AMARAL E AZAL TINTO - SINÓNIMOS OU CASTAS DIFERENTES?
Isaura CASTRO(1); Maria Teresa MOTA(2); Juan Pedro MARTÍN(3); Jesús Maria
ORTIZ(3); José LEÃO(4); João GARRIDO(2); Olinda PINTO-CARNIDE(1)
(1)
CENTRO DE GENÉTICA E BIOTECNOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E
ALTO DOURO, INSTITUTO DE BIOTECNOLOGIA E BIOENGENHARIA (CGB-UTAD/IBB), 5001801 VILA REAL, PORTUGAL
(2)
ESTAÇÃO VITIVINÍCOLA “AMÂNDIO GALHANO”, QTA CAMPOS DE LIMA, 4970-249 PAÇÔ,
ARCOS DE VALDEVEZ, PORTUGAL
(3)
DPTO. DE BIOLOGÍA VEGETAL, ESCUELA TÉCNICA SUPERIOR DE INGENIEROS
AGRÓNOMOS, UNIVERSIDAD POLITÉCNICA DE MADRID, CIUDAD UNIVERSITÁRIA S/N,
28040 MADRID, ESPAÑA
(4)
DIRECÇÃO REGIONAL DE AGRICULTURA E PESCAS DO NORTE, EST. EXTERIOR
CIRCUNVALAÇÃO, 11846, 4460-281 SENHORA DA HORA, MATOSINHOS, PORTUGAL
“Amaral” é uma casta tinta recomendada para a produção de vinhos DOC Vinho Verde.
“Azal Tinto” é o nome pelo qual a casta é mais vulgarmente conhecida, embora em Penafiel e
Amarante seja denominada “Amaral”. Na Lista de Castas Aptas à Produção de Vinho em Portugal
(Portaria nº 428/2000) é atribuído “Amaral” como nomenclatura oficial a esta casta, muito embora
em listas anteriores lhe fosse sempre atribuído o nome de “Azal Tinto”.
A análise de microssatélites é considerada a técnica molecular mais adequada para
identificação de variedades de videira. Seis microssatélites foram indicados pelo projecto europeu
GENRES #81 para identificação de variedades e fazem parte da Lista de Descritores para
Variedades de Videira e Espécies de Vitis estabelecido pelo Office International de la Vigne e du
Vin (OIV) (Códigos nº 801-806) (OIV, 2008).
Na sub-região de Basto esta casta é ainda designada por “Sousão Galego” (Mota e Silva,
1986). Castro e colaboradores, num estudo com 12 microssatélites, concluíram que a casta
"Sousão Galego” é geneticamente diferente da casta “Amaral” (dados não publicados).
Com o objectivo de identificar se “Amaral” e “Azal Tinto” pertencem à mesma casta,
procedeu-se à colheita de várias amostras com origem em várias zonas da Região Demarcada
dos Vinhos Verdes, algumas com a designação de “Amaral” e outras de “Azal Tinto”. Procedeu-se
à extracção de DNA e amplificação dos 6 microssatélites recomendados pela OIV. Com os
resultados já obtidos conclui-se ser incorrecto designar como sinónimos as castas “Amaral” e “Azal
Tinto” encontrando-se genótipos diferentes dentro da casta.
Palavras-chave: Vitis vinifera; biodiversidade; sinonímias; marcadores moleculares; microssatélites
1 - INTRODUÇÃO
Portugal é um país com uma grande riqueza em biodiversidade de material
vegetal vitícola. Apenas a Itália possui um património vegetal vitícola superior ao
Português. Com a descoberta de Vitis vinifera spp. sylvestris na região do
Alentejo, crê-se que Portugal estará estreitamente ligado à origem da videira e
viticultura. É Portuguesa a primeira Denominação de Origem vitícola mundial, a
Região Demarcada “Porto”, estabelecida em 1756. A vitivinicultura é portanto uma
das principais práticas agrícolas no país, tanto a nível económico como social,
sendo Portugal um dos principais países produtores e exportadores de vinho, a
nível europeu e mundial.
A Lista de Castas Aptas à Produção de Vinho em Portugal inclui 341 variedades
(Portaria nº 428/2000) e estão a ser efectuados esforços com vista à detecção de
sinonímias e homonímias entre as várias variedades, nomeadamente esclarecer a
verdadeira identidade das castas Azal Tinto e Amaral. A Portaria nº 428/2000
determina, no nosso entender erradamente, que “Amaral” seja a designação
oficial atribuída a esta casta e que a designação “Azal Tinto” corresponde a um
sinónimo da primeira. Na verdade, em listas de castas anteriores ao ano 2000, a
casta era designada por “Azal Tinto” e este é o nome mais vulgarmente atribuído
à casta na Região Demarcada dos Vinhos Verdes. No Decreto-lei nº 10/92 de 3
de Fevereiro, dos estatutos da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos
Verdes (CVRVV), constavam as duas designações, “Azal Tinto” e “Amaral”, como
castas distintas. A designação “Amaral” existia como casta e como sinónimo da
casta “Azal Tinto”, particularmente em Penafiel e Amarante.
“Amaral” é actualmente uma casta tinta recomendada para a produção de vinhos
DOC Vinho Verde. À excepção das sub-regiões Lima e Monção, esta casta, dada
a sua qualidade, faz parte do encepamento tinto de todas as sub-regiões da
Região dos Vinhos Verdes (Portaria 28/2001 de 16 de Agosto), apesar de ser
mais cultivada nos concelhos mais a Sul da Região Demarcada.
Martín e colaboradores (2006) referem, através de um estudo envolvendo
caracterização molecular e ampelográfica, que esta casta é a mesma que a
espanhola “Caiño Bravo”. “Cainho Bravo” ou “Cainho Miúdo” na sub-região de
Monção e “Cainzinho” em Arcos de Valdevez, são também nomes atribuídos à
casta em Portugal, assim como “Sousão Galego” na sub-região de Basto (Mota e
Silva, 1986).
A caracterização morfológica revela-se por vezes insuficiente na identificação de
variedades de videira e torna-se necessário recorrer a uma análise molecular. Os
Microssatélites ou SSRs (Sequências Simples Repetidas) têm sido muito
utilizados em programas de melhoramento. Estes marcadores são compostos de
sequências simples, de 2 a 5 nucleótidos, repetidas em tandem na sequência de
DNA. Recentemente, seis microssatélites foram indicados pelo projecto europeu
GENRES #81 para identificação de variedades e fazem parte da Lista de
Descritores para Variedades de Videira e Espécies de Vitis estabelecido pela
Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV) (Códigos nº 801-806) (OIV,
2008). A base desta decisão foi o facto de representarem “um ferramenta
extremamente útil e eficiente na identificação de variedades de videira e análise
de parentescos, serem abundantes e aleatoriamente distribuídos em genomas
encariotas e estarem sujeitos a herança Mendeliana co-dominante” (OIV, 2008).
Neste trabalho, estudou-se o perfil alélico em 6 loci microssatélites de 15
amostras de videira com a designação “Amaral”, “Azal Tinto” ou “Sousão Galego”.
O objectivo do estudo foi determinar se as várias designações, que na lista
nacional de castas são consideradas como sinónimos, correspondem a um
mesmo genótipo ou a genótipos distintos.
2 – MATERIAL E MÉTODOS
Na Tabela 1 apresenta-se a lista do material vegetal estudado e local de colheita.
Inicialmente foram estudadas as amostras designadas por Azal Tinto-EVAG, Azal
Tinto-UTAD e Sousão Galego. Mais tarde alargou-se o estudo a amostras com a
designação Amaral, colhidas na Estação Vitivinícola Amândio Galhano (EVAG) e
a amostras representativas da casta em grande parte da região dos Vinhos
Verdes, colhidas num campo de clones situado na Quinta de Soutelo (concelho
de Celorico de Basto). Foi também incluída uma amostra proveniente da Estação
Vitivinícola Nacional (EVN).
O DNA foi extraído a partir de folhas jovens de acordo com o método de Doyle e
Doyle (1987), com algumas modificações.
A amplificação dos seis microssatélites [VVS2 (Thomas e Scott, 1993), VVMD5 e
VVMD7 (Bowers et al., 1996), e ssrVrZAG47, ssrVrZAG62 e ssrVrZAG79 (Sefc et
al., 1999)] realizou-se de acordo com Martín e colaboradores (2003). Os produtos
amplificados separaram-se num sequenciador automático “ABI Prism 3730 DNA
sequencer" (Applied Biosystems) e foram detectados por fluorescência. GS500(250)LIZ (Applied Biosystems) foi utilizado como marcador interno para estimar o
tamanho dos fragmento amplificados. Com o software Peak Scanner (Applied
Biosystems) determinou-se o tamanho exacto dos fragmentos. Os dados obtidos
foram convertidos numa matriz binária de presença/ ausência de cada alelo. A
matriz derivada foi processada no programa NTSYS-pc v2.02 (Rohlf, 1998) para
construir um dendrograma das 15 amostras estudadas baseado no método
UPGMA “Unweigth Pair-Group Method Arithmetic Average) e aplicando o
coeficiente “Dice” (Dice, 1945).
Tabela 1 – Material vegetal estudado e respectivo local de colheita
Amostra
Código
Local de colheita
Azal Tinto
Azal Tinto-UTAD
UTAD - Qta de N.S. de Lourdes
Azal Tinto
Azal Tinto-EVAG
EVAG - Qta de Campos de Lima
Amaral
Amaral-1
EVAG - Qta de Campos de Lima
Amaral
Amaral-2
EVAG - Qta de Campos de Lima
Amaral
Amaral-EVN
EVN - Qta d’Almoinha
Sousão Galego
Sousão Galego
EVAG - Qta de Campos de Lima
Azal Tinto
AT-1
Qta Soutelo
Azal Tinto
AT-2
Qta Soutelo
Azal Tinto
AT-3
Qta Soutelo
Azal Tinto
AT-4
Qta Soutelo
Azal Tinto
AT-5
Qta Soutelo
Azal Tinto
AT-6
Qta Soutelo
Azal Tinto
AT-7
Qta Soutelo
Azal Tinto
Azal Tinto
AT-8
Qta Soutelo
AT-9
Qta Soutelo
UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
EVAG – Estação Vitivinícola Amândio Galhano
EVN – Estação Vitivinícola Nacional
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
Pinto-Carnide e colaboradores (2003) publicaram o genótipo da casta “Amaral”
baseando-se na amplificação dos mesmos seis microssatélites, na amostra
designada, no presente trabalho, por Azal Tinto-EVAG.
As amostras Azal Tinto-UTAD, Azal-Tinto EVAG e Sousão Galego, já foram
anteriormente descritas como correspondendo a genótipos distintos (Castro et al.,
2008). No entanto, partilham entre si um elevado número de alelos, o que
pressupõe que poderão de alguma forma estar relacionadas. Num estudo
envolvendo 12 microssatélites (onde se incluem os 6 deste trabalho), as amostras
Sousão Galego e Azal Tinto-EVAG revelaram possuir exactamente os mesmos
alelos em 4 dos 12 microssatélites e um alelo em comum nos restantes 8 (Castro
et al., dados não publicados).
Nas 15 amostras analisadas foram detectados um total de 25 alelos e 6 genótipos
diferentes, como se pode observar no dendrograma apresentado (Figura 1):
- Oito amostras possuem o genótipo de Azal Tinto-EVAG (o Amaral
publicado por Pinto-Carnide e colaboradores em 2003);
- Três amostras possuem o genótipo de Azal Tinto-UTAD (incluindo a
amostra Amaral presente na EVN);
- As duas amostras colhidas na EVAG com a designação Amaral (Amaral-1
e Amaral-2), possuem genótipos diferentes entre si e diferentes dos restantes
genótipos.
- Uma das 9 amostras colhidas na Quinta de Soutelo (AT-4), originária de
Amarante, apresentou um genótipo diferente dos restantes cinco detectados.
- A amostra “Sousão Galego” apresenta também genótipo único.
Azal Tinto-UTAD
Amaral-EVN
AT-1
Amaral-1
Azal Tinto-EVAG
AT-2
AT-9
AT-7
AT-6
AT-5
AT-8
AT-3
Amaral-2
Sousão Galego
AT-4
0.45
0.52
0.59
0.66
0.73
0.79
0.86
0.93
1.00
Figura 1 – Dendrograma das 15 amostras obtido mediante análise UPGMA,
usando o coeficiente de Dice e baseado em 25 marcadores SSR detectados (ver
Tabela 1 para os códigos das amostras).
4 – CONCLUSÕES
Confirmou-se que a análise de marcadores moleculares SSRs é uma ferramenta
muito útil na identificação de variedades de videira com vista ao esclarecimento
de sinonímias e homonímias entre variedades.
No presente estudo envolvendo a clarificação da sinonímia entre “Amaral” e “Azal
Tinto”, observamos num total de 15 amostras um conjunto de seis genótipos
diferentes, actualmente cultivados na região dos Vinhos Verdes, erradamente
como pertencendo a uma mesma casta. Constatamos que o maior número de
genótipos detectados corresponde ao perfil da amostra Azal Tinto-EVAG. A partir
de cruzamentos envolvendo este genótipo foram obtidos, provavelmente, os
restantes. Fica ainda por esclarecer a verdadeira identidade da casta Amaral. A
amplificação de um maior número de marcadores SSR está já a ser efectuada
com vista a determinar possíveis relações de parentesco entre o material em
estudo, assim como a caracterização ampelográfica do mesmo.
4 – BIBLIOGRAFIA
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Pinto-Carnide, O., Martín, J.P., Leal, F., Castro, I., Guedes-Pinto, H., Ortiz, J.M.
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Thomas, M.R., Scott N.S. (1993) “Microsatellite repeats in grapevine reveal DNA
polymorphisms when analysed as sequence-tagged sites (STSs)” Theor. Appl.
Genet. 86: 985– 990.
Este trabalho foi financiado por uma bolsa da FCT (SFRH/BD/22955/2005).
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o documento na íntegra - Academia da Vinha e do Vinho