8º Congresso de Pós-Graduação NEGOCIAÇÃO NO SETOR EDUCACIONAL: UM ESTUDO DE CASO COM ACADÊMICOS INADIMPLENTES EM UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR DO INTERIOR DO ESTADO DE SÃO PAULO. Autor(es) THIAGO FLAVIO DE SOUZA Co-Autor(es) FERNANDA DE ANGELE FERREIRA Orientador(es) SILVIA HELENA CARVALHO RAMOS VALLADÃO DE CAMARGO 1. Introdução A ação de negociar acontece entre os seres humanos de maneira comum, às vezes de maneira imperceptível, e sua aplicabilidade pode ser observada no dia-a-dia, como na busca de satisfazer desejos e necessidades, onde em muitos casos estes não se caracterizam como os desejos e às necessidades de outras pessoas levando a importância de se estabelecer um acordo. 2. Objetivos O objetivo deste artigo está em identificar por meio de negociações realizadas com acadêmicos inadimplentes quais as práticas e processos utilizados pelos envolvidos para a obtenção de melhores resultados corroborando na redução da inadimplência. A instituição de ensino superior (IES) no qual o estudo foi realizado situa-se no interior do estado de São Paulo. 3. Desenvolvimento Conceitos de Negociação Na história, a negociação é um termo existente até mesmo antes do convívio da humanidade, mas sua conceituação é fundamentada por diversos autores (FISHER, URY e PATTON 1994; LEWICKI, SAUNDERS e MINTON 2002; MELLO 2003; MARTINELLI, VENTURA e MACHADO 2004; CAMARGO 2007). Um dos fatores que levaram a negociação a ser tratada recentemente encontra-se na razão de que se negocia sem a percepção de que ela exista. Kizzier e Donna (2009) consideram negociação um processo onde dois indivíduos ou grupos, almejam um acordo comum sobre necessidades ou idéias diferentes. A negociação aplica todo conhecimento encontrado no campo das comunicações, psicologia, sociologia, de políticas, e de resolução do conflito. Sempre que uma transação econômica ocorre ou uma disputa é estabelecida, a negociação acontece; por exemplo, quando os consumidores compram automóveis ou chefes negociam salários com seus empregados. Andrade, Alyrio e Macedo (2004, p. 80) e Sebenius (1998) conceituam negociação como um processo científico no momento que é estabelecido um problema conjunto que deve ser sanado: criar, reivindicar e sustentar um valor ao longo do tempo. No entanto conforme esse problema conjunto é resolvido, tanto a ciência como a arte se misturam, o que torna a atividade muito criativa e oportunista, observando o pedido de tudo o que é possível obter em determinada situação, onde a comunicação interpessoal é composta de arte e ciência. Saner (2002) cita que a negociação é uma atividade onde duas ou mais partes buscam chegar a um acordo para determinar o que cada uma deverá conceder, ou realizar, numa transação entre elas, destacando para isso alguns pontos importantes: duas ou mais partes, interesses comuns e incomuns, relacionamento espontâneo, distribuição ou trocas de recursos tangíveis ou intangíveis, processo sequencial e dinâmico, informação incompleta, valores e posições passíveis de mudança se afetados por influência. Para Scare e Martinelli (2001) a negociação é um conceito em constante formação, abrangendo o relacionamento e a satisfação mútua das partes envolvidas. Entretanto para os autores, ao longo da história, os objetivos do negociador foram fortemente modificados: onde no passado buscava-se a satisfação momentânea pelos resultados, nos tempos atuais almeja-se um relacionamento duradouro para que no decorrer do tempo as partes envolvidas se beneficiem do resultado das negociações. Conforme Brett (2000) a negociação é uma forma de interação social, onde duas ou mais partes buscam, por meio dessa ação mútua, solucionar objetivamente as divergências percebidas. Complementando Thompson (1998) comenta que negociação é um processo decisório onde duas ou mais pessoas relacionam-se, a fim de solucionar possíveis impasses existentes. O autor utiliza de três elementos principais para definir este conceito, e são eles: o julgamento, a interdependência e a cooperação. Considerando que todo mundo negocia algo a cada dia, Fisher; Ury e Patton (1994, p. 15) identificam a negociação como um meio básico de conseguir o que se quer de outrem. É uma comunicação bidirecional concebida para chegar a um acordo, quando ambas as partes possuem alguns interesses em comum e outros divergentes. Por meio dos conceitos tratados pelos autores, entende-se que a negociação passa a ser a relação entre dois ou mais indivíduos com interesses em comum ou até mesmo diferentes, na busca de atingir um acordo que satisfaça as necessidades em beneficio dos envolvidos. Processo de negociação O processo de negociação é extremamente complexo, visto que envolve pessoas e comportamento humano. Trata-se não apenas de estabelecer as diferenças entre as pessoas no que se refere a valores, objetivos, maneiras de pensar e de se conduzir numa negociação, mas também de estruturar um quadro de pensamento e tomada de decisão para as diferentes partes envolvidas no processo (MARTINELLI, VENTURA; MACHADO 2004, p. 40). De acordo com Matos (2003, p. 62) o processo da negociação, como metodologicamente o próprio autor elaborou, implica em seis passos essenciais como: abordagem, argumentação, superação de objeções, acordo, reforço e reabordagem. Já Saner (2002, p. 175) apresenta o processo de negociação em fases e rodadas divididas em quatro partes. Essas fases poderão ser consideradas cumpridas apenas quando toda a negociação for concluída. Dentre as fases estão: o aquecimento (preparação), apresentações das posições (objetivos), abordagem (criatividade e soluções) e conclusão ou rompimento. O processo de negociação baseado em Martinelli e Almeida (1997) inicia-se com as entradas (influências) que se caracterizam por diferentes aspectos relacionados às partes que negociam, onde após o processo (negociação) serão constituídas as saídas (consequências ou resultados). De acordo com Martinelli, Ventura e Machado (2004, p. 191) os processos de negociação são constituídos de quatro aspectos em sua totalidade: alvo - o que se deseja que o receptor compreenda ou faça como resultado da comunicação; método - existem diversos métodos ou canais de comunicação, onde as vantagens ou desvantagens desse método devem ser ponderadas para se escolher o melhor; estrutura - é importante uma boa estruturação, realizada da maneira mais adequada ao tipo da comunicação e do objetivo; feedback - é o que vai determinar se a mensagem foi recebida e qual a emoção causada no receptor. Procedimentos Metodológicos A presente pesquisa compreende num estudo de caso, visto que os interesses dos pesquisadores abordaram uma única instituição. Os critérios tanto para a seleção da instituição como da amostra, são de caráter não-probabilístico, onde foram escolhidos por meio de uma amostragem por conveniência. A escolha da instituição de ensino superior foi intencional, haja vista que a mesma apresenta condições que corroboraram para o desenvolvimento deste estudo, condições estas evidenciadas por meio de informações concedidas pela IES na busca de encontrar soluções no âmbito científico. 4. Resultado e Discussão Negociação 01 O aluno A matriculado no 7º semestre do curso de administração, devendo finalizá-lo em dezembro de 2009, em entrevista no dia 06.07.2009 durante sua matrícula para o semestre seguinte, informou à IES que possuía dificuldades financeiras, pois atualmente passava por problemas em sua família. Durante a negociação foi informado ao aluno que 50% de sua pendência financeira (R$1.148,85) deveria ser quitada à vista e o restante poderia ser dividido em até cinco parcelas com vencimento todo o dia 10 dos meses de agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro. O negociador da IES propôs ao aluno a seguinte condição: a) pagamento de 50% da dívida à vista, dia 06.07.2009, no valor total de R$ 1.148,85; b) o restante em cinco parcelas de R$ 229,77, com vencimento todo dia 10 dos cinco meses consecutivos; c) e o pagamento da mensalidade referente à matrícula do próximo semestre no valor de R$ 438,00 à vista, no dia 06.07.2009. Após a proposta do negociador da IES o aluno relatou que não teria condições de pagar os 50% à vista de sua dívida. O negociador informou que o pagamento poderia ser realizado por meio do cheque à vista, mas o aluno argumentou que não adiantaria, pois os cheques não teriam fundos para que fossem compensados na data. Diante das dificuldades encontradas, o aluno cogitou a possibilidade de trancar a sua matrícula. O negociador buscando uma forma que atendesse melhor ao aluno comunicou que o pagamento via cartão de crédito também poderia ser feito. Assim foi a preferência do aluno que sugeriu a seguinte forma de pagamento: a) pagamento à vista, dia 06.07.2009, por meio do cartão no valor total de R$ 1.148,85; b) cinco parcelas de R$ 229,70, por meio de cheque com vencimento todo dia 10 dos cinco meses consecutivos; c) e o pagamento de R$ 438,00 à vista, dia 06.07.2009, referente à matrícula para o próximo semestre. Essa negociação foi bem aceita pelo aluno, pois o mesmo relatou possuir condições financeiras de arcar com a proposta da IES e ainda conseguirá se equilibrar melhor financeiramente. Negociação 2 O aluno B encontra-se atualmente cumprindo algumas dependências e possui cinco mensalidades em atraso, precisamente dos meses de fevereiro, março, abril, maio e junho de 2009. Perante as novas regras financeiras adotadas pela IES, a proposta para essa negociação foi: a) pagamento de 50% da dívida à vista no valor de R$ 1.033,22; b) o restante em até cinco parcelas no valor de R$ 206,65 por meio de cheque/nota promissória com vencimento todo dia 10 iniciando no mês de agosto com término em dezembro de 2009; c) pagamento à vista no valor de R$ 394,20 referente à matrícula do próximo semestre. Porém o negociador analisou o histórico financeiro do aluno e detectou que o mesmo nunca deixou de cumprir com suas obrigações em dia. A partir daí avaliou-se uma contra proposta do aluno para que sua pendência financeira seja quitada. O aluno por sua vez propôs: a) fazer o parcelamento em cinco vezes de R$ 413,00 com vencimento todo dia 10 a partir de setembro de 2009 ou; b) parcelar em seis vezes de R$ 344,00 com vencimento todo dia 10 a partir de agosto de 2009. Dessa forma a proposta do aluno B foi enviada a Reitoria para avaliação, onde por sua vez identificou: a) o aluno B possui um histórico financeiro que transmite comprometimento quanto ao pagamento de suas parcelas vencidas; b) a grande preocupação quanto o parcelamento em mais de cinco parcelas é qual será a situação da aluna no próximo semestre (ativo ou passivo). Mesmo considerando o histórico financeiro do aluno B a IES não permite que as dividas parceladas ultrapassem o mês de dezembro, devido à matrícula realizada no próximo semestre, ou seja, em janeiro de 2010. Assim a proposta efetuada pela IES foi: a) o parcelamento em cinco notas promissórias de R$ 413,20 iniciando no mês de agosto com término em dezembro de 2009. O aluno B considerou a forma de pagamento viável, pois para ele o pagamento em cinco parcelas facilitará a regularização da sua dívida e também relatou que conseguirá ficar em dia com as mensalidades do curso. 5. Considerações Finais Neste artigo abordou-se o tema negociação na busca de compreender suas funcionalidades, analisando-as em uma empresa prestadora de serviços educacionais. Nesse setor ficam evidentes certas dificuldades que os diferencia dos demais, tanto no que se refere ao seu cenário atual como no perfil dos clientes, que se demonstram cada vez menos comprometidos com as prioridades relacionadas à formação profissional. Apesar destas complicações, observa-se que poucas ações são desenvolvidas pelos gestores a fim de proporcionar ao seu alunado experiências e instruções de planejamento financeiro pessoal, tendo em vista a redução do acúmulo de dívidas. Por fim, destaca-se a importância e o êxito da negociação no processo de recuperação de créditos, defendendo o estilo integrativo, também conhecido como ganha x ganha, como sendo uma característica encontrada na maioria dos casos de negociação abordados neste artigo. Referências Bibliográficas ANDRADE, R. O. B. de; ALYRIO, R. 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