TJ
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TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 42314/2008 - CLASSE I - 4
COMARCA DE SORRISO
SUSCITANTE:
SUSCITADO:
-
JUÍZO DA 4ª VARA DA COMARCA DE SORRISO
JUÍZO DA 5ª VARA DA COMARCA DE SORRISO
Número do Protocolo: 42314/2008
Data de Julgamento: 07-8-2008
EMENTA
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - LEI 11.340/2006 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA MULHER - CONFLITO ENTRE
JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E VARA CRIMINAL - CONTRAVENÇÃO
PENAL - ARTIGOS 33 e 41 DA LEI MARIA DA PENHA - JUIZADO NÃO
ESTRUTURADO - COMPETÊNCIA CRIMINAL.
A interpretação da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), conduz a
conclusão de que, enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e
Familiar contra a mulher, a competência para processar e julgar qualquer prática
que decorra dessa violência, seja contravenção penal ou crime, será de competência
das Varas Criminais.
Ademais, é vetada pela Lei, em seu artigo 41, a apreciação pelos
Juizados Especiais de casos que envolvam violência contra a mulher, posto que não
se trata de crime de menor potencial ofensivo.
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SUSCITADO:
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JUÍZO DA 4ª VARA DA COMARCA DE SORRISO
JUÍZO DA 5ª VARA DA COMARCA DE SORRISO
RELATÓRIO
EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA
Egrégia Turma:
Versam os autos acerca de Conflito Negativo de Competência suscitado
pelo Juízo de Direito da 4ª Vara (Juizado Especial) da Comarca de Sorriso, em face do Juízo de
Direito da 5ª Vara (Criminal) daquela comarca, averbam-se, simultaneamente serem
incompetentes para conhecer e julgar a ação com origem na Delegacia da Policia Judiciária
Civil do Município de Sorriso, em que figuram como partes SIDNEI SANTOS SCHELL
(indiciado) e ELIETE SANTOS CARVALHO (vítima), pelos fatos registrados no Boletim de
Ocorrência, por eventual prática do ilícito penal da Lei 11.340/2006, reclamada pela vítima.
Instado a se manifestar, o representante do Ministério Público
argumentou que os fatos narrados nos autos, amoldam-se na condição de contravenção penal,
portanto tendo que ser o feito apreciado pelo Juizado Especial Criminal em face do conteúdo
consoante no artigo 41, da Lei 11.340/2006.
O Juízo suscitado, acolhendo a tese do representante do parquet,
declinou da competência, argumentando que as contravenções penais envolvendo violência
doméstica e familiar contra a mulher são de competência do JECRIM, dessa forma determinou
a remessa dos autos para a 4ª Vara da Comarca de Sorriso.
Às fls. 77/103, argumenta a autoridade suscitante que a decisão é
descabida, tendo em vista que a Lei Maria da Penha deve ser aplicada a todos os casos
envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher e, ainda, enquanto não instalados os
Juizados específicos para esse fim, com base no artigo 33, da Lei nº. 11.340/06, c/c artigo 1º do
Provimento n° 45/2007 CGJ, a competência para processar e julgar crimes de violência
doméstica é da 5ª Vara da Comarca de Sorriso-MT.
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Às fls.111, designei como juízo provisório da causa o douto juízo
suscitado, cabendo-lhe o encargo de resolver as medidas de urgência, a teor do disposto no art.
205, in fine, RITJMT. Dispensei a prestação de informações, por ser desnecessária.
O órgão do Ministério Público atuante na jurisdição desse tribunal, em
parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Dr. Hélio Fredolino Faust, opinou pelo
reconhecimento da competência da 4ª Vara da Comarca de Sorriso (Juizado Especial Criminal)
(fls.117/119).
É o relatório.
P A R E C E R (ORAL)
O SR. DR. BENEDITO XAVIER DE SOUZA CORBELINO
Ratifico o parecer escrito.
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VOTO
EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR)
Egrégia Turma:
O conflito de competência deve ser julgado procedente. Vejamos.
Com base no relato da vítima, Eliete Santos Carvalho declarou que
conviveu maritalmente com o agressor Sidnei Santos Schell durante período de 03 (três) anos,
narra ainda, que foi pedir ao agressor que arrumasse um botijão de gás de cozinha, pois o que
tinha havia acabado, e que o mesmo, a partir daí, começou à agredi-la verbalmente e durante a
discussão o seu companheiro tentou enforca-lá.
A meu ver, o fato relatado está contemplado na Lei 11.340/2006 (Lei
Maria da Penha), que disciplina hipótese de violência doméstica e familiar contra a mulher,
segundo dispõem os artigos 5º e incisos, e artigo 7º e incisos da referida Lei:
“Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e
familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe
cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de
convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as
esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada
por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais,
por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva
ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo
independem de orientação sexual.”
Art. 7° São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher,
entre outras:
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I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe
cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
humilhação,
manipulação,
isolamento,
vigilância
constante,
perseguição
contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito
de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à
autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a
constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de
usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao
aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação;
ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure
calúnia, difamação ou injúria.
No caso dos autos, comprova-se que a motivação para a prática delitiva
decorreu da relação íntimo-afetiva que as partes mantiveram anteriormente, amoldando-se,
portanto, a conduta, supostamente criminosa, ao conceito de violência doméstica previsto no
artigo 5º, inciso III, da Lei nº 11.340/06, e a violência física e moral, praticadas por Sidnei
Santos Schell, o que determina que a competência para processar e julgar o feito em questão é
da 5ª Vara (Criminal) da Comarca de Sorriso.
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No que diz respeito, especificamente, à competência para processar e
julgar o litígio em debate, os artigos 14 e 33 da Lei 11.340/06, determinam que causas
decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher sejam contravenções penais ou
crime, sendo, portanto, de competência do Juizado de Violência contra a Mulher, e, no caso da
inexistência deste, as varas criminais acumularão funções cíveis e criminais, in verbis:
“Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão
ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para
o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de
violência doméstica e familiar contra a mulher.”
"Art. 33. Enquanto não estruturados os Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as
competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da
prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões
do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente."
Regulamentando a norma mencionada, a Corregedoria Geral de Justiça
editou o Provimento nº. 45/2007, o qual atribuiu a competência à 5ª Vara da Comarca de
Sorriso para julgar os feitos decorrentes da prática supramencionada, conforme redação a
seguir transcrita :
“Art. 1º. Fica estabelecida a competência para processar e julgar as
causas cíveis e criminais decorrentes de delitos praticados com violência
doméstica e familiar contra a mulher às seguintes Varas Judiciais:
Comarcas de Terceira Entrância:
(...)
Sorriso - 5ª Vara
(...).”
Reforça o argumento de que a competência para conhecer todas as
causas envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher é do juízo criminal comum e
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não dos juizados especiais criminais, conforme artigo 41 da Lei 11.340/2006 o qual veda a
apreciação pelos juizados criminais ou cíveis de causas análogas às supramencionadas.
“Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar
contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no
9.099, de 26 de setembro de 1995.”
Nesse sentido é jurisprudência desse Sodalício e dos tribunais pátrios:
TJMT-“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - LEI 11.340/06
(LEI MARIA DA PENHA) - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER DEMANDA DE NATUREZA PENAL - MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA JUÍZO CRIMINAL COMUM - AUSÊNCIA DE JUIZADO ESPECÍFICO ATRIBUIÇÃO DO JUÍZO SUSCITANTE - IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO.
Tratando-se de violência contra a mulher, com procedimento ditado pela Lei nº.
11.340/06, e proposta a demanda com pedido das medidas protetivas de urgência,
compete ao juízo criminal o processamento da ação judicial, quando ainda não
estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher.”(Conflito Negativo de Competência n° 49046, Câmara de Criminais
Reunidas, Relator Desemb. José Luiz de Carvalho, publicação 10-10-2007).
TJRS - “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI N°
11.340/06 - (LEI MARIA DA PENHA). PRÁTICA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E
FAMILIAR CONTRA MULHER. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO.
CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO. Pelo que se dessume dos autos, a
partir da análise do termo circunstanciado de fl. 02, verifica-se que o delito, em
tese, praticado pelo réu seria a contravenção penal de vias de fato. No caso, a
competência para o processo e julgamento dos procedimentos disciplinados na Lei
nº 11.340/2006 ¿ Lei Maria da Penha ¿ é estabelecida na forma do artigo 1º,
inciso II, da Resolução nº 562/2006 do COMAG, cujo teor abaixo se transcreve:
Nas Comarcas de entrância intermediária, será competente, preferencialmente, a
vara criminal à qual não estejam afetos os processos de júri e os de execução
criminal¿. Portanto, não há dúvida que a competência para processo e julgamento
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do termo circunstanciado instaurado para apurar a prática da contravenção penal
de vias de fato praticada, em tese, pelo réu Lucas Fernando Iser contra Bettina
Rodrigues, sua ex-namorada, é do MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da
comarca de Santa Cruz do Sul, na esteira da Resolução antes mencionada.
CONFLITO DESACOLHIDO.” (Conflito de Competência Nº 70021576053,
Segunda
Câmara
Criminal,
Relator:
José
Antônio
Cidade
Pitrez,
publicação15-01-2008)
TJRS- “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI 11.340/06
(LEI MARIA DA PENHA). COMPETÊNCIA PARA CONHECER E JULGAR
CONTRAVENÇÃO PENAL REFERENTE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E
FAMILIAR CONTRA MULHER. Da interpretação dos artigos 14 e 33 da Lei
Maria da Penha, depreende-se que, enquanto não instalados os Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a competência para conhecer e
julgar os delitos e as contravenções penais relativas à prática de violência
doméstica e familiar contra a mulher é da vara criminal comum, e não do juizado
especial. Conflito julgado improcedente.” (Conflito de Competência Nº
70021307418, Primeira Câmara Criminal, Relator: Marco Antônio Ribeiro de
Oliveira, publicação 21-11-2007).
Certo é que o legislador, com a conhecida Lei Maria da Penha, buscou
conter essa prática condenável e, infelizmente, tão comum nos lares brasileiros, que é a
violência doméstica contra a mulher, e deu-lhe um tratamento mais rigoroso. Primeiro, retiroulhe o caráter de menor potencial ofensivo, afastando a competência dos Juizados Especiais.
Segundo, por constituir um grave problema social, tentou dar a necessária proteção às
mulheres, apenando com mais severidade as agressões perpetradas no ambiente familiar.
Pelo exposto, em dissonância com o parecer da Douta Procuradoria de
Justiça, JULGO PROCEDENTE , o conflito negativo de competência, fixando a competência
para conhecimento e julgamento do presente processo à 5ª Vara (Criminal) da Comarca de
Sorriso-MT.
É como voto.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE
CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a
Presidência da DESA. SHELMA LOMBARDI DE KATO, por meio da Turma Julgadora,
composta pelo DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (Relator), DES. JOSÉ LUIZ DE
CARVALHO (1º Vogal), DES. RUI RAMOS RIBEIRO (2º Vogal), DESA. SHELMA
LOMBARDI DE KATO (3ª Vogal), DES. MANOEL ORNELLAS DE ALMEIDA (4º Vogal)
e DES. PAULO DA CUNHA (5º Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE,
JULGARAM PROCEDENTE O CONFLITO PARA FIRMAR A COMPETÊNCIA DO
JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SORRISO. NO MESMO
SENTIDO É O PARECER.
Cuiabá, 07 de agosto de 2008.
---------------------------------------------------------------------------------------------------DESEMBARGADORA SHELMA LOMBARDI DE KATO - PRESIDENTE DA
TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS
---------------------------------------------------------------------------------------------------DESEMBARGADOR JUVENAL PEREIRA DA SILVA - RELATOR
---------------------------------------------------------------------------------------------------PROCURADOR DE JUSTIÇA
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GEACOR
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