ISSN 2176-6983
AFINAL, O QUE É A TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO
FRANCISCO: OS DESAFIOS EXISTENTES
Elisabete Cardoso Ferreira
[email protected]
Eixo Temático 4: conflitos de usos e gestão de recursos hídricos no litoral
brasileiro
Resumo
O presente trabalho aborda a problemática da transposição do rio São Francisco
e quais são os impactos gerados por esse projeto. Tendo em vista a sua dinâmica
ambiental, biodiversidade, histórico regional, além do seu cenário ambiental decorrentes
das ações humanas. Visando compreender melhor essa dinâmica nosso texto tenta
resgatar historicamente a trajetória dessa bacia hidrográfica e quais são seus impactos na
tentativa de entender melhor seus dilemas e possibilidades na tentativa de alinhar o
desenvolvimento socioambiental e uma melhor maneira de gestão desta bacia
hidrográfica.
Palavras-chave: Desenvolvimento socioambiental; regional e biodiversidade.
Introdução
O estudo apresentado tem como objetivo tecer uma breve analise a respeito da
problemática da transposição do rio São Francisco. O projeto de transposição do rio é
debatido e discutido a mais de um século e continua gerando polêmica. Consideramos
que compreender a complexidade de toda essa dinâmica social e ambiental nos
possibilita um olhar mais critico sobre esta temática.
De acordo com os defensores do projeto, a transposição tem como base resolver
o problema da falta de água do semiárido nordestino, todavia os críticos deste projeto
detêm-se a uma discussão sobre os méritos de sustentabilidade do atual projeto e
defendem uma transposição socialmente sustentável.
Visando compreender melhor essa dinâmica nosso texto tenta resgatar
historicamente a trajetória dessa bacia hidrográfica e quais são seus impactos na
tentativa de entender melhor seus dilemas e possibilidades dentro desse espaço
geográfico.
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Do “velho Chico” ao “Novo olhar”. Um resgate histórico sobre o Rio São
Francisco.
As grandes secas existentes no nordeste se penduraram durante grandes
períodos. No século XVIII, entre os anos de 1777 a 1779, a falta de água no semiárido
nordestino trouxe grande preocupação para a Corte Imperial. Foi um período de grandes
impactos para as famílias nordestinas, pois milhares de vidas estavam sendo ceifadas
devido à falta de reserva de água.
Foi em 1820 que D.João VI perante está situação drástica, sentiu a necessidade
de abrir um canal do rio São Francisco para Jaguaribe, já considerando a falta de recurso
hídrico que o Nordeste podia vir a sofrer.
Os sertanejos com toda a sua criatividade criaram pequenos barramentos no leito
do rio e nos seus afluentes para juntar água. Nos países asiáticos esse processo já era
bem conhecido, já existiam açudes de reserva de águas construídos com técnicas bem
elaboradas. Como não tínhamos meios de comunicação com esses povos, nada
sabíamos por aqui.
Os açudes surgiram em grande escala em inúmeras propriedades, sendo uns
pequenos e outros grandes. Devido à forte radiação solar os sertanejos tinham uma
técnica de proteger as suas águas contra a evaporação.
Em função da seca de 1877 a 79 no período imperial, na segunda metade do
século XIX, nasce com a comissão Cientifica de Exploração, chefiada por (Barão de
Capanema) a proposta política de construções de açudes e a integração do rio são
Francisco aos rios do nordeste setentrional.
Foi nessa seca avassaladora que houve uma emigração em massa de nordestino
para a Amazônia em busca de melhor condição de vida. Foi um desastre social de
grande escala morrendo aproximadamente mais de 500.000 mil vidas em toda a região
do Nordeste.
A partir desde desastre que diversos setores da sociedade e o Poder Público,
perceberam a importância dos açudes como solução para salvar vidas. Os reservatórios
tinham novas técnicas e melhoravam a cada dia. Desta forma o povo nordestino tentava
resgatar e construir uma nova vida no sertão brasileiro.
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Surgiu à parceria das autoridades publicas com pequenos proprietários de terras,
tendo o governo, a maior participação nessa cooperação. Foi uma grande ajuda aos
fundiários, minimizando os terríveis efeitos da seca.
Com a implementação dos açudes o nordeste foi se modificando, tendo a partir
dessa estruturação uma nova maneira de viver.
Já no século XX a infraestrutura hídrica teve um grande crescimento, a partir
desse momento, as estratégias das construções dos açudes, foram bem elaboradas na
intenção de amenizar o impacto. Não sendo o nordeste tão vulnerável a seca como era
antigamente.
Hoje devido os rápidos meios de comunicação, a facilidade de locomoção, as
redes de açudes construídas ao longo do século XX, e a facilidade de interligação entre
as regiões; remete-nos a um Nordeste bem desenvolvido, desconstruindo a imagem
chocante da seca no qual pertenceu ao seu passado.
O Rio São Francisco
Partindo das discussões de João Suassuna essa bacia hidrográfica mais
conhecida como Rio São Francisco, também conhecido como rio da integração
nacional, possui 2800 km de extensão. Nasce na serra da Canastra, em Minas Gerais,
cortando mais de quatro Estados da região do Nordeste, sendo eles; Bahia e
Pernambuco e desemboca no oceano atlântico entre Sergipe e Alagoas. No seu leito se
apresentam 1.800 km de área.
O rio leva esse nome devido ter sido descoberto por Américo Vespúcio em
outubro de 1501, dia de são Francisco, um ano antes do descobrimento do Brasil. O rio
era tão caudaloso, que os indígenas deram o nome de Opará, que significa “rio-mar”
nome esse característico, porque durante séculos seguidos as forças de suas águas eram
tão fortes que avançavam vários quilômetros oceano adentro.
É considerado o terceiro maior rio dos pais, tendo vazão media de
aproximadamente 2.850 m³/s, engloba regiões que apresentam condições naturais bem
diversificadas, a parte superior e inferior da bacia, apresentam bons índices
pluviométricos e fluviometricos, enquanto os seus afluentes atravessam áreas de climas
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seco e semiárido. Em Minas Gerais na nascente do rio tem um grande potencial
agrícola, especialmente para a agricultura irrigada.
Destacaremos algumas características geológicas e pedológicas dessa bacia
hidrográfica. O relevo tem estrutura de vale, sendo uma depressão bem alongada que se
inicia na serra da Canastra, na parte ao sul da bacia, tem como estruturas compartilhadas
a serra do Espinhaço a leste e a serra Geral de Goiás a oeste, tendo altitudes medianas.
Já o solo apresenta estrutura diversificada, desde solos argilosos a solos
arenosos. A camada de formação do solo tem presença de salinidade, ou areias puras,
sendo prejudicial a agricultura. Tanto as margens como ilhas são formados pelo
deslocamento de sedimentos advindo da parte superior do rio, sendo está área utilizada
pelos ribeirinhos para a plantação e cultivo da agricultura.
A vegetação em sua maioria é formada pelo cerrado e pela caatinga em sua
extensão encontramos áreas de matas, em zonas umidades árvores com copas densas
tendo boa precipitação e infiltração profunda no solo. Podemos citar como exemplo os
vales de rios em Minas gerais e na Bahia que apresentam em suas margens vegetações
altas e densas e com espécies de madeiras que são utilizadas por varias empresas
privadas. Há também no São Francisco um tipo de vegetação própria de terrenos
alagados onde na sua grande maioria disponibiliza frutos ou sementes para o sustento
dos peixes de agua doce.
A proposta de ser considerado o rio de integração nacional está inserida na
perspectiva de interligar está bacia a todas as regiões que o mesmo abrange, pois é
através desta via fluvial que o desenvolvimento do nordeste tem seu avanço econômico
e sua autonomia como “Estado”.
Essa bacia hidrográfica é composta por vários afluentes que deságuam em seu
leito e por inúmeras populações ribeirinhas que dependem desse rio para a sua
sobrevivência. Esse rio corta boa parte da região sudeste e nordeste do Brasil no sentido
norte e leste. Podendo ser observado no mapa 1 da figura 1:
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Figura 1: Bacia hidrográfica Rio São Francisco
Fonte: http://www.mi.gov.br/saofrancisco
A transposição
O projeto proposto pelo Poder Público tem a intenção de interligar as bacias do
rio são Francisco com os outros rios do nordeste setentrional que engloba os Estados do
Ceara, Rio do Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, e um pedaço de Pernambuco, obra
essa, que visa bombear as águas através de canais artificiais, promovendo a partir disso,
o uso sustentável dos recursos hídricos.
A proposta tem como objetivo levar a água por cerca de 720 km ao longo do
sertão nordestino, através da construção de um grande sistema de engenharia capaz de
bombear parte das águas do São Francisco, único grande rio que não seca na região
(perene), para o leito de alguns rios temporários. O projeto inclui reservatórios e
estações de bombeamento com a finalidade de distribuir a água pelo sertão nordestino,
propiciando, entre outras coisas, a instalação de polos agrícolas, como no caso das
cidades de Juazeiro e Petrolina.
O semiárido que corresponde o eixo leste do nordeste apresenta uma região com
elevado déficit hídrico e com grandes problemas de seca. Mesmo possuindo uma área
com precipitação pluviométrica considerável, o solo por ser formado por rochas
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cristalinas impedem a infiltração dessa chuva, dificultando a formação de mananciais. O
projeto consiste na construção de dois canais artificiais distintos – eixos Norte e Leste –,
destinados a ligar o rio ao semiárido setentrional. A água captada em Cabrobó (PE),
acima da ilha Assunção, e no reservatório de Itaparica, representando cerca de 3% do
volume do rio, seria então bombeada por 591 quilômetros de canais, dois aquedutos (20
quilômetros) e 12 túneis (22 quilômetros), e jogada nos rios da região até atingir uma
rede de 26 açudes.
Destacando o elevado custo que esse projeto vai ocasionar aos cofres públicos, o
Ministério da Integração nacional acredita e afirma que essa transposição vai beneficiar
milhões de pessoas, atendendo aproximadamente inúmeras cidades circunvizinhas. A
proposta da política governamental é disponibilizar recursos financeiros externos,
criando parcerias com empresas privadas e com os governos regionais.
Compreender a transferência de águas entre as bacias e perceber inúmeros
problemas que esse projeto pode acarretar, sendo necessária, uma transposição de forma
consciente e sustentável, para que não haja um impacto tão alarmante nessa bacia. Por
este motivo valem a pena ser implantados algumas considerações importantes no
desenvolvimento desse projeto. Sendo eles: Respeitar o leito do rio e seus afluentes,
tentar diminuir a perda de água potável, manter os sedimentos e seu nível de descargas
controladas, respeitar o sistema biológico do rio e manter a integração da ação humana
com essa bacia hidrográfica. Gerando com isso a revitalização desse rio.
A partir dessa temática existe toda uma analise dos fatores que precisam ser
respeitados em cada transposição, pois, é de suma importância que se respeite as
comunidades locais, os volumes de águas dos rios, a fauna e flora da região e a
qualidade da água transposta. Podemos perceber que toda e qualquer transposição
resultam em perdas para região doadora e ganhos para a região receptora, gerando um
grande conflito de interesse entre as partes.
A proposta da transposição por parte do Governo e manter grandes açudes que
futuramente receberão águas do rio são Francisco para resolver o problema da falta de
água no nordeste. Enquanto não existe nada definido, grandes estados sofrem com secas
existentes, pois os açudes não dão vazão à necessidade hídrica nordestina, devido ter um
grande processo de evaporação.
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Para que não haja um êxodo rural dessas famílias devido à falta de vida digna no
semiárido nordestino o importante é garantir o ordenamento hídrico dessa região. Esse é
o objetivo do projeto de integração da bacia do rio São Francisco com as bacias dos rios
intermitentes que envolvem o sertão da Paraíba, Pernambuco, Ceara.
Portanto o projeto de transposição tem que ser bem estruturados, respeitando os
aspectos econômicos e sociais do nordeste, entendendo que não adianta apenas transpor
as águas do rio sem entender a sua dinâmica. De fato está região precisa de mais água
do que podemos imaginar, o importante é respeitar o projeto de revitalização e
reestruturar os açudes existentes como forma de integração com a bacia principal.
Alguns apontamentos
Na atualidade percebemos que a água é um bem para todos, mais que nem todos
têm direito a esse bem. Sabemos também que é um dos principais elementos vitais para
a vida. Hoje a água que corre nos rios serve para abastecer as residências, para a
produção de alimentos, para a irrigação, para o uso em processos industriais e como
principal fonte de geração de energia elétrica. O rio são Francisco abrange todos esses
usos mencionados acima ao longo do seu curso.
A partir desta analise pensar a transposição como alternativa importante para
amenizar o impacto da falta de água no semiárido nordestino acaba sendo uma
alternativa viável para o povo sertanejo. A transposição não pode ser estruturada apenas
na tentativa de amenizar a falta d’água do povo nordestino, na verdade ela precisa ter
uma proposta bem organizada na intenção de resolver esta problemática, levando em
consideração, quais os impactos que esse projeto geraria ao Nordeste.
A transposição tinha que ser voltado apenas para atender o eixo leste do projeto,
por ser considerada a região mais dependente dessa água, mais infelizmente isso não vai
acontecer, se a transposição continuar pautada nos argumentos antigos está obra
gigantesca vai atender apenas os grandes latifundiários e os empresariados agrícolas que
visam apenas o seus interesses.
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Para que haja um projeto mais justo, é de suma importância, que o projeto da
transposição, seja reavaliado e restruturado, na tentativa de atender economicamente e
socialmente a região do semiárido nordestino.
Com essa iniciativa dos governantes o sertão nordestino se transformaria em um
polo agrícola, sendo a água irrigada para a fruticultura, gerando emprego e renda para a
região. Modelo esse que está presente no atual polo médio fruticultor do vale médio do
rio São Francisco onde fazendas modernas cultivam frutas de altíssima qualidade, e que
em sua maioria, são voltadas para a exportação para atender o mercado Europeu e o
Japonês. Desta forma a transposição resultaria em uma distribuição hídrica, capaz de
amenizar as mazelas sociais dessa região, e resultaria, em um avanço financeiro e
econômico do Nordeste.
Não se pode pensar em Transposição sem Revitalização
Pensar em transpor as águas do “Velho Chico” sem pensar em um projeto
paralelo de revitalização é gerar um grande desconforto para a região nordestina.
Revitalizar esta bacia é amenizar o processo de deterioração desse rio e pensar um
projeto mais assertivo.
A transposição não pode ser considerada uma das piores soluções para amenizar
o problema da seca do sertão, na verdade, ela precisa ser pautada em outros argumentos
na tentativa de atender o projeto como um todo.
Antes de desviar as águas do rio para a transposição o governo precisa ter um
projeto paralelo de recuperação ambiental com a iniciativa de melhorar a qualidade da
água desta bacia hidrográfica. Uma iniciativa importante seria o reflorestamento das
margens na tentativa de recuperação da mata ciliar, impedindo a erosão, que em muitos
pontos está entupindo os canais com barros e gerando assoreamento; causando
problemas para a navegação e diminuindo a concentração de espécies nativas. Outra
iniciativa que precisa está na nova pauta do projeto, é coletar e tratar o esgoto que
desaguam nessa bacia na intenção de diminuir a poluição.
Desta forma a revitalização entrelaçada com a transposição significaria uma
melhora na qualidade de vida dos sertanejos que esperam pela água prometida,
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amenizando o impacto nesta bacia, resultando com isso, um grande desenvolvimento
regional.
Considerações Finais
Podemos concluir que vários projetos foram criados na esperança de minimizar a
seca nordestina, mais o atual projeto, precisa ser restruturado na perspectiva de atender
a uma dinâmica ambiental mais completa.
É de suma importância garantir uma obra sustentável, sendo necessário um olhar
critico com relação ao processo de revitalização que hoje está presente. Sendo assim, a
proposta mais assertiva para o processo de revitalização, seria; um aumento da
qualidade da agua, a recuperação e preservação da fauna e da flora desse ambiente,
gerações de empregos, reflorestamento das nascentes e recuperação da mata ciliar, além
do tratamento de lixo e esgotos.
Um empreendimento com essa estrutura que envolve tanto os aspectos sociais,
políticos, econômicos e ambientais, necessitam de ações mais integradas para
restabelecer o desenvolvimento regional como um todo. A água como fonte politica
não gera desenvolvimento. É importante produzir racionalmente um olhar critico e
educar as pessoas para que haja novas ações.
Tem que ser feito uma transposição inteiramente responsável, respeitando o
principio das ações humanas e analisando o projeto como um todo.
Um empreendimento dessa estrutura tem que ter um processo de estruturação
bem delimitado, que organize, induza ações humanas em uma perspectiva regional e
local. Contribuindo para consolidá-la nas regiões que serão beneficiadas uma ação
participativa e integrada de toda essa proposta da transposição. Sendo assim, a
transposição é um projeto mais que viável, não na intenção de acabar com todos os
problemas do nordeste, mais na intenção de amenizar todos os impactos que a falta da
água vem gerando a esse povo.
Referências
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Alves, Filho. João. Toda a Verdade sobre a Transposição do Rio São
Francisco. Ed. Mauad X.
BRASIL (2005) Ministério da
www.integraçao. gov.br/SaoFrancisco).
Integração
Nacional
(disponível
em
MORAES, Antônio Carlos Robert de. Para pensar uma política nacional de
ordenamento territorial. Brasília: Ministério da Integração Nacional. p. 14-16. 2005
MAGALHÃES, P.C. (2005) A Transposição das Águas do Rio São Francisco
in Ciência Hoje. Instituto Ciência Hoje (SBPC),
Suassuna, João. Transposição do Rio São Francisco na Perspectiva do Brasil
Real. Ed. Porto de ideias
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