ID: 39314292 26-12-2011 Tiragem: 44867 Pág: 31 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 29,32 x 18,83 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 1 de 1 Debate As reformas na educação Mais vale tarde do que nunca “A minha reacção é negativa, tenho a sensação de mais do menos que cheira a ranço”, escreveu-o Ana Benvente, investigadora e socióloga, antiga secretária de Estado da Educação nos governos de António Guterres (PÚBLICO, 13/12/2011), referindo-se à intervenção televisiva do ministro do Ensino Superior e Cultura, Nuno Crato, do passado dia 12 do corrente. Nada de espantar! Já se vai tornando um hábito pouco ético de antigas figuras governamentais do Partido Socialista criticarem tudo quanto foi feitio no âmbito do sistema educativo, ainda que mesmo por seus pares. Por exemplo, para Valter Lemos, também ele secretário de Estado do Partido Socialista, a actuação de Ana Benavente nos governos de Guterres “‘resultou nos piores resultados escolares da Europa em matéria de sucesso escolar e, na base deste falhanço, esteve uma cedência permanente aos interesses da Fenprof ’” (PÚBLICO, 29/02/2008). Portanto, seria de espantar, isso sim, que Ana Benavente desse o benefício da dúvida às reformas que Nuno Crato pretende implementar num ensino que não ensina e , ipso facto, relutante a que passem a ser avaliados os alunos em fim de percurso dos 1.º e 2.º ciclos do ensino básico com a finalidade em resolver alguns dos problemas que possam ter contribuído (e continuem a contribuir) para um ensino em que tem sido “proibido” reter os alunos que façam da escola um recreio permanente e/ou um ringue de violência e de indisciplina por se não se incutir neles, como defendeu Einstein, “uma compreensão nítida dos valores”. Como escrevi anos atrás, em artigo de opinião neste jornal (05/09/2005), “o caminho demasiado plano dos três ciclos do ensino básico faz com que os alunos circulem ‘sem queimarem as pestanas’ em auto-estradas sem paragens e a toda a velocidade. Deparando-se, de repente, com a primeira portagem a pagar para a passagem em anos do exigente ensino secundário (ao menos, valha-nos isso!) levando as mãos às algibeiras verificam ter os bolsos vazios ou cheios de cotão”. Hoje, essa situação agrava-se com as “Novas Oportunidades” e o “ “Acesso ao Ensino Superior para maiores de 23 anos”. Mas vamos ao cerne da questão, ou seja, em linhas gerais, a temática dedicada ao ensino superior nesse programa televisivo, por ser esse o seu objectivo principal, e a inerente intervenção do ministro Nuno Crato. Do que retive, de memória, dessa intervenção, relevo a intenção Rui de serem definidas, objectivamente, as obrigações e os Baptista deveres que competem ao ensino universitário e ao enProfessor sino politécnico não continuando a permitir, como até e co-autor aqui, a transformação atabalhoada do ensino médio em do blogue ensino superior politécnico na vã tentativa de endirei“De Rerum tar a sombra torta de uma vara e tapar buracos de um Natura” lado para abrir crateras do outro. Na sua intervenção, propôs-se o actual titular da pasta da Educação evitar que algumas boas escolas politécnicas se tornem em más universidades. Aliás, situação, de certo modo, permitida por os formulários respeitantes à legislação destes dois subsistemas do ensino superior pouco diferirem na forma e no conteúdo, quase se podendo dizer que os respectivos articulados se confrontam perante aquilo que quiseram dizer e não disseram e aquilo que disseram e não quiseram dizer sem ter em conta devida a recuperação de uma economia sustentada na força produtiva de uma juventude formada superiormente num exigente sistema educativo cuja planificação não descure a formação de elites e de uma massa crítica que não constitua meras excepções. Aliás, em referência merecida, o professor Seria de espantar, Adriano Moreira, durante o seminário “Reflexos da Declaração de Bolonha” (11 e 12 de Novembro isso sim, que Ana de 2004), promovido pelo Conselho Nacional Benavente desse das Profissões Liberais, em conferência inauo benefício da dúvida gural, com o título “Bolonha e as Profissões Liberais”, criticou a orientação de “univertizar às reformas que os politécnicos ou polectinizar as universidaNuno Crato pretende des”, defendendo o princípio da “identidade separada e de igual dignidade de ambos os subsistemas do ensino superior”, acrescentando implementar PAULO RICCA parecer-lhe “muito evidente ser um erro entender a transformação histórica de institutos politécnicos em universidades, como se de uma promoção se tratasse”. Em sintonia com esta posição se tinha já manifestado o professor Seabra Santos, ao referir-se, na sua primeira tomada de posse como reitor da Universidade de Coimbra, à confusão subjacente nos articulados legais no que respeita às competências e finalidades destes dois subsistemas do ensino superior. Como diz o povo, não há dois sem três: os professores Adriano Moreira, Seabra Santos e Nuno Crato, este com a autoridade e poderes que lhes estão concedidos no desempenho do seu cargo ministerial para tomar uma decisão. Que apenas peca por, pela força das circunstâncias e indecisões sucessivas, ter tardado. Mas, como sói dizer-se, mais vale tarde do que nunca!