Saude_09.book Page 69 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM Biotransformação: importância e toxicidade Biotransformation: importance and toxicity RESUMO – A biotransformação de drogas é uma etapa primordial no processo de eliminação e diminuição da toxicidade. Entretanto, ela também é responsável pelo surgimento de metabólitos reativos intermediários, que se ligam às macromoléculas do organismo. Dependendo da estrutura e do tipo de ligação, diferentes efeitos patológicos poderão ocorrer, como necrose, fibrose, formação de imunógenos, mutagênese, carcinogênese e teratogênese. Este artigo mostra a importância da biotransformação, os sistemas enzimáticos envolvidos e os fenômenos de inibição e indução das enzimas, além de sinalizar os efeitos tóxicos que podem ocorrer após reações de biotransformação, sendo esse o lado “vil” da biotransformação. Palavras-chave: CITOCROMO P450 – INDUÇÃO E INIBIÇÃO ENZIMÁTICA – RADICAIS LIVRES. YOKO OSHIMA-FRANCO* Curso de Farmácia – Faculdade de Ciências da Saúde (UNIMEP/SP) LUIZ MADALENO FRANCO Curso de Farmácia – Faculdade de Ciências da Saúde (UNIMEP/SP) *Correspondências: Rua das Garças, 80 Nova Piracicaba – 13405-132 Piracicaba/SP E-mail: [email protected] Saúde em Revista BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE ABSTRACT – The biotransformation of drugs is an essential step in the process of elimination and reduction of toxicity. However, biotransformation is also responsible for the appearance of intermediary reactive metabolites, that bind to the organism’s macromolecules. Depending on the structure and the kind of binding, different pathological effects may occur, such as tissue necrosis, fibrosis, immunogenic formation, mutagenesis, carcinogenesis and teratogenesis. This article shows the importance of biotransformation, besides pointing out the toxic effects that may occur after the biotransformation reactions, which is its “mean” side. Keywords: CYTOCHROME P450 – ENZYMATIC INDUCTION AND INHIBITION – FREE RADICALS. 69 Saude_09.book Page 70 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM INTRODUÇÃO A exposição diária a uma variedade de compostos estranhos (xenobióticos) é capaz de levar à absorção deles através dos pulmões, da pele ou ingeridos, não intencionalmente, como contaminantes nos alimentos e na água ou, deliberadamente, na forma de medicamentos com fins terapêuticos ou não. A exposição a xenobióticos pode ser inadvertida e acidental, às vezes inevitável. Alguns são inofensivos; outros, porém, podem provocar respostas biológicas de natureza farmacológica ou tóxica. Essas respostas biológicas geralmente dependem da conversão da substância absorvida em um metabólito ativo ou não, com a finalidade principal de ser eliminada. Biotransformação é a alteração química sofrida pelo xenobiótico no organismo, comumente sob a ação de enzimas específicas e/ou inespecíficas (MEYER, 1996). Juntamente com os fenômenos de absorção, distribuição e excreção, ela participa da regulação de níveis plasmáticos de drogas. A biotransformação, portanto, é um processo alternativo, em que os metabólitos formados possuem propriedades diferentes das drogas originais, com características mais hidrofílicas, tendo por objetivo facilitar a excreção pelo organismo (MEYER, 1996). Contudo, nem sempre as drogas são inativadas; pelo contrário, alguns metabólitos apresentam atividade aumentada (por exemplo, codeína em morfina) ou propriedades tóxicas (entre elas, parathion em paraoxon), incluindo a mutagenicidade, a teratogenicidade e a carcinogenicidade. SISTEMAS ENZIMÁTICOS As enzimas são as responsáveis pelas reações de biotransformação e encontram-se presentes em todo o organismo (sangue, rins, pulmões, pele, tecido nervoso, intestino delgado e fígado). Embora elas estejam distribuídas em todo o organismo, o fígado é, sem dúvida, o órgão que mais as concentra (WATKINS, 1992). Testes bioquímicos realizados com o tecido hepático por centrifugações sucessivas permitiram constatar a presença de enzimas nas diferentes frações denominadas solúvel (desidrogenases, esterases, amidases e transferases), mitocondrial (monoamino oxidases) e microssomal (citocromos P450). SISTEMA MICROSSOMAL A fração hepática microssômica corresponde aos fragmentos dos retículos endoplasmáticos cen70 trifugados por 60 minutos a 150 mil G. As enzimas localizam-se predominantemente na superfície do retículo endoplasmático liso e constituem o sistema oxidase de função mista ou monoxigenases ou sistema citocromo P450 (BENET & SHEINER, 1987). Ele possui importantes funções metabólicas, além de ser o sistema de sentinela que primeiro apreende e inativa vários xenobióticos no organismo (fig. 1). Para uma droga ser metabolizada pelos microssomas, é necessário ser lipossolúvel, pois essa propriedade facilita a penetração dela no retículo endoplasmático e a sua ligação ao citocromo P450. Apesar de o fígado ser o principal órgão biotransformador, importa ressaltar que as enzimas microssomais expressam-se em vários outros tecidos, como pulmão e rins (LLAMA & AVENDAÑO, 1993; HONKAKOSKI & NEGHISHI, 1997; BUTLLETÍ GROC, 1999), pele, cérebro e intestino (WATKINS et al., 1987; PETERS & KREMERS, 1989). Os componentes do sistema P450 são: • citocromo P450: componente primordial do sistema enzimático oxidativo. Foi assim denominado por Omura & Sato (1964), porque o complexo formado com o monóxido de carbono apresentava um pico de aborção espectrofotométrica no comprimento de onda 450 nm. Essa enzima apresenta um núcleo pirrólico com o átomo de ferro à semelhança da hemoglobina, sendo considerada uma hemoproteína; • NADPH-citocromo P450 redutase ou NADPHcitocromo C redutase: enzima intermediária, flavoproteína, contendo quantidades equimolares de flavina monomucleotídio (FMN) e flavina adenina dinucleotídio (FAD). Um outro grupo enzimático, NADH-citocromo b5 redutase, acompanha o citocromo P450 e funciona como alternativa na transferência de elétrons, da fonte para o citocromo P450. Essas enzimas necessitam de um agente redutor, a nicotinamida adenina dinucleotídio fosfato (NADPH), e do oxigênio molecular. Consomese uma molécula de oxigênio por molécula de substrato, com um átomo de oxigênio aparecendo no produto e o outro, na forma de água (OGA et al., 1988; OGA, 1996). SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003 Saude_09.book Page 71 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM Figura 1. Reação de oxidação catalisada pelo citocromo P450 (fonte: OGA, 1996). Tabela 1. Principais isoformas do citocromo P450 (STRECK & DALLA COSTA, 1999). ISOFORMA CYP3A4 CYP2D6 CYP2C19 Alprazolam Amitriptilina Amitriptilina Clomipramina Astemizol Clozapina Amitriptilina Carbamazepina Codeína Citalopram Ciclosporina Debrisoquina Clomipramina Eritromicina Esparteína Diazepan Imipramina Fluvoxamina Imipramina Substratos Lidocaína Haloperidol Mefenitoína Midazolam Imipramina Omeprazol Lidocaína Metoprolol Proguanil Nifedipina Mianserina Tolbutamida Omeprazol Nortriptilina Varfarina Quinidina Paroxetina Terfenadina Propranolol Triazolam Marcadores Inibidores seletivos Indutores Polimorfismo genético Ciclosporina Eritromicina Midazolam Nifedipina Omeprazol Cetoconazol Claritromicina Eritromicina Fluoxetina Fluvoxamina Setralina Carbamazepina Dexametasona Etanol Fenitoína Fenobarbital Rifampicina Troleandomicina Não há estudos até o momento Saúde em Revista BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE CYP1A2 Amitriptilina Cafeína Clomipramina Clozapina Fluvoxamina Haloperidol Imipramina Paracetamol Propranolol Teofilina Varfarina Debrisoquina Esparteína Mefenitoína Omeprazol Cafeína Fenacetina Flufenazina Fluoxetina Paroxetina Quinidina Sertralina Fluoxetina Fluvoxamina Sertralina Fluvoxamina Rifampicina Barbitúricos Rifampicina Omeprazol Tabagismo Sim Sim Não há estudos até o momento 71 Saude_09.book Page 72 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM O substrato forma um complexo com a forma oxidada do citocromo P450, que recebe um elétron procedente do NADPH, via NADPH-citocromo P450 redutase. Esse elétron reduz o Fe3+ para Fe2+. O complexo, então, liga-se à molécula de O2 e capta mais um elétron procedente também do NADPH. Esse segundo elétron, às vezes, procede do NADH e é transportado pelo citocromo b5 redutase, de modo a desmembrar o O2 molecular em átomos de oxigênio, altamente reativos e instáveis (radical livre). Um radical livre é uma molécula ou fragmento molecular contendo um ou mais elétron não pareado em sua última camada orbital (GREGUS & KLAASSEN, 1995). Um desses átomos liga-se à droga, resultando em substrato oxidado, que se desliga do complexo enzimático. O outro átomo de oxigênio é utilizado na produção da molécula de água. A enzima, por sua vez, oxida-se para reiniciar o novo ciclo. Reduções ocorrem em condição de baixa concentração de oxigênio molecular. FATORES QUE AFETAM A VELOCIDADE DE BIOTRANSFORMAÇÃO A velocidade de biotransformação depende da concentração de citocromo P450, da proporção das isoformas, da afinidade pelo substrato, da redução do complexo droga-citocromo P450 e da competição entre substratos endógenos e exógenos. Estimase que o citocromo P450 apresente de 20 a 200 isoformas (RELLING & EVANS, 1992). Quatro delas (CYP3A4, CYP2D6, CYP2C19 e CYP1A2) foram mais estudadas por estarem relacionadas com a biotransformação de drogas. A tabela 1 discrimina os diferentes substratos, marcadores, inibidores, indutores e a ocorrência ou não de polimorfismo genético das diferentes isoformas. A velocidade da biotransformação também é afetada por outros fatores, como genéticos (polimorfismos), fisiológicos (doença, estado clínico, idade, sexo) e ambientais (poluentes e substâncias químicas industriais) ou por uso concomitante de outras drogas. Esses fatores podem levar a duas conseqüências antagônicas: inibição ou indução na velocidade de biotransformação, de suma importância no estabelecimento dos regimes terapêuticos (pososlogia). Inibição – A inibição pode ocorrer com todos os sistemas enzimáticos, microssomais e não microssomais. Algumas vezes ela é extremamente desejável, como no caso da terapia antidepressiva e uso dos 72 inibidores da monoamino-oxidase (IMAO) ou no da terapia antietílica e uso de inibidores da desidrogenase aldeídica (antabuse). Outras vezes a inibição é extremamente tóxica, como no caso da inibição da acetilcolinesterase, na intoxicação por praguicidas organofosforados e carbamatos. A competição entre os muitos substratos metabolizados pelas enzimas microssomais pode levar à inibição, assim como o fluxo sanguíneo hepático é capaz de se tornar o fator limitante da velocidade. A destruição do citocromo P450 por agentes hepatotóxicos ou pelo monóxido de carbono diminui o fluxo sanguíneo hepático de maneira crônica. As conseqüências da inibição correspondem a menor velocidade de biotransformação, aumento dos níveis do xenobiótico no organismo, aumento dos efeitos farmacológicos e maior incidência de toxicidade da droga (BENET & SCHEINER, 1987). Indução – A indução é um fenômeno particular às enzimas microssomais. São relatados dois tipos de indução (CORREIA, 1994). Ao primeiro pertence o fenobarbital, em que o aumento da atividade enzimática pode ser atribuído à síntese de citocromo P450, citocromo redutase e outras enzimas, à proliferação do retículo endoplasmático, ao aumento do peso hepático e ao aumento do fluxo sanguíneo e biliar e de outras proteínas hepáticas. Ao segundo tipo pertencem os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA) (GONZALEZ, 1988), por exemplo, 3,4-benzopireno em que ocorre aumento da síntese de proteínas, ao passo que o aumento no metabolismo de drogas limita-se a poucos substratos, não resulta em aumento na concentração dos citocromos P450 redutases e associa-se ao aparecimento de uma oxidase terminal qualitativamente diferente. Essa classe de indutor também pode acelerar a formação de intermediários reativos durante o metabolismo de outras drogas ou de compostos químicos ambientais. São as seguintes as conseqüências da indução: aumento da síntese de proteínas, maior velocidade de biotransformação, menor disponibilidade da droga original e aumento de toxicidade, no caso de drogas metabolizadas para formas reativas. Há diferenças entre os dois tipos de indução, especialmente quanto ao tempo de indução e duração da indução. No caso de anticonvulsivantes, a indução é lenta (no mínimo três dias) e a duração é curta (cinco a sete dias). No HPA, a indução é rápida (algumas horas) e a duração é longa (cinco a 12 dias). SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003 Saude_09.book Page 73 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM A indução causada por medicamentos pode ser benéfica, como na icterícia neonatal, causada pela excessiva quantidade de bilirrubina, que, por não ser conjugada e eliminada, atravessa a barreira hematoencefálica e produz uma forma de lesão cerebral conhecida como Kernicterus. Administra-se fenobarbital para induzir a glicuronil transferase, aumentando, assim, a conjugação de bilirrubina e, conseqüentemente, reduzindo o risco da doença. A indução causada por HPA, presente nos poluentes ambientais pode, por sua vez, trazer conseqüências indesejáveis, como a produção de oxidases terminais qualitativamente diferentes. BIOTRANSFORMAÇÃO E TOXICIDADE A biotransformação, tão importante para a excreção de substâncias, apresenta o seu lado perverso como resultado da oxidação microssômica. Os metabólitos tóxicos podem formar ligação covalente e/ou não-covalente com moléculas-alvo. As interações não-covalentes, entre elas, a peroxidação lipídica, a produção de espécies tóxicas de oxigênio e as reações causadoras de alteração da concentração de glutation e modificação de grupos sulfidril, podem resultar em citotoxicidade. Já as interações covalentes de metabólitos reativos à proteína podem produzir um imunógeno; a ligação ao DNA pode causar carcinogênese e teratogênese. O paracetamol exemplifica vários dos mecanismos gerais de lesão celular, tanto para interação covalente (formação de adição e de imunógeno) como para as não-covalentes. Em doses terapêuticas, o paracetamol é normalmente excretado, conjugado ao ácido glicurônico ou ao sulfato. Pequenas quantidades, entretanto, são biotransformadas em metabólitos reativos intermediários (Nacetil-p-benzo-quinona-imina, NAPBQI), eliminados através do varredor nucleofílico, glutation (GSH), na forma de ácido mercaptúrico. Como o glutation tem suprimento limitado e ainda pode ser depletado (estresse oxidativo) por formação de adição entre NAPBQI e GSH (ligação covalente), a droga na forma de epóxido ou quinona pode atingir concentração suficiente para reagir com os constituintes celulares nucleofílicos (BOOBIS et al., 1989; NELSON & PEARSON, 1990). Sobrevém daí uma necrose hepática ou renal. A figura 2 ilustra as vias de metabolização do paracetamol. É importante ressaltar as propriedades analgésica e antitérmica do paracetamol, droga de Saúde em Revista BIOTRANSFORMAÇÃO: IMPORTÂNCIA E TOXICIDADE escolha em pacientes grávidas e em condições de afecções virais. A dose terapêutica para adultos é de 325-650 mg a cada 4-6 horas ou 1.000 mg 3-4 vezes/dia, não devendo exceder 4 g/dia, sob risco de hepatotoxicidade (LEIKIN & PALOUCEK, 19961997). A toxicidade com o paracetamol, portanto, pode ocorrer com quantidades de apenas 3-4 vezes a dose terapêutica. Os hidrocarbonetos policíclicos são indutores potentes do metabolismo microssômico e acarretam o acúmulo de quantidade relativamente pequena de intermediários reativos, que, presumivelmente, se intercalam na hélice do DNA e iniciam a carcinogênese. A figura 3 mostra a classificação dos carcinógenos químicos. Observe que carcinógenos genotóxicos (causadores de mutação no gene) podem ser primários (causam mutações diretamente) e secundários (após conversão em metabólitos reativos). Os carcinógenos epigenéticos são agentes que, por si só, não causam lesão genética. No entanto, aumentam a probabilidade de causar câncer (BARRET, 1992), por vários mecanismos, entre eles: aumento de concentrações efetoras do genotóxico, potencialização da metabolização do genotóxico, diminuição da desintoxicação de um genotóxico, inibição do reparo de DNA e aumento da proliferação de células com DNA danificado. PERSPECTIVAS Este artigo enfoca a importância da biotransformação, pois, se ela não ocorresse, o organismo seria um depósito de substâncias químicas estranhas por tempo indeterminado. Nesse sentido, as enzimas exercem um papel biológico de extrema importância, sobretudo as enzimas do citocromo P450, presentes nas membranas do retículo endoplasmático liso. A família de genes do citocromo P450 diversificou-se desde sua origem, há mais 3,5 bilhões de anos, para adaptar-se ao metabolismo de um número crescente de substâncias químicas ambientais, toxinas alimentares e drogas ingeridas diariamente (BENET et al., 1996). Essas enzimas apresentam uma particularidade fantástica: são passíveis de indução enzimática, além de inibição enzimática, comum a todas. Embora a indução enzimática ocorra com alguns medicamentos, esse aspecto tem relevância na exposição aos poluentes químicos, pois as reações de biotransformação catalisadas por enzimas microssomais podem levar à formação de uma oxidase terminal qualitativamente diferente. 73 Saude_09.book Page 74 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM Figura 2. Metabolismo do paracetamol (fonte: BOOBIS et al., 1989; NELSON & PEARSON, 1990). Figura 3. Classificação de carcinógenos químicos (fonte: RANG & DALE, 1997). 74 SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003 Saude_09.book Page 75 Wednesday, September 3, 2003 10:20 AM Naturalmente o organismo dispõe de várias formas de neutralizar os metabólitos reativos intermediários formados nas reações de biotransformação ou na exposição a vírus, toxinas e radiações. Entre elas, destacam-se a deleção da célula danificada, por apoptose (morte celular programada) ou necrose, e a posterior substituição da célula danificada, por mitose. Mas se esses mecanismos falham, podem ocorrer necrose tecidual (requerendo, às vezes, amputação de membros), fibrose ou mutagênese (GREGUS & KLAASSEN, 1995). Já se sabe a necessidade da seqüência de quatro a seis mutações para a criação de uma célula cancerosa. O câncer é uma doença que afeta o gene (portanto, genética) e uma das mais temidas entre todas as doenças. Se falham os mecanismos de reparo e o de interrupção do ciclo mitótico, ocorrerá uma proliferação celular, totalmente incontrolável, tornando a célula imortal. Desse conceito de imortalidade surge um novo paradigma dessa doença, relatado pelo físico Kaku (2001), de que “envelhecer pode ser o preço que pagamos para nos proteger contra o câncer”. Nesse contexto, a exposição a novas substâncias químicas deve ser cuidadosa, incluindo-se aqui as drogas de abuso. Mortes têm ocorrido com drogas usadas com finalidade não médica, entre elas, o ecstasy e o 1,4-butanodiol (vendidos como estimulantes para clubbers e esportistas). Outro exemplo bastante comum, pelo uso socialmente aceito, é o acetaldeido, produto de biotransformação do álcool etílico e composto intermediário extremamente reativo, responsável também pelos efeitos deletérios causados pelo uso crônico do álcool. Some-se a esse cenário a exposição aos poluentes químicos, corantes e conservantes fenólicos. Assim, quer-se ressaltar que a ponte entre biotransformação e toxicidade é o metabólito reativo intermediário, ou radical livre, capaz de causar graves danos, como as mutações, que podem levar à perda de informação e, finalmente, ao câncer. Por fim, cabe chamar a atenção sobre a responsabilidade do uso de drogas, lícitas ou ilícitas, terapêuticas ou não, pois o organismo tem seus limites. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARRET, J.C. Mechanisms of action of known human carcinogens. 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Submetido: 15/abr./2002 Aprovado: 22/out./2002 76 SAÚDE REV., Piracicaba, 5(9): 69-76, 2003