira Costa, vítima, fls. 89-90: .".qt.ie dos dois réus presentes nesta manhã neste Fórumio declarante conhece apenas o primeiro réu (...); ftue reconhece o primeiro denunciado como sendo um As autores do crime; que a moto foi recuperada na casa do sogro do primeiro denunciado (...); que o segundo réu disse que tinha alugado a motocicleta (vermelha-)4! ao primeiro denunciado ". Maurisérgio Matos dos Santos, testemunha, fls. 92-93: "que ao retornar a delegacia tomou conhecimento que a moto que foi abandonada no local do crime pertencia a um rapaz que residia no distrito de Sta Fé, neste município, que momentos depois chegou o réu Rodrigo Dias de Sousa na delegacia informando que tinha vindo a delegacia para recuperar sua moto; que o segundo réu não apresentou documento que provasse ser ,ele o proprietário da moto roubada; que ao verificar 'a numeração do chassis verificou-se que a moto • -'estava adulterada; que de imediato também foi dado voz de prisão ao segundo réu (...); que o segundo réu disse que havia alugado a moto ao primeiro réu não dizendo. 'para qual finalidade (...)". Interessante, ainda, é colacionar aos autos os depoimentos prestados na ocasião do interrogatório dos acusados: 5: ".que José Jailson Serafim da Silva, acusado, fls. em dia que não se recorda estava em sua casa doriti'nd no sítio --Saco dos Campos, às 09:00 horas da nOit chegou uni elemento conhecido por Silva a fim de Ven er uma motocicleta, pois este, sabia que o interro do queria comprar uma moto; que como não inha condições de comprar uma moto boa, comprou moto da Silva (...); que em determinado dia ia passafidd na casa de Silva e perguntou ao mesmo se tinha ugha moto pra vender, e o interrogado estava a época éom árna moto alugada; que a motocicleta alugaria 'pelo interrogado era uma fan de cor vermelha, cuja imoto havia alugado a Rodrigo o segundo denunciado, río domingo de tarde para entregar na segunda de manhã; que Rodrigo não tem ponto de alugar motocicleta :(:..); que a motocicleta vermelha fan o depoente tinha alugado a Rodrigo; que a mesma moto emprestou a Silva; que em . prestou a moto a Silva por volta das 05:00 horas da tarde; que Silva mora no distrito de Sta Fé; que Silva ficou de devolver a moto; que esclarece o interrogado no domingo do mês de setembro por volta das 15:00 n'ora's alugou a moto fan de cor vermelha ao segundo denunciado por R$ 20,00 reais, para na segunda feira •c.le Apelação Criminal n°046.2009.001601-8/002 4 manhã ir para o sítio saco dos campos para a feira. ' de Arara; que por volta das 17:00 h Silva chegou na casa da namorada, comprometendo de devolver a moto lio mesmo dia; que o interrogado entregou a moto fan vermelha a Silva; que por volta das 21:00 horas . Silva retornou a casa do interrogado sem a motocicleta que havia tomado emprestado, estava naquele momento fia motocicleta pop preta 2008, produto deste crime e oferecendo a dita moto ao interrogado, tendo o interrogado comprado a moto (...)". Rodrigo Dias de Sousa, acusado, fls. 86-88: "qúe o interrogado alugou a motocicleta ao primeiro denuncíado no domingo por volta das 16:00 horas para este entregar na segunda feira as 07:00h da manhã, por R$ 20,00, uma honda fan de cor vermelha era do interrogado :e havia comprado a cerca de 05 meses da feira de Arara/PB, por R$ 1.500,00 (...)". Percebe-se que a versão apresentada pelos acusados até se harmonizam entre si, visto que José Jailson, em nenhum momento, aponta que Rodrigo participou de assalto. Ao contrário, isenta-o, afirmando que alugou a moto de Rodrigo, mas a emprestou a um terceiro, de alcunha Silva. Nada há de concreto no sentido de apontar Rodrigo corno coautor do delito apresentado na denúncia. A vítima, em seu depoimento, deixa claro que somente reconhece o primeiro acusado — José Jailton — e confirma o fato de Rodrigo ter, apenas, alugado sua moto àquele. O que temos em desfavor do acusado é que . a motocicleta utilizada no assalto — Honda Fan vermelha — era sua, contudo, não possuía documentos e o chassis estava adulterado. Saliento, aqui, que tal informação só foi obtida porque Rodrigo se dirigiu até a delegacia, após a prisão de José Jailton, e informou ser o proprietário da motocicleta vermelha (utilizada no roubo). Ora, é de se pensar a razão pela qual o acusad se realmente tivesse participado do crime, apareceria na delegacia onde seu sup comparsa estivesse preso para afirmar que era o proprietário da motocicleta usa roubo? Se assim fosse, estaria, ao menos, confessandá toda a sua participação na empreitada delituosa, contudo, dessa forma não o fez. Não há como concatenar, de forma razoáve, , todos os . dados processuais e probatórios . e concluir que Rodrigo, de fato, participou do roubo como coautor. .• Apelação Criminal no 0462009.001601-8/002 5 As provas não trazem certeza necessária para upia condenação. É bem sabido que para prolação de um decreto Pelai condenatório é indispensável prova robusta que dê certeza da existência do delito e ;eu autor. A íntima convicção do Julgador deve, sempre, se apoiar em dados objetivos indiscutíveis. Caso contrário, transforma o princípio do livre convencimento em arbítrio. A condenação exige a certeza e não basta, sequer, a alta probabilidade, que é apenas um juízo de incerteza de nossa mente em torno da existência de certa realidade. O princípio do livre convencimento do juiz não pode conduzir à arbitrária substituição da acurada busca da certeza, em termos objetivos e gerais, por uma afirmação de "convencimento". Imp6e-se, sempre, uma verificação . histórica do thema probandum, de forma a excluir qualquer possibilidade de dúvida. • Nenhuma pena pode ser aplicada sem a mais completa certeza da falta. A pena, disciplinar ou criminai, atinge a dipnidade, a honra e a estima da pessoa, ferindo-a gravemente no plano moral, além de representar a perda de bens ou interesses materiais. Aqui, na situação retratada acima, é flagrante a ausência de urna prova robusta, até mesmo indiciária, sobre a participação do apelante no roubo. ' Assim, tenho que o conjunto probatório se afigura insuficiente para embasar uma convicção condenatória. A meu ver, o Ministério Público não se desincumbiu do ônus de provar a imputação feita ao réu, pairando dúvida quanto à sua responsabilidade, devendo, no caso, na ausência de certeza, jár -êdominar o princípio do in dublo pro reo. ; Vale observar tais precedentes: "Sentença condenatória. Necessidade da certeza dOcn e e da autoria. Estupro. Depoimento da vítima ão conclusivo. Para proiação de um decréto enal dê condenatório é indispensável prova robusta q certeza da existência do delito e seu autor. A íntima convicção do julga dor deve sempre se apoiar em' da dos objetivos indiscutíveis. Caso contrário, trandorma o principio do livre convencimento em arbítrio. Na situação, como afirmou a magistrada, após análise da prova produzi da no contraditório, entendo que, diante do quadro probatório supra apreciado, os fatos não restaram esclarecidos, ainda mais se for considerado que o relato na época pode ter sido movido pela intenção de retirar Alexandre de casa, já que consumia drogas e havia se envolvido com delitos contra o patrimônio. A prova deve trazer ao juízo certeza cristalina para que Apelação Crimina/ no 046.2009.001601-8/002 6 culmine com a condenação. Não é o caso dos autosjjá que a dúvida permanece e deixa margens aos inúmeros subjetivismos demonstrados supra. Decisão: arielo ministerial desprovido. Unânime." (APELAÇAO CRIME N° 70008098055, OITAVA CÂMARA CRIMINAL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: SYLVIO BAPTISTA NErp, JULGADOEM 19/05/2004). • "ADOLESCENTE - Ato infracional equivalente ao crime de estupro com violência presumida - Vítima surda-muda - Ausência de prova concreta de ter o infrator se utilizado de violência real - Falta, também, de comprovação da total incapacidade da vítima de consentir no ato sexual - Absolvição que se impõe --_pecisão monocrática reformada - Apelo provido. - No processo criminal vigora o princípio, segundo o qual, para alicerçar um decreto condenatório, a prova deve ser coerente, positiva e indiscutível, não bastando a alta probabilidade acerca do delito e da autoria. Persistindo a dúvida, mínima que seja, impõe-se a absolvição pelo princípio do in dubio pro reo. - Nesse sentir, não demonstrando prova, com a clareza necessária, que o adolescenté representado manteve congresso carnal forçado com a vítima, nem que ela, que é surda-muda, era inteiramente incapaz de compreender ou de • autogovernar-se, retirando-lhe, assim, a capacidade de consentir no ato sexual, impõe-se a absolvição:do infrator." (Apelação Criminal n°888.2004.0042609/001 Rel. Des. Raphael Carneiro Arnaud.. Jul. 24/8/2004: DJ. 27/8/2004). Finalmente, é imperioso salientar que, embora não restem dúvidas de que a vítima, após grave ameça, teve sua motocicleta roubada; é duvidosa a autoria do delito. Assim sendo, -rião há como negar o benefício da dúvida ao réu. Ainda que se admitisse ser muito provável - não seria prudente empregar esse adjetivo - a autoria do réu ; isto não seria base suficiente 'para a formação do juízo de certeza buscado, pois o que é muito provável em um sentido, ainda' é provável, ainda que menos, no sentido oposto. A probabilidade pertence ao pantanoso terreno da dúvida, que precede o solo firme da.certeza. Dessa forma, ante o omissivo contexto da pro a, que traz mais dúvidas do que certezas, com supedâneo no princípio humanitário do in s bio prd reo e em desarmonia com o parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, dou .rovimento ao recurso para absolver o acusado Rodrigo Dias de Sousa, com força no art 386, inc. VII, do CPP. Expeça-se o competente Alvará de Soltu •se por c"iutro motivo não deva permanecer preso o apelante. Apelação Criminal no 046,2009.001601-8/002 É o meu voto. • ,.. . Presidi ao julgamento, com voto, dele participando, alér'cle mim, Relatar, o Desembargador 3oás de Brito Pereira Filho e o Dr. José Guedes Cavalcanti Neto (Juiz de Direito convocado para substituir o Desembargador Arnóbio Alves Teodósio). ...t Presente à sessão de julgamento o Excelentíssimo Senhor Doutor Álvaro Cristina Pinto Gadelha Campos, Procurador de Justiça. Sala de Sessões "Des. Manoel Taigy de Queiroz Melo Fitho" da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, em João Pessoa, a .c) 12 (doze) dias do mês de abril do ano de 2011. • João Pessoa, 20 de abril de 2011 2"R181..iNAL DE J1.1;)ii '' , G* érienacbaria kflicitei:,-. ,::\ .... ra io . .. •