FUNDAÇÃO EDUCACIONAL SERRA DOS ÓRGÃOS CENTRO UNIVERSITÁRIO SERRA DOS ÓRGÃOS Centro de Ciências e Tecnologia Curso de Graduação em Matemática Análise I – 2012-1 Solução da 1ª Lista de Exercícios 1. ATENÇÃO: O enunciado correto é: Seja X ⊆ um subconjunto não vazio tal que n, m ∈ X ⇔ n + m ∈ X. Prove que existe k ∈ tal que X é o conjunto dos múltiplos de k. Solução: Pelo Princípio da Boa Ordenação, X tem um menor elemento k, ou seja, existe k∈X tal que k ≤ x para todo x∈X. Vamos mostrar por indução que nk∈X para todo n∈: de fato, 1⋅k = k∈X e, se nk∈X, então (n + 1)k = nk + k ∈ X. Portanto, {nk|n∈} ⊆ X. Vamos mostrar que vale a igualdade. Suponha, por absurdo, que existe x∈X que não é múltiplo de k. Então x ≠ k, logo, como k é o menor elemento, k < x. Pelo algoritmo de Euclides, existe um inteiro positivo q e um inteiro r tal que 0 ≤ r < k tal que x = qk + r. Mas x∈X, o que significa que qk + r∈X e, portanto, r∈X, o que contradiz o fato de que k é o menor elemento de X. Isto mostra que X é o conjunto dos múltiplos de k. 2. Vamos mostrar o resultado por indução no número de elementos do conjunto X. Suponha que X é um conjunto finito com n elementos. Se n = 0, então X é o conjunto vazio e seu único subconjunto é ele mesmo, ou seja, ℘(X) = {∅}, o que significa que |℘(X)| = 1 = 20 = 2|X|. Se n = 1, digamos X = {x1}, então ℘(X) = {∅, {x1}}, logo |℘(X)| = 2 = 21 = 2|X|. Suponha que o resultado é válido para um conjunto de n elementos, n ≥ 1, e seja X = {x1, …, xn, xn+1} um conjunto com n + 1 elementos. Então ℘(X) pode ser escrito como a união de dois conjuntos disjuntos ℘1 = {S ⊆ X| xn+1∉S } e ℘2 = {S ⊆ X| xn+1∈S }. Note que ℘1 = ℘({x1, …, xn}) tem 2n elementos pela hipótese de indução. Além disso, se S∈℘2, então S – {xn+1} ∈℘({x1, …, xn}) e, reciprocamente, se T∈℘({x1, …, xn}), então S = T ∪ {xn+1} ∈℘2. Então temos uma bijeção entre ℘2 e ℘({x1, …, xn}), o que significa que|℘2| = |℘({x1, …, xn})| = 2n. Como ℘1 e ℘2 são disjuntos, obtemos: |℘(X)| = |℘1| + |℘2| = 2n + 2n = 2n(1 + 1) = 2⋅2n = 2n+1 = 2|X|. Isso prova o resultado. 3. Defina a função ϕ: → {ímpares positivos} por ϕ(n) = 2n − 1. Então ϕ é sobrejetora, pois todo número ímpar positivo é da forma 2n – 1 para algum n natural. E ϕ também é injetora, pois ϕ(n) = ϕ(m) ⇒ 2n – 1 = 2m – 1 ⇒ n = m. Logo ϕ é uma bijeção. 4. Defina a função ϕ: → {quadrados perfeitos} por ϕ(n) = n2. Então ϕ é sobrejetora, pois todo quadrado perfeito n2 para algum n natural. E ϕ também é injetora, pois ϕ(n) = ϕ(m) ⇒ n2 = m2 ⇒ n = m, já que ambos são números positivos. Logo ϕ é uma bijeção. 5. Defina a função ϕ: → {m∈|m ≥ n} por ϕ(k) = n + k − 1. Como k ≥ 1, é claro que n + k – 1 ≥ n. Então ϕ é sobrejetora, pois todo m ≥ n ⇒ m – n ≥ 0 ⇒ m – n + 1 ≥ 1 ⇒ m – n + 1 = k ∈ ⇒ ϕ(k) = n + k – 1 = n + m – n + 1 – 1 = Análise I 2012-2 m. E ϕ também é injetora, pois ϕ(k) = ϕ(l) ⇒ n + k – 1 = n + l – 1 ⇒ k = l. Logo ϕ é uma bijeção. 6. Se A ⊆ B, então A ∪ B = B é um conjunto enumerável infinito. Se A não é um subconjunto de B, então A – A ∩ B é um subconjunto finito não vazio, digamos A – A ∩ B = {a1, …, an}. Como B é um conjunto enumerável infinito, existe uma bijeção entre e B; denotando a imagem do número natural k por bk, temos que B = {b1, b2, …, bk, bk+1, …}. Então A ∪ B = {a1, …, an, b1, b2, …}. Defina a função ϕ: → A ∪ B por ϕ(k) = ak se 1 ≤ k ≤ n e ϕ(k) = bk−n se k ≥ n + 1. É claro que ϕ é uma bijeção, o que prova que A ∪ B é um conjunto enumerável finito. 7. Se ambos forem finitos, já vimos que a união de conjuntos finitos é finita, logo A ∪ B é finito. Se um deles for finito e o outro for enumerável infinito, pelo Exercício 6 a união será um conjunto enumerável infinito. Só falta mostrar o caso em que ambos os conjuntos são enumeráveis infinitos. Suponha então que A e B são dois conjuntos enumeráveis infinitos. Se A ⊆ B, então A ∪ B = B é um conjunto enumerável infinito. Se A não é um subconjunto de B, então A – A ∩ B é um subconjunto de A que pode ser finito não vazio ou enumerável infinito. Se A – A ∩ B é um subconjunto finito e não vazio de A, então A ∪ B é enumerável infinito pelo Exercício 6. Se A – A ∩ B é um subconjunto enumerável infinito de A, então existe uma bijeção entre e A – A ∩ B. Denotando a imagem de n∈ sob esta bijeção por an, podemos escrever A – A ∩ B = {a1, …, an, …}, onde ai ≠ aj se i ≠ j. Analogamente, B = {b1, b2, …} com bi ≠ bj se i ≠ j. É claro que A – A ∩ B e B são conjuntos disjuntos e A ∪ B = (A – A ∩ B) ∪ B = {a1, b1, a2, b2, …}. Defina a função ϕ: → A ∪ B por ϕ(n) = a(n+1)/2 se n for ímpar e ϕ(n) = bn/2 se n for par. Como A – A ∩ B e B são conjuntos disjuntos, se n for par e m ímpar ou vice-versa, ϕ(n) ≠ ϕ(m); se n e m forem ímpares, ϕ(n) = ϕ(m) ⇒ a(n+1)/2 = a(m+1)/2 ⇒ (n + 1)/2 = (m + 1)/2 ⇒ n = m; se n e m forem pares, ϕ(n) = ϕ(m) ⇒ bn/2 = bm/2 ⇒ n/2 = m/2 ⇒ n = m. Isto mostra que ϕ é injetora. Para ver que ϕ é sobrejetora, seja a qualquer elemento de A – A ∩ B: então a = ak para algum k ∈, logo n = 2k − 1 ∈ e a = ϕ(2k − 1) = ϕ(n); analogamente, se b é qualquer elemento de B, então b = bk para algum k ∈, logo n = 2k∈ e b = ϕ(2k) = ϕ(n). Portanto, ϕ é uma bijeção e A ∪ B é um conjunto enumerável infinito. 8. Pelo Exercício 7, A enumerável e B enumerável ⇒ A ∪ B enumerável. Mas esta afirmação é equivalente à sua contrapositiva, ou seja, A ∪ B não enumerável ⇒ A não enumerável ou B não enumerável 9. Já vimos que o conjunto dos números reais não é enumerável e que o conjunto dos números racionais é enumerável. Denotando por o conjunto dos números irracionais, temos que = ∪ , logo, pelo Exercício 8, não é enumerável. 10. Construa uma bijeção entre o intervalo (0, 1) e a reta inteira. Uma função que tivesse o gráfico como na figura a seguir seria a bijeção desejada. 2 Análise I 2012-2 y 4 3 2 1 x 1 −1 −2 −3 −4 Este gráfico lembra um dos ramos do gráfico da tangente. Por exemplo, o gráfico da tangente no intervalo (−π/2, π/2) é y 4 3 2 1 x −π/2 −π/4 π/4 π/2 −1 −2 −3 −4 Então, para obter a equação do gráfico desejado, basta fazer a composição de duas bijeções: a primeira leva o intervalo (0, 1) no intervalo (−π/2, π/2) e a segunda é a tangente definida no intervalo (−π/2, π/2). y y 4 π/2 3 2 1 x x 1 −π/2 −π/4 π/4 π/2 −1 −2 −3 −π/2 −4 É claro que a equação da reta é y = πx − π/2, logo a bijeção desejada é ϕ: (0, 1) → , ϕ(x) = tan(πx − π/2). 11. Seja X um conjunto infinito. Então podemos escolher um ponto qualquer x1∈X. O conjunto X – {x1} é infinito, logo podemos escolher um elemento x2 ∈ X – {x1}. Uma vez escolhido n elementos distintos x1, …, xn ∈ X, o 3 Análise I 2012-2 conjunto X – {x1, …, xn} é um conjunto infinito e podemos escolher xn+1 ∈ X – {x1, …, xn}. Usando indução, podemos escolher xm∈X para cada m∈ e o conjunto E = {x1, x2, …} é um subconjunto enumerável infinito de X. 12. Seja X um conjunto qualquer. Então A é um subconjunto de X se e somente se todo elemento a∈A pertence a X. Em símbolos: (∀a∈A)[a∈X]. A negação desta proposição é (∃a∈A)[a∉X]. É claro que esta última proposição é sempre falsa para o conjunto vazio, o que significa que o conjunto vazio satisfaz (∀x∈∅)[x∈X] (por vacuidade, já que o conjunto vazio não tem elemento algum). Isso mostra que ∅ ⊆ X. 13. Suponha, por absurdo, que o conjunto das sequências infinitas de inteiros positivos é enumerável. Isto significa que existe uma bijeção entre e este conjunto; denotando a imagem de n∈ por xn, o conjunto das sequências infinitas de inteiros positivos é igual a {x1, x2, …, xn, xn+1, …}. Todas essas sequências são distintas. Escrevendo os elementos da sequência, obtemos x1 : x1,1 x1,2 x1,n x1,n +1 x2 : x 2,1 x 2,2 x 2,n x 2,n +1 xm : xm ,1 xm ,2 xm ,n xm ,n +1 xm +1 : xm +1,n xm +1,2 xm +1,n xm +1,n +1 O método de diagonalização de Cantor consiste em considerar a sequência formada pelos elementos na diagonal, ou seja, x1,1, x2,2, …, xn,n, …. Vamos modificar um pouco o método porque não sabemos se todos os xij são distintos, já que duas sequências distintas podem ter alguns elementos iguais. Seja y1 = x1,1. Como as sequências x1 e x2 são distintas, seja n o menor inteiro tal que x1,2 ≠ x2,n e escolha y2 = x2,n, de modo que x1,2 ≠ y2. Como as sequências x2 e x3 são distintas, seja n o menor inteiro tal que x2,3 ≠ x3,n e escolha y3 = x3,n, de modo que x2,3 ≠ y3. Uma vez escolhidos y1, y2, …, ym tais que xi,i+1 ≠ yi+1 para i = 1, …, m − 1, como as sequências xm e xm+1 são distintas, seja n o menor inteiro tal que xm,m+1 ≠ xm+1,n e escolha ym+1 = xm+1,n, de modo que xm,m+1 ≠ ym. Construímos assim uma sequência de inteiros positivos y: y1, y2, …, ym, ym+1, … que é diferente de todas as sequências xi, já que xi,i+1 ≠ yi para todos i∈, uma contradição, já que o conjunto {x1, x2, …} era suposto de conter todas as sequências de inteiros positivos. Portanto, o conjunto de todas as sequências de inteiros positivos não é enumerável. 14. Suponha que todos os quartos já estejam ocupados. Como o hotel tem um número infinito de quartos, pelo Exercício 11 existe um subconjunto enumerável do conjunto de todos os quartos, digamos q1, q2, …. Dado qualquer n∈, mesmo com todos os quartos ocupados podemos receber n pessoas (ou grupos que ficarão no mesmo quarto): de fato, basta transferir as pessoas do quarto q1 para o quarto qn+1, as pessoas do quarto q2 para o quarto qn+2, etc., ou seja, as pessoas no quarto qk serão transferidas para o quarto qk+n para todo k∈ e os quartos q1, q2, …, qn ficarão vazios para acomodar os novos hóspedes. 15. Demonstração (por absurdo) de que u + v é irracional: 4 Análise I 2012-2 Suponha, por absurdo, que u + v é racional. Mas então, como a diferença de racionais é racional e u é racional, v = (u + v) – u é racional, uma contradição. Demonstração (por absurdo) de que uv é irracional: Suponha, por absurdo, que uv é racional. Mas então, como o inverso de um racional não nulo é racional e o produto de racionais é racional, v = (uv)(1/u) é racional, uma contradição. 16. Suponha, por absurdo, que existe um número racional a tal que a2 = 12. Como a é racional, existem inteiros p e q, sem fatores comuns, com q > 0, tais que a = p/q. Temos: p2/q2 = 12 ⇒ p2 = 12q2 ⇒ 3 divide p2 ⇒ 3 divide p (pois 3 é primo) ⇒ 9 divide p2 = 12q2 ⇒ 3 divide 4q2 ⇒ 3 divide q2 (pois 3 não divide 4) ⇒ 3 divide q (pois 3 é primo), uma contradição, já que p e q não tinham fatores comuns. Logo, podemos concluir que não existe número racional a tal que a2 = 12. 17. Seja A um subconjunto não vazio dos números reais limitado inferiormente. Seja B = {–x| x∈A}. Prove que inf A = –sup B. 5. Já vimos que, se A é limitado inferiormente, então A tem ínfimo. Seja α = inf A e seja β = –α. Vamos mostrar que β = sup B. β é uma cota superior para B: De fato, dado y∈B, ∃x∈A tal que y = –x, ou seja, x = –y. Como α = inf A, −β = α ≤ x = −y. Multiplicando esta desigualdade por −1 < 0, obtemos y ≤ β . Se γ é outra cota superior para B, então β ≤ γ: De fato, suponha que γ é outra cota superior para B. Dado x∈A, seja y = −x. Então: y∈B ⇒ −x = y ≤ γ ⇒ −γ ≤ x ⇒ (pois α = inf A) −γ ≤ α = −β ⇒ β ≤ γ. Portanto, β é a menor cota superior de B, ou seja, β = sup B. 5