Up-to-date on treatment of mullerian anomalies As malformações genitais, felizmente pouco freqüentes, são assunto de pouco conhecimento na prática clínica, e por isso, muitas vezes mal conduzidas, prejudicando a qualidade de vida e o futuro reprodutivo das mulheres portadoras. Geralmente, o diagnóstico é tardio, vindo a ocorrer apenas na idade reprodutiva, quando se atenta pela ausência de menstruação, ou por dificuldade de se iniciar a relação sexual, ou ainda, por quadros de infertilidade ou abortamentos de repetição. Muitas destas anomalias podem ser tratadas, proporcionando a estas mulheres uma vida sexual saudável, como nos casos de agenesias vaginais, casos de anomalias obstrutivas, com criptomenorréia, casos de anomalias uterinas, com gestações exitosas após correção cirúrgica. Devido à grande variedade de malformações, várias tentativas de classificá-las foram improdutivas, ou por serem simples demais ou muito complexas, dificultando seu entendimento e a escolha do tratamento. Para eliminar estas dificuldades, a Sociedade Americana de Fertilidade elaborou em 1988 uma classificação que separa as anomalias em grupos com as mesmas manifestações clínicas, o mesmo prognóstico reprodutivo e o mesmo tratamento. 1 2 E d i t o r ia l Estado atual do tratamento das malformações genitais Mauri José Piazza1,2 Ana Paula B Marques Lisbôa Peixoto2 Bruna Maria Filippetto2 Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Ginecologia Endócrina, Infanto-puberal e Climatério do Departamento de Tocoginecologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) FEMINA | Julho 2007 | vol 35 | nº 7 411 Estado atual do tratamento das malformações genitais Classe 1 Agenesias/Hipoplasias: • • • • • vaginal cervical fúndica tubárea mista ou combinada Classe 2 Unicornos: • • • • comunicante não-comunicante sem cavidade corno único Classe 3 Didelfos: • septo longitudinal • septo oblíquo Classe 4 Bicornos: • completo • parcial Classe 5 Septados: • completo • parcial Classe 6 Arqueados Classe 7 Relacionado ao uso do dietilestilbestrol (não descritas no Brasil) A causa mais comum de agenesia vaginal é a ausência congênita do útero e da vagina, conhecida como Síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser (MRKH). Nos casos em que o canal vaginal é relativamente profundo e com boa elasticidade, o tratamento é expectante, ocorrendo 412 FEMINA | Julho 2007 | vol 35 | nº 7 completa ampliação vaginal com o início da atividade sexual ou com dilatações progressivas com prótese apropriada (Frank, 1938), o que requer grande motivação da paciente. Em uma série de casos relatados recentemente de pacientes com agenesia útero-vaginal, mais de 90% foram capazes de obter sucesso funcional e anatômico através da dilatação vaginal (Roberts et al., 2001). Se a cavidade vaginal for curta e pouco elástica, aguarda-se o início ou intenção de atividade sexual, para então realizar sua ampliação cirúrgica. Existem várias técnicas apropriadas para a correção da agenesia vaginal. A escolha irá depender da experiência e habilidade do cirurgião. Até o momento, não há consenso na literatura em relação à melhor opção (Laufer, 2002). A técnica mais utilizada atualmente é a de Abbe-McIndoe (McIndoe, 1950), modificada por Banister, que consiste na dissecção do espaço entre o reto e a bexiga e colocação de molde coberto por enxerto no espaço neoformado. O enxerto pode ser obtido de retalho cutâneo das virilhas, coxas ou grandes lábios, ou, como se prefere atualmente, de membrana amniótica pré-lavada com solução fisiológica e antibiótico. O molde pode ser confeccionado de espuma, plástico, acrílico ou silicone. Após a retirada da prótese inicial, realizada em geral por volta do sétimo dia pós-operatório (podendo se estender por 2 a 3 semanas dependendo do enxerto utilizado), orienta-se dilatação progressiva com prótese rígida, associada a aplicação de estrogênio tópico, a fim de manter a vagina aberta até que ela seja completamente epitelizada, o que pode levar até 12 meses. O coito deve iniciar após algumas semanas e continuar regularmente para evitar estenose. Quando a epitelização estiver completa, a prótese deve ser usada somente à noite. Em alguns serviços, as próteses possuem uma indentação circular na sua extremidade distal para que fiquem presas a uma cinta abdominal, simulando um suspensório, devendo ser retiradas e lavadas diariamente, por 2 a 3 semanas. Técnicas que utilizam o intestino como enxerto para evitar o colabamento da neocavidade vaginal, como o reto (técnica de Sneguireff, 1892), o íleo (técnica de Baldwin, 1904) ou o sigmóide (técnica de Albrecht, 1902), são menos utilizadas por serem mais trabalhosas, necessitando de grandes cirurgias abdominais concomitantes, e com resultados semelhantes à técnica de McIndoe. A utilização do sigmóide tem como vantagem a constante Estado atual do tratamento das malformações genitais umidade, semelhante ao canal vaginal, e a pequena tendência cicatricial, que evita a estenose. Porém, o odor que permanece na vagina neoformada devido à secreção produzida pelas glândulas do tecido intestinal é extremamente incômodo para a paciente. Sendo assim, tais técnicas estão desaconselhadas. Vecchietti propôs outro procedimento para a criação da neovagina, que consiste na dilatação progressiva do espaço retovesical através de uma oliva tracionada por suturas realizadas no espaço subperitoneal por laparotomia ou laparoscopia (Borruto et al., 1999). Davydov desenvolveu uma técnica em 3 estágios, evolvendo mobilização de retalho peritoneal via abdominal, dissecção do espaço retovesical, e fixação do peritôneo no intróito vaginal (Davydov et al., 1974). A técnica de Wharton-Shares modificada por George (Schätz et al., 2005) é considerada uma técnica simples, de baixo custo, bons resultados e baixo índice de complicações. Consiste na identificação de vestígios dos ductos müllerianos no tecido conectivo plano entre a bexiga e o reto, que servirão como guia de orientação para a formação da neovagina. Estes ductos podem ser identificados em todas as pacientes com síndrome de MRKH, 2 cm abaixo do óstio uretral externo e 1 cm paramedial. Em pacientes que possuem alguma depressão em intróito vaginal, os ductos podem ser identificados 1 cm látero-dorsal à depressão. Procede-se então, à dilatação progressiva destes ductos rudimentares com velas de Hegar em direção ao eixo da pelve. Um duplo canal é formado, sendo a rafe mediana seccionada para se obter um canal único. Subseqüentemente, um molde coberto de estrogênio em creme é colocado na nova cavidade e mantido por 2 a 3 semanas. Nos casos de insucesso da neovaginoplastia por estenose cicatricial, com persistência de dor pélvica cíclica e hematométrio, nas pacientes com útero ou corno uterino funcionante, pode ser necessário a realização de histerectomia abdominal total para resolução dos sintomas. Nas demais malformações genitais, a indicação de tratamento cirúrgico vai depender da sintomatologia. Na existência de corno rudimentar funcionante sem comunicação com a cavidade uterina, a extirpação cirúrgica por laparotomia ou laparoscopia deve ser realizada para evitar o surgimento de hematométrio, hematossalpinge e endometriose pélvica provenientes do acúmulo de sangue neste local. Na ocorrência de abortamento de repetição com útero septado parcial ou completo, bons resultados são obtidos com histeroscopia para ressecção dos septos uterinos (metroplastia). Mullesserill et al., 2003 realizaram a metroplastia histeroscópica para retirada de septo uterino parcial guiada por ultra-sonografia, cujo benefício foi o de facilitar a visualização dos instrumentos dentro da cavidade uterina, garantindo a unificação das duas cavidades. Em casos em que a metroplastia histeroscópica não é possível, procede-se à metroplastia via abdominal pelas técnicas de Jones e Jones ou de Tompkins. Na primeira, o septo é removido em forma de cunha através de duas incisões separadas no fundo uterino. Na segunda, a incisão é única, dividindo o útero e o septo exatamente no meio até que se atinja a cavidade no ápice do septo. Uma sonda ou pinça é introduzida no corno uterino e o septo é seccionado sobre a mesma, um lado de cada vez. Diante de um septo vaginal longitudinal, a correção só se faz necessária se houver dispareunia. Já nos casos de septos vaginais oblíquos não comunicantes (Síndrome de Herlyn-Werner-Wunderlich), a septoplastia é mandatória devido ao hematocolpo, hematométrio e hematosalpinge resultantes. Para o útero bicorno, a técnica de Strassman ainda é o procedimento clássico. Consiste na realização de uma incisão transversa, corno a corno, no fundo uterino, aprofundando a incisão em sua parte medial para adentrar a ambas as cavidades. O miométrio é suturado em dois planos iniciando da parede posterior em sentido longitudinal. O hímen imperfurado deve ser excisado; se for apenas incisado, as bordas tendem a se fundir e formar nova membrana obstrutiva. Esta correção pode ser postergada para o período perimenarca. Considerações finais O bom manejo das malformações genitais deverá incluir sempre a investigação de outras malformações associadas, especialmente as que envolvem o trato urinário, além de um preparo psicológico cuidadoso da paciente antes do tratamento ou intervenção. Aquelas que foram submetidas a neovaginoplastia deverão ser acompanhadas como qualquer mulher, submetidas a exame ginecológico anual, para prevenção de possível malignização do enxerto, nos casos de pele e intestino. A coleta de citologia oncótica poderá ser realizada a intervalos maiores, assim como preconizado para pacientes histerectomizadas por patologias benignas. Devido ao sucesso da técnica não invasiva para criação da neovagina, através de dilatação progressiva, esta deverá ser a primeira linha de tratamento recomendada. FEMINA | Julho 2007 | vol 35 | nº 7 413 Estado atual do tratamento das malformações genitais Leituras suplementares 1. Borruto F, Chasen ST, Chervenak FA, Fedele L. The Vecchietti procedure for surgical treatment of vaginal agenesis: comparison of laparoscopy and laparotomy. Int J Gynaecol Obstet 1999; 64: 153-8. 2. Davydov SN, Zhvitiashvili OD. Formation of vagina (colpopoiesis) from peritoneum of Douglas pouch. Acta Chir Plast 1974; 16: 35-41. 3. Frank RT. The formation of an artificial vagina without operation. Am J Obstet Gynecol 1938; 35: 1053-5. 4. Laufer MR. Congenital absence of the vagina: in search Concursos 2007 Concursos 2007 of the perfect solution. When, and by what technique, should a vagina be created? Curr Opin Obstet Gynecol 2002: 14: 441-4. 414 FEMINA | Julho 2007 | vol 35 | nº 7 5. McIndoe AH. The treatment of congenital absence and obliterative conditions of the vagina. Br J Plast Surg 1950; 2: 254-67. 6. Mullesserill BT, Dumesic DA, Damario MA, Session DR. Ultrassound-guided unification of non communicating uterine cavities. JSLS 2003; 7: 155-7. 7. Roberts CP, Haber MJ, Rock JA. Vaginal creation for müllerian agenesis. Am J Obstet Gynecol 2001; 185: 1349-52; discussion 1352-3. 8. Schätz T, Huber J, Wenzl R. Creation of neovagina according to Wharton-Sheares-George in patients with Mayer-Rokitansky-Küster-Hauser syndrome. Fertil Steril 2005; 83: 437-41. Para obtenção do Certificado de atuação nas áreas de: • Endoscopia Ginecológica (Laparoscopia e Histeroscopia) • Urodinâmica e Uretrocistoscopia em Ginecologia • Sexologia em Ginecologia e Obstetrícia • Medicina Fetal Inscrições: 07/08/2007 a 06/09/2007 Na Associação de Ginecologia e Obstetrícia do seu Estado Data da prova: 12/11/2007 Local: Centro de Convenções do Ceará Fortaleza - Ceará