PARECER Nº 2385/2012 CRM-PR PROCESSO CONSULTA N.º 023/2012 – PROTOCOLO N. º 11589/2012 ASSUNTO: PROCEDIMENTO DE IMUNOTERAPIA PARECERISTA: CONS.ª ROSENI TERESINHA FLORENCIO EMENTA: Imunoterapia com extratos alergênicos e normas mínimas de utilização - aplicabilidade da Resolução CFM Nº 1886/2008 - Unidade Tipo I para procedimentos clínicos, como a Imunoterapia. CONSULTA Em e-mail encaminhado a este Conselho Regional de Medicina, a Sr.ª XXX, faz consulta com o seguinte teor: “Solicitação: Verifiquei que conforme a Resolução CFM nº 1794/2006, que estabelece as normas mínimas para a utilização de extratos alergênicos para fins de diagnósticos e terapêuticos nas doenças alérgicas e, descreve em seu artigo 2º que a imunoterapia é um procedimento que necessita de local apropriado como também necessita de conservação em refrigeração. Mediante estas descrições, solicito um parecer deste conselho sobre a classificação de atividade para o funcionamento de consultórios médicos com este procedimento. Em consulta ao CNAE 8630-05/01 verificamos que a realização de procedimentos estão descritos nesta atividade. A dúvida é se a imunoterapia é inclusa nesta atividade como procedimento, pois em consulta a Resolução do CFM nº 1886/2008 que dispõe sobre as "Normas mínimas para o funcionamento de consultórios médicos e dos complexos cirúrgicos para procedimentos com internação de curta permanência" subentendemos que procedimento está incluso na classificação da Unidade de Tipo I: consultório médico, independente de um hospital, destinado à realização de procedimentos clínicos sem necessidade de internação. Dúvida: A Resolução do CFM é específica só a procedimentos cirúrgicos ou inclui outros procedimentos conforme citado na classificação da Unidade I? Justificativa: Consultórios Médicos com ramo de atividade restrito a consulta médica, mas com realização de procedimentos.” FUNDAMENTAÇÃO E PARECER Para que possamos melhor atender a solicitação da Consulente, vamos revisar alguns tópicos legais e éticos pertinentes ao assunto. Os testes alérgicos e a imunoterapia alérgeno-específica são procedimentos médicos reconhecidos pela Associação Médica Brasileira e pelo Conselho Federal de Medicina. A aplicação e acompanhamento da imunoterapia específica com alérgenos são baseados no planejamento técnico elaborado pelo médico responsável. Os extratos alergênicos são utilizados na avaliação diagnóstica e no tratamento das doenças alérgicas mediadas por IgE e na terapêutica com vacinas de alérgenos (imunoterapia alérgeno-específica), devendo ser personalizada e individualizada de acordo com o grau de reatividade e a relevância clínica da sensibilização alérgica apresentada pelo paciente. As vacinas de alérgenos para imunoterapia de aplicação subcutânea ou sublingual diferem de vacinas antiinfecciosas; portanto, as normas que regulam o uso destas não se aplicam aos extratos alergênicos. As diluições de extratos alergênicos não caracterizam manipulação de produtos farmacêuticos ou alteração imunoquímica de produto farmacêutico e, portanto, não se enquadram nas normas da Resolução Anvisa/DC/MS no 33, de 19 de abril de 2000, e estão de acordo com o descrito no Capítulo II, art. 5o e 6o da Resolução Anvisa RDC nº 233, de 17 de agosto de 2005. É vedado ao médico comercializar medicamentos ou obter vantagem pela comercialização de medicamentos cuja compra decorra de influência direta em virtude de sua atividade profissional. A Resolução CFM Nº 1.794/2006 estabelece as normas mínimas para a utilização de extratos alergênicos para fins diagnósticos e terapêuticos nas doenças alérgicas. Ela cita no seu Artigo 1º: “A utilização de extratos alergênicos para fins diagnósticos e terapêuticos é procedimento integrante da prática médica, devendo o médico selecionar, fixar as concentrações dos alérgenos, prescrever e orientar as diluições adequadas a serem administradas aos pacientes para imunoterapia alérgeno-específica, baseado na intensidade e na importância clínica da sensibilização alérgica identificada, observados os padrões internacionalmente aceitos como de excelência técnica”. O Artigo 2º, descreve: ”Os procedimentos e requisitos técnicos referentes à diluição e à conservação de extratos alergênicos não estão sujeitos às normas previstas para as vacinas antiinfecciosas, devendo a imunoterapia subcutânea ser aplicada em locais apropriados, conforme o Anexo”. No Anexo da Resolução CFM Nº 1.794/06, consta, em relação ao local de realização do procedimento: “Condições básicas do local destinado à realização de testes alergológicos, diluição e aplicação de imunoterapia alérgeno-específica por via subcutânea: a) área física com luminosidade e ventilação adequadas, com geladeira do tipo doméstico; b) o mobiliário deve ser simples, com linhas retas para facilitar a limpeza e conservação; c) o material deverá estar acondicionado em local de fácil acesso, próprio e limpo; d) os extratos alergênicos são estabilizados e conservados no glicerol e devem ser estocados em geladeira – de uso doméstico – à temperatura de 4º a 17ºC. Considera-se como materiais imprescindíveis para a realização de testes e preparo de imunoterapia específica: a) seringas, agulhas, puntores descartáveis e material de antissepsia; b) coletor descartável para material perfurocortante; c) medicamentos de emergência: incluem adrenalina, anti-histamínico, corticosteróide e broncodilatador; d) material para intubação endotraqueal e ventilação. A imunoterapia específica com alérgenos deve ser baseada na identificação de sensibilização alérgica e na verificação da importância desta no quadro clínico do paciente. Para o planejamento técnico da imunoterapia alérgeno-específica, o médico responsável deve analisar os dados da história clínica, do exame físico e de exames complementares, bem como se certificar da existência de comprovação científica do possível benefício da imunoterapia para cada indicação clínica. Na Resolução da ANVISA No 33, de 19 de abril de 2000, e na RDC nº 233, de 17 de agosto de 2005, especificamente no Capítulo II, art. 5º e 6º desta foi formalizada a diferença de cuidados no manuseio dessas preparações que apresentam finalidades distintas de outras vacinas. Quanto à Resolução CFM Nº 1.886/2008, ela dispõe sobre as "Normas Mínimas para o Funcionamento de consultórios médicos e dos complexos cirúrgicos para procedimentos com internação de curta permanência”. Observemos o que consta nos seguintes Artigos dessa Resolução: Artigo 2º: Os estabelecimentos públicos, privados, filantrópicos ou de qualquer natureza, que se proponham a prestar internação de curta permanência, deverão estruturar-se de acordo com a presente Norma. Artigo 3º: As unidades de saúde referidas no anexo são hospitais, clínicas, casas de saúde, institutos, consultórios, ambulatórios isolados, centros e postos de saúde e outras que executem os procedimentos clínico-cirúrgicos de curta permanência. Cirurgias com internação de curta permanência são assim definidos: “São todos os procedimentos clínico-cirúrgicos (com exceção daqueles que acompanham os partos) que, pelo seu porte dispensam o pernoite do paciente. Eventualmente o pernoite do paciente poderá ocorrer, sendo que o tempo de permanência do paciente no estabelecimento não deverá ser superior a 24 horas”. Os estabelecimentos de saúde que realizam procedimentos clínico-cirúrgicos de curta permanência, com ou sem internação são classificados em Unidades tipo I a IV. A Unidade tipo I se refere ao consultório médico, independente de um hospital, destinado à realização de procedimentos clínicos, ou para diagnóstico, sob anestesia local, sem sedação, em dose inferior a 3,5 mg/kg de lidocaina (ou dose equipotente de outros anestésicos locais), sem necessidade de internação. (Grifo nosso). Os critérios estabelecidos para a seleção destes pacientes são os seguintes: a. Estado físico: os pacientes que podem ser submetidos a cirurgia/procedimento com internação de curta permanência são os classificados nas categorias ASA-I e ASA-II da American Society of Anesthesiologists (1962), ou seja: ASA I – pacientes sem transtornos orgânicos, fisiológicos, bioquímicos ou psicológicos. A enfermidade que necessita de intervenção é localizada e não gera transtornos sistêmicos; ASA II – o paciente apresenta pequenos ou moderados transtornos gerais, seja pela enfermidade sob intervenção ou outra (ex.: enfermidade cardíaca leve, diabetes leve ou moderado, anemia, hipertensão compensada, idades extremas e obesidade). b. A extensão e localização do procedimento a ser realizado permitem o tratamento com internação de curta permanência; c. Não há necessidade de procedimentos especializados e controles estritos no pós-operatório; d. Nas Unidades tipo II, III e IV o paciente deverá estar acompanhado de pessoa adulta, lúcida e responsável; e. Aceitação, pelo paciente, do tratamento proposto. A indicação da cirurgia/procedimento com internação de curta permanência no estabelecimento apontado é de inteira responsabilidade do médico executante. Toda a investigação pré-operatória/pré-procedimento do paciente (realização de exames laboratoriais, radiológicos, consultas a outros especialistas etc.) para diagnóstico da condição pré-operatória/pré-procedimento do paciente é de responsabilidade do médico e/ou da equipe médica executante. A avaliação pré-operatória/pré-procedimento dos pacientes a serem selecionados para a cirurgia/procedimento de curta permanência exige no mínimo: ASA I: história clínica, exame físico e exames complementares; ASA II: história clínica, exame físico e exames complementares habituais e especiais, que cada caso requeira. O médico deverá orientar o paciente ou o seu acompanhante, por escrito, quanto aos cuidados pré e pós-operatório/procedimento necessários e complicações possíveis, bem como a determinação da Unidade para atendimento das eventuais ocorrências. A responsabilidade do acompanhamento do paciente, após a realização da cirurgia/procedimento até a alta definitiva, é do médico e/ou da equipe médica que realizou a cirurgia/procedimento. A Unidade tipo I deverá contar com os seguintes materiais: a. instrumental para exame clínico e procedimentos de diagnóstico; b. dispositivo para iluminação adequada para a atividade c. mesa/maca/cadeira adequada para a realização da atividade; d. equipamentos e materiais específicos da especialidade praticada; e. tensiômetro ou esfigmomanômetro; f. equipamento para ausculta cardíaca; g. material de consumo adequadamente esterilizado, de acordo com as normas em vigor; h. material para a coleta de resíduos, conforme norma da ABNT. As Unidades que realizam procedimentos clínico-cirúrgicos de curta permanência, com ou sem internação, deverão contar com profissionais médicos e de enfermagem suficientes e qualificados para as atividades propostas. Todos os profissionais deverão estar inscritos nos respectivos Conselhos de Fiscalização, conforme determina a legislação em vigor. Os procedimentos para controle de infecção pós-operatória, incluindo procedimentos de limpeza, esterilização e desinfecção, deverão obedecer as determinações do Ministério da Saúde. Os medicamentos sujeitos a controle especial deverão obedecer ao estabelecido na legislação pertinente. Deverão ser estabelecidas rotinas para os serviços de limpeza, de enfermagem e de lavanderia. Os estabelecimentos deverão ser mantidos em perfeitas condições de ordem e limpeza. No Parecer Consulta do CREMESP nº 104.870/08, emitido pelos Conselheiros Maria do Patrocínio Tenório Nunes e João Ladislau Rosa, constam as seguintes considerações: “A imunoterapia é mais desenvolvida nos países escandinavos. Requer ambiente apropriado para sua aplicação, tendo-se em vista o risco de eventos adversos graves, como edema de glote que requeira intubação. Esses eventos adversos decorrem da exposição ao alérgeno específico, razão pela qual só pode ser realizada em ambiente hospitalar, com material disponível e recursos humanos devidamente treinado e liderado por médico especializado e capacitado para esse fim”. Traz ainda algumas referências bibliográficas de grande importância nessa área da Medicina, quais sejam: Allergol. Damunopathol. 2000: 28(3) 89-33; Imunol. Allergy Clin North An. 2004; 24(2): 335; Imunologia Clínica - edições 2006, 2007, 2008, de variados autores brasileiros, Prof. Julio Voltarelli. A Resolução ANVISA Nº 324, de 10 de novembro de 2003, aprovou o Regulamento Técnico de Produção e Controle de Qualidade para Registro, Alteração pós registro e Revalidação dos Extratos Alergênicos e dos Produtos Alergênicos, conforme Regulamento Técnico anexo a esta Resolução. Este Regulamento Técnico refere-se tanto aos Extratos Alergênicos e aos Produtos Alergênicos produzidos industrialmente, disponibilizados no mercado, quanto aos fornecidos como produto "nominal ao paciente" ou ao "profissional habilitado". Dentre as definições apresentadas quanto aos termos utilizados neste Regulamento Técnico, constam: - Produto Alergênico Medicamento elaborado a partir de extratos alergênicos registrados, que tem como finalidade identificar a etiologia de uma doença alérgica ou induzir um estado de tolerância imunológica ao mesmo alérgeno. Podem ser utilizados como: diagnostico, em provas cutâneas de leitura imediata ou tardia, em provas de provocação (oral, nasal ou brônquica) e em teste de contato, também são utilizados no tratamento, como vacinas alergênicas, visando o controle das doenças alérgicas. - Produto "nominal ao paciente" e/ou ao "profissional habilitado": Formulações alergênicas preparadas, a partir de extratos alergênicos, sob prescrição médica individual ou para uso interno na clínica, consultórios e hospitais utilizados para diagnóstico ou imunoterapia alérgeno-específica. São preparações com composição variável, contendo um único alérgeno ou misturas de alérgenos ou em uma concentração específica ou em uma diluição adequada à sensibilidade do paciente, conforme definido na prescrição médica individual. - Produto alergênico de diagnóstico: Qualquer produto produzido a partir de extrato alergênico, contendo um único alérgeno ou mistura definidas de alérgenos, com concentrações específicas, com a finalidade de identificar ou induzir uma alteração específica adquirida na resposta imunológica a um agente alergizante. - Vacinas alergênicas industrializadas: Produtos alergênicos disponíveis no mercado como medicamentos produzidos a partir de extratos alergênicos contendo um único alérgeno ou mistura de alérgenos, com concentração específicas, utilizados em imunoterapia alérgeno-específica, que modificam a resposta imunológica nas doenças alérgicas, capazes de promover a redução ou eliminação dos sintomas associados à exposição subseqüente ao alérgeno causal. Somente poderão extrair, produzir, fabricar, transformar, sintetizar, purificar, fracionar, embalar, reembalar, importar, exportar, armazenar, manipular ou expedir os produtos de que trata este Regulamento Técnico, as empresas detentoras dos respectivos Registros e que possuam Autorização de Funcionamento da ANVISA/MS, cujos estabelecimentos tenham sido licenciados pelo órgão sanitário das Unidades Federativas em que se localizam. Devido à grande diversidade do painel de sensibilização apresentada pelos pacientes alérgicos, nem sempre é possível disponibilizar ao mercado produtos industrializados para diagnóstico ou imunoterapia alérgeno-específica. Por esta razão, pode-se utilizar produtos alergênicos do tipo "nominal ao paciente ou ao profissional habilitado". Os produtos do tipo "nominal ao paciente ou ao profissional habilitado" devem ser preparados a partir de Extratos Alergênicos registrados. Para a fabricação e manipulação de produtos alergênicos do tipo "nominal ao paciente" ou ao "profissional habilitado" deve-se cumprir com os critérios especificados nessa Resolução. Após analisarmos todos os dados acima descritos, podemos observar que para realizar os procedimentos inerentes à imunoterapia, o médico precisa ter amplo conhecimento das substâncias a serem selecionadas e aplicadas no paciente; necessita ainda estar preparado para atender o paciente, caso ocorra qualquer evento adverso em qualquer fase do tratamento, especialmente o edema de glote e a insuficiência respiratória aguda, com eventual parada respiratória. É necessário ter disponível equipamentos e medicamentos para atender a parada respiratória e eventualmente a parada cardíaca. Concluímos, portanto, este Parecer respondendo à dúvida da Consulente, qual seja: “A dúvida é se a imunoterapia é inclusa nesta atividade como procedimento, pois em consulta a Resolução do CFM nº 1886/2008 que dispõe sobre as "Normas mínimas para o funcionamento de consultórios médicos e dos complexos cirúrgicos para procedimentos com internação de curta permanência" subentendemos que procedimento está incluso na classificação da Unidade de Tipo I: consultório médico, independente de um hospital, destinado à realização de procedimentos clínicos sem necessidade de internação. Dúvida: A resolução do CFM é específica só a procedimentos cirúrgicos ou inclui outros procedimentos conforme citado na classificação da Unidade I? Justificativa: Consultórios Médicos com ramo de atividade restrito a consulta médica, mas com realização de procedimentos.” A Resolução CFM Nº 1.886/2008 é dirigida aos procedimentos clínicos e cirúrgicos com o uso de anestésicos. No entanto, considerando que a imunoterapia é procedimento clínico e que o médico que a realiza precisa dispor de material de entubação orotraqueal, para atender eventos adversos até o mais grave, podemos caracterizar esse ato médico dentro da classificação da Unidade de Tipo I da referida Resolução. Lembremos que o médico é responsável por todos os atos profissionais que pratica, devendo buscar o máximo de segurança possível na sua realização, visando proteger plenamente o paciente. É o parecer, s. m. j. Curitiba, 08 de junho de 2012. Cons.ª ROSENI TERESINHA FLORENCIO Parecerista Aprovado em Sessão Plenária n.º 3020.ª de 09/07/2012.