Moradores pintaram de azul bairro degradado da Bela Vista Setúbal. Cor voltou a ganhar brilho nas paredes dos 167 fogos, 23 anos após a inauguração Smile Campos e Vítor Batista estão orgulhosos ROBERTO DORES uma espécie de "segunda vida" para o bairro Azul. O mais degraÉ dado do conjunto e problemático de três bairros que formam a Bela Vista, em Setúbal, nem parece o mesmo. Muito por culpa dos moradores, que se juntaram e trabalharam durante os últimos dois meses para deixar os 12 lotes quase como novos. Inaugurados há 23 anos, nunca os 167 fogos, onde residem cerca de 700 pessoas de várias etnias, tinham "visto" tinta. "Saímos das cinzas para uma vida nova. Deu muito trabalho, mas é um orgulho viver aqui agora." A garantia é dada por Smile do trabalho feito no bairro Azul da Bela Vista Campos Orneias, um brasileiro de 32 anos, que reside em Portugal há 12, oito dos quais no bairro Azul, que chegou a ser apontado pela autarquia como tendo um projeto de demolição. É de rolo em riste que vai retocando o acesso a um dos pátios, onde as paredes "estavam negras", diz, mas hoje o azul parece "brilhar". Quando arrancou com as pinturas no "bloco 8", onde reside, estava longe de imaginar a dimensão que o projeto ia alcançar. Até porque não foi fácil fazer que a tinta agarrasse às paredes. "Assim que lá caía era logo absorvida. Foi preciso muita calma e muita tinta", diz. Porém, assim que o primeiro prédio "ganhou cor" começaram a chegar novos interessados. "Foi espetacular, porque era um bairro a ferro e fogo e nós também fizemos isto para ver se as pessoas mudam", explica Smile, um montador de estruturas metálicas desempregado juntamente há um ano, que com o estucador António Nicácio (angolano) conseguiu mobilizar os moradores dos 12 lotes. Aliás, António Nicácio, um dos oito interlocutores do bairro (figuras criadas para facilitar o contacto entre apopulação e aautarquia), revela que alguns habitantes estão mesmo a proceder à recuperação dos interiores num curioso siste- ma de "troca de favores". "Uns são canalizadores, outros eletricistas, outros estucadores. A ideia é ajudarmo-nos uns aos outros e foi assim que isto deixou de ser uma capoeira", sustenta, sendo que o projeto logrou mesmo atrair os mais novos em tempo de férias. É o caso de Vítor Batista, 15 anos, pertencente a uma das famílias portuguesas do bairro, que depois de ter pintado vários blocos, está agora à espera de ser "convocado" para retocar as galerias. "Nasci aqui e estava tão habituado a paredes sujas e lixo nas ruas, que nem sabia que o bairro, afinal, até era bonito", comenta. Os idosos que já não reúnem condições para participar têm contribuído com dinheiro para garantir o almoço e jantar de quem trabalha, numa altura em que esta intervenção na zona conhecida como Forte da Bela Vista orça os 70 mil euros, 40 mil ao abrigo do mecenato e 30 mil a cargo da autarquia, através da cedência de materiais, como tinta, cimento ou tijolo. EDIFÍCIOS Mais pedidos de tinta chegam à autarquia Os moradores de um dos blocos do bairro Amarelo, que reúne o maior aglomerado da Bela Vista, foram os primeiros ajuntar-se para pintar o edifício, pela primeira vez em 30 anos, mas já há mais 50 pedidos de tinta à autarquia, o que equivale à maioria das casas. Também habitantes do bairro Rosa não querem ficar para trás e > já constituíram um grupo. 3 PERGUNTAS A... "Puxava à degradação humana" A câmara tem feito um esforço para integrar socialmente estas pessoas, com técnicos que têm acompanhado a vida no bairro. Agora foi possível criar os oito o que vai possirealização de novas interlocutores, bilitar a ações, culturais o que gera e desportivas, um dinamismo e in- teração entre as várias etnias. Foi difícil convencer os moradores a requalificarem o bairro Azul? Foram eles que tiveram a iniciativa, porque tínhamos aqui umbairro muito degradado, talvez o pior da Bela Vista, o que puxava também à degradação humana. Há gente que aqui está a dar o melhor de si para tornar este bairro melhor e isso levou a que aqueles que aqui criavam de marginalidade escondam. Trata-se de um bairro que a autarquia chegou admitir demolir. Essa hipótese está a eliminada agora? Está posta de parte. Implicava deslocalizar as pessoas para outras zonas da cidade, mas hoje os moradores dizem que melhoraram a autoestima e que têm orgulho de viver aqui. Falta apenas a iluminação, porque o bairro é muito escuro à noite, e arranjar as ruas, criar espaços verdes e colocar flores nas floreiras, o que não era possível até há bem pouco tempo, mas hoje os interlocutores estão a problemas se conseguir isso. Os oito interlocutores, moradores no bairro, são chave neste nrocesso?