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TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA Nº 10086/2008 - CLASSE I - 4
COMARCA DE SORRISO
SUSCITANTE:
-
JUÍZO DA QUARTA VARA DA COMARCA DE
SORRISO
JUÍZO DA QUINTA VARA DA COMARCA DE
SORRISO
SUSCITADO:
Número do Protocolo: 10086/2008
Data de Julgamento: 05-6-2008
EMENTA
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA – LEI 11.340/2006 –
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA MULHER – CONFLITO ENTRE
JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E VARA CRIMINAL – CONTRAVENÇÃO
PENAL – ARTIGO 33 e 41 DA LEI MARIA DA PENHA – JUIZADO NÃO
ESTRUTURADO – COMPETÊNCIA CRIMINAL.
A interpretação da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), conduz a
conclusão, de que enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e
Familiar contra a mulher, a competência para processar e julgar qualquer prática
que decorra dessa violência, seja contravenção penal ou crime, será de competência
das Varas Criminais.
Ademais, é vetada pela Lei em seu artigo 41 a apreciação pelos
Juizados Especiais de casos que envolvam violência contra a mulher, posto que não
se trata de crime de menor potencial ofensivo.
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SUSCITANTE:
SUSCITADO:
-
JUÍZO DA QUARTA VARA DA COMARCA DE
SORRISO
JUÍZO DA QUINTA VARA DA COMARCA DE
SORRISO
RELATÓRIO
EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA
Egrégia Turma:
Trata-se de conflito negativo de competência entre o Juízo da 4ª Vara
(Juizado Especial) e da 5ª Vara ambas da Comarca de Sorriso-MT, no qual os titulares das
mencionadas Varas Judiciárias averbam-se, simultaneamente, serem incompetentes para
conhecer e julgar a ação com origem Delegacia da Policia Judiciária Civil do Município de
Sorriso, em que figuram como partes Reinaldo Bucker (indiciado), Roseli Salustiano de Paula
Bucker e Regiane de Paula Bucker (vítimas), pelos fatos registrados no Boletim de Ocorrência,
por eventual prática do delito de ameaça, com efeito, de assegurar algumas medidas protetivas
elencadas na Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), reclamada pelas vítimas.
Instado a se manifestar o representante do Ministério Público
consignou: “... tendo em vista o conjunto probatório até então coligido ao feito invetigativo,
amolda-se, em tese, na condição de contravenção penal, temos que o mencionado feito não
resta obstaculizado da apreciação do JECRIM em face do conteúdo constante no art.41 da
Lei 11.340/2006.”
O juízo suscitado, acolhendo a tese do representante do parquet,
declinou da competência, argumentando de que as contravenções penais envolvendo violência
doméstica e familiar contra a mulher são de competência do Juizado Especial Criminal, dessa
forma determinou a remessa dos autos para a 4ª Vara da Comarca de Sorriso.
Às fls. (44/70), o juízo suscitante averba que a Lei Maria da Penha deve
ser aplicada a todos os casos envolvendo violência doméstica e familiar contra mulher e,
enquanto não criados os Juizados Especializados, nos termos do artigo 33, Lei 11.340/2006 c/c
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o art.1º do Provimento n°45/2007/CGL, a competência para processar e julgar crimes de
violência doméstica é a 5ª Vara da Comarca de Sorriso - MT.
Ás fls.78, designei como juízo provisório da causa o douto juízo
suscitante, cabendo-lhe o encargo de resolver as medidas de urgência, a teor do disposto no art.
205, parte final, RITJMT. Dispensei a prestação de informações, por ser desnecessária.
A douta Procuradoria Geral de Justiça, em memorável parecer da lavra
da eminente Procuradora de Justiça Drª Kátia Maria Aguilera Ríspoli, opina pela procedência
do conflito manejado pelo suscitante (fls.84/97).
É o relatório.
P A R E C E R (ORAL)
O SR. DR. SIGER TUTYIA
Ratifico o parecer escrito.
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VOTO
EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR)
Egrégia Turma:
Como mencionado no relatório, o conflito negativo de competência
suscitado pelo juiz de direito da 4ª Vara da Comarca de Sorriso (Juizado Especial) que entende
ser a 5ª Vara (Criminal) da mesma Comarca competente para o exame do presente feito, em
tese, envolvendo contravenção penal de vias de fato e violência doméstica e familiar contra
mulher.
Releve-se, a princípio, que a entrada em vigor da Lei 11.340/2006 –
que cria mecanismos para coibir a violência doméstica contra mulher, nos termos do §8º do
artigo 226 da Constituição Federal – tem gerado inúmeros conflitos negativos entre os juizados
criminais e as varas comuns, sobre a competência para processamento das ações envolvendo
violência doméstica contra mulher, uma vez que a referida norma estabeleceu sistemática
diferente da atual e comum divisão de competências estabelecidas pela Constituição Federal,
Constituição Estadual e Lei de Organização Judiciária do Estado.
O conflito deve ser julgado procedente.Vejamos.
Com base no relato de Rozeli Salustiano de Paula Bucker e Regiane de
Paula Bucker, respectivamente esposa e filha do agressor, Reinaldo Bucker, na delegacia de
policia narram que na noite anterior teriam sido agredidas verbalmente, e que na intensa
discussão entre os pais Regiane chegou a desmaiar após ter sido empurrada pelo seu genitor
contra o sofá. Relatam ainda que a Sra. Rozeli sofreu várias ameaças por parte se seu
companheiro, sendo que, por diversas vezes, chegou a ser agredida fisicamente pelo mesmo.
A meu ver, o fato relatado está contemplado na Lei 11.340 (Lei Maria
da Penha), que disciplina hipóteses de violência doméstica e familiar contra a mulher.
Segundo dispõe o artigo 7° e incisos, da referida lei:
Art. 7° São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher,
entre outras:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua
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integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe
cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
humilhação,
manipulação,
isolamento,
vigilância
constante,
perseguição
contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito
de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à
autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a
constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de
usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao
aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação;
ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que
configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos,
instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou
recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure
calúnia, difamação ou injúria.
In casu, verifica-se pelo menos três formas de violência prevista na Lei
11.340/2006 quais sejam: a violência física, moral e psicológica, praticadas por Reinaldo
Bucker, o que reforça a competência da 5ª Vara (criminal) para processar e julgar o feito em
questão.
Ademais, os artigos 14, caput e 33, caput, da Lei Maria da Penha,
afastam qualquer controvérsia sobre a competência para processar e julgar causas decorrentes
da violência doméstica e familiar contra a mulher, sejam elas contravenções penais ou crime é
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do juizado de violência contra mulher, e, no caso de não existir, as varas criminais acumularão
funções cível e criminal, in verbis:
Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão
ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para
o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de
violência doméstica e familiar contra a mulher.
Art. 33.
Enquanto não estruturados os Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as
competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da
prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões
do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.
Reforça o argumento de que a competência para conhecer todas as
causas envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher é do juízo criminal comum e
não dos juizados especiais criminais, conforme artigo 41 da Lei 11.340/2006 em que veda a
apreciação pelos juizados criminais ou cíveis de causas supramencionadas.
Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar
contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no
9.099, de 26 de setembro de 1995.
Nesse sentido é jurisprudência desse Sodalício e dos tribunais pátrios:
TJMT-“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - LEI 11.340/06
(LEI MARIA DA PENHA) – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER –
DEMANDA DE NATUREZA PENAL – MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA
– JUÍZO CRIMINAL COMUM - AUSÊNCIA DE JUIZADO ESPECÍFICO ATRIBUIÇÃO DO JUÍZO SUSCITANTE – IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO.
Tratando-se de violência contra a mulher, com procedimento ditado pela Lei nº.
11.340/06, e proposta a demanda com pedido das medidas protetivas de urgência,
compete ao juízo criminal o processamento da ação judicial, quando ainda não
estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
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Mulher.”(Conflito Negativo de Competência n° 49046, Câmara de Criminais
Reunidas, Relator Desemb. José Luiz de Carvalho, publicação 10/10/2007).
TJRS – “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI N°
11.340/06 - (LEI MARIA DA PENHA). PRÁTICA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E
FAMILIAR CONTRA MULHER. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO.
CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO. Pelo que se dessume dos autos, a
partir da análise do termo circunstanciado de fl. 02, verifica-se que o delito, em
tese, praticado pelo réu seria a contravenção penal de vias de fato. No caso, a
competência para o processo e julgamento dos procedimentos disciplinados na Lei
nº 11.340/2006 ¿ Lei Maria da Penha ¿ é estabelecida na forma do artigo 1º,
inciso II, da Resolução nº 562/2006 do COMAG, cujo teor abaixo se transcreve:
Nas Comarcas de entrância intermediária, será competente, preferencialmente, a
vara criminal à qual não estejam afetos os processos de júri e os de execução
criminal¿. Portanto, não há dúvida que a competência para processo e julgamento
do termo circunstanciado instaurado para apurar a prática da contravenção penal
de vias de fato praticada, em tese, pelo réu Lucas Fernando Iser contra Bettina
Rodrigues, sua ex-namorada, é do MM. Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da
comarca de Santa Cruz do Sul, na esteira da Resolução antes mencionada.
CONFLITO DESACOLHIDO.” (Conflito de Competência Nº 70021576053,
Segunda
Câmara
Criminal,
Relator:
José
Antônio
Cidade
Pitrez,
publicação15/01/2008)
TJRS- “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI 11.340/06
(LEI MARIA DA PENHA). COMPETÊNCIA PARA CONHECER E JULGAR
CONTRAVENÇÃO PENAL REFERENTE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E
FAMILIAR CONTRA MULHER. Da interpretação dos artigos 14 e 33 da Lei
Maria da Penha, depreende-se que, enquanto não instalados os Juizados de
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a competência para conhecer e
julgar os delitos e as contravenções penais relativas à prática de violência
doméstica e familiar contra a mulher é da vara criminal comum, e não do juizado
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especial. Conflito julgado improcedente.” (Conflito de Competência Nº
70021307418, Primeira Câmara Criminal, Relator: Marco Antônio Ribeiro de
Oliveira, publicação 21/11/2007).
Dessa forma, a competência para processar o julgar os delitos e
contravenções penais relativas à prática de violência doméstica e familiar contra a mulher é da
Vara Criminal Comum, e não do juizado especial criminal, sendo no caso em comento a 5ª
Vara da Comarca de Sorriso, conforme provimento n° 45/2007 da ilustre Corregedoria Geral de
Justiça:
“Art. 1º. Fica estabelecida a competência para processar e julgar as
causas cíveis e criminais decorrentes de delitos praticados com violência
doméstica e familiar contra a mulher às seguintes Varas Judiciais:
Comarcas de Terceira Entrância:
(...)
Sorriso – 5ª Vara
(...).”
Ante o exposto, em consonância com parecer da douta Procuradoria
Geral de Justiça, JULGO PROCEDENTE o conflito negativo de competência, fixando a
competência para conhecimento e julgamento do presente processo a 5ª Vara (criminal) da
Comarca de Sorriso-MT.
É como voto.
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ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE
CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a
Presidência da DESA. SHELMA LOMBARDI DE KATO, por meio da Turma Julgadora,
composta pelo DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (Relator), DESA. SHELMA
LOMBARDI DE KATO (1ª Vogal), DES. JOSÉ JURANDIR DE LIMA (2º Vogal), DES.
MANOEL ORNELLAS DE ALMEIDA (3º Vogal), DES. PAULO DA CUNHA (4º Vogal),
DES. OMAR RODRIGUES DE ALMEIDA (5º Vogal) e DES. JOSÉ LUIZ DE CARVALHO
(6º Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, JULGARAM PROCEDENTE
O CONFLITO PARA RECONHECER A COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. O
PARECER É PELO DEFERIMENTO.
Cuiabá, 05 de junho de 2008.
---------------------------------------------------------------------------------------------------DESEMBARGADORA SHELMA LOMBARDI DE KATO - PRESIDENTE DA
TURMA DE CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS
---------------------------------------------------------------------------------------------------DESEMBARGADOR JUVENAL PEREIRA DA SILVA - RELATOR
---------------------------------------------------------------------------------------------------PROCURADOR DE JUSTIÇA
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GEACOR
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