Expectativa de Vida à Luz da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD 2006 A 2008)
Autoria: Rafael dos Santos da Silva, Francisco Correia de Oliveira, Jonas Ferreira Araujo Junior
Resumo
O objetivo deste trabalho é investigar se as variáveis divulgadas na Pesquisa Nacional
de Amostra por Domicilio (PNAD), associadas à demografia, educação, renda e prestação de
serviços públicos revelam-se influentes na expectativa de vida dos cidadãos brasileiros. Para
tanto, adotou-se como referencial teórico a Teoria do Desenvolvimento como Liberdade
formulada pelo economista indiano Amartya Sen. A pesquisa concentrou esforços na
interpretação de dados quantitativos selecionados das edições de 2006 a 2008 da Pesquisa
Nacional de Amostra por Domicilio (PNAD), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE). O presente estudo pode ser classificado como exploratório e
quantitativo, utilizando-se como técnica de análise as análise de correlação e a regressão
linear múltipla. Também foram realizadas pesquisas bibliográficas, uma vez que foi
examinada a plataforma teórica da Teoria do Desenvolvimento como Liberdade, e assim, a
partir das explicações da teoria foram selecionadas as variáveis que fariam parte do estudo.
Dessa forma, foram selecionadas 20 variáveis para a análise, sendo que uma delas, a
expectativa de vida (EV), foi considerada como a variável dependente, para efeito da
estimativa das retas de regressão multivariada. Durante a análise dos dados, foram
identificadas as variáveis que mais se relacionam à expectativa de vida, considerando-se cada
caso nos diversos estados brasileiros. Como instrumento de análise foi utilizado o software
SPSS (Statistical Package for Social Science) para o cálculo da regressão linear múltipla,
utilizando-se todas as variáveis independentes com r maior ou igual a 0,6. Adotou-se a
estimação stepwise. A análise dos resultados revelou que das 19 variáveis restantes
analisadas, 12 apresentaram coeficientes de correlação significativos: Taxa de mortalidade
infantil (-0,870), Domicílios com serviço telefônico (0,829), Trabalhadores contribuintes da
previdência (0,829), Taxa de freqüência líquida ao ensino médio (0,781), Média de anos de
estudo de pessoas de 15 anos ou mais (0,759), Média de anos de estudo de pessoas de 25 anos
ou mais (0,738), PIB per capita (0,723), Rendimento médio mensal (0,723), Número médio
de pessoas por domicílio (-0,675), Domicílios com coleta de lixo (0,670), Taxa de
urbanização (0,614), Taxa de fecundidade (-0,612). Concluiu-se que taxas de mortalidade
infantil, taxa de natalidade, e a oferta do serviço de telefonia fixa foram as três variáveis que
mostraram maior relação com a variável expectativa de vida. Os resultados inferem que as
melhorias, principalmente nas condições higiênicas e sanitárias, são determinantes para a
melhoria, tanto das taxas de mortalidade quanto para o aumento da expectativa de vida.
1 1 Introdução
Previamente a qualquer debate conceitual faz-se necessário contextualizar alguns pontos
relevantes para o entendimento e à melhoria da expectativa de vida de um cidadão ou mesmo
de uma população.
Defende-se que a expectativa de vida está intimamente associada ao grau de liberdade e
acesso aquilo que julgar necessário para sua vida; ao importante papel de agente da sua
promoção e ao nível de desenvolvimento esperado. Estes tópicos serão explorados no
referencial teórico.
Este trabalho constituir-se de um estudo exploratório, buscou-se determinar variáveis
capazes de refletir a instrumentalização das liberdades básicas da população e assim construir
um cenário promissor para a expectativa de vida. Nestes termos, não raro poderão ser
verificadas variáveis associadas, direta ou indiretamente, às oportunidades econômicas que
um indivíduo necessita para alcançar seus intitulamentos, variáveis que se bem utilizadas
facilitam as relações naturais de troca.
Também, variáveis com fortes características sociais foram utilizadas, sobretudo, em
duas áreas temáticas – educação e serviços públicos. Estas foram entendidas como
importantes por possibilitar dentre outras coisas, participação mais efetiva em atividades
econômicas e políticas. No curso da história, tais interações sociais têm se mostrado
fundamentais quando se trata de proporcionar aos indivíduos melhores expectativas de vida.
Nestes termos, é interesse deste trabalho verificar se a oferta de melhores serviços
públicos, educação e distribuição de renda, aos moldes da PNAD, influenciam
favoravelmente nos patamares da expectativa de vida. Buscando abrangência sem perda de
objetividade, julgou-se oportuno investigar 19 variáveis, associadas à demografia, educação,
serviços públicos e renda. As variáveis escolhidas são apresentadas na seção referente à
metodologia.
Uma vez definidas as variáveis e selecionados os dados respectivos, procedeu-se à
correlação relativamente à expectativa de vida, e a seguir a uma análise de regressão linear
múltipla, com todas as variáveis cujo coeficiente de correlação tenha se mostrado
significativo. Os resultados são analisados em seção específica.
2 Expectativa de Vida
Um dos principais objetivos do ser humano é se dedicar ao aumento da expectativa de
vida de sua raça, por razões óbvias e abrangentes a cada um. Ocorre que durante muito tempo
a expectativa de vida estava associada ao PNB per capita – (Produto Nacional Bruto dividido
pela quantidade de pessoas do país) considerava-se que a elevação média da renda de uma
determinada população seria a solução dos problemas relacionados a viver mais e melhor. No
contra ponto disso recorre-se à definição de riqueza de Aristóteles (1980) quando este afirma
que “a riqueza evidentemente não é o bem que se estar buscando, sendo ela meramente útil e
em proveito de alguma outra coisa.”
Ainda sendo um instrumento recorrente a muitos governos nos dias atuais a lei do
derrame (como é comumente conhecida a iniciativa que visa aumentar os intitulamentos
econômicos a ponto de sofrerem gradual processo de derrame em direção às camadas mais
inferiores da sociedade e assim, supostamente, provocar o desenvolvimento econômico) tem
sido alvo de criticas contundentes do ponto de vista qualitativo; e também estudos
quantitativos têm demonstrado que mesmo havendo estreita relação entre longevidade e renda
2 per capita, pode ser um erro preocupar-se em demasia com as realizações de renda e
sobrevivência. Este fato ganha explicação diante do argumento de que relações estatísticas
requerem atenção antes de provocar qualquer justificativa convincente para a relevância das
disposições sociais caminhando para além da opulência baseada nos rendimentos. Sen (2000).
Estudos realizados por Sudhil Anand e Ravallion (1993) com base em comparações
entre países revelaram que há de fato uma relação positiva entre PNB per capita e expectativa
de vida. Entretanto as relações mais fortes se revelam entre distribuição de renda,
especialmente nas populações mais pobres, e investimentos públicos, com a variável saúde
aparecendo como a principal.
Na análise feita por Anand e Ravallion, parece haver uma forte inclinação para o
desaparecimento da variável PNB per capita como instrumento efetivo de combate à pobreza.
Sen (2000) vai argumentar que “(...) o crescimento econômico não pode ser considerado, de
forma sensata, um fim em si mesmo (...)”
O economista indiano Amartya Sen (2000), no seu trabalho “Desenvolvimento como
liberdade”, afirma que estudos empíricos têm demonstrado que a expectativa de vida não se
eleva com o PNB per capita, mas há indícios bastante plausíveis que inclinam para uma
relação funcional entre aumento das expectativas de vida e dispêndio público como serviços
de saúde e combate à pobreza extrema pelo instrumento de distribuição direta. O que reforça
o estudo de Sudhil Anand e Ravallion.
Contudo, adverte que o impacto do crescimento econômico depende da maneira como
seus frutos são aproveitados, e isso em certa medida pode explicar de que forma economias de
países como a Coréia do Sul e Taiwan, foram capazes de elevar suas expectativas de vida tão
rapidamente por meio do crescimento econômico. Que nos casos específicos, vieram
acompanhados pela variável educação.
Nessas economias, continua Sen, a expansão das oportunidades sociais serviu para
facilitar o desenvolvimento econômico favorecido na maioria das vezes por alta oferta de
emprego, baixas taxas de mortalidade e, conseqüentemente, aumento da expectativa de vida.
Em um estudo realizado em Oxford, dirigido por Jean Drèze e Amertya Sen em 1989,
propôs-se uma distinção entre duas formas de crescimento. De um lado estava o crescimento
mediado pelo desenvolvimento econômico; do outro, o crescimento conduzido pelo custeio
público.
Ao contrário da primeira (eminentemente liberal), a segunda forma deve operar por
meio de uma hábil e complexa manutenção dos serviços sociais de saúde, educação e outras
disposições sociais relevantes como a liberdade de escolha, garantias protetoras e acesso a
oportunidades básicas, de viver, por exemplo. O estudo conclui que o segundo modelo se
aproxima mais estreitamente da expansão da expectativa de vida, do que o primeiro (modelo
liberal).
A seguir, um gráfico de um estudo onde se compara a relação entre o PIB per capita e a
expectativa de vida ao nascer para seis países, inclusive o Brasil, o terceiro maior crescimento
econômico do século XX, ficando atrás somente da Alemanha pós-guerra e do Japão, onde o
processo de expansão se deu de forma desenfreada e em descompasso com a oferta das
oportunidades sociais. Não sendo raro constatar isso, bastando para tanto, olhar para o
descaso dado ao serviço público de saúde, constituindo um problema crônico que continua a
imperar na primeira década do século XXI.
3 Gráfico Expectativa de Vida ao nascer (em anos)
Fonte: Wold Bank and Wold Development Report - Desenvolvimento como liberdade Amartya Sen - (2000 p
64)
Da esquerda para a direita a posição dos países pesquisados foram Kerela (mesmo não
sendo uma nação, possui porte para tanto, o que justifica sua inclusão na pesquisa. O estado
de Kerela é o segundo maior estado da Índia) China, Sri Lanka, Namíbia, Brasil, África do
Sul e Gabão. A primeira coluna (mais escura) representa crescimento econômico enquanto
que a coluna da esquerda (mais clara) representa a linha da expectativa de vida
Na leitura realizada no gráfico é possível constatar que apesar de possuir um nível de
renda muito baixo, os habitantes de lugares como Kerela, China e Sri Lanka apresentam
níveis de expectativa de vida muito maiores do que aqueles países que apresentam níveis de
PIB per capita mais elevados, como o Brasil. O Graf. 2 revela
Há pouca relação entre expectativa de vida e PNB per capita.
Grafico Expectativa de vida e PNB per capita
Fonte: phases of capitalist development, NY, Oxford University – Desenvolvimento como Liberdade (2000 pp
70)
A linha vermelha (com forte inclinação para baixo, inicialmente) representa o
crescimento do PNB per capita, que logo avança em detrimento da outra linha, de cor verde,
representando aqui a expectativa de vida. A leitura possível neste gráfico, que visa retratar a
relação entre o PNB per capita e a expectativa de vida de um país europeu, é justamente
compreender que se há relação entre estas duas variáveis é de proporcionalidade inversa (ao
menos neste caso específico). Desmistifica-se, portanto, o associativismo de causa e efeito
entre PNB per capita e expectativa de vida, introduzida sob certa medida, de forma
convincente no senso comum.
Entretanto, para se contrapor a um argumento forte como o PNB per capita, há de se
apresentar outras variáveis de referência que possam impactar diretamente na expectativa de
vida. Neste sentido, lançou-se mão dos dados da PNAD, 2006 a 2008, onde foram
4 identificadas 19 variáveis capazes de estabelecer relação com a variável expectativa de vida,
fato este que se associa diretamente a dois pontos centrais deste estudo.
Um deles é a liberdade, composta por um número considerável de outras variáveis, mas
com a idéia básica de que a expansão da liberdade humana deve ser tanto o centro como o
meio de uma segunda variável – o desenvolvimento. Esta variável, cuja concepção adequada
deve ir para além da acumulação da riqueza e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB),
argumenta Sen (2000) “precisa estar relacionada com a melhora da vida e dos aumentos das
liberdades”. Para tanto, tal expansão, continua o indiano, “(...) nos tornam seres mais
completos, ao permitir que sejamos mais desimpedidos e conseqüentemente mais livres,
dando-se condições de interagir com o mundo em que se vive e, sobretudo, influenciando
ele.”
Estas duas vertentes (Liberdade e Desenvolvimento) podem ainda, se bem articuladas,
sustentar uma pluralidade de instituições dentro de um sistema democrático, sendo exigidos
mecanismos legais, seja de mercado ou de provisão de serviços públicos básicos e de
qualidade.
Os papéis fundamentais da liberdade que basicamente incluem variáveis econômicas,
liberdades políticas, oportunidades sociais, garantias de transparência e segurança protetora,
estão associadas à expectativa de vida que na PNAD são representadas por variáveis:
demografia, educação, renda e prestação de serviços públicos. Assim como o processo de
desenvolvimento pode se mostrar crucial para assegurar tais liberdades e conseqüentemente
promover um desencadeamento inter-relacionado entre direitos, oportunidades e outros
intitulamentos que um ser humano possui razões abrangentes para recorrer.
3 Expectativa de vida e liberdade
O problema da liberdade para Polanyi (2000) passa por dois eixos centrais, apesar de
diferentes: o institucional e o moral. No eixo institucional cabe a ação de equilibrar o aumento
ou a diminuição da liberdade, onde as instituições são vistas como materializações daquilo
que o ser humano assume por significado. Aqui o autor enfatiza que “não se pode atingir a
liberdade que tanto procuramos sem antes compreendermos o verdadeiro significado da
liberdade numa sociedade incerta e, conseqüentemente, complexa”.
Este tipo de entendimento exige uma abstração acurada sob o ponto de vista
regulatório, sobretudo quando aplicadas a distintos contextos sociais onde, por exemplo, as
classes mais abastadas gozam da liberdade que pode lhes oferecer ócio e segurança. No
contra-fluxo estão as camadas sociais que buscam maior liberdade, retidas devido ao nãoacesso à educação e, conseqüentemente, à renda.
Aqui pode ser exposta a idéia de Sen (2000) quando este aborda o assunto da
condição de agente da mulher. Sen argumenta que a mulher não carece somente de
anticoncepcionais ou outros métodos contraceptivos mascarados como políticas públicas de
controle de natalidade – o autor deixa claro que é direito da mulher gozar de um bom
planejamento público para suas necessidades, mas estes avanços ficam comprovados quando
a mulher possui acesso a educação de qualidade e, por conseguinte, a bons empregos e a
rendas elevadas. Nesse processo, a mulher passa a possuir capacidade de escolha e isso a faz
mais livre e, portanto menos propensa às “imposições sociais” de procriação.
Logo a principal função da liberdade é tornar livres aqueles (as) que queiram possuíla, assim como argumenta Polanyi (2000), “é isso que buscamos, ou seja, um mecanismo
social que seja capaz de nos encaminharmos em direção à liberdade em que o individuo seja
5 livre para decidir”. Um relatório da ONU (1994, p. 17) aponta caminhos importantes para o
desenvolvimento da liberdade de um indivíduo, como segue:
as pessoas não se constituem meramente em instrumentos úteis para a produção de bens, e
que o próprio desenvolvimento não é meramente produzir mais valor adicional
independente de seu uso (...) atribuindo valor a vida humana apenas na visão de que pode
ser instrumento de produção de lucro – visão de capital humano. Na sua forma extrema esta
visão pode facilmente conduzir à escravidão da força de trabalho, como uso forçado de
crianças e exploração dos trabalhadores como ocorreu na revolução industrial. (HDR, 1994)
Porém em todos os níveis de desenvolvimento, os três aspectos a serem considerados como
relevantes e essenciais para os seres humanos são aqueles que contemplam: uma vida longa
e saudável, que permite aquisição de conhecimento e ter acesso aos recursos necessários
para se atingir padrões dignos da vida (HDR, 1995)
A perspectiva trazida pelos relatórios da ONU está associada a três aspectos essenciais
do desenvolvimento que passam pela educação, longevidade e renda, constituindo assim, uma
consistente base de liberdade, onde o agente possui a perspectiva de uma vida longa.
Condição esta, induzida pelo acesso a instrumentos adequados de saúde, saneamento, moradia
alimentação, lazer e etc.
O segundo aspecto passa pelo acúmulo de conhecimento, ou seja, acesso a educação de
qualidade, onde se assume que sem educação o individuo não pode conquistar qualquer
avanço no propósito de liberdade e, conseqüentemente, de desenvolvimento. O último
conceito passa pela renda média em que remuneração e condições de trabalho digno são
pressupostos essenciais para a formação do agente. O exemplo a seguir é revelador da
importância do processo citado anteriormente.
Reunidos em cúpula vários ministros africanos concluíram que para um processo de
desenvolvimento alcançar as perspectivas relatadas acima seria preciso ser composto
fundamentalmente por quatro caracterizações: ambiental, econômico, científica e
institucional.
Este estudo considera três das quatro variáveis apontadas na África e substituí a variável
cientifica pela variável social, pois se entende que esta variável em suma aparece antes da
cientifica, não a diminuindo mas num aspecto de emergência a variável social se mostra mais
urgente.
Isso porque, vários indivíduos vêem negado o direito de saciar suas necessidades mais
elementares como a fome; além de ainda não ser raro, pessoas com pouco acesso a saúde,
saneamento básico ou água tratada, sendo obrigadas sob certa medida a passarem a vida
lutando “desnecessariamente” contra a morbidez e sucumbindo a morte evitável. Este tipo
fenômeno ocorre muitas vezes em países pobres e emergentes, onde as crianças, jovens,
mulheres e idosos vêm com freqüência enfrentando este tipo de luta.
4 Expectativa de vida e desenvolvimento
O leitor deve estar se perguntando se o objetivo deste estudo é afirmar que o
desenvolvimento está subentendido nas liberdades de ações e descentralizações do poder de
decisão sob as oportunidades sistemáticas ao processo de crescimento. Sob certa medida
pode-se afirmar que sim. Isso explica o porquê da abordagem de alguns conceitos centrais de
liberdade nesta parte do texto.
6 Ora, para fins deste estudo desenvolvimento e liberdade são conceitos tão imbricados
que não faz diferença utilizar um ou outro. Antes, porém antes de explanar sobre
desenvolvimento faz oportuno compreender seu oposto. Ménsáros (2002) levanta um debate
conceitual acerca das conseqüências do subdesenvolvimento socioeconômico no qual o
mundo ocidental e parte do oriente se vêem sub-rogados ao refletir que na tentativa de
solucionar seus problemas a humanidade nada mais tem feito que “encher buraco cavando
buracos cada vez maiores” e, continua ele, descobrir uma saída para este labirinto tem por
imperativo passar por assimilar as contradições do sistema capitalista. Ao fazer isso, a
humanidade deve optar por uma transição sustentável direcionada a uma ordem social por
demasia diferente.
Logo para Ménsáros (2002, p.134)
(...) uma negação parcial do existente só pode ser considerada plausível e legitima se
baseada numa visão estratégica coerente de todo o complexo social. A alternativa
proposta – explicita ou implicitamente - deve ser sustentável em seu próprio
conjunto social (...)
Nas palavras acima fica clara a critica dos modelos de desenvolvimento utilizados pela
sociedade contemporânea, onde nas últimas décadas um conjunto de enfoques oferecia uma
alternativa de desenvolvimento centrada na idéia do “derrame”.
A hipotética idéia de se atender aos indicadores macroeconômicos alcançando
equilíbrio financeiro e progresso econômico é insustentável enquanto proposta de
desenvolvimento, pois esta opção segundo ele não levou seus seguidores a lugar algum a não
ser ao aumento da concentração de renda e riqueza (KLIKSBERG, 1998).
Observar o desenvolvimento chegar à população mais carente e posteriormente, aos
setores mais pobres requer um exame acurado da complexidade social, o que indica um
caminho mais complexo e mais abrangente, podendo facilmente ser aceita aqui a discussão
levantada por Castel (1995) sobre a necessidade de se debater as questões do tecido social,
suas relações de trabalho e como fruto disso, a formação do estado social baseado na
construção do equilíbrio tênue entre coesão e conflito.
Estudos das Nações Unidas que incluem todos os países em desenvolvimento
evidenciam que é importante uma nação alcançar sua estabilidade econômica e o equilíbrio
financeiro, mas isso por si só, não melhora a distribuição de renda nem reduz à pobreza.
Por muitos anos, acreditou-se que a maneira mais eficiente de se reduzir a pobreza e a
desigualdade social era através do crescimento acelerado da economia. Contudo, a
evidência empírica tem demonstrado que, embora um elevado crescimento econômico seja
condição necessária, não se constitui, porém, numa condição suficiente para se reduzir a
pobreza e a desigualdade social (KLIKSBERG, 1998).
É possível, na opinião desse autor, haver elevadas taxas de crescimento econômico
acompanhadas por exclusão, aculturamento social e até deteriorização do meio ambiente. Para
ele é preciso observar a qualidade do crescimento e enxergar mais detalhes na relação entre o
setor econômico, social e acrescenta-se aqui a vertente institucional. Relação esta que se torna
possível na visão de Sen (2000) pelo processo que permite a liberdade de ações e decisões
como as oportunidades reais que uma pessoa tem, dada suas circunstâncias sociais e pessoais.
Para o autor a privação de liberdade pode surgir em razão de processos inadequados de
desenvolvimento ou de oportunidades oferecidas a uma determinada pessoa. A visão exposta
7 acima por Kliksberg (1998) fundamenta uma das principais criticas realizadas por Sen ao
desenvolvimento no modelo do derrame.
A análise do desenvolvimento na visão de Sen considera alguns elementos
constitutivos básicos, e isso passa, segundo o autor, pela elevação das capacidades das
pessoas de levar o tipo de vida que elas valorizem. Tais capacidades podem ser aumentadas
por políticas públicas e pelo uso efetivo da participação popular.
Sen argumenta ainda que o êxito de uma sociedade deva ser avaliado prioritariamente
segundo as liberdades substantivas que seus membros desfrutam. Outro argumento central na
explanação do autor revela a importância das pessoas possuírem iniciativa individual, fator
influente na perspectiva da eficácia social:
(...) ter mais liberdade melhora a capacidade e o potencial das pessoas para cuidar de si
mesmas e para influenciar as questões centrais do desenvolvimento, onde o argumento
central para o desenvolvimento passa pelas condições de agente livre do homem (...) SEN,
(2000)
Neste sentido, o tópico do desenvolvimento, mesmo fugindo da simplificação, poderia
ser facilmente interpretado da seguinte forma:
a solução dos problemas de desenvolvimento requer, sob certa medida, mais
liberdade de escolha por parte da população, e não menos. Isso implica uma
série de fatores que passam pela iniciativa popular, até intervenções
planejadas do setor público na sociedade (SEN, 2000).
Não obstante as conclusões dessa concepção, a abstrata definição de desenvolvimento
sustentável do relatório de Brundtland (1987) apud Nascimento (2008) assume que:
O desenvolvimento deve procurar satisfazer as necessidades da geração atual, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias
necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível
satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural,
fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies
e os habitantes naturais. (RELATÓRIO BRUNDTLAND 1987)
A Organização das Nações Unidas – ONU no seu relatório HDR (1995) acrescenta ao
assunto desenvolvimento o seguinte:
(...) a segurança física, ou seja, as garantias de que o cidadão possa ir e vir livremente sem
receio de ser assaltado, roubado e mesmo assassinado, e a garantia de trabalho digno, tanto
em termos ambientais quanto em termos de remuneração digna (...).
Obviamente, os autores se referiam ao imperativo de que qualquer tipo de
desenvolvimento deve pressupor a eliminação da pobreza extrema; e em certa medida eles
têm razão, dado que ninguém é capaz de se desenvolver sem antes ter satisfeitas suas
necessidades básicas.
Há relatórios das nações unidas afirmando que essas necessidades podem ser alcançadas
se o individuo possuir um patamar mínimo de renda que arbitrariamente foi estabelecido no
nível de US$ 1,00 por dia e em países ricos na casa de US$ 2,00 diários.
O inconveniente nessa aferição passa pela variação cambial, ou seja, uma pessoa que
mora no nordeste brasileiro com R$ 90,00 por mês, verba oriunda de programas sociais, por
exemplo, não pode ser considerado pobre, isso porque seus míseros R$ 3,00 diários ainda são
8 maiores do que os R$ 1,75 equivalentes à cotação cambial de US$ 1,00 em novembro de
2009. Entretanto, não é preciso ir longe e verificar que com R$ 3,00 diários não se pode fazer
muito, nem sequer se alimentar com dignidade. Lemos (2007).
Neste contexto, para Sachs (1993) os novos paradigmas do desenvolvimento sustentável
devem aceitar os seguintes itens como parâmetros a serem trabalhados: (i) ser solidário com
as futuras gerações; (ii) satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos; (iii) buscar a
participação efetiva da população envolvida; (iv) possuir metas de preservação ambiental
(aqui se entende por meio-ambiente todo o meio antrópico e biota); (v) criar um sistema social
que garanta o trabalho estável com remuneração e condições dignas de trabalho; e (vi)
promover amplamente a educação.
Logo, o desenvolvimento sustentável poderia ser descrito aqui sob diversas formas. Mas
para efeito deste trabalho o desenvolvimento será sustentável se possuir fortalecida em suas
características a dimensão ambiental, no aspecto amplo da palavra, será sustentável se
promover condições necessárias para o progresso social e, portanto for eqüitativamente justo;
deve haver base para que o indivíduo possa garantir suas necessidades básicas por meio do
provento de suas ações, e que implica condições de renda digna e justa; e por fim, deve
contemplar a dimensão institucional, que confere a representação política das tomadas de
decisão no âmbito das mais diferentes instituições inseridas no ambiente social que possa
garantir o desenvolvimento das outras variáveis, o que permite afirmar que esta possui a
característica de aglutinar as condições de funcionalidade das outras três variáveis.
Portanto, descobrir uma saída para esse labirinto de contradições que permeiam o
sistema global do capital, exige uma transição com aspectos de sustentabilidade e sobre tudo
uma ordem social diferente. Isso segundo Mészáros é “(...) mais imperativo hoje do que
jamais foi diante da instabilidade cada vez mais ameaçadora”.
Em outras palavras a expectativa de vida dos povos depende de respostas consistentes
as propostas de desenvolvimento e tais respostas, não serão úteis se não passarem pelo
aumento das liberdades. Logo identificar as contribuições ao aumento das liberdades que as
variáveis fornecidas pela PNAD 2006 a 2008 como as demográficas, educacionais serviços
públicos e rendimento médio mensal se torna imperativo o que justifica o objetivo deste
estudo.
5 Metodologia
O procedimento metodológico adotado se compõe de três fases bem distintas: coleta de
dados secundários em publicações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, escolha
das variáveis e análise quantitativa de correlação e regressão linear multivariada. A seguir
essas etapas são detalhadas.
5.1 Dados coligidos
Os dados foram todos retirados de publicações disponíveis na internet, de
responsabilidade do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São elas: Contas
Regionais 2003-2007, quanto às informações sobre o PIB, a população e conseqüentemente o
9 PIB per capita de cada Estado, foram utilizadas as edições de 2006, 2007 e 2008 da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), bem como todas as demais variáveis.
O sistema de pesquisas domiciliares do IBGE foi implantado progressivamente no país
desde 1967, e busca a “produção de informações básicas para o estudo do desenvolvimento
socioeconômico do país” (IBGE, 2008, p. 16). Possui algumas características
socioeconômicas que são investigadas de forma permanente, tais como caracteres
demográficos gerais, educação, habitação e renda, e outras investigadas de forma mais
esparsa, como saúde, nutrição e nupcialidade. Disso resultou a busca em três diferentes
anuários para obter as características selecionadas para o presente trabalho.
O processo de seleção da amostra foi explicado pelo próprio Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística e reproduzido a seguir para facilitar a ampla compreensão.
No primeiro estágio, as unidades (municípios) foram classificados em duas categorias:
auto-representativas (probabilidade 1 de pertencer à amostra) e não-auto-representativas.
No segundo estágio, as unidades (setores censitários) foram selecionadas, em cada
município da amostra, também com probabilidade proporcional e com reposição, com base
Censo Demográfico 2000. No último estágio foram selecionados, com eqüiprobabilidade,
em cada setor censitário da amostra, os domicílios particulares e as unidades de habitação
em domicílios coletivos para investigação das características dos moradores e da habitação.
(IBGE, 2007, p. 40):
Privilegiou-se a obtenção de dados relativos ao exercício de 2007, em virtude de a
publicação mais recente contendo dados sobre o PIB e a população datar do mesmo ano.
Quando a informação buscada não estava disponível no PNAD 2007, buscou-se o PNAD
2008, e depois, caso ainda necessário, o PNAD 2006.
5.2 Variáveis escolhidas
Muitas variáveis são coligidas a cada Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. A
seleção daquelas que interessam a este trabalho levou em conta não somente a relevância,
como também certa disparidade entre os estados, constatada em uma primeira vista. Buscouse selecionar variáveis com valores dissonantes nos estados, dado que o objetivo do artigo é
exatamente buscar apontar aqueles cuja variação mais impacta a expectativa de vida do
brasileiro.
Como o próprio nome está a indicar, a PNAD é uma amostragem – processo pelo qual
se inferem os parâmetros populacionais, a partir da análise de uma parcela (amostra) da
população. Não obstante, deve-se ressaltar que se trata de amostras de grande porte – em
2008, por exemplo, foram pesquisadas 391.868 pessoas e 150.591 unidades domiciliadas,
distribuídas por todas as unidades federativas (IBGE, 2008, p. 20), enquanto em 2007 foram
399.964 pessoas e 147.851 unidades domiciliares (IBGE, 2007, p. 20).
Foram selecionadas 20 grandezas para a análise, sendo que uma delas, a expectativa de
vida (EV), será a variável dependente para efeito de estimativa das retas de regressão
multivariada. Isto posto, seguem as variáveis escolhidas, classificadas conforme definições do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística:
- PIB (PIB2007) – o produto interno bruto, soma de todo que é produzido pela nação, foi
extraído do relatório “Contas Regionais 2003-2007” Há variação entre os estados
correspondendo a R$ 2,66 trilhões para o país em 2007, com valores para as unidades
federadas desde R$ 4,17 bilhões para Roraima até R$ 902,8 bilhões para São Paulo.
- PIB per capita (PIBpc2007) – consiste na simples divisão do PIB pela população residente.
O valor nacional calculado é de R$ 14.465. A unidade federativa mais pobre, por esse
10 -
-
-
-
-
-
-
-
critério, é o Piauí, com PIB per capita de R$ 4.662, em 2007; e a mais rica é o Distrito
Federal, com R$ 40.696 per capita.
População residente (População) – composta pelos moradores presentes e ausentes, ou
seja, pelas pessoas que tinham a unidade domiciliar como local de residência habitual, e
não estavam ausentes, na data em que foram entrevistadas, por período superior a 12
meses. Nesses termos, a população brasileira de 2007 foi estimada em 184,0 milhões de
pessoas.
Expectativa de vida (EV) – Esse indicador foi retirado do PNAD 2006, constituindo a
variável dependente no presente trabalho. A expectativa de vida do brasileiro era de 72,4
anos em 2006, em um espectro de 66,4 anos (para Alagoas) até 75,1 anos (para o Distrito
Federal).
Taxa de urbanização (TU) – percentual das pessoas residentes em área urbana. Indicador
extraído do PNAD 2006. O qual estimou para o Brasil o valor de 83,3%, sendo o Piauí a
unidade federativa mais rural (60,7% de população urbana), e o Rio de Janeiro a unidade
federativa mais urbana (96,9%).
Taxa de fecundidade (TF) – Número médio de filhos por mulher. O qual era de 2,0 em
2007 para o Brasil, variando de 1,6 filho por mulher no Rio Grande do Sul até 3,3 filhos
por mulher em Roraima.
Taxa de mortalidade infantil (TMI) – mortalidade infantil em óbitos por mil nascimentos.
Aqui o valor médio de 25,1 para o Brasil em 2007, com valores extremos de 13,9 no Rio
Grande do Sul e de 51,9 em Alagoas por mil nascidos.
Taxa de frequência líquida ao ensino médio (TFLEM) – indicador do comparecimento ao
estudo de nível médio, medido em percentagem. Os dados apresentaram em 2007 uma
média nacional de 47,1%, variando de 25,4% em Alagoas até 65,8% em São Paulo.
Média de anos de estudos de pessoas de 15 anos ou mais (MAE15) – indica a série e o
nível ou grau que a pessoa estava freqüentando ou havia freqüentado, com aprovação, a
partir da 1ª série do ensino fundamental. Considerada a população acima de 15 anos de
idade completos. Em 2006, a média nacional foi de 7,2 anos de escolaridade, sendo
Alagoas o estado menos escolarizado (5,1 anos), e o Distrito Federal o mais escolarizado
(9,2 anos).
Média de anos de estudos de pessoas de 25 anos ou mais (MAE25) – indica a série e o
nível ou grau que a pessoa estava freqüentando ou havia freqüentado, com aprovação, a
partir da 1ª série do ensino fundamental, considerada a população acima de 25 anos de
idade completos. Em 2006, a média nacional foi de 6,7 anos de escolaridade, sendo
Alagoas o menos escolarizado (4,7 anos), e o Distrito Federal o mais escolarizado (9,1
anos).
Número médio de pessoas por domicílio (NPD) – indica a estimativa média de pessoas por
domicilio. Em 2007, viviam em média 3,2 brasileiros em cada domicílio, sendo que o Rio
de Janeiro e o Rio Grande do Sul apresentaram os menores valores (2,9 pessoas) e o
Amazonas apresentou o valor mais elevado (3,8 pessoas).
Domicílios com rede de abastecimento de água (DRAE) – percentagem dos domicílios
com serviço de abastecimento de água, com canalização interna. Eram 83,3% dos
domicílios brasileiros em 2007, com variações nos estados desde 39,7% em Rondônia até
96,7% dos domicílios em São Paulo.
Domicílios com rede coletora de esgoto ou fossa séptica (DRCE) – percentagem dos
domicílios atendidos por serviço de esgotamento sanitário, seja mediante rede coletora
(condutora dos dejetos para um desaguadouro geral, com ou sem estação de tratamento),
seja por fossa séptica (com absorção no próprio terreno ou escoamento para desaguadouro
11 -
-
-
-
-
-
-
geral). Em 2007, 73,6% dos domicílios brasileiros eram contemplados com algum desses
serviços, com valores extremos em Mato Grosso (26,1%) e no Distrito Federal (95,1%).
Domicílios com serviço de coleta de lixo (DCL) – percentagem dos domicílios atendidos
por serviço de coleta de lixo, seja esse serviço de coleta direta (empresa de limpeza,
pública ou privada que atendia o logradouro em que se situava o domicílio) ou de coleta
indireta (lixo depositado em caçamba, tanque ou depósito de serviço de empresa de
limpeza, pública ou privada, que posteriormente o recolhia). O parâmetro nacional de 2007
foi estimado em 87,5% dos domicílios brasileiros, com variação entre 54,1% (Piauí) e
98,6% (Distrito Federal).
Domicílios com serviço de iluminação elétrica (DIL) – percentagem dos domicílios
atendidos por serviço de iluminação elétrica, seja por rede pública, grupo gerador, energia
solar ou qualquer outra forma de fonte. No âmbito brasileiro 98,2%, dos domicílios
dispunham de energia elétrica em 2007, desde 88,8% no Piauí até 100,0% no Distrito
Federal e no Rio de Janeiro.
Domicílios com serviço telefônico (DST) – percentagem dos domicílios com linha
telefônica fixa (telefone fixo convencional) instalada no domicílio, mesmo que de forma
compartilhada. Dispunham desse serviço 77,0%, dos domicílios brasileiros em 2007, sendo
46,9% no Piauí e 95,7% no Distrito Federal.
Trabalhadores contribuintes de algum sistema de previdência (TCP) – percentagem dos
trabalhadores contribuintes de algum sistema de previdência federal (Instituto Nacional do
Seguro Social – INSS ou Plano de Seguridade Social da União), estadual ou municipal. O
total para o Brasil em 2007, foi de 50,7% dos trabalhadores, com uma variação de 24,4%
(no Piauí) a 67,4% (em Santa Catarina).
Índice GINI – indicador da distribuição da renda mensal das pessoas em idade ativa, com
variação escalar entre 0 e 1, onde segundo tal indicador quanto mais próximo de O
melhor, ou seja indica menor concentração de renda, e tanto mais próximo de 1 pior, onde
há fortes indícios de concentração de renda. Em 2007, o valor nacional foi de 0,534, com
valor mínimo de 0,470 em Santa Catarina e valor máximo de 0,604 no Distrito Federal.
Rendimento médio mensal de todos os trabalhos (RMM) – valor em reais do rendimento
obtido com os trabalhos desenvolvidos, para empregados e trabalhadores domésticos; para
os empregadores e trabalhadores autônomos, a retirada mensal normalmente feita, ou,
quando variável, a retirada média mensal referente ao mês de realização da pesquisa. O
valor nacional desse parâmetro foi de R$ 956 para o Brasil, variando entre R$ 546, no
Piauí, e R$ 1.970, no Distrito Federal.
Diferença média entre os rendimentos de homens e mulheres (DRHM) – este indicador foi
calculado a partir de dois outros, fornecidos pelo IBGE, e consiste no cálculo em
percentual sobre o salário médio feminino da diferença a maior do salário médio
masculino. Assim, sua fórmula é: DMRHM = 100x(RMM-RMF)/RMF, onde: DMRHM =
diferença média entre o rendimento de homens e mulheres; RMM = rendimento médio
masculino; RMF = rendimento médio feminino.
Apurou-se em 2007, uma diferença média de 40,0% no Brasil, ou seja, nesse ano, em
média os homens ganhavam 40% a mais que as mulheres, segundo apurado no PNAD;
enquanto no Amapá a diferença foi de 10,6%, no Espírito Santo chegou a 61,4%.
5.3 Análise quantitativa
12 Na análise dos dados foram utilizadas as técnicas de correlação e de regressão linear
multivariada. A análise da correlação e regressão compreende o estudo de dados amostrais
para saber se e como duas ou mais variáveis estão relacionadas uma com a outra em uma
população (STEVENSON, 1981, p. 341). Enquanto a correlação mede o grau de
relacionamento entre as variáveis, a regressão fornece uma equação (função) para descrever
esse relacionamento.
A análise de correlação determina um número que expressa uma medida numérica do
grau de relação de duas grandezas ou variáveis (BRUNI, 2009, p. 204); a correlação linear
simples entre duas variáveis será feita pelo cálculo do coeficiente de correlação linear
simples, denominado coeficiente r de Pearson.
Calculada a correlação entre cada variável independente e a variável dependente
escolhida (expectativa de vida), selecionaram-se aquelas com r maior ou igual a 0,6. Valor
indicativo de correlação significativa para os objetivos deste trabalho.
No passo seguinte, procedeu-se no SPSS (Statistical Package for Social Science) ao
cálculo da regressão linear múltipla, utilizando todas as variáveis independentes com r maior
ou igual a 0,6. Adotou-se a estimação stepwise, ou método por etapas ou passo a passo, o
mais comum dos métodos de busca seqüencial, possibilitador do exame da contribuição
adicional de cada variável independente ao modelo, já que cada variável é considerada para
inclusão antes do desenvolvimento da equação (CORRAR; PAULO; FILHO, 2007, p. 159).
Ao final, obteve-se uma reta de regressão, relacionando a variável estudada (expectativa
de vida) àquelas que, em conjunto, explicam a maior fração da variação total dos dados.
6 Análise dos resultados
6.1 Correlação com a expectativa de vida (EV)
Das 19 grandezas analisadas, as 12 seguintes foram selecionadas por apresentarem
coeficientes de correlação significativos (valor do coeficiente de Pearson entre parênteses):
Taxa de mortalidade infantil (-0,870), Domicílios com serviço telefônico (0,829),
Trabalhadores contribuintes da previdência (0,829), Taxa de freqüência líquida ao ensino
médio (0,781), Média de anos de estudo de pessoas de 15 anos ou mais (0,759), Média de
anos de estudo de pessoas de 25 anos ou mais (0,738), PIB per capita (0,723), Rendimento
médio mensal (0,723), Número médio de pessoas por domicílio (-0,675), Domicílios com
coleta de lixo (0,670), Taxa de urbanização (0,614), Taxa de fecundidade (-0,612).
Desse modo, a expectativa de vida ao nascer revelou significativas correlações positivas
com a taxa de mortalidade infantil, a disponibilidade de serviço telefônico, a filiação dos
trabalhadores a algum sistema oficial de previdência, a freqüência ao ensino médio, a
escolaridade dos maiores de 15 e de 25 anos, o PIB per capita, o rendimento médio mensal, a
disponibilidade de serviço de coleta de lixo e a taxa de urbanização.
Revelou correlações negativas relevantes com o número médio de pessoas por domicílio
e a taxa de fecundidade.
Foram descartadas, por correlação abaixo do critério de corte adotado (valor modular do
coeficiente de Pearson 0,6) as seguintes variáveis: índice GINI (-0,282), População (0,347),
Domicílios com serviço de rede de abastecimento de água (0,398), PIB (0,416), Domicílios
com rede coletora de esgoto ou fossa séptica (0,476), Domicílios com rede de iluminação
elétrica (0,483) e diferença média entre o rendimento de homens e mulheres (0,544).
O índice GINI teve o menor valor modular dentre todos os coeficientes de correlação
calculados – o que pode indicar pouca ligação com a expectativa de vida. Entretanto, por
13 limitação presente no recorte espacial feito no fenômeno pesquisado, o presente estudo
evidência a necessidade de uma analise mais apurada dessa ou de qualquer uma das
correlações em particular sendo imperativo um exame maior da série histórica, valendo
lembrar que a PNAD é uma pesquisa amostral realizada anualmente pelo IBGE desde 1967.
6.21 Regressão linear multivariada
Procedeu-se então, no software SPSS, a uma regressão linear multivariada, adotando-se
a expectativa de vida (EV) como variável dependente e as 12 variáveis significativamente
correlacionadas com aquela, já relacionadas, como variáveis independentes. Adotou-se o
método stepwise, com estimação dos coeficientes de regressão. Os valores preditos (predicted
values) e os resíduos (residuals) foram padronizados.
O sistema SPSS calculou, então, três opções de regressão. O modelo univariado
considerou apenas a taxa de mortalidade infantil como variável independente, com r2 = 0,756,
ou seja, um poder de explicação de 75,6% da variação total dos dados; o modelo bivariado
acrescentou a taxa de fecundidade, chegando a 84,0% o valor do coeficiente de determinação
r2; o modelo com três variáveis independentes incluiu o índice de domicílios com serviço
telefônico, mas nesse caso o ganho no valor do coeficiente de determinação foi pouco
significativo, com r2 = 87,7%.
O erro-padrão da estimativa foi de 1,2304 no modelo univariado, 1,0185 no bivariado e
no trivariado, 0,9105; os resíduos da soma dos quadrados (sum of squares) também foi
progressivamente reduzido, de 37.849 para 24.896 e depois 19.095, denotando a progressiva
precisão da função de regressão à medida que aumentam o número de variáveis explicativas.
Para os três modelos, o teste F-ANOVA apresentou sig = 0,000, ou seja, menor que
alfa, sendo rejeitada a hipótese de que o r2 seja igual a zero, de modo que há influência sobre
o valor da variável dependente EV, ou seja, o modelo, nos três casos, é significativo.
Os coeficientes de regressão estão apresentados no quadro Coefficients. Em todos os
casos, o valor de Sig para cada coeficiente (inclusive os coeficientes lineares, ou interceptos)
foi satisfatório, mais uma vez atestando a significância dos modelos.
Na coluna Beta observa-se a influência relativa de cada variável independente na reta de
regressão, de modo que, no modelo bivariado, a taxa de mortalidade infantil tem
aproximadamente o dobro da importância da taxa de fecundidade na determinação da
expectativa de vida; já no modelo trivariado, o percentual de domicílios atendidos por serviço
telefônico apresentou-se um pouco mais determinante do que a taxa de fecundidade, sendo
que ambos correspondem, cada um, a aproximadamente metade do peso da taxa de
mortalidade infantil.
São as seguintes as retas de regressão obtidas:
Sendo: EV = expectativa de vida ao nascer, em anos; TMI = taxa de mortalidade
infantil, em percentagem; TF = taxa de fecundidade, em número de filhos e DAST = taxa de
domicílios atendidos por serviço telefônico.
EV = 77,514 – 0,227TMI (Modelo Univariado com poder de explicação de 75,6%)
EV = 80,630 – 0,194TMI – 1,833TF (Modelo Bivariado com poder de explicação de 84,0%)
EV = 74,234 – 0,145TMI – 1,361TF + 0,057DSAT ( Modelo Trivariado com poder de
explicação de 87,7%)
Observou-se assim que, em função dos dados coligidos, a expectativa de vida ao nascer
dos brasileiros pode ser estimada a partir das taxas de mortalidade infantil (o que é intuitivo,
14 já que um menor número de mortes prematuras inevitavelmente contribuirá para o aumento da
expectativa de vida em geral) onde o investimento de uma unidade monetária em TMI,
reduzirá em 0,145 a taxa de mortalidade infantil, de fecundidade (o sinal negativo está a
indicar que menos filhos tendem a render-lhes a expectativa de maior longevidade) onde o
investimento de uma unidade monetária aumenta em 1,361 a taxa de fecundidade e,
curiosamente, à taxa de domicílios com serviços telefônicos, que possivelmente apareceu
como a terceira variável dado sua crescente assimilação por parte da população brasileira,
onde o investimento de uma unidade monetária produz um acréscimo em 0,057 em DSAT.
As demais variáveis não foram consideradas relevantes para efeito de determinação da
equação de regressão linear. Entretanto, deve ser lembrado que o aporte dos serviços públicos
de qualidade, nas áreas de saúde, educação e política protetora tendem a favorecer o aumento
das liberdades do cidadão.
Conclusão
Considerou-se atingidos os objetivos para o conjunto de dados estudados, as variáveis
mais fortemente ligadas à expectativa de vida nos diversos estados brasileiros. As duas
primeiras, em relação inversa: as taxas de mortalidade infantil e de natalidade. O fato de
expectativa de vida e mortalidade infantil se relacionarem de forma inversa é intuitivo, mas
não o de que seja esta a variável mais relacionada àquela, dentre todas as estudadas. Outra
descoberta é a de que uma menor taxa de natalidade (menor número de filhos por mulher)
resulta em maior expectativa de vida.
A terceira variável surpreende por sua aparente desconexão com a expectativa de vida: a
oferta de serviços de comunicação telefônica nos domicílios apareceu à frente não apenas de
outros serviços públicos considerados mais essenciais, como energia elétrica e esgotamento
sanitário. Estudos posteriores e mais aprofundados são necessários para investigar com maior
apuro as conclusões apresentadas.
Não sem razão, a redução da mortalidade infantil está intimamente associada à
prestação de serviços públicos de qualidade na área da saúde e segurança protetora. Na
seqüência, a redução da fecundidade vem associada diretamente a políticas de planejamento
familiar e a condição de agente da mulher, onde maior grau de educação tende a torná-la mais
critica do seu papel de procriação, aumentando sua liberdade, neste estudo entendida por
expectativa de vida.
Estas analises ainda que carentes de mais detalhamentos possibilitam responder que as
variáveis associadas a educação e prestação de serviços públicos contribuem diretamente para
o aumento da expectativa de vida, o que responde parte da hipótese deste estudo e reforça o
debate apresentado no referencial teórico em onde se discute que desenvolvimento como
liberdade esta associado mais com serviços públicos de saúde e educação à PIB per capta.
Referências
BRASIL. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Contas
Regionais
do
Brasil
2003-2007.
Disponível
em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/contasregionais/2003_2007/contas_region
ais_2003_2007.pdf. Acesso em: 3 jan. 2010.
________, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE).
Pesquisa nacional por amostra de domicílios. Volume 27. 2006. Disponível em:
15 http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2006/default.sht
m. Acesso em: 2 jan. 2010.
_________, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE).
Pesquisa nacional por amostra de domicílios. Volume 28. 2007. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2007/default.sht
m. Acesso em: 2 jan. 2010.
__________, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE).
Pesquisa nacional por amostra de domicílios. Volume 29. 2008. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2008/default.sht
m. Acesso em: 3 jan. 2010.
BRUNI, Adriano Leal. SPSS aplicado à pesquisa acadêmica. São Paulo: Atlas, 2009.
CORRAR, Luiz J.; PAULO, Edilson; FILHO, José Maria Dias (Coord). Análise
multivariada: para os cursos de administração, ciências contábeis e economia. São Paulo:
Atlas, 2007.
DRÉZE J.; SEN A. Hunger and public action, Oxford, Clarendon Press, 1989. Pp 3-4 e 123
HOON, P.; SING, N; WANMALL, S. S. Sustainable Livelehoods, Concepts, Principles
and approachs to incators of development: A draft discussion paper. New York: UNPD,
1997.
Human Development Report. New York: United Nations Development Program, 1994
Human Development Report. New York: United Nations Development Program, 1995
KLISKSBERG, B. Repensando o estado para o desenvolvimento social. Brasilia - DF Cortez,
1998
LEMOS, J.S. O mapa da exclusão Social no Brasil – Radiografia de um Pais
assimetricamente pobre, UFC, Fortaleza, 2007.
MENZAROS, I. Para Além do Capital – Tradução Paulo Cesar Castanheira - São Paulo Ed.
Boitempo, 2002
NASCIMENTO, L. F. LEMOS A. D - Gestão socioambiental estratégica Porto Alegre:
Bookman, 2008
POLANYI, K – A grande Transformação: as origens de nossa época. 2ª Ed Rio de Janeiro:
Campos 2000
SANCHES, I. Estratégias de Transição para o sec XXI – para pensar o desenvolvimento
sustentável, São Paulo: Brasiliense, 1993
SEN Amartya Kumar – Desenvolvimento como Liberdade – São Paulo: Companhia das
Letras, 2000
STEVENSON, William J. Estatística aplicada à administração. São Paulo: Harper & How
do Brasil, 1981.
SUDHIR A.; RAVALLION M. Human development in poor countries: on the role of
private incomes and public services – journal of economic Perspectives, 7, 1993
16 
Download

Expectativa de Vida à Luz da Pesquisa Nacional por Amostra de