Expectativa de Vida à Luz da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD 2006 A 2008) Autoria: Rafael dos Santos da Silva, Francisco Correia de Oliveira, Jonas Ferreira Araujo Junior Resumo O objetivo deste trabalho é investigar se as variáveis divulgadas na Pesquisa Nacional de Amostra por Domicilio (PNAD), associadas à demografia, educação, renda e prestação de serviços públicos revelam-se influentes na expectativa de vida dos cidadãos brasileiros. Para tanto, adotou-se como referencial teórico a Teoria do Desenvolvimento como Liberdade formulada pelo economista indiano Amartya Sen. A pesquisa concentrou esforços na interpretação de dados quantitativos selecionados das edições de 2006 a 2008 da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicilio (PNAD), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O presente estudo pode ser classificado como exploratório e quantitativo, utilizando-se como técnica de análise as análise de correlação e a regressão linear múltipla. Também foram realizadas pesquisas bibliográficas, uma vez que foi examinada a plataforma teórica da Teoria do Desenvolvimento como Liberdade, e assim, a partir das explicações da teoria foram selecionadas as variáveis que fariam parte do estudo. Dessa forma, foram selecionadas 20 variáveis para a análise, sendo que uma delas, a expectativa de vida (EV), foi considerada como a variável dependente, para efeito da estimativa das retas de regressão multivariada. Durante a análise dos dados, foram identificadas as variáveis que mais se relacionam à expectativa de vida, considerando-se cada caso nos diversos estados brasileiros. Como instrumento de análise foi utilizado o software SPSS (Statistical Package for Social Science) para o cálculo da regressão linear múltipla, utilizando-se todas as variáveis independentes com r maior ou igual a 0,6. Adotou-se a estimação stepwise. A análise dos resultados revelou que das 19 variáveis restantes analisadas, 12 apresentaram coeficientes de correlação significativos: Taxa de mortalidade infantil (-0,870), Domicílios com serviço telefônico (0,829), Trabalhadores contribuintes da previdência (0,829), Taxa de freqüência líquida ao ensino médio (0,781), Média de anos de estudo de pessoas de 15 anos ou mais (0,759), Média de anos de estudo de pessoas de 25 anos ou mais (0,738), PIB per capita (0,723), Rendimento médio mensal (0,723), Número médio de pessoas por domicílio (-0,675), Domicílios com coleta de lixo (0,670), Taxa de urbanização (0,614), Taxa de fecundidade (-0,612). Concluiu-se que taxas de mortalidade infantil, taxa de natalidade, e a oferta do serviço de telefonia fixa foram as três variáveis que mostraram maior relação com a variável expectativa de vida. Os resultados inferem que as melhorias, principalmente nas condições higiênicas e sanitárias, são determinantes para a melhoria, tanto das taxas de mortalidade quanto para o aumento da expectativa de vida. 1 1 Introdução Previamente a qualquer debate conceitual faz-se necessário contextualizar alguns pontos relevantes para o entendimento e à melhoria da expectativa de vida de um cidadão ou mesmo de uma população. Defende-se que a expectativa de vida está intimamente associada ao grau de liberdade e acesso aquilo que julgar necessário para sua vida; ao importante papel de agente da sua promoção e ao nível de desenvolvimento esperado. Estes tópicos serão explorados no referencial teórico. Este trabalho constituir-se de um estudo exploratório, buscou-se determinar variáveis capazes de refletir a instrumentalização das liberdades básicas da população e assim construir um cenário promissor para a expectativa de vida. Nestes termos, não raro poderão ser verificadas variáveis associadas, direta ou indiretamente, às oportunidades econômicas que um indivíduo necessita para alcançar seus intitulamentos, variáveis que se bem utilizadas facilitam as relações naturais de troca. Também, variáveis com fortes características sociais foram utilizadas, sobretudo, em duas áreas temáticas – educação e serviços públicos. Estas foram entendidas como importantes por possibilitar dentre outras coisas, participação mais efetiva em atividades econômicas e políticas. No curso da história, tais interações sociais têm se mostrado fundamentais quando se trata de proporcionar aos indivíduos melhores expectativas de vida. Nestes termos, é interesse deste trabalho verificar se a oferta de melhores serviços públicos, educação e distribuição de renda, aos moldes da PNAD, influenciam favoravelmente nos patamares da expectativa de vida. Buscando abrangência sem perda de objetividade, julgou-se oportuno investigar 19 variáveis, associadas à demografia, educação, serviços públicos e renda. As variáveis escolhidas são apresentadas na seção referente à metodologia. Uma vez definidas as variáveis e selecionados os dados respectivos, procedeu-se à correlação relativamente à expectativa de vida, e a seguir a uma análise de regressão linear múltipla, com todas as variáveis cujo coeficiente de correlação tenha se mostrado significativo. Os resultados são analisados em seção específica. 2 Expectativa de Vida Um dos principais objetivos do ser humano é se dedicar ao aumento da expectativa de vida de sua raça, por razões óbvias e abrangentes a cada um. Ocorre que durante muito tempo a expectativa de vida estava associada ao PNB per capita – (Produto Nacional Bruto dividido pela quantidade de pessoas do país) considerava-se que a elevação média da renda de uma determinada população seria a solução dos problemas relacionados a viver mais e melhor. No contra ponto disso recorre-se à definição de riqueza de Aristóteles (1980) quando este afirma que “a riqueza evidentemente não é o bem que se estar buscando, sendo ela meramente útil e em proveito de alguma outra coisa.” Ainda sendo um instrumento recorrente a muitos governos nos dias atuais a lei do derrame (como é comumente conhecida a iniciativa que visa aumentar os intitulamentos econômicos a ponto de sofrerem gradual processo de derrame em direção às camadas mais inferiores da sociedade e assim, supostamente, provocar o desenvolvimento econômico) tem sido alvo de criticas contundentes do ponto de vista qualitativo; e também estudos quantitativos têm demonstrado que mesmo havendo estreita relação entre longevidade e renda 2 per capita, pode ser um erro preocupar-se em demasia com as realizações de renda e sobrevivência. Este fato ganha explicação diante do argumento de que relações estatísticas requerem atenção antes de provocar qualquer justificativa convincente para a relevância das disposições sociais caminhando para além da opulência baseada nos rendimentos. Sen (2000). Estudos realizados por Sudhil Anand e Ravallion (1993) com base em comparações entre países revelaram que há de fato uma relação positiva entre PNB per capita e expectativa de vida. Entretanto as relações mais fortes se revelam entre distribuição de renda, especialmente nas populações mais pobres, e investimentos públicos, com a variável saúde aparecendo como a principal. Na análise feita por Anand e Ravallion, parece haver uma forte inclinação para o desaparecimento da variável PNB per capita como instrumento efetivo de combate à pobreza. Sen (2000) vai argumentar que “(...) o crescimento econômico não pode ser considerado, de forma sensata, um fim em si mesmo (...)” O economista indiano Amartya Sen (2000), no seu trabalho “Desenvolvimento como liberdade”, afirma que estudos empíricos têm demonstrado que a expectativa de vida não se eleva com o PNB per capita, mas há indícios bastante plausíveis que inclinam para uma relação funcional entre aumento das expectativas de vida e dispêndio público como serviços de saúde e combate à pobreza extrema pelo instrumento de distribuição direta. O que reforça o estudo de Sudhil Anand e Ravallion. Contudo, adverte que o impacto do crescimento econômico depende da maneira como seus frutos são aproveitados, e isso em certa medida pode explicar de que forma economias de países como a Coréia do Sul e Taiwan, foram capazes de elevar suas expectativas de vida tão rapidamente por meio do crescimento econômico. Que nos casos específicos, vieram acompanhados pela variável educação. Nessas economias, continua Sen, a expansão das oportunidades sociais serviu para facilitar o desenvolvimento econômico favorecido na maioria das vezes por alta oferta de emprego, baixas taxas de mortalidade e, conseqüentemente, aumento da expectativa de vida. Em um estudo realizado em Oxford, dirigido por Jean Drèze e Amertya Sen em 1989, propôs-se uma distinção entre duas formas de crescimento. De um lado estava o crescimento mediado pelo desenvolvimento econômico; do outro, o crescimento conduzido pelo custeio público. Ao contrário da primeira (eminentemente liberal), a segunda forma deve operar por meio de uma hábil e complexa manutenção dos serviços sociais de saúde, educação e outras disposições sociais relevantes como a liberdade de escolha, garantias protetoras e acesso a oportunidades básicas, de viver, por exemplo. O estudo conclui que o segundo modelo se aproxima mais estreitamente da expansão da expectativa de vida, do que o primeiro (modelo liberal). A seguir, um gráfico de um estudo onde se compara a relação entre o PIB per capita e a expectativa de vida ao nascer para seis países, inclusive o Brasil, o terceiro maior crescimento econômico do século XX, ficando atrás somente da Alemanha pós-guerra e do Japão, onde o processo de expansão se deu de forma desenfreada e em descompasso com a oferta das oportunidades sociais. Não sendo raro constatar isso, bastando para tanto, olhar para o descaso dado ao serviço público de saúde, constituindo um problema crônico que continua a imperar na primeira década do século XXI. 3 Gráfico Expectativa de Vida ao nascer (em anos) Fonte: Wold Bank and Wold Development Report - Desenvolvimento como liberdade Amartya Sen - (2000 p 64) Da esquerda para a direita a posição dos países pesquisados foram Kerela (mesmo não sendo uma nação, possui porte para tanto, o que justifica sua inclusão na pesquisa. O estado de Kerela é o segundo maior estado da Índia) China, Sri Lanka, Namíbia, Brasil, África do Sul e Gabão. A primeira coluna (mais escura) representa crescimento econômico enquanto que a coluna da esquerda (mais clara) representa a linha da expectativa de vida Na leitura realizada no gráfico é possível constatar que apesar de possuir um nível de renda muito baixo, os habitantes de lugares como Kerela, China e Sri Lanka apresentam níveis de expectativa de vida muito maiores do que aqueles países que apresentam níveis de PIB per capita mais elevados, como o Brasil. O Graf. 2 revela Há pouca relação entre expectativa de vida e PNB per capita. Grafico Expectativa de vida e PNB per capita Fonte: phases of capitalist development, NY, Oxford University – Desenvolvimento como Liberdade (2000 pp 70) A linha vermelha (com forte inclinação para baixo, inicialmente) representa o crescimento do PNB per capita, que logo avança em detrimento da outra linha, de cor verde, representando aqui a expectativa de vida. A leitura possível neste gráfico, que visa retratar a relação entre o PNB per capita e a expectativa de vida de um país europeu, é justamente compreender que se há relação entre estas duas variáveis é de proporcionalidade inversa (ao menos neste caso específico). Desmistifica-se, portanto, o associativismo de causa e efeito entre PNB per capita e expectativa de vida, introduzida sob certa medida, de forma convincente no senso comum. Entretanto, para se contrapor a um argumento forte como o PNB per capita, há de se apresentar outras variáveis de referência que possam impactar diretamente na expectativa de vida. Neste sentido, lançou-se mão dos dados da PNAD, 2006 a 2008, onde foram 4 identificadas 19 variáveis capazes de estabelecer relação com a variável expectativa de vida, fato este que se associa diretamente a dois pontos centrais deste estudo. Um deles é a liberdade, composta por um número considerável de outras variáveis, mas com a idéia básica de que a expansão da liberdade humana deve ser tanto o centro como o meio de uma segunda variável – o desenvolvimento. Esta variável, cuja concepção adequada deve ir para além da acumulação da riqueza e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), argumenta Sen (2000) “precisa estar relacionada com a melhora da vida e dos aumentos das liberdades”. Para tanto, tal expansão, continua o indiano, “(...) nos tornam seres mais completos, ao permitir que sejamos mais desimpedidos e conseqüentemente mais livres, dando-se condições de interagir com o mundo em que se vive e, sobretudo, influenciando ele.” Estas duas vertentes (Liberdade e Desenvolvimento) podem ainda, se bem articuladas, sustentar uma pluralidade de instituições dentro de um sistema democrático, sendo exigidos mecanismos legais, seja de mercado ou de provisão de serviços públicos básicos e de qualidade. Os papéis fundamentais da liberdade que basicamente incluem variáveis econômicas, liberdades políticas, oportunidades sociais, garantias de transparência e segurança protetora, estão associadas à expectativa de vida que na PNAD são representadas por variáveis: demografia, educação, renda e prestação de serviços públicos. Assim como o processo de desenvolvimento pode se mostrar crucial para assegurar tais liberdades e conseqüentemente promover um desencadeamento inter-relacionado entre direitos, oportunidades e outros intitulamentos que um ser humano possui razões abrangentes para recorrer. 3 Expectativa de vida e liberdade O problema da liberdade para Polanyi (2000) passa por dois eixos centrais, apesar de diferentes: o institucional e o moral. No eixo institucional cabe a ação de equilibrar o aumento ou a diminuição da liberdade, onde as instituições são vistas como materializações daquilo que o ser humano assume por significado. Aqui o autor enfatiza que “não se pode atingir a liberdade que tanto procuramos sem antes compreendermos o verdadeiro significado da liberdade numa sociedade incerta e, conseqüentemente, complexa”. Este tipo de entendimento exige uma abstração acurada sob o ponto de vista regulatório, sobretudo quando aplicadas a distintos contextos sociais onde, por exemplo, as classes mais abastadas gozam da liberdade que pode lhes oferecer ócio e segurança. No contra-fluxo estão as camadas sociais que buscam maior liberdade, retidas devido ao nãoacesso à educação e, conseqüentemente, à renda. Aqui pode ser exposta a idéia de Sen (2000) quando este aborda o assunto da condição de agente da mulher. Sen argumenta que a mulher não carece somente de anticoncepcionais ou outros métodos contraceptivos mascarados como políticas públicas de controle de natalidade – o autor deixa claro que é direito da mulher gozar de um bom planejamento público para suas necessidades, mas estes avanços ficam comprovados quando a mulher possui acesso a educação de qualidade e, por conseguinte, a bons empregos e a rendas elevadas. Nesse processo, a mulher passa a possuir capacidade de escolha e isso a faz mais livre e, portanto menos propensa às “imposições sociais” de procriação. Logo a principal função da liberdade é tornar livres aqueles (as) que queiram possuíla, assim como argumenta Polanyi (2000), “é isso que buscamos, ou seja, um mecanismo social que seja capaz de nos encaminharmos em direção à liberdade em que o individuo seja 5 livre para decidir”. Um relatório da ONU (1994, p. 17) aponta caminhos importantes para o desenvolvimento da liberdade de um indivíduo, como segue: as pessoas não se constituem meramente em instrumentos úteis para a produção de bens, e que o próprio desenvolvimento não é meramente produzir mais valor adicional independente de seu uso (...) atribuindo valor a vida humana apenas na visão de que pode ser instrumento de produção de lucro – visão de capital humano. Na sua forma extrema esta visão pode facilmente conduzir à escravidão da força de trabalho, como uso forçado de crianças e exploração dos trabalhadores como ocorreu na revolução industrial. (HDR, 1994) Porém em todos os níveis de desenvolvimento, os três aspectos a serem considerados como relevantes e essenciais para os seres humanos são aqueles que contemplam: uma vida longa e saudável, que permite aquisição de conhecimento e ter acesso aos recursos necessários para se atingir padrões dignos da vida (HDR, 1995) A perspectiva trazida pelos relatórios da ONU está associada a três aspectos essenciais do desenvolvimento que passam pela educação, longevidade e renda, constituindo assim, uma consistente base de liberdade, onde o agente possui a perspectiva de uma vida longa. Condição esta, induzida pelo acesso a instrumentos adequados de saúde, saneamento, moradia alimentação, lazer e etc. O segundo aspecto passa pelo acúmulo de conhecimento, ou seja, acesso a educação de qualidade, onde se assume que sem educação o individuo não pode conquistar qualquer avanço no propósito de liberdade e, conseqüentemente, de desenvolvimento. O último conceito passa pela renda média em que remuneração e condições de trabalho digno são pressupostos essenciais para a formação do agente. O exemplo a seguir é revelador da importância do processo citado anteriormente. Reunidos em cúpula vários ministros africanos concluíram que para um processo de desenvolvimento alcançar as perspectivas relatadas acima seria preciso ser composto fundamentalmente por quatro caracterizações: ambiental, econômico, científica e institucional. Este estudo considera três das quatro variáveis apontadas na África e substituí a variável cientifica pela variável social, pois se entende que esta variável em suma aparece antes da cientifica, não a diminuindo mas num aspecto de emergência a variável social se mostra mais urgente. Isso porque, vários indivíduos vêem negado o direito de saciar suas necessidades mais elementares como a fome; além de ainda não ser raro, pessoas com pouco acesso a saúde, saneamento básico ou água tratada, sendo obrigadas sob certa medida a passarem a vida lutando “desnecessariamente” contra a morbidez e sucumbindo a morte evitável. Este tipo fenômeno ocorre muitas vezes em países pobres e emergentes, onde as crianças, jovens, mulheres e idosos vêm com freqüência enfrentando este tipo de luta. 4 Expectativa de vida e desenvolvimento O leitor deve estar se perguntando se o objetivo deste estudo é afirmar que o desenvolvimento está subentendido nas liberdades de ações e descentralizações do poder de decisão sob as oportunidades sistemáticas ao processo de crescimento. Sob certa medida pode-se afirmar que sim. Isso explica o porquê da abordagem de alguns conceitos centrais de liberdade nesta parte do texto. 6 Ora, para fins deste estudo desenvolvimento e liberdade são conceitos tão imbricados que não faz diferença utilizar um ou outro. Antes, porém antes de explanar sobre desenvolvimento faz oportuno compreender seu oposto. Ménsáros (2002) levanta um debate conceitual acerca das conseqüências do subdesenvolvimento socioeconômico no qual o mundo ocidental e parte do oriente se vêem sub-rogados ao refletir que na tentativa de solucionar seus problemas a humanidade nada mais tem feito que “encher buraco cavando buracos cada vez maiores” e, continua ele, descobrir uma saída para este labirinto tem por imperativo passar por assimilar as contradições do sistema capitalista. Ao fazer isso, a humanidade deve optar por uma transição sustentável direcionada a uma ordem social por demasia diferente. Logo para Ménsáros (2002, p.134) (...) uma negação parcial do existente só pode ser considerada plausível e legitima se baseada numa visão estratégica coerente de todo o complexo social. A alternativa proposta – explicita ou implicitamente - deve ser sustentável em seu próprio conjunto social (...) Nas palavras acima fica clara a critica dos modelos de desenvolvimento utilizados pela sociedade contemporânea, onde nas últimas décadas um conjunto de enfoques oferecia uma alternativa de desenvolvimento centrada na idéia do “derrame”. A hipotética idéia de se atender aos indicadores macroeconômicos alcançando equilíbrio financeiro e progresso econômico é insustentável enquanto proposta de desenvolvimento, pois esta opção segundo ele não levou seus seguidores a lugar algum a não ser ao aumento da concentração de renda e riqueza (KLIKSBERG, 1998). Observar o desenvolvimento chegar à população mais carente e posteriormente, aos setores mais pobres requer um exame acurado da complexidade social, o que indica um caminho mais complexo e mais abrangente, podendo facilmente ser aceita aqui a discussão levantada por Castel (1995) sobre a necessidade de se debater as questões do tecido social, suas relações de trabalho e como fruto disso, a formação do estado social baseado na construção do equilíbrio tênue entre coesão e conflito. Estudos das Nações Unidas que incluem todos os países em desenvolvimento evidenciam que é importante uma nação alcançar sua estabilidade econômica e o equilíbrio financeiro, mas isso por si só, não melhora a distribuição de renda nem reduz à pobreza. Por muitos anos, acreditou-se que a maneira mais eficiente de se reduzir a pobreza e a desigualdade social era através do crescimento acelerado da economia. Contudo, a evidência empírica tem demonstrado que, embora um elevado crescimento econômico seja condição necessária, não se constitui, porém, numa condição suficiente para se reduzir a pobreza e a desigualdade social (KLIKSBERG, 1998). É possível, na opinião desse autor, haver elevadas taxas de crescimento econômico acompanhadas por exclusão, aculturamento social e até deteriorização do meio ambiente. Para ele é preciso observar a qualidade do crescimento e enxergar mais detalhes na relação entre o setor econômico, social e acrescenta-se aqui a vertente institucional. Relação esta que se torna possível na visão de Sen (2000) pelo processo que permite a liberdade de ações e decisões como as oportunidades reais que uma pessoa tem, dada suas circunstâncias sociais e pessoais. Para o autor a privação de liberdade pode surgir em razão de processos inadequados de desenvolvimento ou de oportunidades oferecidas a uma determinada pessoa. A visão exposta 7 acima por Kliksberg (1998) fundamenta uma das principais criticas realizadas por Sen ao desenvolvimento no modelo do derrame. A análise do desenvolvimento na visão de Sen considera alguns elementos constitutivos básicos, e isso passa, segundo o autor, pela elevação das capacidades das pessoas de levar o tipo de vida que elas valorizem. Tais capacidades podem ser aumentadas por políticas públicas e pelo uso efetivo da participação popular. Sen argumenta ainda que o êxito de uma sociedade deva ser avaliado prioritariamente segundo as liberdades substantivas que seus membros desfrutam. Outro argumento central na explanação do autor revela a importância das pessoas possuírem iniciativa individual, fator influente na perspectiva da eficácia social: (...) ter mais liberdade melhora a capacidade e o potencial das pessoas para cuidar de si mesmas e para influenciar as questões centrais do desenvolvimento, onde o argumento central para o desenvolvimento passa pelas condições de agente livre do homem (...) SEN, (2000) Neste sentido, o tópico do desenvolvimento, mesmo fugindo da simplificação, poderia ser facilmente interpretado da seguinte forma: a solução dos problemas de desenvolvimento requer, sob certa medida, mais liberdade de escolha por parte da população, e não menos. Isso implica uma série de fatores que passam pela iniciativa popular, até intervenções planejadas do setor público na sociedade (SEN, 2000). Não obstante as conclusões dessa concepção, a abstrata definição de desenvolvimento sustentável do relatório de Brundtland (1987) apud Nascimento (2008) assume que: O desenvolvimento deve procurar satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os habitantes naturais. (RELATÓRIO BRUNDTLAND 1987) A Organização das Nações Unidas – ONU no seu relatório HDR (1995) acrescenta ao assunto desenvolvimento o seguinte: (...) a segurança física, ou seja, as garantias de que o cidadão possa ir e vir livremente sem receio de ser assaltado, roubado e mesmo assassinado, e a garantia de trabalho digno, tanto em termos ambientais quanto em termos de remuneração digna (...). Obviamente, os autores se referiam ao imperativo de que qualquer tipo de desenvolvimento deve pressupor a eliminação da pobreza extrema; e em certa medida eles têm razão, dado que ninguém é capaz de se desenvolver sem antes ter satisfeitas suas necessidades básicas. Há relatórios das nações unidas afirmando que essas necessidades podem ser alcançadas se o individuo possuir um patamar mínimo de renda que arbitrariamente foi estabelecido no nível de US$ 1,00 por dia e em países ricos na casa de US$ 2,00 diários. O inconveniente nessa aferição passa pela variação cambial, ou seja, uma pessoa que mora no nordeste brasileiro com R$ 90,00 por mês, verba oriunda de programas sociais, por exemplo, não pode ser considerado pobre, isso porque seus míseros R$ 3,00 diários ainda são 8 maiores do que os R$ 1,75 equivalentes à cotação cambial de US$ 1,00 em novembro de 2009. Entretanto, não é preciso ir longe e verificar que com R$ 3,00 diários não se pode fazer muito, nem sequer se alimentar com dignidade. Lemos (2007). Neste contexto, para Sachs (1993) os novos paradigmas do desenvolvimento sustentável devem aceitar os seguintes itens como parâmetros a serem trabalhados: (i) ser solidário com as futuras gerações; (ii) satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos; (iii) buscar a participação efetiva da população envolvida; (iv) possuir metas de preservação ambiental (aqui se entende por meio-ambiente todo o meio antrópico e biota); (v) criar um sistema social que garanta o trabalho estável com remuneração e condições dignas de trabalho; e (vi) promover amplamente a educação. Logo, o desenvolvimento sustentável poderia ser descrito aqui sob diversas formas. Mas para efeito deste trabalho o desenvolvimento será sustentável se possuir fortalecida em suas características a dimensão ambiental, no aspecto amplo da palavra, será sustentável se promover condições necessárias para o progresso social e, portanto for eqüitativamente justo; deve haver base para que o indivíduo possa garantir suas necessidades básicas por meio do provento de suas ações, e que implica condições de renda digna e justa; e por fim, deve contemplar a dimensão institucional, que confere a representação política das tomadas de decisão no âmbito das mais diferentes instituições inseridas no ambiente social que possa garantir o desenvolvimento das outras variáveis, o que permite afirmar que esta possui a característica de aglutinar as condições de funcionalidade das outras três variáveis. Portanto, descobrir uma saída para esse labirinto de contradições que permeiam o sistema global do capital, exige uma transição com aspectos de sustentabilidade e sobre tudo uma ordem social diferente. Isso segundo Mészáros é “(...) mais imperativo hoje do que jamais foi diante da instabilidade cada vez mais ameaçadora”. Em outras palavras a expectativa de vida dos povos depende de respostas consistentes as propostas de desenvolvimento e tais respostas, não serão úteis se não passarem pelo aumento das liberdades. Logo identificar as contribuições ao aumento das liberdades que as variáveis fornecidas pela PNAD 2006 a 2008 como as demográficas, educacionais serviços públicos e rendimento médio mensal se torna imperativo o que justifica o objetivo deste estudo. 5 Metodologia O procedimento metodológico adotado se compõe de três fases bem distintas: coleta de dados secundários em publicações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, escolha das variáveis e análise quantitativa de correlação e regressão linear multivariada. A seguir essas etapas são detalhadas. 5.1 Dados coligidos Os dados foram todos retirados de publicações disponíveis na internet, de responsabilidade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São elas: Contas Regionais 2003-2007, quanto às informações sobre o PIB, a população e conseqüentemente o 9 PIB per capita de cada Estado, foram utilizadas as edições de 2006, 2007 e 2008 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), bem como todas as demais variáveis. O sistema de pesquisas domiciliares do IBGE foi implantado progressivamente no país desde 1967, e busca a “produção de informações básicas para o estudo do desenvolvimento socioeconômico do país” (IBGE, 2008, p. 16). Possui algumas características socioeconômicas que são investigadas de forma permanente, tais como caracteres demográficos gerais, educação, habitação e renda, e outras investigadas de forma mais esparsa, como saúde, nutrição e nupcialidade. Disso resultou a busca em três diferentes anuários para obter as características selecionadas para o presente trabalho. O processo de seleção da amostra foi explicado pelo próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e reproduzido a seguir para facilitar a ampla compreensão. No primeiro estágio, as unidades (municípios) foram classificados em duas categorias: auto-representativas (probabilidade 1 de pertencer à amostra) e não-auto-representativas. No segundo estágio, as unidades (setores censitários) foram selecionadas, em cada município da amostra, também com probabilidade proporcional e com reposição, com base Censo Demográfico 2000. No último estágio foram selecionados, com eqüiprobabilidade, em cada setor censitário da amostra, os domicílios particulares e as unidades de habitação em domicílios coletivos para investigação das características dos moradores e da habitação. (IBGE, 2007, p. 40): Privilegiou-se a obtenção de dados relativos ao exercício de 2007, em virtude de a publicação mais recente contendo dados sobre o PIB e a população datar do mesmo ano. Quando a informação buscada não estava disponível no PNAD 2007, buscou-se o PNAD 2008, e depois, caso ainda necessário, o PNAD 2006. 5.2 Variáveis escolhidas Muitas variáveis são coligidas a cada Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. A seleção daquelas que interessam a este trabalho levou em conta não somente a relevância, como também certa disparidade entre os estados, constatada em uma primeira vista. Buscouse selecionar variáveis com valores dissonantes nos estados, dado que o objetivo do artigo é exatamente buscar apontar aqueles cuja variação mais impacta a expectativa de vida do brasileiro. Como o próprio nome está a indicar, a PNAD é uma amostragem – processo pelo qual se inferem os parâmetros populacionais, a partir da análise de uma parcela (amostra) da população. Não obstante, deve-se ressaltar que se trata de amostras de grande porte – em 2008, por exemplo, foram pesquisadas 391.868 pessoas e 150.591 unidades domiciliadas, distribuídas por todas as unidades federativas (IBGE, 2008, p. 20), enquanto em 2007 foram 399.964 pessoas e 147.851 unidades domiciliares (IBGE, 2007, p. 20). Foram selecionadas 20 grandezas para a análise, sendo que uma delas, a expectativa de vida (EV), será a variável dependente para efeito de estimativa das retas de regressão multivariada. Isto posto, seguem as variáveis escolhidas, classificadas conforme definições do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística: - PIB (PIB2007) – o produto interno bruto, soma de todo que é produzido pela nação, foi extraído do relatório “Contas Regionais 2003-2007” Há variação entre os estados correspondendo a R$ 2,66 trilhões para o país em 2007, com valores para as unidades federadas desde R$ 4,17 bilhões para Roraima até R$ 902,8 bilhões para São Paulo. - PIB per capita (PIBpc2007) – consiste na simples divisão do PIB pela população residente. O valor nacional calculado é de R$ 14.465. A unidade federativa mais pobre, por esse 10 - - - - - - - - critério, é o Piauí, com PIB per capita de R$ 4.662, em 2007; e a mais rica é o Distrito Federal, com R$ 40.696 per capita. População residente (População) – composta pelos moradores presentes e ausentes, ou seja, pelas pessoas que tinham a unidade domiciliar como local de residência habitual, e não estavam ausentes, na data em que foram entrevistadas, por período superior a 12 meses. Nesses termos, a população brasileira de 2007 foi estimada em 184,0 milhões de pessoas. Expectativa de vida (EV) – Esse indicador foi retirado do PNAD 2006, constituindo a variável dependente no presente trabalho. A expectativa de vida do brasileiro era de 72,4 anos em 2006, em um espectro de 66,4 anos (para Alagoas) até 75,1 anos (para o Distrito Federal). Taxa de urbanização (TU) – percentual das pessoas residentes em área urbana. Indicador extraído do PNAD 2006. O qual estimou para o Brasil o valor de 83,3%, sendo o Piauí a unidade federativa mais rural (60,7% de população urbana), e o Rio de Janeiro a unidade federativa mais urbana (96,9%). Taxa de fecundidade (TF) – Número médio de filhos por mulher. O qual era de 2,0 em 2007 para o Brasil, variando de 1,6 filho por mulher no Rio Grande do Sul até 3,3 filhos por mulher em Roraima. Taxa de mortalidade infantil (TMI) – mortalidade infantil em óbitos por mil nascimentos. Aqui o valor médio de 25,1 para o Brasil em 2007, com valores extremos de 13,9 no Rio Grande do Sul e de 51,9 em Alagoas por mil nascidos. Taxa de frequência líquida ao ensino médio (TFLEM) – indicador do comparecimento ao estudo de nível médio, medido em percentagem. Os dados apresentaram em 2007 uma média nacional de 47,1%, variando de 25,4% em Alagoas até 65,8% em São Paulo. Média de anos de estudos de pessoas de 15 anos ou mais (MAE15) – indica a série e o nível ou grau que a pessoa estava freqüentando ou havia freqüentado, com aprovação, a partir da 1ª série do ensino fundamental. Considerada a população acima de 15 anos de idade completos. Em 2006, a média nacional foi de 7,2 anos de escolaridade, sendo Alagoas o estado menos escolarizado (5,1 anos), e o Distrito Federal o mais escolarizado (9,2 anos). Média de anos de estudos de pessoas de 25 anos ou mais (MAE25) – indica a série e o nível ou grau que a pessoa estava freqüentando ou havia freqüentado, com aprovação, a partir da 1ª série do ensino fundamental, considerada a população acima de 25 anos de idade completos. Em 2006, a média nacional foi de 6,7 anos de escolaridade, sendo Alagoas o menos escolarizado (4,7 anos), e o Distrito Federal o mais escolarizado (9,1 anos). Número médio de pessoas por domicílio (NPD) – indica a estimativa média de pessoas por domicilio. Em 2007, viviam em média 3,2 brasileiros em cada domicílio, sendo que o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul apresentaram os menores valores (2,9 pessoas) e o Amazonas apresentou o valor mais elevado (3,8 pessoas). Domicílios com rede de abastecimento de água (DRAE) – percentagem dos domicílios com serviço de abastecimento de água, com canalização interna. Eram 83,3% dos domicílios brasileiros em 2007, com variações nos estados desde 39,7% em Rondônia até 96,7% dos domicílios em São Paulo. Domicílios com rede coletora de esgoto ou fossa séptica (DRCE) – percentagem dos domicílios atendidos por serviço de esgotamento sanitário, seja mediante rede coletora (condutora dos dejetos para um desaguadouro geral, com ou sem estação de tratamento), seja por fossa séptica (com absorção no próprio terreno ou escoamento para desaguadouro 11 - - - - - - - geral). Em 2007, 73,6% dos domicílios brasileiros eram contemplados com algum desses serviços, com valores extremos em Mato Grosso (26,1%) e no Distrito Federal (95,1%). Domicílios com serviço de coleta de lixo (DCL) – percentagem dos domicílios atendidos por serviço de coleta de lixo, seja esse serviço de coleta direta (empresa de limpeza, pública ou privada que atendia o logradouro em que se situava o domicílio) ou de coleta indireta (lixo depositado em caçamba, tanque ou depósito de serviço de empresa de limpeza, pública ou privada, que posteriormente o recolhia). O parâmetro nacional de 2007 foi estimado em 87,5% dos domicílios brasileiros, com variação entre 54,1% (Piauí) e 98,6% (Distrito Federal). Domicílios com serviço de iluminação elétrica (DIL) – percentagem dos domicílios atendidos por serviço de iluminação elétrica, seja por rede pública, grupo gerador, energia solar ou qualquer outra forma de fonte. No âmbito brasileiro 98,2%, dos domicílios dispunham de energia elétrica em 2007, desde 88,8% no Piauí até 100,0% no Distrito Federal e no Rio de Janeiro. Domicílios com serviço telefônico (DST) – percentagem dos domicílios com linha telefônica fixa (telefone fixo convencional) instalada no domicílio, mesmo que de forma compartilhada. Dispunham desse serviço 77,0%, dos domicílios brasileiros em 2007, sendo 46,9% no Piauí e 95,7% no Distrito Federal. Trabalhadores contribuintes de algum sistema de previdência (TCP) – percentagem dos trabalhadores contribuintes de algum sistema de previdência federal (Instituto Nacional do Seguro Social – INSS ou Plano de Seguridade Social da União), estadual ou municipal. O total para o Brasil em 2007, foi de 50,7% dos trabalhadores, com uma variação de 24,4% (no Piauí) a 67,4% (em Santa Catarina). Índice GINI – indicador da distribuição da renda mensal das pessoas em idade ativa, com variação escalar entre 0 e 1, onde segundo tal indicador quanto mais próximo de O melhor, ou seja indica menor concentração de renda, e tanto mais próximo de 1 pior, onde há fortes indícios de concentração de renda. Em 2007, o valor nacional foi de 0,534, com valor mínimo de 0,470 em Santa Catarina e valor máximo de 0,604 no Distrito Federal. Rendimento médio mensal de todos os trabalhos (RMM) – valor em reais do rendimento obtido com os trabalhos desenvolvidos, para empregados e trabalhadores domésticos; para os empregadores e trabalhadores autônomos, a retirada mensal normalmente feita, ou, quando variável, a retirada média mensal referente ao mês de realização da pesquisa. O valor nacional desse parâmetro foi de R$ 956 para o Brasil, variando entre R$ 546, no Piauí, e R$ 1.970, no Distrito Federal. Diferença média entre os rendimentos de homens e mulheres (DRHM) – este indicador foi calculado a partir de dois outros, fornecidos pelo IBGE, e consiste no cálculo em percentual sobre o salário médio feminino da diferença a maior do salário médio masculino. Assim, sua fórmula é: DMRHM = 100x(RMM-RMF)/RMF, onde: DMRHM = diferença média entre o rendimento de homens e mulheres; RMM = rendimento médio masculino; RMF = rendimento médio feminino. Apurou-se em 2007, uma diferença média de 40,0% no Brasil, ou seja, nesse ano, em média os homens ganhavam 40% a mais que as mulheres, segundo apurado no PNAD; enquanto no Amapá a diferença foi de 10,6%, no Espírito Santo chegou a 61,4%. 5.3 Análise quantitativa 12 Na análise dos dados foram utilizadas as técnicas de correlação e de regressão linear multivariada. A análise da correlação e regressão compreende o estudo de dados amostrais para saber se e como duas ou mais variáveis estão relacionadas uma com a outra em uma população (STEVENSON, 1981, p. 341). Enquanto a correlação mede o grau de relacionamento entre as variáveis, a regressão fornece uma equação (função) para descrever esse relacionamento. A análise de correlação determina um número que expressa uma medida numérica do grau de relação de duas grandezas ou variáveis (BRUNI, 2009, p. 204); a correlação linear simples entre duas variáveis será feita pelo cálculo do coeficiente de correlação linear simples, denominado coeficiente r de Pearson. Calculada a correlação entre cada variável independente e a variável dependente escolhida (expectativa de vida), selecionaram-se aquelas com r maior ou igual a 0,6. Valor indicativo de correlação significativa para os objetivos deste trabalho. No passo seguinte, procedeu-se no SPSS (Statistical Package for Social Science) ao cálculo da regressão linear múltipla, utilizando todas as variáveis independentes com r maior ou igual a 0,6. Adotou-se a estimação stepwise, ou método por etapas ou passo a passo, o mais comum dos métodos de busca seqüencial, possibilitador do exame da contribuição adicional de cada variável independente ao modelo, já que cada variável é considerada para inclusão antes do desenvolvimento da equação (CORRAR; PAULO; FILHO, 2007, p. 159). Ao final, obteve-se uma reta de regressão, relacionando a variável estudada (expectativa de vida) àquelas que, em conjunto, explicam a maior fração da variação total dos dados. 6 Análise dos resultados 6.1 Correlação com a expectativa de vida (EV) Das 19 grandezas analisadas, as 12 seguintes foram selecionadas por apresentarem coeficientes de correlação significativos (valor do coeficiente de Pearson entre parênteses): Taxa de mortalidade infantil (-0,870), Domicílios com serviço telefônico (0,829), Trabalhadores contribuintes da previdência (0,829), Taxa de freqüência líquida ao ensino médio (0,781), Média de anos de estudo de pessoas de 15 anos ou mais (0,759), Média de anos de estudo de pessoas de 25 anos ou mais (0,738), PIB per capita (0,723), Rendimento médio mensal (0,723), Número médio de pessoas por domicílio (-0,675), Domicílios com coleta de lixo (0,670), Taxa de urbanização (0,614), Taxa de fecundidade (-0,612). Desse modo, a expectativa de vida ao nascer revelou significativas correlações positivas com a taxa de mortalidade infantil, a disponibilidade de serviço telefônico, a filiação dos trabalhadores a algum sistema oficial de previdência, a freqüência ao ensino médio, a escolaridade dos maiores de 15 e de 25 anos, o PIB per capita, o rendimento médio mensal, a disponibilidade de serviço de coleta de lixo e a taxa de urbanização. Revelou correlações negativas relevantes com o número médio de pessoas por domicílio e a taxa de fecundidade. Foram descartadas, por correlação abaixo do critério de corte adotado (valor modular do coeficiente de Pearson 0,6) as seguintes variáveis: índice GINI (-0,282), População (0,347), Domicílios com serviço de rede de abastecimento de água (0,398), PIB (0,416), Domicílios com rede coletora de esgoto ou fossa séptica (0,476), Domicílios com rede de iluminação elétrica (0,483) e diferença média entre o rendimento de homens e mulheres (0,544). O índice GINI teve o menor valor modular dentre todos os coeficientes de correlação calculados – o que pode indicar pouca ligação com a expectativa de vida. Entretanto, por 13 limitação presente no recorte espacial feito no fenômeno pesquisado, o presente estudo evidência a necessidade de uma analise mais apurada dessa ou de qualquer uma das correlações em particular sendo imperativo um exame maior da série histórica, valendo lembrar que a PNAD é uma pesquisa amostral realizada anualmente pelo IBGE desde 1967. 6.21 Regressão linear multivariada Procedeu-se então, no software SPSS, a uma regressão linear multivariada, adotando-se a expectativa de vida (EV) como variável dependente e as 12 variáveis significativamente correlacionadas com aquela, já relacionadas, como variáveis independentes. Adotou-se o método stepwise, com estimação dos coeficientes de regressão. Os valores preditos (predicted values) e os resíduos (residuals) foram padronizados. O sistema SPSS calculou, então, três opções de regressão. O modelo univariado considerou apenas a taxa de mortalidade infantil como variável independente, com r2 = 0,756, ou seja, um poder de explicação de 75,6% da variação total dos dados; o modelo bivariado acrescentou a taxa de fecundidade, chegando a 84,0% o valor do coeficiente de determinação r2; o modelo com três variáveis independentes incluiu o índice de domicílios com serviço telefônico, mas nesse caso o ganho no valor do coeficiente de determinação foi pouco significativo, com r2 = 87,7%. O erro-padrão da estimativa foi de 1,2304 no modelo univariado, 1,0185 no bivariado e no trivariado, 0,9105; os resíduos da soma dos quadrados (sum of squares) também foi progressivamente reduzido, de 37.849 para 24.896 e depois 19.095, denotando a progressiva precisão da função de regressão à medida que aumentam o número de variáveis explicativas. Para os três modelos, o teste F-ANOVA apresentou sig = 0,000, ou seja, menor que alfa, sendo rejeitada a hipótese de que o r2 seja igual a zero, de modo que há influência sobre o valor da variável dependente EV, ou seja, o modelo, nos três casos, é significativo. Os coeficientes de regressão estão apresentados no quadro Coefficients. Em todos os casos, o valor de Sig para cada coeficiente (inclusive os coeficientes lineares, ou interceptos) foi satisfatório, mais uma vez atestando a significância dos modelos. Na coluna Beta observa-se a influência relativa de cada variável independente na reta de regressão, de modo que, no modelo bivariado, a taxa de mortalidade infantil tem aproximadamente o dobro da importância da taxa de fecundidade na determinação da expectativa de vida; já no modelo trivariado, o percentual de domicílios atendidos por serviço telefônico apresentou-se um pouco mais determinante do que a taxa de fecundidade, sendo que ambos correspondem, cada um, a aproximadamente metade do peso da taxa de mortalidade infantil. São as seguintes as retas de regressão obtidas: Sendo: EV = expectativa de vida ao nascer, em anos; TMI = taxa de mortalidade infantil, em percentagem; TF = taxa de fecundidade, em número de filhos e DAST = taxa de domicílios atendidos por serviço telefônico. EV = 77,514 – 0,227TMI (Modelo Univariado com poder de explicação de 75,6%) EV = 80,630 – 0,194TMI – 1,833TF (Modelo Bivariado com poder de explicação de 84,0%) EV = 74,234 – 0,145TMI – 1,361TF + 0,057DSAT ( Modelo Trivariado com poder de explicação de 87,7%) Observou-se assim que, em função dos dados coligidos, a expectativa de vida ao nascer dos brasileiros pode ser estimada a partir das taxas de mortalidade infantil (o que é intuitivo, 14 já que um menor número de mortes prematuras inevitavelmente contribuirá para o aumento da expectativa de vida em geral) onde o investimento de uma unidade monetária em TMI, reduzirá em 0,145 a taxa de mortalidade infantil, de fecundidade (o sinal negativo está a indicar que menos filhos tendem a render-lhes a expectativa de maior longevidade) onde o investimento de uma unidade monetária aumenta em 1,361 a taxa de fecundidade e, curiosamente, à taxa de domicílios com serviços telefônicos, que possivelmente apareceu como a terceira variável dado sua crescente assimilação por parte da população brasileira, onde o investimento de uma unidade monetária produz um acréscimo em 0,057 em DSAT. As demais variáveis não foram consideradas relevantes para efeito de determinação da equação de regressão linear. Entretanto, deve ser lembrado que o aporte dos serviços públicos de qualidade, nas áreas de saúde, educação e política protetora tendem a favorecer o aumento das liberdades do cidadão. Conclusão Considerou-se atingidos os objetivos para o conjunto de dados estudados, as variáveis mais fortemente ligadas à expectativa de vida nos diversos estados brasileiros. As duas primeiras, em relação inversa: as taxas de mortalidade infantil e de natalidade. O fato de expectativa de vida e mortalidade infantil se relacionarem de forma inversa é intuitivo, mas não o de que seja esta a variável mais relacionada àquela, dentre todas as estudadas. Outra descoberta é a de que uma menor taxa de natalidade (menor número de filhos por mulher) resulta em maior expectativa de vida. A terceira variável surpreende por sua aparente desconexão com a expectativa de vida: a oferta de serviços de comunicação telefônica nos domicílios apareceu à frente não apenas de outros serviços públicos considerados mais essenciais, como energia elétrica e esgotamento sanitário. Estudos posteriores e mais aprofundados são necessários para investigar com maior apuro as conclusões apresentadas. Não sem razão, a redução da mortalidade infantil está intimamente associada à prestação de serviços públicos de qualidade na área da saúde e segurança protetora. Na seqüência, a redução da fecundidade vem associada diretamente a políticas de planejamento familiar e a condição de agente da mulher, onde maior grau de educação tende a torná-la mais critica do seu papel de procriação, aumentando sua liberdade, neste estudo entendida por expectativa de vida. Estas analises ainda que carentes de mais detalhamentos possibilitam responder que as variáveis associadas a educação e prestação de serviços públicos contribuem diretamente para o aumento da expectativa de vida, o que responde parte da hipótese deste estudo e reforça o debate apresentado no referencial teórico em onde se discute que desenvolvimento como liberdade esta associado mais com serviços públicos de saúde e educação à PIB per capta. Referências BRASIL. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Contas Regionais do Brasil 2003-2007. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/contasregionais/2003_2007/contas_region ais_2003_2007.pdf. Acesso em: 3 jan. 2010. ________, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa nacional por amostra de domicílios. Volume 27. 2006. Disponível em: 15 http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2006/default.sht m. 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