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Quarta-feira
25 de Novembro de 2015
Jornal do Comércio - Porto Alegre
Internacional
ARGENTINA
La Nación noticia reação
contrária a seu editorial
LA NACION/AFP/JC
Texto do jornal defendeu a anistia de repressores da ditadura
Um editorial do jornal La Nación defendendo uma anistia a repressores condenados por crimes
cometidos durante o regime militar argentino (1976-83) causou
forte reação entre políticos, jornalistas e leitores da publicação, de
linha conservadora. O próprio jornal voltou a manifestar-se ontem,
um dia após a publicação, noticiando o ato de repúdio promovido pelos funcionários e dizendo
que o texto reflete “exclusivamente a posição editorial do jornal, e
não a de seus jornalistas”.
O editorial, intitulado “No
más venganza” (Chega de vingança), afirma que os julgamentos
dos crimes de lesa-humanidade
promovidos nos anos do kirchnerismo foram atos de “vingança” e
chama os opositores do regime militar de “terroristas”. Afirma ainda
que os repressores que se encon-
tram encarcerados, a maioria em
idade avançada, estariam sendo
maltratados. O texto ainda celebra
a eleição de um novo presidente
como oportunidade para “sepultar” as “ânsias de vingança” alimentadas pelas políticas de direitos humanos de Néstor e Cristina
Kirchner — que anularam indultos
e estimularam investigações.
Em sua edição de ontem, a
publicação pediu também desculpas à senadora Norma Morandini,
que foi citada no editorial por conta de um artigo em que falava na
necessidade de reconciliação na
área de direitos humanos. Norma,
que teve dois irmãos desaparecidos durante a ditadura, diz que o
jornal distorceu seu pensamento.
“Quando falo em reconciliar, não
é com os repressores, mas sim
com a sociedade. Me vi envolvida
em uma mentira.”
O ex-chefe de gabinete do governo Cristina Kirchner, Jorge Capitanich, declarou que o editorial
era “abominável”. Já a deputada
Victoria Donda (Progressistas) argumentou que os donos do jornal
foram “irresponsáveis” ao comparar aqueles que morreram nos
centros clandestinos aos terroristas que atacaram Paris no dia
13 de novembro. Já a presidente
da associação Avós da Praça de
Maio, Estela de Carlotto, considerou o editorial “desatinado, injurioso e ofensivo”, afirmando que
os repressores presos são “pessoas muito perigosas, que não estão arrependidas”.
Na tarde de segunda-feira, os
jornalistas do La Nación, realizaram um ato de repúdio em plena
redação. Soltaram um comunicado e tiraram uma foto com cartazes dizendo: “eu repudio o edi-
Jornalistas realizaram um ato de repúdio em plena redação
torial”. “Nunca vi nada parecido
aqui, foi uma reação muito contundente”, disse à reportagem o
jornalista da seção de política Jorge Liotti.
A polêmica surgiu no dia seguinte à eleição de Mauricio Macri,
que deu declarações polêmicas sobre o tema dos direitos humanos,
afirmando que o kirchnerismo
havia criado um sistema de “currais”, beneficiando grupos de direitos humanos que se alinham
ao governo. Apesar de declarar
que manterá os julgamentos em
curso, Macri não dá detalhes sobre o que pretende fazer com relação aos repressores presos nem
se novos julgamentos terão início.
O presidente eleito tem o apoio de
entidades e advogados que pedem
a anistia e a interrupção dos processos em curso. Na ditadura argentina, desapareceram 20 mil
pessoas e mais de 500 bebês foram sequestrados.
Partido governista da Venezuela condena Macri por propor a retirada do país do Mercosul
Melhorar a relação com o Brasil e acelerar acordos para liberar o comércio com
a União Europeia (UE) e com a Aliança do
Pacífico são alguns dos pontos já definidos
pelo presidente eleito da Argentina, Mauricio Macri, em sua política externa.
Um dia após ser eleito, ele reafirmou
a promessa de propor ao Mercosul acionar
a cláusula democrática contra a Venezuela
em razão dos políticos presos pelo governo
de Nicolás Maduro. O presidente venezuelano condenou a fala de Macri.
Nas palavras do argentino, o líder venezuelano age com “abuso e perseguição”
contra seus opositores. “Acredito que é evidente que se aplique essa cláusula, porque
as denúncias são claras e contundentes. Não
são uma invenção. Os testemunhos de Lilian Tintori, mulher de Leopoldo Lopez, são
claros sobre o que está acontecendo na Venezuela. Não tem a ver com o compromisso
democrático que assumimos.” A mulher do
venezuelano, que foi condenado a 14 anos
de prisão em um julgamento controverso,
esteve na Argentina no domingo e acompanhou o resultado da apuração na sede da coligação Cambiemos.
O tema pode ser o primeiro ponto de
atrito entre o Brasil e a Argentina sob a gestão de Macri, uma vez que o governo de Dilma Rousseff vem mantendo silêncio sobre a
política venezuelana. Em seu discurso, porém, Macri tentou minimizar contradições.
“Queremos construir e afiançar boas rela-
ções com todos os governantes da América
Latina e com o mundo. A Argentina precisa
intercambiar culturalmente e economicamente com todos os países, buscando melhores oportunidades”, afirmou.
Ainda na noite de segunda-feira, o partido chavista divulgou um comunicado oficial para condenar Macri por criticar o governo da Venezuela e tentar expulsá-lo do
Mercosul por abusos de direitos humanos.
A nota do Partido Socialista Unido da
Venezuela (PSUV) é a primeira reação do
chavismo às duras críticas do recém-eleito.
“As declarações do presidente-eleito, Mauricio Macri, são condenáveis e lamentáveis, já
que representam um ato de ingerência interna nas eleições parlamentares”, diz a nota
do PSUV, assinada pelo economista Rodrigo Cabeza Morales, vice-presidente da sigla
para temas internacionais.
Entre os temas também abordados por
Macri está a intenção de avançar na facilitação comercial com a UE — com quem o Mercosul discute há anos um acordo de livre comércio — e com a Aliança do Pacífico, com o
objetivo de aumentar o intercâmbio. Macri
afirmou ainda que proporá o cancelamento
do acordo com o Irã, costurado pela presidente Cristina Kirchner com o objetivo, segundo o governo, de interrogar suspeitos do
ataque a bomba em Buenos Aires, em 1994.
O acordo foi alvo de investigação do promotor Alberto Nisman, encontrado morto em
janeiro em caso ainda sem solução.
VATICANO
OSSERVATORE ROMANO/AFP/JC
Uso de documentos confidenciais levou jornalistas ao banco dos réus
Tribunal rejeita arquivar acusações de vazamento
Um tribunal do Vaticano rejeitou ontem um pedido de dois jornalistas para arquivar acusações
contra eles por publicarem documentos confidenciais na abertura
de um julgamento sobre o caso.
As acusações aos jornalistas
Emiliano Fittipaldi e Gianluigi
Nuzzi ocorrem após a publicação
de livros sobre o desperdício, a
ganância e problemas de gerenciamento no Vaticano, em parte
baseados em documentos confidenciais da Santa Sé.
O julgamento foi aberto apesar de apelos de grupos de monito-
ramento da imprensa, entre eles o
Comitê de Proteção aos Jornalistas
e o Repórteres Sem Fronteiras. As
entidades pediram o arquivamento das acusações, alegando que a
liberdade de imprensa era um direito humano fundamental.
A audiência foi realizada no
tribunal criminal do Vaticano.
Após a leitura das acusações, Fittipaldi disse que não era acusado
por publicar nada falso ou difamatório, simplesmente notícias.
O promotor assistente Roberto
Zannotti afirmou que a liberdade
de imprensa não estava em ques-
tão, mas sim o “comportamento
ilícito” dos jornalistas para obter
as informações.
Os dois livros foram baseados em documentos produzidos
por uma comissão de reforma nomeada pelo Papa Francisco para
avaliar as finanças do Vaticano e
propor mudanças. As outras três
pessoas no julgamento pertenceram à comissão: o monsenhor Angelo Lucio Vallejo Balda, Francesca
Chaouqui e Nicola Maio. O trio é
acusado de formação de uma organização criminosa e de vazamento
de documentos confidenciais.
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