“A realidade lá fora...”
Cada um de nós deve decidir: fazer escolhas fáceis para “viabilizar o viável” ou
buscar a realização do impossível?
Por Oscar Motomura
S
empre que se fala sobre caminhos que podem nos
levar a melhorias radicais na política, na economia,
nos negócios, no social, na ecologia, é comum ouvirmos como contra-argumento uma frase feita: “isso é
muito bonito... mas a realidade lá fora ...”. Qual o sentido
desse argumento? É que, se não entrarmos no jogo, não
conseguiremos sobreviver no mundo selvagem dos espertos? Que todo mundo nessa realidade “lá fora” pratica
uma forma não ética de fazer negócios e mesmo de governar? Acreditamos realmente nisso? Ou simplesmente
a frase-chavão nos pega distraídos e nem sequer temos
tempo de contra-argumentar? Seria também porque temos vergonha de defender uma posição mais utópica,
por parecer algo inocente e distante da realidade que os
que têm sucesso “no jogo lá fora” parecem dominar?
Usar frases feitas sobre
a realidade lá fora é fácil.
Difícil é assumir que ela
reflete a realidade dentro
de cada um de nós
O que acontece quando decidimos ir fundo na questão e procuramos desvendar a realidade como ela é?
Simplesmente constatamos que a realidade lá fora varia
de A a Z. Em Z, estariam os empreendimentos do crime
organizado. São do crime e assumem que são. Próximas
de Z, encontramos as organizações que são do crime,
mas não assumem. Vestem uma fachada de legalidade
como estratégia. Outras não matam, mas corrompem
e são corruptíveis. Outras, ainda, não corrompem, mas
sonegam todos os impostos possíveis. Há ainda as que
pagam os impostos corretamente, mas têm produtos que
prejudicam a saúde das pessoas e do planeta. E assim por
diante. Em cada ponto do alfabeto seria possível posicionar cada um desses tipos de “filosofia de gestão”, de
posicionamento ético.
No outro extremo da escala, em A, estão as organizações que fazem questão de ser absolutamente éticas
em tudo. Estão voltadas para o bem comum e existem
para servir à vida. Querem ser cada vez melhores, mas
sempre dentro do espírito das leis. São como “os melhores atletas, que querem seus oponentes em sua melhor
forma”, como no poema taoísta. A “realidade lá fora” vai
de A a Z. Sim, também com As que têm muito sucesso.
E não são poucas. E por terem sucesso sustentável são
até chamadas de organizações “feitas para durar”. Usar
frases feitas sobre a realidade “lá fora” é muito fácil. Difícil é assumir que fazemos parte dela e que ela reflete o
conjunto da própria realidade dentro de cada um de nós.
Mais difícil ainda é decidir em qual jogo queremos ter
sucesso e evoluir.
No jogo em que todos quebram regras e pensam em
derrubar os outros? (Aliás, onde estaria a graça em ganhar
trapaceando?) Num jogo em que só há satisfação genuína
quando a ética estiver presente até em seus aspectos mais
sutis? Existiria ainda um outro jogo, maior, em que se
busca o bem-estar de todos? Um jogo mais desafiador e
complexo, porém mais leve, que pressupõe que estejamos
sempre em nosso melhor estado, sejamos a melhor expressão de nós mesmos, conscientes de que constituímos
um grande Todo? Estaria inerente a esse tipo de reflexão
e posicionamento o significado mais genuíno de sucesso
e valor de nossa competência estratégica?
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* Oscar Motomura, diretor geral da Amana-Key, empresa especializada em inovações radicais em gestão.
Fonte: Revista Época Negócios
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- Oscar Motomura