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INCLUI CLASSIFICADOS
TERÇA-FEIRA, 19 DE FEVEREIRO DE 2013
Justiça
Administração
Chuva de verão
Júri de Gil Rugai começa
com perícia contestada
Haddad quer autorização
para cobrar veículos de fora
Temporal castiga zona leste,
para trens e fecha aeroporto
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Pág. C12
Pág. C7
O ESTADO DE S. PAULO
ALBERTO AUGUSTO/SIGMAPRESS
Metrópole
estadão.com.br
Exumação inédita de Dom Pedro I e suas
2 mulheres reconta detalhes da História
Exames foram feitos em sigilo no Hospital das Clínicas de fevereiro a setembro de 2012, como parte de mestrado apresentado ontem
OS MONARCAS
Dom Pedro I
Dona Leopoldina
(1798–1834)
(1797-1826)
✽ O primeiro
imperador
brasileiro teve
uma vida dividida
entre duas
pátrias, amantes,
batalhas e muita
velocidade sobre
seus cavalos
✽ A primeira
mulher de Dom
Pedro I nasceu em
Viena, na Áustria, e
ganhou a simpatia
dos brasileiros por
sua fama de
caridosa, culta e
educada
Dona Amélia
(1812-1876)
✽ Por ter vivido
pouco tempo
no Brasil,
a segunda
mulher do
imperador
é uma
personagem
pouco
conhecida
por aqui
ARTE/ESTADÃO
Edison Veiga
Vitor Hugo Brandalise
Pela primeira vez em quase 180
anos,foramexumadosparaestudososrestosmortaisdeDomPedro I, o primeiro imperador brasileiro, e de suas duas mulheres:
as imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia.
Os exames – realizados em sigilo entre fevereiro e setembro
de 2012 pela historiadora e arqueóloga Valdirene do Carmo
Ambiel, com o apoio da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo – revelam fatos até
então desconhecidos da família
imperial brasileira e compõem
um retrato jamais visto dos personagens históricos, cujos corpos estão na cripta do Parque da
Independência,nazonasuldacidade, desde 1972.
A reportagem do Estado
acompanha os estudos de Valdirene desde 2010, quando a historiadora e arqueóloga conseguiu
autorização dos descendentes
da família imperial para exumar
os restos mortais. Ontem, ela
apresentou sua dissertação de
mestrado no Museu de Arqueologia e Etnologia da USP.
Agora se sabe que o imperador
tinha quatro costelas fraturadas
do lado esquerdo, o que praticamenteinutilizou umdeseus pulmões – fato que pode ter agravado a tuberculose que o matou,
aos36 anos,em1834.Os ferimentos constatados foram resultado
de dois acidentes a cavalo (queda e quebra de carruagem), em
1823 2 1829, ambos no Rio.
No caixão de Dom Pedro, nova surpresa: não havia nenhuma
comenda ou insígnia brasileira
entre as cinco medalhas encontradas.O primeiro imperador do
Brasil foi enterrado como general português, vestido com botas
de cavalaria, medalha que reproduzia a constituição de Portugal
e galões com formato da coroa
do país ibérico. A única referência ao período em que governou
o Brasil está na tampa de chum-
bo de um de seus três caixões: a
gravação Primeiro Imperador
doBrasil,aoladodeReidePortugal e Algarves.
Ao longo de três madrugadas,
os restos mortais da família imperial foram transportados da
cripta imperial, no Parque da Independência,àFaculdadedeMedicina da USP, na Avenida Doutor Arnaldo, onde passaram por
sessões de até cinco horas de tomografias e ressonância magnética. Pela primeira vez, o maior
complexo hospitalar do País foi
usado para pesquisar personagens históricos – na prática,
Dom Pedro I, Dona Leopoldina e
Dona Amélia foram transformados em ilustres pacientes, com
fichas cadastrais, equipe médica
e direito a bateria de exames.
No caso da segunda mulher de
Dom Pedro I, Dona Amélia de
Leuchtenberg, a descoberta
mais surpreendente veio antes
ainda de que fosse levada ao hospital: ao abrir o caixão, a arqueóloga descobriu que a imperatriz
estámumificada, fatoqueatéhoje era desconhecido em sua biografia. O corpo da imperatriz,
embora enegrecido, está preservado, inclusive cabelos, unhas e
cílios. Entre as mãos de pele intacta, ela segura um crucifixo de
madeira e metal (leia na C3).
O estudo também desmente a
versão histórica – já próxima da
categoria de “lenda” – de que a
primeiramulher,DonaLeopoldina, teria caído ou sido derrubada
por Dom Pedro de uma escada
no palácio da Quinta da Boa Vista, então residência da família
real. Segundo a versão, propalada por alguns historiadores, ela
teriafraturado o fêmur. Nas análises no Instituto de Radiologia
da USP, porém, não foi constatadanenhuma fratura nos ossosda
imperatriz.
Futuro. “Unimos as ciências hu-
●
Projeto multimídia
Todos os resultados da exumação da família imperial foram divulgados com exclusividade na
tarde de ontem pelo portal estadão.com.br. Além da cobertura
completa, infográficos revelam
detalhes da história do Brasil.
manas, exatas e biomédicas com
o objetivo de enriquecer a História do Brasil. A cripta imperial foi
transformada em laboratório de
especialidades, com profissionais usando os equipamentos
mais modernos em prol da pesquisahistórica”,disseapesquisadora, que trabalhou três anos
sob sigilo acadêmico. “O material coletado será útil para que as
pesquisas continuem em diversas áreas ao longo dos próximos
anos.”
Valdirene do Carmo Ambiel, historiadora e arqueóloga
‘Essa cripta marcou a minha vida desde pequena’
Pesquisadora enfrentou
três anos de burocracia e
conseguiu mobilizar
quase duas dezenas de
especialistas no estudo
Foram três anos de burocracia,
sabatinas minuciosas da família
imperial,“grandeesforçodeconvencimento”dequaseduasdezenas de especialistas de campos
tão diversos como Física, História e Medicina. Depois, com todas as partes de acordo, sete meses de trabalho diário na cripta
do Parque da Independência, no
Ipiranga, para fazer o primeiro
estudo arqueológico em restos
Terminada a primeira fase dos
trabalhos na cripta, ela se diz
“honradaporter sidoautorizada
a trabalhar ali” – e sente que era
“a pessoa certa” para capitanear
as pesquisas. “Todo mundo tem
seu lugar especial. O meu é esse,
a cripta imperial, um local que
marcouminhavidadesdepequena”, conta a pesquisadora, formada em História pelo Centro
Universitário Assunção (Unifai)
e que ontem defendeu seu mestrado pelo Museu de Arqueologia e Etnologia da USP. “Comentava quando trabalhávamos
aqui: era como se olhasse para o
corredor e visse aquela menininha no colo do pai, pedindo para
olhar o que havia na capela da
Dona Leopoldina, por quem
sempre tive admiração.”
A paixão por temas relacionados à monarquia vem da adolescência – um dos marcos em sua
vida profissional foi o primeiro
emprego,comoestagiárianaEmbaixada de Mônaco. “Me apaixonei pela maneira formal como
tratavam sua família real, o respeito que tinham. Uni com minha história no Ipiranga e entendi que fazia parte de mim”, conta
a pesquisadora – que costuma
usarbrincosquereproduzemordens do Brasil Império. “A meta
agora é finalmente acabar com
os problemas de infiltração que
tanto prejudicaram o lugar nos
últimos anos.” / E.V. e V.H.B.
1.
Dom Pedro I foi realmente
enterrado – e não cremado,
como diz texto no Monumento à
Independência, no Ipiranga.
A 2ª mulher de Dom Pedro,
Dona Amélia de Leuchtenberg, foi mumificada.
Dona Leopoldina não quebrou o fêmur. Dizia-se que
ela teria caído – ou sido derrubada por Dom Pedro – de uma escada e sofrido grave fratura, que
teria culminado em sua morte.
Dom Pedro I teve fraturas
em quatro costelas. A causa seria duas quedas de cavalo.
Dona Leopoldina foi enterrada com a roupa com que foi
coroada imperatriz e com brincos de ouro com gemas que, em
vez de diamante, eram resina.
Dom Pedro I foi enterrado
como Dom Pedro IV de Portugal, com insígnias portuguesas, sem referência ao passado
brasileiro.
Ao morrer, aos 66 anos,
Dona Amélia tinha escoliose severa e osteoporose.
Dom Pedro I era menor do
que se supunha. Com 1,66
m a 1,73 m, era alto para um português da época, mas de médio a
baixo para um brasileiro atual.
Dom Pedro I foi enterrado
com solo do Porto, de Portugal. Foi possivelmente uma homenagem por ter liderado o Cerco do Porto (1832-1833), episódio da guerra pelo trono português.
Dona Amélia foi enterrada toda de preto e guardou luto por 42 anos por Dom
Pedro.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
PERFIL
mortais de personagens históricos do País. E para realizar um
sonho pessoal.
A historiadora e arqueóloga
Valdirene do Carmo Ambiel, de
42 anos, nasceu no Ipiranga e
sempre viveu perto dali. Frequenta o parque desde a infância
e assistiu, aos 11 anos, à chegada
ao Ipiranga dos restos mortais
da imperatriz Amélia, em 1982.
“Muitagente nemsabe oque significa, o que há dentro desse monumento. Decidi fazer a pesquisa pensando que, se as pessoas
souberem melhor seu significado, valorizarão os personagens
históricosecobrarãoasautoridades para que preservem o que temos aqui.”
DEZ REVELAÇÕES
VICTOR HUGO MORI/ESTADÃO
9.
10.
Online. Veja vídeos da
exumação da família imperial
Dedicação. Valdirene, com o
crânio de Dom Pedro: paixão
por temas da monarquia
Na cripta. Como estavam
organizados os restos mortais
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ESP 13-02-19 C1 - Casa Imperial do Brasil