20 anos de PSDB em São Paulo
a consolidação da política neoliberal na educação
Ivan Valente deputado federal
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20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
Sumário
Introdução
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A municipalização do ensino e a política de fundos para o financiamento
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Ensino Superior e formação de professores
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Avaliação em larga escala como centro da política educacional
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Compreensão do papel dos educadores e estudantes
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Há outra forma de governar!
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Introdução
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20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
O Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB – chega a cinco mandatos
consecutivos à frente do governo do estado de São Paulo, e não pode alegar falta de
tempo e descontinuidade para executar um plano de governo. Pelo contrário, são quase
20 anos de sucateamento da educação e desvalorização do magistério.
Com um breve intervalo, em 2006, em que Claudio Lembo (DEM) ocupou a cadeira,
desde 94 os governadores tucanos se sucedem: Mário Covas (1995-1998 e 1999-2001),
Geraldo Alckmin (2001 -2002 e 2003 -2006), José Serra (2007-2010), Alberto Goldman
(2010) e mais uma vez Geraldo Alckmin (a partir de 2011). Neste período, a tônica da
administração foi no sentido de implementar os mecanismos de reforma do Estado,
especialmente na década de 90, quando Fernando Henrique Cardoso foi presidente da
República, levando a cabo a plena realização da política neoliberal.
A principal característica do modelo adotado pelos tucanos tem sido a redução do
papel do Estado em áreas como educação, saúde, transporte, habitação e outras, por meio
de uma política de privatizações e terceirizações que só tem beneficiado as chamadas
“forças do mercado”, ou seja, a iniciativa privada interessada apenas no aumento do lucro
na exploração de serviços que deveriam ser públicos, gratuitos, universais e de qualidade.
Nestes quase 20 anos, o neoliberalismo tucano aprofundou a desigualdade social,
a violência urbana e a corrupção, convertendo-se em um governo de uma minoria
endinheirada e conservadora, avessa a garantida de direitos da população e adepta da
repressão policial frente a crescente tensão social provocada pelo quadro de exclusão
vivido no estado de São Paulo, em especial nas periferias das maiores cidades.
A educação é um dos alvos centrais desta política conservadora, tanto no que diz
respeito à formação dos alunos, que deixam de ser vistos como cidadãos e passam a
ser entendidos como consumidores, quanto pelos mecanismos de criação de amplos
mercados, expressos na criação de grandes “filões” para que a “indústria educacional”
comercialize seus produtos nas redes de ensino, professores e interessados na
área, com vasta oferta de mercadorias, desde material pedagógico e apostilas, até
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
cursos e instituições de ensino superior, tudo sob o comando da iniciativa privada.
Nesta ótica, a educação passa a ser gerida com indicadores, metas e perspectivas
empresariais. Não é por acaso, portanto, o fortíssimo vínculo de pessoas oriundas da
iniciativa privada com o governo estadual, ocupando cargos no poder educacional
paulista, como no caso da composição do Conselho Estadual de Educação, formado hoje
por 55% de representantes, sócios ou consultores do setor privado.
Embora tenha existido descontinuidade de alguns programas e políticas pontuais,
a política educacional implementada nos últimos 20 anos tem uma trajetória unitária,
marcada por desresponsabilização do Estado, municipalização, mercantilização, controle
e meritocracia. Os nomes que ocuparam o posto máximo na Secretaria de Educação foram
preenchidos por pessoas comprometidas com um projeto de sociedade que não enxerga
a educação como meio para promover a igualdade, mas sim como forma de aprofundar a
distância entre ricos e pobres, entre quem tem acesso ao conhecimento e quem não tem.
Rose Neubauer (1995-2002), Gabriel Chalita (2003-2006), Maria Helena Guimarães Castro
(2007-2009), Paulo Renato (2009-2010) e, desde 2011, Herman Voorwald capitanearam
um processo de larga escala de transformação da educação em mercadoria.
Desde o início do processo de municipalização, com a reestruturação do
atendimento da demanda de ensino fundamental e médio nas escolas, iniciada
ainda em 95, até o radical processo de avaliação meritocrática instituída nos
últimos anos, as políticas tucanas têm produzido efeitos nocivos aos profissionais
da educação, no funcionamento da escola e no processo de ensino-aprendizagem.
Salários defasados, péssimas condições de trabalho e escolas sucateadas são apenas
alguns dos sintomas da perversidade da política tucana para a educação.
Iniciamos o debate sobre os significados e resultados dessa política para, a partir
de outras contribuições, fortalecer a resistência dos profissionais da educação e
a construção de uma alternativa que dê bases para uma educação de qualidade,
verdadeiramente pública e gratuita, para todas e todos.
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A municipalização do ensino e a política de fundos para o financiamento
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20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
Em 1995, na primeira gestão do PSDB em São Paulo, a secretária
estadual de educação Rose Neubauer iniciou o processo de reestruturação
da rede de ensino, a partir de mudanças na forma como as escolas
atendiam as demandas do ensino fundamental. O centro desse processo
foi a separação do atendimento das séries iniciais do ensino fundamental
das séries finais e do ensino médio, realocando e agrupando professores e
alunos em escolas específicas para cada uma dessas modalidades.
As escolas foram originalmente construídas pensando na população de
uma determinada área e, de forma geral, procuravam atender todo o percurso
educacional necessário. Ainda que as escolas de ensino médio fossem em
número bem reduzido e atendessem regiões mais amplas, refletindo o próprio
processo de exclusão do sistema de ensino, que permitia a poucos chegar a
esta etapa, a intenção era de atendimento à demanda de uma região como
um todo e não de um nível de ensino específico.
A separação das séries iniciais em escolas específicas foi sustentada
por um discurso pedagógico e administrativo de que isso possibilitaria
um atendimento mais adequado e qualificado, garantindo estruturas,
equipamentos, materiais e projetos pedagógicos específicos para
o trabalho com as crianças pequenas e com esta fase do processo
educativo. Este discurso pedagógico escondia, na verdade, uma medida
política alinhada com o pensamento neoliberal, pois foi neste momento
que o governo tucano deu um passo importantíssimo para um longo
processo de mudanças cujo principal foco era implantar uma política de
correção de fluxo, de redução de “gastos” e de enxugamento da estrutura
estatal da educação paulista e que pouco ou nada teve a ver com um
atendimento mais adequado e qualificado para as crianças.
A reorganização da rede permitiu que, ainda em 1995, fossem dados
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
os primeiros passos para que no ano seguinte começasse o processo de
municipalização das escolas estaduais que atendiam as séries iniciais do
ensino fundamental em todo o estado de São Paulo.
A Secretaria Estadual de Educação de São Paulo (SEE) passou a firmar
acordos com os municípios, que até então atendiam essencialmente a
educação infantil – ainda que de forma muito insuficiente – e em poucos
casos atendiam parte da demanda de ensino fundamental, para que
assumissem a gestão das escolas de ensino fundamental I, recebendo do
Estado os prédios e uma promessa de apoio.
Com a aprovação da Emenda Constitucional nº 14, que criou o Fundef
– Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (Lei 9424/96) no segundo semestre de 1996, a
municipalização se intensificou ao longo de 1997 e 1998.
É preciso relembrar que na lógica do FUNDEF cada aluno representava
um determinado valor a ser recebido. Portanto, com a expectativa de
ampliar os recursos financeiros para a educação pelo aumento das
matriculas do Ensino Fundamental, que antes faziam parte da rede
estadual, e dimensionando mal os verdadeiros custos e dificuldades
para gerir e manter essas escolas, as prefeituras abrem suas portas para
o processo de municipalização, acreditando nas promessas de apoio do
governo estadual, mas que nunca se cumpriram de forma efetiva.
Municipalização e Sucateamento da Educação
Com a municipalização, o governo estadual foi reduzindo
gradativamente sua responsabilidade com as séries iniciais sem, no
entanto, ampliar sua atuação em outros níveis ou modalidades, como o
Ensino Médio ou a Educação de Jovens e Adultos.
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O oposto ocorre com os municípios que aceitaram a municipalização.
Se em um primeiro momento eles tiveram aumento de recursos, estes
logo se mostraram insuficientes para o custeio e manutenção das escolas
herdadas da rede estadual ou dos novos equipamentos construídos para
atender a demanda crescente.
Esses municípios, que antes mantinham algumas “pré-escolas” e
pouquíssimas creches, entram então em uma espiral de dificuldades. A
ampliação de matriculas – com a superlotação de salas e sem investimento
em novos equipamentos e materiais – passa a ser o caminho natural
para obter mais recursos do Fundef, ao mesmo tempo em que as
municipalidades reduziam ou paravam completamente o atendimento
da educação infantil, que não recebia recursos no fundo. Além disso,
muitos municípios fraudaram os números de matrícula de suas redes para
receberem mais dinheiro, conforme diversas denúncias na Corregedoria
Geral da União à época. Ou seja, passaram a atender de forma ainda mais
precária – ou simplesmente deixaram de atender – a educação infantil
e foram obrigadas a receber as escolas de ensino fundamental sem as
condições e recursos para mantê-las de forma adequada.
A municipalização promovida pelo governo de Mário Covas espalhou-se por
todo o Brasil, sendo a primeira grande marca da política educacional tucana.
Num momento em que se buscava o pleno acesso ao ensino
fundamental, incluindo milhões de crianças que naquele momento
estavam fora das escolas, o processo de municipalização, somado à
reorganização da rede, permitiu que o Estado pudesse fechar escolas e
reduzir turmas. Por outro lado os municípios foram obrigados a ampliar o
atendimento, sem ampliar gastos, sem investir em estrutura e sem garantir
qualidade no atendimento. Os resultados são muito perceptíveis 20 anos
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depois: superlotação de salas, precarização das carreiras docentes, graves
problemas na qualidade de ensino e uma vergonhosa defasagem no
atendimento da educação infantil, que se arrasta ao longo das décadas.
O mote para o avanço desse processo da forma aguda como ele
ocorreu foi a implantação, na esfera federal, da política de fundos pelo
governo Fernando Henrique Cardoso. O Fundef entra de forma decisiva
nesse processo não só por ser o principal elemento de atração para que
os municípios aderissem à municipalização, mas também por sustentar
toda uma política pautada pela lógica neoliberal que desresponsabiliza a
União pelo financiamento da educação básica.
O Fundef – e depois o Fundeb – parte do principio de uma necessária
redistribuição de recursos financeiros como forma de garantir aos
municípios que não contam com arrecadação própria financiamento para
a manutenção do atendimento. No entanto, ele não possui qualquer
mecanismo que obrigue a suplementação, restringindo-se apenas à divisão
proporcional do que já existe. Uma política de “cobertor curto”, que de fato
não trouxe novos recursos para o financiamento da educação. O governo
federal pouco contribuiu para injetar dinheiro novo e, ao mesmo tempo,
jogou toda a responsabilidade para os municípios. O Fundeb estendeu
o financiamento também para a educação infantil, mas o principio da
distribuição sem garantia de novos recursos permaneceu o mesmo.
Mercantilização da Educação
Durante esses vinte anos, foram poucos os momentos em que os
movimentos em defesa da educação pública conseguiram contrapor essa
política de financiamento neoliberal. O principal deles foi a aprovação do
Plano Nacional de Educação em 2001, que determinava a aplicação de
20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
7% do PIB para a educação pública, 3% menor do que o reivindicado, mas
substancialmente maior do que o implementado. Contudo, FHC vetou
esta meta e todas as outras que de uma forma ou de outra implicavam na
garantia de mais recursos financeiros para a educação.
A falta de mecanismos que obrigassem um investimento consistente
na educação pública é um dos fatores que levaram à ampliação da
mercantilização do ensino e que impedem a garantia do direito a
educação pública de qualidade para todos os brasileiros. Mesmo
com toda a pressão da sociedade civil organizada, os vetos ao PNE
permaneceram ao longo de toda a década, endossados depois pelo
governo Lula ao longo de seus dois mandatos.
Ainda hoje assistimos a batalha que tem sido registrar no novo PNE a meta
de alcançar 10% do PIB para educação pública em 10 anos. O segundo Plano
Nacional de Educação foi aprovado na Câmara Federal por unanimidade,
mas está parado no Senado por mais de um ano. O governo Dilma não quer
empenhar mais recursos orçamentários para a educação, utilizando-os para
pagar juros e amortizações da dívida pública para rentistas e banqueiros.
Apostam gradualmente em recursos do pré-sal para depois de 2020.
Além do processo de municipalização e de reorganização da rede, as
duas primeiras gestões do PSDB em São Paulo também implementaram
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
projetos e programas que procuraram transferir para a comunidade, para
os profissionais e para os próprios alunos a responsabilidade pela solução
dos problemas do cotidiano escolar.
Entre esses programas destacam-se o “Amigos da Escola” e o “Escola
da Família”. O primeiro apostava no voluntariado como forma de
responder às insuficiências e à falta de recursos cada vez mais aguda nas
escolas, em grande medida pela própria omissão do poder público e pela
ausência de investimentos concretos na educação. O segundo delegava a
estudantes do ensino superior privado, em troca de concessão de bolsas
de estudo, a responsabilidade por atividades fora do horário regular de
aulas. Tais ações mantinham total coerência com os princípios neoliberais
de redução do aparato estatal e apostavam na melhoria pela via da
competitividade, característicos do mercado.
Nessa mesma lógica, os sucessivos governos também desenvolveram
ao longo desses anos inúmeras reestruturações e ações voltadas
à terceirização da quase totalidade dos serviços de apoio, como
alimentação escolar, limpeza e transporte. Na impossibilidade de
simplesmente privatizar totalmente as escolas, os governos tucanos
tomaram medidas para privatizar ao máximo tudo aquilo que fosse
possível na estrutura da educação pública do Estado.
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Ensino Superior e formação de professores
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20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
As políticas educacionais dos governos tucanos se desenvolveram em sintonia com as
políticas do governo federal, primeiro com FHC e depois com a opção pela continuidade da
política, ainda que com nova roupagem, feita pelo governo Lula. Um exemplo representativo
e com implicação direta na educação básica, foi a política educacional para o ensino superior.
O forte incentivo à expansão do ensino superior privado associado a mudanças
no próprio modelo de instituição levou a sérias consequências na formação
universitária e de forma mais direta na formação de professores. A expansão do
ensino superior teve como elemento central a flexibilização do modelo, permitindo
o surgimento de instituições mais “enxutas”, com foco exclusivamente no ensino,
numa visão tecnicista que abre mão do tripé ensino-pesquisa-extensão.
Essas mudanças no modelo universitário estão intimamente ligadas a uma visão
de formação centrada no domínio de conteúdos específicos, negando uma formação
que prepare o docente para uma postura de pesquisa, investigação e reflexão sobre
o seu fazer cotidiano. Resumindo, bastaria ao professor ter um bom domínio sobre
os conteúdos, sendo dispensável a reflexão pedagógica mais ampla (que deveria
se destinar apenas aos “cientistas da educação”). Essa formulação tem como suas
principais defensoras, além de Rose Neubauer, Eunice Durhan e Guiomar Namo de
Mello, formuladoras da política educacional tucana em São Paulo.
Com isso, a formação de professores em cursos de pedagogia e licenciatura
aligeirados, em cursos normais superiores e em cursos à distância, passa a ser um
dos grandes “mercados” explorados pelas instituições privadas.
Esses grandes mercados que se formam (e conquistam cada vez mais espaço na
formação inicial e na formação continuada) atingem a classe docente sobremaneira.
Ampliando a oferta de cursos a baixo custo, de curta duração ou mesmo
certificações sem o verdadeiro envolvimento acadêmico que se espera, precarizam
esse processo. Por não encontrar demais opções de formação superior pública,
gratuita e de qualidade, muitos ingressam e endossam esses tipos de curso.
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
Há, nesse modelo da mercantilização, uma perspectiva restrita sobre a formação,
induzindo à constituição de toda uma geração de profissionais com pouca
autonomia para pensar e desenvolver seu trabalho e que muitas vezes nem sequer
pode discutir a importância dessa autonomia para a docência enquanto profissão
intelectual. Muitas vezes se vêem sem uma base mais consistente para lidar de
forma dialógica com os desafios cotidianos e, sobretudo, sentem-se fragilizados na
sua própria condição para enfrentar as políticas impostas pelos governos tucanos.
A tecnocracia do ensino
A mudança no perfil da formação se soma a um processo de sucateamento da
carreira docente, levando a uma condição de profunda desvalorização profissional.
A própria capacidade de resistência da categoria às mudanças foi sendo minada por
políticas meritocráticas, baseadas em premiações e punições que, ao mesmo tempo,
serviram para retirar direitos trabalhistas.
Somado a isso, foi tirado dos professores o controle e o planejamento sobre seu
próprio trabalho, com a adoção de apostilas e a implantação de sistemas de exames
que os obrigam a treinar os alunos para obter resultados ao invés de desenvolver
processos educativos que, de fato, garantissem um aprendizado.
Foi a implementação do que se convencionou chamar de “tecnocracia” do ensino, ou
seja, a compreensão de que a execução da prática educativa poderia estar deslocada
do “pensar” sobre a prática. Os professores, nesse sentido, foram vistos como “técnicos”
e “executores” das aulas, minando sua condição de sujeitos neste processo.
Chegamos ao final desses 20 anos com um quadro dramático: os profissionais se
sujeitam a jornadas extenuantes, que inevitavelmente os levam a adoecer, a escolas
seguem sem condições físicas e materiais para garantir uma qualidade mínima para o
trabalho, e uma patente falta de qualidade na educação de nossas crianças e jovens –
fruto de uma política que não pensa a educação como um direito.
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Avaliação em larga escala como centro da política educacional
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20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
Outra marca do governo do PSDB na educação foi recorrer à avaliação em larga
escala como instrumento definidor das políticas. A partir da instituição do Sistema
de Avaliação da Educação Básica (SAEB), no início da década de 1990, o modelo
se generalizou para ser aplicado em todas as escolas da rede durante o governo
de Mário Covas. O resultado foi o Saresp – Sistema de Avaliação do Rendimento
Escolar no Estado de São Paulo, aplicado pela primeira vez em 1996. Desde então, a
Secretaria Estadual de Educação tem feito avaliações externas todos os anos em todas
as escolas da rede (com exceção dos anos de 1999 e 2006).
Cabe destacar que o que foi implementado é uma aferição do desempenho de
estudantes, e não uma avaliação de aprendizagem, uma vez que esta pressupõe
o acompanhamento do desenvolvimento de cada aluno no decorrer de sua
trajetória escolar. Ao contrário, a “medição” adotada pelas políticas de avaliação
em larga escala acontece com a utilização de instrumentos externos, uma prova
única e padronizada em um determinado dia e horário. É, por definição, um
instrumento limitado que jamais poderia se tornar a referência de qualidade
para a educação brasileira.
O que se destaca nessa política centrada nos testes – que permanece muito forte
e presente nos dias atuais, tanto na esfera federal quanto na estadual e municipal,
com diferentes nomenclaturas – é que se trata de uma concepção de que a avaliação
em si seria indutora de qualidade do ensino. É uma indicação de que ao medir a febre,
o doente estaria sendo curado.
Na concepção neoliberal de desresponsabilização do Estado pela educação
pública, cabe a ele apenas o papel de fiscalizador e avaliador das unidades, e não
o de executor e responsável pelos resultados adquiridos, isentando-se assim da
realidade concreta, na qual interferem efetivas condições de trabalho, formação
dos profissionais e organização das escolas. A avaliação assume, portanto, um
papel inverso ao que deveria ter: produzir um diagnóstico para elaborar e executar
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políticas públicas para educação. Ao contrário, a avaliação passa a definir currículos,
produzir o ranqueamento das unidades escolares, e servindo como instrumento de
culpabilização dos professores, equipes e alunos por um eventual fracasso escolar.
Dessa forma, a avaliação tende a uniformizar os processos educativos, ainda que
diferentes escolas, com diferentes grupos em diferentes localizações apresentem
contextos e realidades muito distintas. A uniformização se atrela à concepção do
professor como “técnico”, pois a ele basta “ensinar” os conteúdos das provas externas.
Portanto, desqualifica o papel da escola como difusora, reprodutora e produtora
de cultura em suas mais diferentes faces: conhecimento, artes, ciências, costumes,
valores etc. A avaliação associada à meritocracia na política educacional define o
eixo de trabalho das escolas, seus programas, projetos e cotidiano da maneira mais
perversa possível, exatamente por desconsiderar o ato educativo como um conjunto
de relações humanas entre sujeitos mediados pela cultura historicamente produzida.
Premiação e Punição
Adotando a meritocracia como sistema de gestão, o governo estadual elaborou
políticas de premiação e punição às unidades com baixo desempenho, como se
escolas que possuem dificuldades fossem melhorar com menos subsídios e insumos
para a efetivação de seu trabalho.
A mesma lógica meritocrática se deu com os professores, como já mencionado.
Avaliados pelo desempenho de seus alunos, passaram a ser premiados ou punidos de
acordo com as notas alcançadas por eles. Essa concepção compreende que o sucesso
e o bom desempenho dependeriam exclusivamente do “esforço” de cada professor
e aluno, independente das condições materiais, sociais, culturais e financeiras nas
quais escolas, professores, alunos e comunidade estão inseridos, independente das
políticas públicas do Estado para a melhoria das condições do ensino, deixando claro,
novamente, a desresponsabilização com a escola pública e sua qualidade.
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Compreensão do papel dos educadores e estudantes
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20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
Outro traço marcante da política educacional do PSDB em São Paulo foi a forma
com que foi se acentuando a repressão e a violência contra os movimentos sociais,
especialmente com estudantes universitários e professores do ensino básico.
A repressão policial aos movimentos coloca em pauta muito mais do que uma
falsa dicotomia entre o “bem e o mal” e os “fora da Lei”, mas está absolutamente
vinculada com a concepção de mundo, de escola, de universidade e de educação
defendida pelos tucanos e que se contrapõe ao que defendemos, em um país
fortemente marcado por resquícios da ditadura militar.
Como caso emblemático, podemos citar o ano de 2009, quando com bombas
de “efeito moral”, e spray de pimenta, a Tropa de Choque entrou no campus
da USP cercando estudantes em greve. Infelizmente, de lá para cá o gesto
tem se repetido não só dentro da USP em atos estudantis e de trabalhadores,
mas também nas manifestações dos profissionais de educação e, não menos
emblemático, na reação violenta da polícia de São Paulo durante os primeiros
protestos de junho deste ano, que acabaram desencadeando as maiores
manifestações de rua das últimas décadas.
A repressão violenta da polícia militar nessas diversas situações enfrenta
o Estado Democrático de Direito, questiona o direito de greve presente na
Constituição Federal e afronta o direito à livre expressão, à livre manifestação
e ao questionamento da ordem estabelecida. Querem acabar à força (usando
cacetetes, bombas, sprays, tiros e prisões arbitrárias) com a divergência, a
crítica e a contestação, tão necessárias para a alteração da ordem social em
que vivemos. A truculência, apoiada e incentivada pelo governo de São Paulo,
representa uma política totalitária e que busca, a todo custo, calar e criminalizar
os movimentos sociais e seus manifestantes que ousam lutar.
O mesmo tratamento policialesco do Estado de São Paulo é usado com os
professores da sua própria rede de ensino. Ao acionar o aparato policial para
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
conter os profissionais que lutam por melhores salários, carreira e condições
de trabalho, o governo aposta no silêncio e na resignação para que a “ordem”
educacional seja mantida e que os planos de privatização e sucateamento da
escola pública continuem avançando.
Vale destacar também qual o significado da violência durante as
manifestações e greves dos profissionais para a imagem pública dos professores
frente aos pais, alunos e a sociedade em geral. Em tempos no qual a violência
dentro das escolas tem tomado à frente de diversos debates, campanhas e
proposituras legislativas, a imagem de violência e barbárie contra profissionais
da educação diz muito sobre a (falta de) dignidade e respeito com tal categoria,
em um círculo vicioso de violência promovido e incentivado pelo próprio Estado.
Desvalorização Profissional
Falta de respeito e de dignidade com a profissão também são revelados pelo
poder público quando, na promoção do cargo e da profissão, o Estado continua a
oferecer salários desvalorizados, fazendo da docência uma das profissões de nível
universitário com menor salário do país. Hoje, o salário inicial para um professor
das séries iniciais em início de carreira na rede estadual é de R$1.170,24 por 24
horas de trabalho semanais. Enquanto isso, o DIEESE (Departamento Intersindical
de Estatística e Estudos Socioeconômicos) defende, como salário mínimo
necessário R$2.729,24, por 20h de trabalho semanais.
Significativa é também a presença de quase metade dos professores da rede em
caráter precário e com redução de direitos para esses mesmos professores (Categoria
O). Hoje são mais de 50 mil professores da chamada categoria “O” contratados que
após anos de dedicação ao magistério estadual não têm isonomia de direitos. Mesmo
que enfrentem a dura realidade do cotidiano das escolas, em especial das periferias,
estes professores ainda são considerados uma “sub-categoria”.
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Os profissionais da rede convivem diariamente com condições de trabalho
também precárias: salas de aula lotadas, violência e riscos à integridade física,
prédios inadequados, falta de recursos humanos, materiais e financeiros. A
rede estadual ainda não cumpre a Lei do Piso Salarial em sua maior conquista,
a garantia da destinação de 1/3 da jornada de trabalho dos professores para
momentos de formação e planejamento.
Isto posto, é evidente que os professores, enquanto categoria estruturante e
da mais alta importância para a construção da sociedade, estão absolutamente
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precarizados e desvalorizados pelo poder público estadual e que, ao longo
de quase 20 anos, as políticas do governo tucano só fez acentuar tamanha
desvalorização. Hoje, são poucos os jovens que querem seguir a carreira docente
e o país já encontra dificuldades para suprir a necessidade de profissionais
para os cargos existentes, mesmo sem considerar a urgência de ampliação
dos mesmos. Essa situação é inaceitável. Faz-se urgente mudar a forma
como os profissionais da educação são tratados pelos governos, antes que as
consequências afetem ainda mais a estrutura de nossa sociedade.
20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
Há outra forma de governar!
Os quase 20 anos de governo do PSDB para a educação paulista trouxe
o aprofundamento do pensamento conservador e de desigualdades
educacionais. As políticas do governo do PT em todas as suas esferas
também se mostraram alinhadas com o pensamento neoliberal,
fortalecendo a rede privada, a lógica tecnocrática, as terceirizações e a
meritocracia. Ou seja, as políticas educacionais dos governos em exercício
estão alinhadas.
Destacamos, enquanto mandato popular e socialista, que é papel
fundamental de todos aqueles que lutam pela escola pública gratuita,
laica e de qualidade para todos, não permitir que bandeiras históricas do
movimento sejam renomeadas e reapropriadas pela direita brasileira e
pelas políticas neoliberais em implantação. Reafirmamos nossa convicção
de que há outra forma de governar e de compreender a educação. Educação
enquanto direito público universal, estatal, gratuita, compromissada com
uma organização de sociedade sem desigualdades nos quais a formação
cidadã e solidária esteja de fato como foco principal.
Para essa efetivação, há necessidade de reafirmarmos princípios e ações
que compactuamos e que podem a curto, médio e longo prazo ressignificar
a escola pública e retomar o respeito e a valorização do profissional de
educação, reconhecendo seu papel de sujeito intelectual, função primordial
dos docentes em nossa sociedade.
Em primeiro lugar, defendemos a ampliação dos investimentos
na educação pública. Parafraseando o grande educador Paulo Freire,
prioridades são definidas no financiamento e não no discurso. A luta
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
por 10% do PIB nacional para a educação pública é uma bandeira que
encampamos desde a década de 1990 junto aos movimentos em defesa
da escola pública, quando apresentamos, em 1998, o primeiro Projeto de
Lei para um Plano Nacional de Educação – Proposta da Sociedade Civil.
Após 15 anos essa meta ainda não foi sequer aprovada e os recursos para a
educação pública continuam escassos frente às necessidades do país. Para
o desencadeamento das propostas seguintes, é fundamental a garantia de
recursos financeiros por parte do Estado, marcando sua responsabilização
com a efetivação do Direito à Educação.
É preciso também apostar na valorização profissional e salarial dos
professores. Em uma jornada de 40 horas semanais defendemos o piso
salarial inicial de acordo com o definido pelo DIEESE, de R$5.458,48. E
garantia de um plano de carreira que valorize os professores durante
seu percurso profissional. Além de salários e carreiras compatíveis com o
papel que exercem na sociedade, é fundamental que os profissionais da
educação sejam legitimados e respeitados em sua profissão, e isso se faz
com a garantia da sua efetiva autonomia pedagógica na participação da
construção de um Projeto Político Pedagógico para suas unidades e sua
rede de ensino. Autonomia para pensar, elaborar e executar sua prática
pedagógica coletivamente.
Tal concepção está intrinsecamente ligada à concepção da Gestão
Democrática como pressuposto da qualidade social. Ou seja, reconhecer
na equipe escolar sua condição de sujeito é também condição para que
seja reconhecida a condição de sujeito dos alunos, de suas famílias e da
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comunidade. A sociedade deve participar efetivamente das decisões,
corrigindo rumos e verificando acertos do processo educacional, em um
efetivo envolvimento com o projeto de escola e de sociedade no qual estão
inseridos. Se queremos mudar a sociedade, é preciso que ir além dos muros
da escola e envolver todos na construção desse projeto, que passa, entre
outros, pela construção de um Projeto Político Pedagógico coletivo em cada
unidade educacional.
Por fim, cabe destacar que o Estado deve assegurar as condições
necessárias para que uma escola de qualidade se efetive. Ou seja, deve
garantir estrutura: recursos físicos, materiais e humanos em quantidade
e qualidade suficientes para o bom funcionamento das escolas. Bons
prédios e materiais de qualidade são opções políticas balizadas por
uma determinada concepção de educação. Deve-se compreender a
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educação como um processo de relações humanas mediados pela cultura
historicamente acumulada. Portanto, um número máximo de alunos por
turma se faz necessário, considerando a especificidade de cada faixa etária
e etapa da educação, conforme apresentamos na Relatoria do PL 597/2007,
em forma de substitutivo, o qual foi aprovado na Câmara dos Deputados e
hoje em tramitação na Comissão de Educação do Senado Federal.
Reconhecer a história e o sentido das políticas educacionais que têm sido
hegemônicas no último período é fundamental para o conhecimento dos
projetos de sociedade que estão postos. Portanto, fazemos um chamado
para essa reflexão e o fortalecimento da luta por uma educação pública,
gratuita, estatal, democrática e de qualidade na perspectiva da construção
de uma sociedade mais justa e igualitária. Essa é uma tarefa coletiva,
vamos à ela.
20 anos de PSDB em São Paulo: a consolidação da política neoliberal na educação
Mandato Ivan Valente PSOL/SP
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Desde o início do processo de municipalização, com a reestruturação do atendimento da demanda
de ensino fundamental e médio nas escolas, iniciada ainda em 1995, até o radical processo
de avaliação meritocrática instituída nos últimos anos, as políticas tucanas têm produzido
efeitos nocivos aos profissionais da educação, no funcionamento da escola e no processo de
ensino-aprendizagem. Salários defasados, péssimas condições de trabalho e escolas sucateadas
são apenas alguns dos sintomas da perversidade da política tucana para a educação.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP
Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados
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