MATÉRIA DE CAPA
CONSIDERAÇÕES SOBRE A MAIORIDADE
PENAL E MUDANÇAS NO ECA
“Se o jovem pode votar a partir dos 16 anos, praticar sexo consentido a partir dos 14 e, agora, optar
pela cirurgia de mudança de sexo, por que não pode responder pelos atos criminais que pratica?
Neste caso, a balança da justiça está em total desequilíbrio. Não há mais como aceitar essa situação!”
F
„„ por Marisa Rita Riello Deppman
alar sobre a redução da maioridade penal e possíveis mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente, neste momento em que vivo, após meu
filho ser brutal e covardemente executado por
um adolescente autor de ato infracional, que fez
18 anos três dias após cometer o latrocínio, sem qualquer
ranço de parcialidade, é muito difícil.
O tema é bastante controvertido, mas merece um estudo
sério e balizado de nossos governantes, diante das barbáries que estão sendo praticadas pelos ditos popularmente
“de menor”, pela certeza de sua impunidade.
Várias são as propostas de Emenda à Constituição que
tramitam no Congresso Nacional visando à redução da
maioridade penal, mas, por ser um tema controvertido e
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revista JURÍDICA consulex - ano xviI - nº 392 - 15 DE maio/2013
historicamente imutável pelo Partido que hoje governa o
Brasil, não é apreciado com a atenção que merece.
Começando pela nossa Presidente Dilma, passando
pelo Secretário-Geral do Governo Gilberto Carvalho
e, ainda, pelo nosso Ministro da Justiça, José Eduardo
Cardoso, bem como por vários deputados e senadores
do Legislativo Federal, todos eles se declaram contra a
redução da maioridade penal, justificando, no meu
entender, de forma simplória, que nosso sistema prisional
está falido e não pode absorver mais essa gama de criminosos de 16 e 17 anos.
Diante dessa assertiva pergunto: Se o sistema está falido,
o que os senhores farão para colocá-lo em condições de
ressocialização do preso? Creio que o poder e a vontade de
PIXMAC
JUSTIÇA, REFORMA!
resolver esse problema é dos senhores que estão governando
nosso Brasil. O que estão esperando para fazê-lo?
Interpreto essa torpe justificativa como “os adolescentes em
conflito com a lei podem cometer qualquer atrocidade, mas
não podem ser presos porque a cadeia é ruim”. Foi-lhes dado
pelos nossos governantes licença para a prática do crime, pois
eles têm certeza da impunidade.
Desculpem-me, mas isso é inaceitável. A bandidagem toma
conta de nossa sociedade, o medo impera na esfera familiar nos tornando reféns de uma situação que há muito pede
para ser discutida, legislada e combatida. De forma alguma
desejo que isso aconteça com outra família, mas será que é
preciso acontecer com alguém “do poder” para que se tome
uma providência?
Em recente pesquisa publicada pelo Jornal O Estado de
S. Paulo, apontou-se que, nos últimos dez anos, houve um
aumento da criminalidade, entre adolescentes em conflito com
a lei de 16 e 17 anos, de 141%; enquanto que entre os maiores
de 18 anos, de 41%. Esse dado deixa muito claro que os jovens
de 16 e 17 anos passaram a ser a longa manus do crime organizado, que os arma e os coloca na linha de frente pois sabe que,
no máximo, cumpririam três anos de medida socioeducativa.
Até quando a sociedade vai ter que conviver com esse estado
de coisas? Importante ressaltar que a postura do Governo
Federal de complacência motiva o pleito de indenização por
danos morais e materiais, haja vista que a omissão por ato ilícito
é indenizável. É dever constitucional do Estado o de garantir a
segurança do cidadão, sendo responsabilidade objetiva indenizar a família da vítima.
O Governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin,
encaminhou, recentemente, o Projeto de Lei nº 5.385/13 ao
Congresso Nacional, o qual pretende alterar o Código Penal, o
ECA e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, para
em bases gerais: (i) alterar o tempo de internação do adolescente em conflito com a lei de acordo com o crime cometido;
(ii) avaliar seus antecedentes; e (iii) encaminhar o adolescente
autor de ato infracional que completa 18 anos para internação
em estabelecimento educacional com maior contenção, em
Regime Especial de Atendimento.
O Governador busca dar uma solução ao problema dos crimes
de maior potencial ofensivo praticado por adolecentes; ele fez
a sua parte, resta aos senhores congressistas fazerem a deles.
Não sou uma pessoa alienada e, apesar da dor que sinto, sei
que somente isso não basta. Tenho dito reiteradas vezes que
é necessário investir na educação, no combate às drogas e ao
armamento, e em medidas sociais na periferia, atividades de
lazer e cultura, para não permitir que o jovem seja cooptado
pelo crime organizado. De forma concomitante, também é
preciso aprovar medidas que coíbam de forma drástica os
crimes cometidos por adolescentes entre 16 e 17 anos. Eles
têm que ter receio da punição que vão receber. Será que o bandido que executou meu filho o faria se soubesse que teria
que cumprir pena de até 30 anos, e não medida socioeducativa de três anos?
Também, entendo que não se deve levar a discussão sobre a
maioridade penal para o campo da “luta de classes”, pelo que
dizem que meu filho teve oportunidades para ser uma pessoa
de bem; e seu assassino, por ser negro e pobre, não tinha alternativas de vida, então, partiu para o crime. Essa teoria “do pobre
coitado” não se justifica, pois se pensarmos dessa forma, todos
os pobres serão criminosos em potencial, e não posso, de forma
alguma, concordar com isso, pois conheço e admiro várias
pessoas que se incluem nesse grupo social. A falta de família,
de valores cristãos, de valores morais, leva qualquer jovem, de
qualquer classe social, para o crime. Tudo é questão de índole
criminosa ou não.
Ideologias utópicas de esquerda tentam nos fazer ver
que o ECA não deve ser alterado, que a maioridade penal
não deve ser reduzida, pois apenas uma ínfima minoria de
adolescentes comete crimes hediondos. Como pessoas com
tal entendimento conseguem pôr a cabeça no travesseiro
e dormir de forma tranquila sabendo que alguém pode ser
morto com requintes de crueldade por um adolescente em
conflito com a lei? Se a mudança do ECA e a redução da maioridade penal puderem salvar apenas uma vida, já terão valido.
Outro grupo diz que não se deve praticar mudanças no
calor da emoção, mas se não for nesse momento de indignação
nacional, em que ficamos estupefatos diante da imagem da
barbárie e que temos, sim, o dever de cobrar de nossos governantes que medidas urgentes e sérias sejam tomadas, em que
momento seria então?
Se o jovem pode votar a partir dos 16 anos, praticar sexo consentido a partir dos 14 (vide Lei nº 12.594/12) e, agora, optar pela
cirurgia de mudança de sexo, por que não pode responder pelos
atos criminais que pratica? Nesse caso, a balança da justiça está
em total desequilíbrio. Não há mais como aceitar essa situação!
Para ilustrar o pedido popular de mudanças na maioridade penal e no ECA, pesquisa publicada recentemente pelo
Instituto Datafolha mostra que 93% dos paulistas são a favor
da redução da maioridade penal, e, ainda, na enquete feita
durante o programa Encontro, em que o tema foi debatido em
rede de televisão (Globo), tínhamos um total de 83% de brasileiros favoráveis à redução da maioridade penal.
“O copo transbordou”. As autoridades federais não podem
mais se fazer de “surdas” ao clamor da sociedade que pede
justiça, reforma, até porque foram eleitos pelos cidadãos para
serem sua voz no Legislativo Federal.
Como mãe e cidadã desse país, que perdeu seu filho pelas
mãos de um adolescente autor de ato infracional, exijo dos
nossos legisladores federais, lá colocados por força do voto,
que aprovem medidas urgentes e emergenciais para que outros
“Victor Hugo Deppman” não percam suas vidas desta maneira.
Por fim, exijo que nossa Presidente Dilma governe para
o povo que a elegeu, e não para as ideologias utópicas do
seu Partido político. Vivemos em um Estado Democrático de
Direito, em que a voz do povo deve e tem que ser ouvida pelos
governantes, sob pena de a dita democracia sucumbir ante a
imposição de valores partidários.
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luto
MARISA RITA RIELLO DEPPMAN é Advogada. Mãe do jovem Victor Hugo Deppman.
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