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Rita de Cássia Santana
de Carvalho Rosado é
professora universitária
graduada em História e
Mestra em História Social
pela Universidade Federal da
Bahia - Ufba. Professora de
História Econômica e de
História do Brasil da
Universidade do Estado da
Bahia - Uneb, onde exerceu o
cargo de Diretora do então
Centro de Educação Técnica
da Bahia - CETEBA.
Atualmente exerce o cargo de
Coordenadora de Projetos do
Arquivo Público da Bahia APB. Dentre seus trabalhos
destacam-se:
n
O Porto de Salvador:
modernização em projeto
1854 a 1891;
n
Cronologia: Portos da
Bahia: Salvador, Ilhéus e
Aratu;
n
Cronologia: São João do
Piauí 80 Anos;
n
Memória Histórica do
Colégio Dois de Julho 70
Anos.
A fé que nos move
Uma das características de
Salvador é a fé de seu povo,
manifestada sob diversas formas
de crenças e religiões, que muitas
vezes se interligam e se completam.
É a fé que faz do baiano um
povo acolhedor, humano,
empreendedor. Que faz da Bahia
uma nação singular dentro dessa
imensa nação brasileira.
No momento em que resgata,
através deste importante trabalho,
a história de São Nicodemus,
Padroeiro dos Trabalhadores do
Porto de Salvador, a Companhia
das Docas do Estado da Bahia CODEBA mais uma vez reforça
seu compromisso de integração e
inserção na comunidade onde o
sistema portuário está localizado.
Esse resgate histórico se dá num
momento especial, em que a
CODEBA participa de um
ambicioso projeto de revitalização
do Comércio, transformando esta
área num efervescente pólo
comercial, de lazer e de
entretenimento.
Que São Nicodemus abençoe
não apenas os portuários, mas
também, os cidadãos baianos
comprometidos na
construção de
uma cidade
com qualidade
de vida para
todos.
Geraldo Simões
Diretor Presidente
da CODEBA
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SÃO NICODEMUS
“VITÓRIA DO POVO”
“AQUELE QUE VENCE AS PESSOAS”
PADROEIRO DOS TRABALHADORES
DO PORTO DE SALVADOR
RITA DE CÁSSIA SANTANA DE CARVALHO ROSADO
Salvador - Bahia
Novembro - 2005
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CODEBA Companhia das Docas do Estado da Bahia
GERALDO SIMÕES DE OLIVEIRA
Diretor Presidente
JOSÉ GALDINO DE ARAGÃO LEITE
Diretor de Gestão Administrativa
JOSÉ FIDELIS AUGUSTO SARNO
Diretor de Infra-Estrutura e Gestão Portuária
NEWTON FERREIRA DIAS
Diretor de Gestão Financeira
ROSILANE BARBOSA
Assessora de Comunicação
Ficha Técnica
RITA MALTEZ
AGAPÊ DESIGN
RENATO ANDRADE
FOTOS
Revisão
Projeto Gráfico e Editoração Eletrônica
Capa
Acervo da CODEBA e Agência A Tarde
Rosado, Rita de Cássia Santana de Carvalho
São Nicodemus: Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de
Salvador / Rita de Cássia Santana de Carvalho Rosado. Salvador: CODEBA, 2005.
60p.
1. São Nicodemus. 2. Porto de Salvador. I. CODEBA.
II. Título.
Ficha Catalográfica elaborada pela CODEBA/CDI.
Direitos Autorais: São da CODEBA, podendo a Autora aprofundar as
pesquisas e ampliar o trabalho, em comum acordo com a Companhia.
Companhia das Docas do Estado da Bahia - CODEBA
Av. da França, 1551, Comércio - CEP 40010-000 - Salvador - Bahia - Brasil
Tel.: (71) 3320-1270 - Fax: (71) 3320-1365 - www.codeba.com.br
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Sumário
Dedicatória .................................................................
5
Agradecimentos ..........................................................
7
Prefácio .....................................................................
9
Introdução .................................................................. 11
1. São Nicodemus e Jesus de Nazareth ........................ 15
2. São Nicodemus Padroeiro dos Trabalhadores do
Porto de Salvador ................................................... 27
3. A Festa ................................................................... 39
Conclusão ................................................................... 53
Referências Bibliográficas ........................................... 55
Anexo ......................................................................... 59
Portaria DPR no 055, 04 de julho de 2005 ............... 59
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Dedicatória
Aos Trabalhadores do Porto de Salvador
que "inventaram" o seu Santo Padroeiro
São Nicodemus.
E a todos os devotos que participam,
fervorosamente, deste ato de fé.
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Agradecimentos
À Diretoria Executiva da CODEBA, por acreditar
na importância deste trabalho;
à autora pela sua dedicação ao estudo da vida
portuária da Bahia e disposição pela pesquisa
sobre São Nicodemus;
aos colegas da CODEBA, aos trabalhadores da
estiva e equipe do OGMOSA, e demais pessoas que
contribuíram, direta ou indiretamente, na busca de
informações;
e aos patrocinadores, sem os quais este registro
não seria democratizado.
A Comissão dos Festejos de São Nicodemus - 2005
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Prefácio
D
esde 1980 venho participando atentamente dos festejos de São
Nicodemus. A cada ano aumentava a minha curiosidade. Queria
saber um pouco mais sobre este ato de fé e devoção dos
portuários de Salvador.
Após receber a faixa de Presidente dos Festejos de 2005, em
novembro do ano passado, procurei ler sobre a vida de São Nicodemus
e percebi que haviam muitos fatos importantes permeados por
exemplos de ética, coragem, humildade, justiça e amor. Eis que surgiu a
idéia de convidar a Professora Rita de Cássia Santana de Carvalho
Rosado, historiadora que dedicou a maior parte da sua vida profissional ao estudo da história dos portos da Bahia, para participar da
Comissão dos Festejos e colaborar com as ações relacionadas à
preservação das tradições desta Festa.
De pronto ela aceitou o convite e o desafio de dar continuidade a uma
pesquisa já iniciada na década de 80. Dois meses depois a autora
surpreende a Comissão dos Festejos com esta valiosa publicação. Uma
publicação dedicada aos portuários de Salvador que, de forma organizada,
escolheram São Nicodemus como seu protetor e padroeiro.
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Hoje tenho certeza, de que os fatos não se esgotam neste livro. Esta obra
será mais uma fonte, mais um documento valioso para a preservação da
memória da vida dos portuários e das suas manifestações religiosas e
culturais, principalmente por ordenar informações esparsas e por
permitir que os leitores façam uma reflexão profunda e uma correlação
da vida de Nicodemus com Jesus, com os fatos vivenciados pelos
trabalhadores do Porto de Salvador ao longo dessas últimas seis décadas
de profundas mudanças no sistema portuário.
Itamar Trindade Valadares
Presidente da Comissão dos Festejos de São Nicodemus - 2005
Economista, empregada da CODEBA desde maio de 1980
Ex-Diretora Operacional e Vice-Presidente do OGMOSA
10
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Introdução
“Certa vez, Michel Foucault criticou os
historiadores pelo que ele chamou de sua
‘idéia empobrecida do real’, que não
deixava lugar para o que é imaginado”.
Peter Burke
A
contecimento de repercussão inesperada teve como cenário o
Porto de Salvador, mais especificamente o denominado Cais do
Carvão. De movimentação expressiva pelos serviços que
prestava aos navios de longo curso e de cabotagem, abastecendo as
caldeiras de carvão, era aquele cais muito povoado de estivadores e
doqueiros em geral.
Um estivador, ou dois estivadores, ou três estivadores, ou uma mulher
balaieira, gritou / falou / exclamou NICODEMUS!!! Outros estivadores
quem sabe, talvez aqueles mesmos que gritaram o encontraram,
sonharam, moldaram-no e falaram NICODEMUS!!! Então, o Santo foi
o eleito, o aclamado, o escolhido no ano de 1941, 1942, 1943, início da
década de 1940, o Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador, já
estava definido - São Nicodemus. O processo que resultou na escolha de
São Nicodemus para Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador
é povoado de casos que se desdobram em visões, sonhos, mensagens,
brincadeiras e achados.
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
A tentativa de compreender esse imaginário “construído e inventado” que
“construiu e inventou”1a São Nicodemus como Padroeiro dos
Trabalhadores do Porto de Salvador é em parte um dos objetivos deste
trabalho. O entendimento da linguagem dos trabalhadores do porto, de
ontem e de hoje, através dos rituais, das comemorações, dos festejos, das
graças alcançadas e outros abre caminho para a explicação da
permanência da Festa por mais de seis décadas. Através da repetição, de
acréscimos de elementos, supressão de outros e manutenção de alguns, a
Festa tem se mantido ininterruptamente e, São Nicodemus mais amado
e fortalecido como Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador.
E as fontes? Poucos os registros escritos, muitas expectativas. São
Nicodemus ajudou. Ajudou de verdade a encontrá-las. O Informativo
CODEBA forneceu dados sobre os festejos desde o ano de 1981 até os
dias atuais. Os jornais - A Tarde, Tribuna da Bahia, Correio da Bahia,
devidamente catalogados no Centro de Documentação e Informação CDI da CODEBA, que trazem aqui acolá depoimentos de estivadores,
doqueiros e demais trabalhadores do porto no tempo da aclamação do
Santo Padroeiro. E mais as entrevistas que foram realizadas em
setembro e outubro deste ano de 2005, com dois estivadores. O Sr.
Antônio Alves dos Santos (63), cognominado “Toni Tornado” que
trabalha na estiva desde 1958. Presidiu o Sindicato dos Estivadores e
continua na militância em prol da categoria. Também nos foi dada a
oportunidade de conversar, de entrevistar o Sr. Jacintho da Silva Costa
(90) cognominado “Bala” que começou a trabalhar na estiva no ano de
1935 e se aposentou em 1966. Sempre freqüentador do porto ainda
permaneceu na ativa por muito tempo após a aposentadoria. Um e outro,
os entrevistados forneceram dados que muito ajudou na recomposição, no
resgate deste fenômeno que nasceu no imaginário e virou realidade.
O depoimento da Administradora Ana Rita Moreira Brandão, uma
das devotas e idealizadora do Encontro de São Nicodemus, Bom
Jesus dos Navegantes e Nossa Senhora da Conceição da Praia,
1Terminologia utilizada na área de Representações Sociais. Consultar Minayo, Cecília. Vide referências
bibliográficas.
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
contribuiu para enriquecer o ítem relativo ao referido encontro e ao
trabalho em geral.
Aqui tem lugar para o imaginário. Foucault tinha razão. O imaginário
enriquece a narrativa, porque ele é o real de uma dada sociedade. As
informações sobre o processo da escolha do Santo Padroeiro foram
registradas com base em um conteúdo onde prevalece o imaginário. Esse
mundo povoado da subjetividade, da criatividade vai atuar como elemento
identificador da tradição que se incorpora à Festa desde as suas origens.
Faltava algo não menos importante. A vida, a trajetória de São
Nicodemus lá nos primeiros anos da Era Cristã. A Bíblia Sagrada
apresentou-se como o primeiro documento e o mais importante. Outras
publicações foram fundamentais como por exemplo a Legenda Áurea:
Vidas de Santos, obra de destaque na literatura hagiográfica que data do
século XIII, de autoria do Arcebispo de Gênova Jacopo Varazze. La Fleur
des Saints de Omer Englebert e a Ressurreição de Cristo de Og Mandino.
Um outro recurso utilizado foi a Internet, que nos sites de busca oferecem uma série de informações sobre o tema.
São Nicodemus: Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador está
estruturado em três partes, além da Introdução, da Conclusão e das
Referências Bibliográficas. A primeira parte trata sobre a vida de São
Nicodemus, sua relação com Jesus de Nazareth e a sua trajetória após a
Ressurreição de Cristo. A segunda parte relaciona-se a São Nicodemus e
os trabalhadores do Porto de Salvador. Como e quando o Santo tornou-se
padroeiro. Quem o escolheu, quais os mensageiros e o local. A Festa
compõe a terceira parte. É o momento em que se trata dos festejos desde
a década de 1940 até o momento atual.
A memória de São Nicodemus e a sua relação com os trabalhadores do
Porto de Salvador, com este trabalho ganha espaço pela oportunidade de
ser preservada, resgatada e mais valorizada. O Santo Padroeiro muito
ajudou para que este trabalho chegasse ao final. Ele esteve a atender os
pedidos da sua devota assídua e desprendida. Estou falando da Presidente
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
da Comissão dos Festejos de São Nicodemus - Itamar Trindade
Valadares. Corajosa. Planejou um folheto, algo sobre Nicodemus. Fui
buscar, corri atrás das fontes. Ao entregar-lhe o pequeno texto ela
exclamou!!! Agora queremos um livro. Ela me deu a honra de ser
convidada especial dos festejos deste ano. Colocou-me perto dela na
comissão. Obrigada Itamar pela confiança a mim depositada. Obrigada
pelo que aprendi sobre Nicodemus e sobre os trabalhadores deste porto.
Obrigada aos funcionários da CODEBA. Obrigada as Bibliotecárias Maria
Suely de Castro Martins e Maria Luciana Barbosa de Araújo. Desde
1983 que estamos sempre unidas. O elo principal é o Porto de Salvador.
Quero agradecer. Agradecer faz bem. A Marli Geralda Teixeira minha
amiga. Mestra e Doutora em História. Leu este trabalho e o aprovou. A
Ellen Melo dos Santos Ribeiro minha amiga. Mestra em História.
Conhecedora da Bíblia. Discutimos e estudamos juntas passagens da vida
de Nicodemus. Fez-me entender sem muitas dificuldades a linguagem
bíblica. A Profa. Antonietta Nunes, Doutora em Educação. Quando falei
a ela do trabalho, de imediato colocou à minha disposição uma rara
bibliografia sobre vida de Santos. Foi aí que encontrei, localizei a vida de
São Nicodemus após a morte de Jesus de Nazareth. A Odete Uzeda,
Profa. de História porque me ouviu e se entusiasmou pelo tema. A
Bárbara Patury que digitou comigo as várias versões do texto. Dispôs-se
a trabalhar à noite para que eu cumprisse os prazos de entrega.
Rita de Cássia Rosado
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1. São Nicodemus e
Jesus de Nazareth
S
ão Nicodemus2 o eleito, o escolhido Padroeiro dos Trabalhadores
do Porto de Salvador, que em grego significa "Vitória do Povo", e
"Aquele que vence as pessoas" nasceu na cidade de Emaús3, sul da
Palestina , região da Judéia, como destacada no mapa a seguir. Por três
anos Jesus de Nazareth, dos 30 aos 33 anos, ali esteve exercendo o seu
ministério, pregando o Evangelho e operando milagres. Fariseu de grande
prestígio na região, vivia Nicodemus àquela época em um palácio
suntuoso, de sua propriedade, afastado de Emaús, e a apenas 16km de
Jerusalém, a capital da Palestina.
2
A grafia do nome do Santo Padroeiro dos trabalhadores do Porto de Salvador é Nicodemus. Na Bíblia
encontra-se como Nicodemo e, em outras publicações como Nicodemos. Neste trabalho o consenso foi
pela uniformização - SÃO NICODEMUS - como é grafado pelos seus devotos do Porto de Salvador.
3
Significa “desejo de conselho”.
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Figura 1
Mapa da Palestina
onde se destaca a
cidade de Emaús
onde Nicodemus
nasceu.
Fonte: Bíblia Sagrada 49ª Edição. São Paulo:
Ave Maria. 2004
O Palácio pela riqueza e pela imponência, contrastava com a simplicidade
do seu proprietário. A construção exibia alvas colunas de mármore e
telhas avermelhadas com aparência de coisa nova, enquanto que
Nicodemus já se apresentava em idade avançada. Os cômodos refletiam
luxo, suntuosidade e os jardins eram sem dúvida uma exposição de
horticultura artística além de decorado com mosaicos de rara beleza.
Mas Nicodemus refletia acima de tudo naturalidade em suas ações e em
seu comportamento (Mandino: 1981, p. 215 a 245).
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
À época, era Nicodemus um fariseu “que inspirava o respeito e a
amizade” daqueles que se aproximavam e que com ele conviviam.
(Englebert, 1984 p. 253). Membro do Sinédrio, Corte Suprema ou
Grande Conselho, sem dúvida mantinha compromisso de fidelidade com a
Lei Judaica. O Sinédrio era o espaço que congregava os denominados
doutores da lei, príncipes dos sacerdotes para as tomadas de decisão
referentes à religião e para as discussões e interpretações sobre a Lei
Judaica. Por integrar a categoria dos fariseus, por compor a elite local,
mas sobretudo pelo respeito que inspirava, Nicodemus veio a receber o
título de Príncipe dos Judeus.
Ser membro do Sinédrio significava freqüentar, ter acesso e compor o
mesmo fórum, com direito a voz e voto, ao lado de personalidades
poderosas e de destaque, a exemplo de Caifás. Significava defender os
interesses farisaicos de preservar intacto/intocáveis os dogmas contidos
na Lei de Moisés, ou seja no Antigo Testamento. Essa postura rígida e
conservadora dos fariseus os fez repudiar, perseguir e condenar a Jesus
de Nazareth que veio ao mundo, dentre outras razões, com a missão
delegada pelo Pai, de reformular aqueles dogmas, vistos como
ultrapassados para o momento histórico de então.
Nicodemus, na condição de fariseu, deveria de forma incondicional
defender a manutenção da Lei de Moisés, discordando portanto, de
condutas que a maculassem. Mas, mesmo com todo o poder político e
econômico de que desfrutava, era admirado como homem discreto,
simples e quase tímido. Seus únicos traços fortes eram a barba cheia e as
sobrancelhas grossas. Tinha aproximadamente 1,50m (hum metro e
meio) de altura e pesava não mais que 50kg (cinqüenta quilos). Quanto
à sua idade, sabe-se segundo as informações bíblicas, que se tratava de
uma pessoa idosa. No diálogo com Jesus reproduzido em João 3:1-21 é
ele mesmo quem se declara velho.
Este homem rico, que galgou o título de Príncipe dos Judeus, de elevado
status político e social, representante da elite do sul da Palestina,
defensor dos dogmas do Antigo Testamento/ Lei de Moisés foi se ter com
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Jesus de Nazareth, exatamente Aquele que estava lutando para reformular
os dogmas defendidos pelos fariseus.
O que motivou, então, a Nicodemus para que
fosse ao encontro do Mestre?
O despertar de Nicodemus por Jesus de Nazareth se deu após as
colocações feitas por seu filho único chamado Gorion, sobre as
mensagens que ouviu em uma das pregações e, em posterior diálogo que
mantiveram sobre as promessas do Reino de Deus. As declarações de
Jesus de Nazareth trouxeram inquietações a Gorion que terminou por
revelar ao seu pai. Este se sensibilizou e, mesmo ciente das restrições
estabelecidas pelo Sinédrio aos seguidores de Jesus, foi discretamente em
busca de uma oportunidade para dialogar com o Mestre. Nicodemus,
estava com disposição para o encontro. Ansioso, mostrava-se para saber,
descobrir qual o caminho a percorrer e como proceder para alcançar a
salvação e o Reino de Deus (Mandino: 1981, p. 222/23).
Figura 2
Momento do
Encontro entre
Nicodemus e Jesus
de Nazareth.
Fonte: www.bibleexplained.com
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Então, foi se ter com Jesus de Nazareth. Na condição de fariseu e
membro do Sinédrio, receoso de perder a posição, o status de que privava
entre o seu povo, buscou um horário conveniente para evitar dúvidas e
publicidade de seu gesto. Para não ser visto em companhia daquele a
quem os fariseus identificavam como Falso Profeta, portador de idéias e
disseminador de ações consideradas revolucionárias e subversiva, os
encontros vão acontecer, mas, somente na calada da noite. A despeito de
todos os riscos, o Príncipe dos Judeus continuou a buscar meios de se
encontrar com Jesus de Nazareth.
Contou, entretanto com a companhia e o apoio de seu amigo fariseu e
membro do Sinédrio, José de Arimatéia, que era grande admirador e
amigo do Mestre. Os dois já se conheciam. Na Bíblia encontra-se
assentado que Arimatéia era “o discípulo rico de Jesus”, mas era ao
mesmo tempo um “discípulo oculto” assim oculto como Nicodemus. Um
e outro guardavam reservas destes contatos, sob o risco de sofrerem
penalidades vindas do Grande Conselho. O encontro entre Nicodemus e
Jesus de Nazareth aconteceu, à noite e, com a intermediação de José de
Arimatéia.
João Evangelista, o único dos Evangelistas que trata sobre Nicodemus relata
um dos diálogos entre Jesus de Nazareth e aquele fariseu (João 3:1-21).
Trata-se de uma passagem que deixa transparecer a aproximação que se
firmou entre ambos. A conversa entre eles e as parábolas de Jesus de
Nazareth estão diretamente relacionadas aos ensinamentos voltados
para o alcance da salvação. Jesus de Nazareth propõe a Nicodemus uma
mudança radical de conduta ao afirmar sobre a premência de rever o tipo
de vida à qual se dedicava e valorizava ali na Judéia. De uma mentalidade
fechada e voltada ainda para as coisas da terra, Nicodemus recebe de
Jesus de Nazareth o convite para um repensar, abrir o coração e
incorporar a mensagem de que “É preciso nascer de novo para ver o
Reino de Deus”.
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Figura 3
Nicodemus em
diálogo com Jesus
de Nazareth.
Fonte:
www.ternews2.com
“Havia um homem da seita dos fariseus, chamado
Nicodemus, um dos principais entre os judeus. Este foi ter
com Jesus, de noite, e disse-lhe: Mestre, sabemos que fostes
enviado por Deus como mestre, porque ninguém pode fazer
estes milagres que tu fazes, se Deus não estiver com ele.
Jesus respondeu e disse-lhe: Em verdade em verdade te digo
que não pode ver o reino de Deus, senão aquele que nascer
de novo. Nicodemus disse-lhe: Como pode um homem nascer,
sendo velho? Por ventura pode tornar a entrar no ventre de
sua mãe e renascer? Respondeu-lhe Jesus: Em verdade em
verdade te digo que quem não renascer da água e do Espírito
Santo, não pode entrar no reino de Deus. O que nasceu da
carne, é carne, e o que nasceu do Espírito, é espírito...
(Bíblia Sagrada, João 3:1-21 ).
Nicodemus de início não entendeu o significado das palavras de Jesus de
Nazareth, mas o Mestre explicou claramente que renascer significava
nascer do alto, com o espírito de Deus entrando em nosso ser, indepen20
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dentemente de idade ou posição social... e Jesus ainda perguntou-lhe:
como poderia ele Nicodemus ser mestre em Israel, se entendia tão pouco
sobre o Reino de Deus? Os dois ainda se encontraram muitas vezes. Era
sobre a busca da salvação e do Reino de Deus que eles tratavam, sempre
à noite e muitas das vezes na companhia de José de Arimatéia. Nicodemus
demonstrava sempre preocupação e receio de ir sozinho falar com Jesus
de Nazareth (Mandino, 1981, p. 223) mas, ao longo do tempo, aqueles
receios foram aos poucos se diluindo como mostra o texto a seguir.
As perseguições a Jesus se intensificavam. Os representantes de Roma na
Judéia e os fariseus estavam dispostos a calar a sua voz. Nicodemus
acompanhava atentamente o desenrolar dos fatos. Até que em uma das
reuniões no Sinédrio, onde se encontravam os principais sacerdotes dos
fariseus, para ouvir os guardas do Templo que foram prender Jesus de
Nazareth, Nicodemus se manifestou de forma tímida, mas provocou
críticas e cobranças por parte dos membros daquele Conselho.
Os guardas eram as pessoas encarregadas, por Caifás, de prenderem
Jesus que estava sendo acusado pelos sacerdotes de agitar o povo, de
provocar desordem e tumulto na região. Aconteceu, porém, que os referidos
guardas voltaram de “mãos abanando”, dizendo que não tinham ousado
colocar suas mãos sobre o Mestre. Nicodemus, ao ouvir aquelas
declarações muito se surpreendeu e perguntou: Porventura condena a
nossa lei um homem sem primeiro o ouvir e ter conhecimento do que faz?
(João 7:51). A este seu protesto os fariseus, que repudiavam a Jesus de
Nazareth, responderam e disseram-lhe: És tu também da Galiléia?
Examinas as Escrituras e verás que da Galiléia não se levanta profeta
(João 7: 52).
Estas palavras proferidas pelos fariseus em resposta a Nicodemus
expressam o elevado nível de vaidade e de prepotência dos seus patrícios
e representantes do Sinédrio. A verdade, para aquele Conselho estava
apenas com os fariseus do sul da Palestina, ou seja, da Judéia. Jamais
admitiu ser o Profeta alguém que procedesse da Galiléia. “Da Galiléia
não se levanta Profeta”. Por se tratar de uma região pobre da Palestina,
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
a Galiléia, terra natal de Maria e de José, terra onde Jesus4 viveu e foi
criado, não daria um Profeta. Reprovam e zombam de Nicodemus. Como
ele, um fariseu, vai se ocupar, se expor e se manifestar em defesa daquele
que era sem dúvidas um “Falso Profeta”?
Entretanto quando da crucificação e morte de Jesus de Nazareth,
Nicodemus e seu amigo José de Arimatéia, os quais permaneceram seus
admiradores vão se empenhar para conseguirem a liberação do corpo
junto a Pilatos, que era procurador romano e Governador da Judéia.
Aqueles dois fariseus, homens poderosos de então, providenciaram para
Jesus um sepultamento digno em sepultura especial, evitando que o seu
corpo fosse lançado em vala comum. Pilatos cedeu ao pedido de José de
Figura 4
Descrucificação de
Jesus de Nazareth.
Fonte:
www.oleschmitt.com.br
4
Jesus nasceu na Judéia porque seus pais foram obrigados a comparecerem ao recenseamento para
votarem. Mas ele ali só nasceu. Foi criado e educado na Galiléia, portanto, era considerado um Galileu.
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
Arimatéia. Nicodemus fez-se presente acompanhando aos trabalhos de
retirada do corpo da Cruz e oferecendo cobertura ao seu amigo Arimatéia.
No ato do sepultamento, a sua participação foi definitivamente marcante.
Disponibilizou, na ocasião, uma composição de quase cem libras de mirra
e de aloés, ervas aromáticas, correspondendo a 25kg (vinte e cinco quilos)
aproximadamente, que envolveram e perfumaram o corpo de Jesus de
Nazareth, e o envolveram ainda em lençóis conforme a prática de
sepultamento dos judeus (João 19: 39). Este ato tornou público para a
região da Judéia e para o Sinédrio em particular, o envolvimento
daqueles poderosos fariseus da Judéia - Nicodemus e José de Arimatéia
- com Jesus de Nazareth.
Uma pergunta se impõe. Qual o destino de Nicodemus após a morte,
crucificação, sepultamento e ressurreição de Jesus de Nazareth? A Bíblia
trata da vida dele até o sepultamento de Jesus. Após este momento
referência alguma se encontra registrada sobre as suas ações nos Textos
Sagrados. Outras fontes tratam sobre esta fase, como registrado logo a
seguir.
Nicodemus fez-se cristão, seguidor dos ensinamentos de Cristo, tendo
recebido o batismo das mãos de João e Pedro. Em 03 de agosto do ano
da Ascensão do Senhor quando do martírio de Santo Estevão, ele e o seu
tio Gamaliel, impediram que o corpo do mártir fosse jogado às feras e às
aves. Então, os dois, tio e sobrinho colocaram-no em ataúde de ouro e
sepultaram-no dignamente em Mausoléu pertencente a Gamaliel5,localizado em Cafargamala6. Gamaliel e Nicodemus eram vistos em
Jerusalém como defensores “dos cristãos em todos os conselhos dos
judeus”. Mas, por outro lado, a aproximação, a admiração, o envolvimento
de Nicodemus com Jesus de Nazareth e as atitudes em defesa dos
cristãos resultaram em severas punições e agressões físicas que o
levaram à morte (Varazze: 2003, p. 110).
5
Gamaliel era professor, homem sábio e um dos fariseus mais respeitados e reverenciados pela sua
sabedoria e pela sua elevada condição socioeconômica. Praticamente não sofreu perseguições.
6
Cafargamala era um departamento, um vilarejo ao norte de Jerusalém onde Gamaliel tinha
propriedades e detinha grande prestígio.
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O fato de Nicodemus ter se encontrado com Jesus de Nazareth; de ter se
mostrado solícito e sensível à causa dos cristãos, a exemplo do que fez
com o corpo de Santo Estevão e, de ter recebido o batismo, os príncipes
dos sacerdotes resolveram matá-lo. Não o fizeram de imediato por
consideração a Gamaliel. Contudo eles, os príncipes dos sacerdotes,
confiscaram os seu bens, depuseram-no do cargo que assumia no Sinédrio
e, além disto deram-lhe tantas chicotadas que ele ficou praticamente
morto. Gamaliel o levou para a sua casa, cuidou dele por alguns dias mas
logo veio a falecer. Ele foi sepultado pelo seu tio, junto a Santo Estevão
(Varazze: 2003, p. 609/610).
Morreu Nicodemus sacrificado, vítima de chibatadas e de espancamentos.
Sacrificado pelos fariseus, pelos príncipes dos sacerdotes, os mesmos que
crucificaram a Jesus de Nazareth, e que apedrejaram Santo Estevão e a
muitos outros, em um momento em que nas fronteiras do Império
Romano se intensificou a perseguição aos cristãos (Varazze: 2003, págs.
609 e 610).
Dessa forma, levando-se em conta a credibilidade dos registros da vida de
Santos em Legenda Áurea, pode-se considerá-lo um Mártir, pelos
martírios que resultaram na sua morte.
Passado algum tempo, em 415 d.C., aproximadamente quatro séculos
após a morte de Nicodemus, o Padre Luciano, presbítero de Jerusalém,
teve uma visão. Quando adormecido em uma sexta-feira à tarde,
Gamaliel lhe apareceu e lhe instruiu sobre o local onde estavam
sepultados Santo Estevão, Nicodemus, o próprio Gamaliel e o seu filho
Abibas, Abibão ou Abibone. O local e os corpos conforme a orientação
ao Pároco Luciano, foram identificados. Todos que ali foram localizados galgaram o status de Santo. O dia 03 de agosto, inicialmente, passou a ser o dia consagrado a eles, devido ao fato de terem sido sepultados junto a Santo Estévão e ser o dia 03 de agosto, o dia em que Santo
Estevão foi lapidado pelos judeus. Significa portanto que o dia 03 de
agosto é o dia de São Nicodemus.
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“A Gerusalemme il natale di santo Stefano Protomartire,
il quale fu lapidato dai Giudei non molto dopo l'Ascenzione
del Signore. 3 Agosto - A Gerusalemme l'Invenzione del
beatissimo Stefano Protomartire, e dei santi Gamaliele,
Nicodemo ed Abibone, come fu rivelato da Dio al Prete
Luciano, al tempo del Principe Onorio.” www.google.com.br
- Santo Stefano, Martire. P. 1 (tradução a seguir).
Em Jerusalém o nascimento de Santo Estevão Proto-Mártir, o qual foi
lapidado pelos judeus não muito depois da Ascensão do Senhor - 03 de
agosto. Em Jerusalém a Invenção do Beatíssimo Estevão Proto-Mártir,
e dos santos Gamaliel, Nicodemo e Abibone, como foi revelado por Deus
ao Padre Luciano, no tempo do príncipe Onório.
A Igreja Católica autorizou a transladar os restos mortais de Santo
Estevão, que permaneceu por um tempo em Jerusalém, seguiu
posteriormente para Constantinopla até chegar a Roma. Sobre o destino
dos corpos de São Nicodemus, Gamaliel e Abibas, as fontes consultadas
apresentaram-se omissas.
Conforme declaração do Pe. Sadoc (Salvador) documentada e arquivada
no Centro de Documentação e Informação da CODEBA, São Nicodemus
não é Santo oficial, por não ter sido canonizado pela Igreja. Contudo, Ele
permanece como tal na devoção e no imaginário dos cristãos que o
cultuam, e que já o entronizaram, venerando-o como Padroeiro dos
Trabalhadores do Porto de Salvador.
Sobre a trajetória espiritual de São Nicodemus pode-se registrar três
momentos (Revista dos Anais, Ano LXVIII):
O momento da omissão - Trata-se de uma etapa demorada,
humilhante e até sofrida. Nicodemus não vê Jesus como o
“sinal de Deus”, mas vê sinais de Deus em Jesus. Esta etapa
da omissão está retratada no Evangelho João 3: 1-21.
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O momento da indecisão - Nicodemus começa a se posicionar
quanto à sua admiração por Jesus de Nazareth, mesmo que
timidamente. Não enfrenta o Sinédrio quando questionado.
Prefere o silêncio, prefere calar-se, prefere ir para casa como
está dito na Bíblia, em João 7:37-52.
O momento da opção - O cuidado e o zelo com o cadáver de
Jesus. É o momento em que ele prova o amor por Jesus mas,
sobretudo, pratica um ato de coragem. Ali Nicodemus participou do “ofício das trevas”, no alto do Calvário. Assume
publicamente a sua postura ajudando no sepultamento de
Jesus. Um gesto de amor total. Evangelho: João 19: 38-41.
São Nicodemus viu a luz quando tudo parecia chegar ao fim. Ele, João e
José de Arimatéia foram os três homens presentes que, assistidos por três
mulheres - Maria Madalena, Maria Mãe de Jesus e Maria mulher de
Cléofas, vão retirar o corpo de Jesus da cruz. Vão desfazer o que os
poderosos fizeram. VÃO DESCRUCIFICAR JESUS.
“VITÓRIA DO POVO”, “AQUELE QUE VENCE AS PESSOAS” são
expressões que exprimem o significado do nome NICODEMUS, como
colocadas no início desta parte. A vida do Santo que esta sucinta
narrativa permitiu acompanhar, foi de crescimento espiritual e renúncias
o que permitiu prevalecer a vitória do povo, se nos reportarmos aos
sacrifícios aos quais se expôs em defesa da justiça, do amor e da humildade.
Indicação completa em Referências Bibliográficas.
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2. SÃO NICODEMUS PADROEIRO
DOS TRABALHADORES DO
PORTO DE SALVADOR
O
Porto de Salvador, elemento importante e facilitador das
comunicações entre o Brasil e o exterior - seja em momentos
distintos como o de Colônia, de Império e de República, manteve
sempre o status de um porto de destaque no conjunto do complexo
portuário brasileiro. Dentre as muitas passagens, acontecimentos e
atribuições que Ele testemunhou e viveu, pode-se rememorar que,
n
Contribuiu definitivamente na escolha do local onde se
ergueu a Cidade do Salvador;
n Abrigou o 1º Governador Geral - Tomé de Souza em sua nau
Nossa Senhora da Conceição;
n Participou do nascimento da Cidade do Salvador;
n Abrigou / socorreu as naus da Carreira da Índia;
n Assistiu a invasões e a expulsão de estrangeiros concorrentes;
n Importou milhares de negros africanos escravizados: a
base da colonização;
n Recebeu autoridades e colonos portugueses e outros povos
europeus;
n Atuou como palco no Ato da Abertura dos Portos às
Nações Amigas;
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
n
Exportou as riquezas da terra;
n Funcionou sempre como porta de entrada e saída de
mercadorias, de homens e de idéias;
n Recebeu as imagens, santos e grande parte do material para
construção de igrejas, conventos, mosteiros e similares.
A despeito de toda esta importância e evidência, o Porto de Salvador
encravado na Baía de Todos os Santos, não tinha um Santo Padroeiro.
Permaneceu toda aquela gente que trabalhava no porto, (fossem escravos
ou assalariados, prestadores de serviços), carente de um santo protetor,
por aproximadamente 400 (quatrocentos) anos, embora tenha sido
freqüentado e explorado, em sua maioria, por pessoas católicas que
cultivavam o hábito e a cultura de destinarem um Santo Padroeiro, um
santo protetor, para cada um dos espaços.
A situação de ausência de um Santo Padroeiro para os trabalhadores do
Porto de Salvador se prolongou, até que, em meados do século XX,
sensibilizados e movidos pela fé, foram em busca de uma representação
que desse sentido ao seu cotidiano.
O SANTO ESCOLHIDO
SÃO NICODEMUS
POR QUE SÃO NICODEMUS?
COMO SE PROCEDEU A ESCOLHA?
QUEM O ESCOLHEU?
QUAL O LOCAL DA ESCOLHA?
QUAL O PERÍODO?
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
Figuras 5
Imagem atual de
São Nicodemus.
Fonte: Acervo da CODEBA
Existem várias versões no imaginário dos trabalhadores do porto, que se
destinam a explicar a escolha de São Nicodemus como o símbolo
sagrado a protegê-los. Parte das versões foi recuperada e encontra-se
registrada neste trabalho. A ordem adotada no registro, como se
apresenta a seguir, não significa que essa ou aquela versão seja mais ou
menos importante. O entendimento é de que elas se completam, se
complementam. As crendices, as brincadeiras em torno da escolha do
padroeiro, as várias formas de comunicação com o Santo constituem-se
recursos facilitadores da compreensão daquele universo em que os
portuários eram os atores principais. Embora fragmentárias, elas
permitem a visão de uma realidade, onde São Nicodemus se apresenta
como o instrumento de representação da expressão da fé, da religiosidade
de uma comunidade.
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Aquelas pessoas, aqueles homens, certamente procuravam responder ao
sentido de situações (Minayo:1995, p. 96) que se lhes apresentavam no
cotidiano e, em especial, a uma conjuntura de instabilidade e de
insegurança, em nível mundial, que se instalou ao longo do período entre
guerras e que se aprofundou com a eclosão da II Guerra Mundial em
1939, que durou até 1945. Os acontecimentos no interior da própria
guerra e seus efeitos chegam aos portos do Brasil e naturalmente ao
Porto de Salvador. Esses efeitos se materializam através da queda nas
importações e nas exportações que, diretamente refletiam na
movimentação de navios de cabotagem e de longa distância.
Conseqüentemente a esta realidade, espalhava-se por toda aquela gente
uma mensagem de apreensão, de incerteza, quanto à garantia da
manutenção do volume de trabalho que lhes havia sido assegurado até
então. Em linhas gerais era essa a conjuntura que permeava a fase de
1940 a 1945, quando São Nicodemus tornou-se por “decreto” dos
estivadores, o seu padroeiro. É este o momento da “invenção”, da
“construção” de São Nicodemus como padroeiro dos trabalhadores do
Porto de Salvador.
Por que São Nicodemus?
Certo dia, por volta do ano de 1940, uma mulher chamada Cotinha que
trabalhava no Cais do Carvão, como balaieira7, estava a colocar o carvão
no seu balaio quando de repente encontrou a imagem de São Nicodemus
em meio ao carvão armazenado. Assim o Santo foi aclamado Padroeiro
nas imediações da prainha onde os estivadores costumavam permanecer
na hora do almoço e à tardinha para tomar banho. Segundo o Sr.
Jacintho da Silva e o Sr. Antônio Alves que a conheceram e que foram
entrevistados como referidos na introdução deste trabalho, Cotinha era
muito dada e respeitada por todos. Àquela época ela era uma das
mulheres a trabalhar no cais do porto.
7
Carregava carvão em balaio para dar suporte aos estivadores na alimentação das caldeiras dos navios
fossem eles de cabotagem ou de longo curso.
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Uma outra versão narra que um trabalhador do porto encontrou uma
imagem em meio ao carvão vegetal armazenado no Cais do Carvão (à
época, um cais com área de aproximadamente setecentos metros
quadrados, destinado especificamente, a cargas pesadas). Logo que a
imagem foi encontrada os companheiros ali presentes trataram de
identificar o santo correspondente àquela representação. Identificaram-na
como sendo de São Nicodemus. Então, a partir daquele momento do ano
de 1941, São Nicodemus foi eleito o padroeiro dos trabalhadores do
Porto de Salvador.
Mas existe um depoimento do professor e historiador Antônio Monteiro
sobre o processo de escolha de São Nicodemus como padroeiro dos
trabalhadores do Porto de Salvador. Pelos idos de 1942/1943 homens do
povo, gente simples brincava no Cais do Carvão com um bolo de barro
amassando-o e dando aspecto de figura exótica e disforme. Esta figura
era às vezes colocada em uma tábua, como também era elevada ao alto
como se estivessem fazendo apresentação a uma assistência, a uma
platéia imaginária.
Em um determinado momento, um dos estivadores, exaltado e emocionado, após um gole de pinga nas barracas da prainha começou a exclamar
vários nomes para a figura: “Onofrófrio”, “Prafúcio”, “Procópio”,
“Pancrácio”, “Elesbão”. Até então nenhum destes nomes foi aceito.
Porém, um dos estivadores, mais experiente, Cirilo Manoel dos Reis, nome
de batismo, calmo e respeitado, de súbito proclama - NICODEMUS!!!.
Com aplausos e satisfação o nome do Santo foi aceito por todos. Mas,
alguns dias após esta brincadeira com a figura de barro no Cais do
Carvão, um outro fato veio a acontecer. Certa noite Cirilo Manoel dos
Reis acordou assustado devido a um sonho bem expressivo. Disse ele que
um homem branco, bonito, calvo de barba alongada e portando um bastão,
chegou a bater com o mesmo no piso e franzindo o rosto dizendo: não
brinque com o meu nome, que é nome sério. E desapareceu de forma rápida.
No dia seguinte, lá na Rua Campo Sales, antiga Julião, localizada atrás
do Mercado do Ouro onde se trocava de roupa para enfrentar o dia-a-dia
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na estiva e nas Docas, Cirilo Manoel dos Reis contou o sonho aos
companheiros ali presentes. Um deles sugeriu que se procurasse no
Taboão um velho Santeiro de nome Vicente. Assim foi feito. O Santeiro
confeccionou a imagem como vista no sonho, a partir do retrato falado.
Quando de posse da imagem os estivadores levaram-na até a Igreja de
Nossa Senhora do Pilar, onde foi benta e em seguida celebrada uma
missa em seu louvor. Após os rituais sagrados a imagem foi conduzida em
procissão ao Cais do Carvão. Ali dominou o samba-de-roda, e o mais
curioso: a exposição da figura exótica moldada no barro.
Diz o Sr. Antonio Alves dos Santos, que se comentava no porto que São
Nicodemus foi encontrado na prainha, nas imediações do Cais do Carvão,
onde hoje é o Moinho Salvador. Ali era o ponto de reunião dos portuários.
À tardinha se dirigiam para lá onde tomavam banho e às vezes um trago
de cachaça nas barracas ali estabelecidas.
Em uma das vezes um dos estivadores encontrou a imagem nas águas
mansas da prainha e deu nome de São Nicodemus. Esta é mais uma
versão que o Sr. Antonio também ouviu contar.
Nos idos de 1940 um trabalhador de capatazia estava fazendo um
serviço no Cais do Carvão, quando, de repente, o Santo lhe apareceu. Ele
ficou muito emocionado e por isso não falou nada para o Santo. O Santo
também nada lhe disse. Passado o momento da emoção esse trabalhador
contou o ocorrido aos seus companheiros que decidiram, após a descrição
da visão (retrato falado) atribuir-lhe o nome correspondente aos detalhes
descritos, de São Nicodemus. Assim Ele foi destinado, logo a seguir,
Padroeiro dos trabalhadores do Porto de Salvador.
Contam também que a imagem do santo apareceu dentro de uma porção
de carvão vegetal. Um grupo de estivadores fazia o descarregamento do
carvão vegetal quando encontrou a imagem. Fez uma pesquisa para
identificar que santo era, descobrindo mais tarde que se tratava de São
Nicodemus e, por isso, resolveu fazer dele o padroeiro da categoria.
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Figura 6
Planta Parcial do Porto de Salvador,
onde se destaca o Cais do Carvão e
o local da Capela de São Nicodemus.
Fonte: Acervo da CODEBA
Qual das versões é a mais importante?
Na verdade todas se destacam pela importância porque todas elas se
completam. São representações da expressão da fé, da religiosidade de
uma comunidade. Foram elas que deram sentido e contribuíram para
oficializar São Nicodemus como Padroeiro dos Trabalhadores do Porto
de Salvador.
São Nicodemus como padroeiro dos trabalhadores do Porto de Salvador
é um exemplo de cristalização de uma “tradição inventada”, impregnada
de valores, de rituais, de modos de comportamento que se repetem a cada
ano e que dão continuidade de um passado a preservar8. Há 62 anos os
trabalhadores do porto comemoram o seu Santo Padroeiro congregando
fiéis devotos e curiosos que se fazem presentes às homenagens. A parte
8
Tese defendida por Eric Hobsbawm, em Invenção da Tradição. São Paulo: Paz e Terra, 1984.
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dos festejos é conteúdo do capítulo que se segue, que dentre outros, trata
dos acréscimos, das supressões e da manutenção de rituais que mantêm
a Festa. Mas tratando de retomar aquelas colocações iniciais vamos
perceber que elementos de grande significado são comuns às versões,
apontando para o sentido de complementariedade ao qual nos referimos
anteriormente.
O escolhido: São Nicodemus. Em momento algum se
apresentou um outro Santo concorrente. Nicodemus foi
aclamado por unanimidade.
O local do encontro: O Cais do Carvão. Na totalidade das
versões registradas Nicodemus ou foi encontrado, ou achado,
ou sonhado, ou visto ou aparecido no Cais do Carvão.
O período do encontro: 1940 a 1943. Momento de crise
provocada pela Segunda Guerra Mundial.
Os mensageiros: os trabalhadores do Porto de Salvador.
Por iniciativa do próprio Sr. Cirilo Manoel dos Reis que recebeu o
cognome de CIRILO DE NICODEMUS, os festejos ao Santo Padroeiro
tiveram início no ano de 1943, no último domingo do mês de novembro.
Nessas comemorações, como especificadas no capítulo seguinte, registra-se
a presença do Cachimbo como um objeto que simboliza e representa o
SANTO. No espaço do Porto de Salvador, São Nicodemus é também
conhecido como O SANTO DO CACHIMBO, uma tradição até hoje
respeitada e cultivada.
O historiador Antônio Monteiro, amigo dos estivadores e participante assíduo
dos festejos a São Nicodemus, em declarações por ocasião de um daqueles
momentos, disse que a opção pelo Santo referido resultou de uma
brincadeira dos trabalhadores no Cais do Carvão, como relatada anteriormente na versão de Cirilo Manoel dos Reis (A Tarde: 1985, cad.2 p. 3).
O importante porém é reconhecer que aqueles trabalhadores, aquela comu34
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nidade estava em busca de proteção e esta busca certamente relacionavase ao momento de crise e de instabilidade que se expandia, na medida em que
se expandiam os conflitos que alimentavam a Segunda Guerra Mundial.
Encontros e reencontros no Cais
São Nicodemus, Bom Jesus dos Navegantes,
Nossa Senhora da Conceição da Praia
Há aproximadamente dois mil anos São Nicodemus esteve com Jesus de
Nazareth a sós, ou na companhia de José de Arimatéia. Também esteve
com Maria, a Mãe de Jesus no momento em que Jesus era descrucificado,
para depois envolver o seu corpo em ervas aromáticas, em lençóis, e
sepultá-lo. Por causa destes gestos São Nicodemus foi posteriormente
perseguido pelos fariseus e sacrificado até a morte.
Hoje os encontros e os reencontros acontecem. Não mais na calada da
noite, mas ao entardecer. Não às escondidas, mas em local movimentado,
público, muito freqüentado por gente do povo, por trabalhadores e por
visitantes do mundo inteiro. No cais do Porto de Salvador.
Tudo teve início a partir da idéia, do espírito inventivo e da iniciativa de
Ana Rita Moreira Brandão, Administradora da CODEBA que presidiu a
Comissão dos Festejos nos anos de 1996 e 1998. Em sua primeira
gestão/1996 ela idealizou este encontro e contando com o apoio de
outros(as) devotos(as) assíduos(as) e cativos(as) do santo, relacionadas
a seguir, colocou em prática este rito que vem se repetindo ano a ano,
sempre no dia 31 de dezembro.
DEVOTOS E DEVOTAS
Antônia Ferraz de Araújo (in memoriam);
Wellinghton Sampaio Neves;
Ubirajara da Paixão Pimentel Seixas;
Paulo Jorge Rios de Oliveira, e
Antônio Raimundo Nascimento.
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
O encontro acontece de forma expressiva e emocionante. No dia 31 de
dezembro, por volta das 17 horas quando o sol vai se pondo, São
Nicodemus se estabelece no cais do Porto de Salvador para receber Bom
Jesus dos Navegantes e Nossa Senhora da Conceição da Praia. São
Nicodemus é agora o anfitrião Daquele que o acolheu, que o aconselhou
e o conduziu no caminho da salvação: Jesus de Nazareth representado
por Bom Jesus dos Navegantes. O seu caminho é o mar, vem navegando
trazido pelos devotos da Irmandade da Boa Viagem na “Galeota
Gratidão do Povo”, e Nossa Senhora vem por terra trazida pelos fiéis.
Vem de lá da sua casa, da Igreja de Nossa Senhora da Conceição da
Praia.
Ali, bem ali, no Porto de Salvador, o porto que viu o Brasil nascer acolhe
São Nicodemus, Bom Jesus dos Navegantes e Nossa Senhora da
Conceição da Praia, a Mãe de Jesus. Os três juntos mantêm um colóquio,
uma conversa em língua estrangeira, quem sabe, talvez em aramaico.
Era uma das línguas faladas na região onde se conheceram. Mas certamente
a conversa é sobre como fazer estabelecer e prevalecer no mundo
sentimentos tais como a paz, o amor, o respeito e a observância aos
Direitos Humanos, no dia-a-dia dos homens.
Em seguida é celebrada a Santa Missa. Terminada a celebração os três
se despedem ao som do Hino do Senhor do Bonfim. A Mãe leva o seu
Filho Senhor dos Navegantes para a sua casa. São Nicodemus retorna ao
seu aconchego que fica no Cais do Carvão - A Capela do Santo
Padroeiro.
No dia 01 de janeiro, ou seja, no dia seguinte, São Nicodemus logo pela
manhã dirige-se novamente ao cais. Agora ele assiste a passagem de
Nosso Senhor dos Navegantes, seu amigo, seu conselheiro, que partindo
do lar materno segue por mar para o Farol da Barra e deste para o cais
do Porto de Salvador onde é recebido com uma corbelha e salva de fogos
de artifício, retornando à sua casa - a Igreja da Boa Viagem.
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Figura 7
Encontro de São Nicodemus com
Bom Jesus dos Navegantes e N.Sa. da
Conceição da Praia no Porto de
Salvador, em 31 de dezembro de 1999.
Fonte: Acervo da CODEBA
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3. A Festa
F
esta do Cachimbo. Como é conhecida, identificada a Festa de São
Nicodemus. Denominou-se do Cachimbo porque o seu organizador
também cognominado de Cirilo de Nicodemus costumava transitar
pelo cais com um grande cachimbo ofertado por uma firma inglesa, a
quem ele prestava serviços. O cachimbo tornou-se, por isso, um marco, um
objeto identificador do Cirilo. Posteriormente identificador da Festa
porque, desde os primórdios dos festejos a Nicodemus, Cirilo, o
organizador-mor daquelas comemorações, estipulou que cada participante
recebesse de brinde, um cachimbo. Assim foi feito, e continua até hoje.
Sem dúvidas o cachimbo, de tão popularizado na Festa, também passou
a ser associado ao próprio Santo, a Nicodemus a quem os devotos
referiam-se como O Santo do Cachimbo. Tudo do Cachimbo. Ficou assim:
Festa do Cachimbo, Santo do Cachimbo, Clube do Cachimbo e SegundaFeira do Cachimbo. E o Cirilo que era o proprietário do cachimbo?
Cirilo, então, tornou-se Cirilo de Nicodemus.
Os festejos tiveram início em 1943, conforme as declarações e afirmativas
do historiador Antonio Monteiro “testemunha ocular dos fatos” e autor
de vários registros a respeito da escolha do Padroeiro e das primeiras
festividades. (A Tarde: 1994 Cad. Geral, fl. 3). Naquele ano foi entregue
aos trabalhadores do porto a imagem do Santo talhada pelo Santeiro
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Vicente, estabelecido no Taboão. De posse da imagem os trabalhadores da
estiva, principalmente, conduziram-na da sede do sindicato da categoria,
localizado à Rua Pethion de Vilar no 15, antigo Julião, à Igreja de Nossa
Senhora do Pilar, na freguesia do Pilar. Ali naquele Templo, em espírito
de festa a imagem foi benta e em seguida, celebrada a missa em seu
louvor. Contudo, a primeira missa em homenagem ao Padroeiro do Porto,
independente da conclusão da imagem, foi celebrada na Igreja de Nossa
Senhora da Conceição da Praia, no ano de 1943.
Figura 8
Igreja de Nossa Senhora do Pilar,
onde a imagem de madeira de São
Nicodemus, talhada pelo santeiro
Vicente, foi benta em 1943.
Fonte: Acervo da CODEBA
Terminada a missa, São Nicodemus foi novamente conduzido, em procissão,
para o local onde Ele foi achado, visto, encontrado, sonhado, imaginado o Cais do Carvão. Ali entre aplausos e muita emoção os trabalhadores do
porto o receberam. O local para receber Nicodemus estava todo decorado.
Muitas bandeirolas, e o chão coberto de uma areia bem alva para recepcionar
o recém-escolhido Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador.
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
Desde a primeira procissão que se fez com São Nicodemus estabeleceu-se
a prática das mulheres inicialmente conduzirem o andor com a imagem
do santo, para posteriormente entregá-lo a cargo dos homens. Esta prática pode ser visualizada nas imagens que se seguem. A tradição se mantém até os dias atuais. A razão explicativa para o fato ainda está por
esclarecer.
Prevaleceu porém na Festa de apresentação do Padroeiro, a simplicidade
daquela gente humilde, que engrandeceu e deu sentido ao momento, com
os seus gestos espontâneos e a criatividade que fazia emanar o
descontraído e saudável clima de Festa. Durante todo o dia o samba-deroda alegrava mais e mais o ambiente e, ao lado uma tábua rústica onde
ficou exposto o "bolo de barro" que simbolizou a Nicodemus no processo
de escolha do Santo Protetor como relatado no capítulo anterior. (A
Tarde: 1985, Cad. 2, fl.3).
Figura 9
As mulheres inicialmente carregam o andor, tradição
mantida até os dias atuais. Vale a pena observar que os
participantes portam seus melhores trajes. A imagem
conduzida naquele ano, até o momento não foi localizada.
Fonte: Jornal A TARDE. Acervo do historiador
Antonio Monteiro (in memoriam)
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Para que os devotos pudessem se concentrar nos rituais religiosos que
aconteciam no último domingo de novembro, sem a interferência dos
rituais profanos, instituíram, conforme decidido no Clube do Cachimbo, a
chamada “Segunda-Feira do Cachimbo”.
Na Segunda-Feira do Cachimbo, conforme José Carlos Contreiras (70)
um dos participantes a 40 anos, disse que no início “só tinha o caruru,
cachaça, samba-de-roda e capoeira”. (Correio da Bahia: 1995, Cad.1,
fl.12). “A festa era mais pobre” pois quem bancava eram os
trabalhadores da estiva e similar declarou o Sr. José Martins dos Santos
(75) que a quinze anos não participava dos festejos. (Tribuna 1987: Cad.
Cidade. fl. 3). A iniciativa de escolher, eleger um padroeiro e de manter
os festejos era exclusivamente daqueles trabalhadores.
A “festa era mais pobre”,”só tinha o caruru, cachaça, samba-de-roda e
capoeira”. As duas declarações referem-se ao período correspondente
aos primeiros anos da década de 1970. Eles estabeleceram uma
comparação entre a Festa dos anos 80 com os festejos da década
anterior. Existem entretanto algumas razões que, se explicitadas, poderão
facilitar o entendimento daquelas declarações.
Em 1970 o Governo Federal controlado pelos militares desde 1964,
declarou a intervenção no Porto de Salvador. O porto esteve sob a
administração de uma empresa privada, a Companhia Docas da Bahia,
com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro, até o início da década de
1960. Esta intervenção estava fundamentada e amparada pelo Ato
Institucional no 5 que enrijeceu a Ditadura e passou a intervir, em nível
nacional, também nos sindicatos. O Sindicato da Estiva do Porto de
Salvador foi atingido pelas medidas de exceção. A conjuntura local e a
conjuntura nacional criaram um ambiente de turbulência.
Neste ambiente de violência e de incertezas, os trabalhadores do Porto
mantiveram os elementos que deram continuidade aos festejos de São
Nicodemus. Festejá-lo com simplicidade e muita fé, mesmo que os festejos
fossem considerados pobres mas, foi mantida a tradição por força da
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
crença e da repetição. Os festejos e a devoção ao Santo Padroeiro por
conta da perseverança daqueles trabalhadores foram se expandindo e
adquirindo adeptos e freqüentadores que aumentavam ano a ano.
Com a constituição da Companhia das Docas do Estado da Bahia CODEBA (1977), e concluída a sua fase de implantação por volta de
1980, a Festa veio a contar efetivamente com a presença dos
funcionários da própria companhia que também são trabalhadores do
porto. A presença deles não se resumiu apenas à presença física. Tanto a
empresa quanto os empregados passaram a contribuir financeiramente
para o custeio das despesas dos festejos, além da contribuição de
empresas que direta ou indiretamente estão envolvidas nas atividades
portuárias. A Festa, a partir de então, ganha uma nova dimensão no
contexto das manifestações culturais da cidade do Salvador, chegando
mesmo a integrar o calendário de festas populares da Bahiatursa.
Os interesses da CODEBA coincidiam com a política nacional de preservação
do patrimônio. Fosse a preservação de conjuntos arquitetônicos, de objetos
e/ou peças raras, como também a preservação das manifestações culturais,
a exemplo das festas, do folclore, da gastronomia, da religiosidade e
outros. Então, a CODEBA se incorporou aos festejos, manteve a sua
participação e normatizou a Festa através de portarias. Criou uma
comissão específica - Comissão dos Festejos de São Nicodemus, incluindo
convidados e homenageados e propiciando o acréscimo de muitos
elementos nas comemorações. Mas, tudo tem uma história.
A comissão criada pela CODEBA também tem a sua história, cujas raízes
estão plantadas no Clube do Cachimbo, constituído desde o tempo de
Cirilo de Nicodemus. Um clube que reunia os trabalhadores do porto
semanalmente, para discutir inclusive a organização dos festejos.
Posteriormente este clube foi transformado e/ou substituído pela
Sociedade das Comemorações de São Nicodemus. A sociedade era
dirigida por um presidente, o Sr. Glicério, que desempenhava a profissão
de ferreiro, conhecido dos estivadores, pois foi um deles. Chegou a
estipular uma outra data para os festejos - 27 de setembro. Prevaleceu
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
entretanto a última semana do mês de novembro (Informativo CODEBA
1982, p.3). A esta sociedade se seguiu a Comissão dos Festejos de São
Nicodemus, instituída pela CODEBA, e que existe desde 1985 como pode
ser visualizada no quadro que se segue.
QUADRO DEMONSTRATIVO
PRESIDENTES DAS COMISSÕES
FESTEJOS DE SÃO NICODEMUS - 1985 a 2005
Ano Nome
Cargo/Função
1985 Edelmito Cézar da Silva
Técnico de Segurança do Trabalho
1986 Flávio Martins Pimentel
Engenheiro
1987 José Américo Argolo Farani
Assistente Técnico Administrativo
1988 Mauro Coqueijo Fidalgo
Administrador
1989 Antônio Raimundo Nascimento
Assistente Técnico de Contabilidade
1990 Ivaldo Soriano de Oliveira
Técnico de Sistemas Portuários
1991 Paulo Jorge Rios de Oliveira
Técnico de Sistemas Portuários
1992 Wellington Sampaio Neves
Supervisor de Manutenção
1993 Renato Neves da Rocha Filho
Engenheiro
1994 Ubirajara da Paixão Pimentel Simas Assistente Administrativo
1995 Ademário Mendonça Lima
Assistente Administrativo
1996 Ana Rita Moreira Brandão
Administradora
1997 Mário Antenor de Carvalho Muricy
Engenheiro
1998 Ana Rita Moreira Brandão
Administradora
1999 Alfredo Vita Neto
Técnico de Sistemas Portuários
2000 Luiz Augusto dos Santos Viana
Técnico de Sistemas Portuários
2001 Álvaro César Da Rin
Líder de Gestão
2002 Alfredo Vita Neto
Técnico de Sistemas Portuários
2003 Amarílio Conceição dos Santos
Técnico de Sistemas Portuários
2004 Marlene de Jesus
Analista de Sistemas
2005 Itamar Trindade Valadares
Analista de Sistemas
Fonte: Portarias do Diretor Presidente - Acervo do Centro de Documentação e Informação da CODEBA.
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
Na década de 1980 muitos elementos foram incorporados aos festejos,
sem contudo descaracterizar o sentido primeiro daquelas homenagens. A
Festa que se compunha de procissão, missa, caruru, bebidas, samba-deroda e capoeira, continuará a vivenciá-los, à exceção da capoeira. O
samba-de-roda só acontece quando se realiza a lavagem da capela.
A missa passou a ser celebrada na capela construída para São
Nicodemus no Cais do Carvão (1981/82). Antes a celebração se dava na
Igreja de Nossa Senhora do Pilar e o santo ficava guardado na sede da
estiva à Rua Pethion de Vilar nº 15, no antigo Julião, atrás do Mercado
do Ouro.
A procissão continua. Há quase três décadas o cortejo acontece no
espaço do cais do Porto de Salvador, preservando um componente que se
fez presente no ritual, desde a primeira Festa que se realizou no ano de
1943. As mulheres carregando São Nicodemus no início da procissão,
como visualizado anteriormente.
Outro elemento que acompanha a Festa desde os seus primórdios é o
caruru que continua sendo servido na Segunda-Feira do Cachimbo. Seja
ele de cinco mil quiabos, de sete mil quiabos, de vinte mil quiabos, não
importa. É o caruru instituído desde a eleição de Nicodemus para
Figura 10
Capela de São
Nicodemus
construída em
1982, na Gestão
do Diretor
Presidente, Eng.
Mário Antenor de
Carvalho Muricy.
Fonte: Acervo da
CODEBA
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador. Esses elementos que
se mantêm ao longo destes 62 anos, são elementos que asseguram a
identidade e continuidade da Festa. Eles têm o grande poder de congregar,
de unir, e de neutralizar as diferenças culturais, étnicas, políticas, sociais
e econômicas.
Quanto aos elementos que foram acrescidos ao longo desses vinte e cinco
anos, é possível relacionar os mais expressivos:
n
a peregrinação da imagem de São Nicodemus, por todos,
nas instalações da CODEBA e do OGMOSA9, uma semana
antes do início dos festejos;
n
a Lavagem da Capela, na sexta-feira anterior aos festejos,
teve início com a inauguração daquela ermida erigida em
homenagem ao Santo Padroeiro. Dela participavam o Afoxé
Filhos de Gandhi e as baianas.
Figura 11
Ala das baianas.
Lavagem da
Capela de São
Nicodemus.
Fonte: Acervo da
CODEBA
9
Órgão Gestor de Mão-de-Obra do Trabalho Portuário dos Portos de Salvador e Aratu, congrega
atualmente os estivadores, trabalhadores de bloco, capatazia, arrumadores, conferentes de navio,
consertadores, e vigias portuários.
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
n
a alvorada, que acontece a mais de duas décadas às 05h da
manhã no dia da Festa, com salva de fogos pirotécnicos
anunciando a entrada dos festejos;
n
a corrida rústica instituída desde 1985, aproximadamente,
se faz presente até hoje. Esporte de caráter competitivo
incentiva e anima mais ainda aquele momento promovendo
a integração;
n
a arrumação do andor fica a cargo de uma pessoa cuidadosa,
e devotíssima de São Nicodemus, Vanda de Araújo Gaspar,
viúva de um empregado da CODEBA. A decoração do andor
com flores, fitas, água-de-cheiro é responsabilidade da
habilidosa Ana Cristina Borba Nobre empregada da CODEBA.
Vale ressaltar uma prática adotada pelos devotos do
Padroeiro. É que, no momento da colocação das flores,
também, são colocados moedas e bilhetes na esperança de
alcançar graças e bonanças.
n
os bilhetes e as flores, usados na procissão, após uma
semana são retirados e lançados ao mar, inicialmente por
Antônia Ferraz de Araújo (in memoriam), hoje por Ana
Rita Moreira Brandão, por considerar o homenageado o
santo que se identifica com as águas e que mora no cais do
porto;
n
a procissão no cais do porto que se dava, como já referido,
da sede do Sindicato da Estiva para a Igreja do Pilar e em
seguida para o cais. Agora ela sai do Porto de Salvador e se
dirige até a capela no Cais do Carvão, sempre acompanhada
pela Banda de Música dos Fuzileiros Navais ou do Corpo de
Bombeiros;
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Figura 12
Procissão de São Nicodemus em 1996, onde os devotos
estão trajados com as cores do Santo - vermelha e branca.
Fonte: Acervo da CODEBA
Figura 13
Mulheres conduzindo o andor
com São Nicodemus em
1995, no início da procissão,
preservando a tradição.
Fonte: Acervo da CODEBA
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
n
a saudação dos navios, sejam eles de proveniência nacional
ou estrangeira, se dá no momento do cortejo quando todos
eles ancorados fazem soar o “apito” complementando a
beleza e a expressividade daquele ritual;
n
a Missa Campal no cais do porto, na frente da capela. A
missa é um elemento como a procissão, como o caruru que se
mantêm há sessenta e dois anos. Alterou o espaço. Acontecia
na Igreja de Nossa Senhora do Pilar, mas, a partir de 1982,
passou a ser celebrada no cais do Porto de Salvador.
São Nicodemus - Obaluaiê
Dalvanízio Fonseca, Presidente do Afoxé Filhos de Gandhi diz que São
Nicodemus pode ser relacionado na religião do Candomblé, à entidade Obaluaiê.
Figura 14
Missa Campal,
celebrada pelo
Primaz do
Brasil, Arcebispo
D. Lucas Moreira
Neves em 1993.
Fonte: Acervo da
CODEBA
Figura 15
Ala das Baianas e
Filhos de Gandhi.
Fonte: Acervo da
CODEBA
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Além do hino e da oração de autoria de um dos trabalhadores portuários,
devoto do Santo Padroeiro, acrescento o Hino da Igreja Batista que se
reporta ao diálogo entre Nicodemus e Jesus de Nazareth, como se
apresentam a seguir.
Oração e Hinos a São Nicodemus
Hino a São Nicodemus
Afonso Lopes Sobreira - In memoriam
(trabalhador da CODEBA)
Nicodemus, Nicodemus
Tu és Santo amigo de Jesus
Nicodemus Santo forte
Nos ajuda após nossa morte
Neste dia de alegria
Te pedimos a fé com fervor
Para que Deus nosso Pai
Nos dê paz, alegria e amor
Nicodemus, Nicodemus
Ajudai esta gente de luta
Para que todos sintam alegria
Junto a ti, de Jesus e de Maria
50
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
Oração dos Trabalhadores do
Porto de Salvador a São Nicodemus.
Afonso Lopes Sobreira - In memoriam
(trabalhador da CODEBA)
A Ti. Ó Nicodemus Irmão de Cristo!
Nós os servidores do Porto de Salvador,
neste dia em que humildemente te rendemos
homenagem, dirigimos nossas orações ao
Pai a quem, em teu Santo Nome, pedimos
paz e prosperidade para o Brasil, união
entre os povos e a ajuda necessária para
que possamos cumprir com os nossos
deveres de cristãos e de cidadãos brasileiros!
Amém!
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
Hino a São Nicodemus
(Autor anônimo)
Fonte: Cantor Cristão
Hinário das Igrejas Batistas do Brasil
49ª Edição - Rio de Janeiro-1984
O NÔVO NASCIMENTO
Um rico, de noite, chegou a Jesus,
A fim de saber o caminho da luz;
O Mestre bem claro lhe fez entender;
Importa renascer!
Importa renascer!
Importa renascer!
Com voz infalível o disse Jesus:
Importa renascer!
Vós, filhos do mundo, escutai ao Senhor,
Que sempre vos chama com mui terno amor;
Ouvi que o Senhor nunca cessa em dizer:
Importa renascer!
Ó vós, que no santo descanso de Deus
Quereis ter entrada, e viver com os seus,
Deveis a palavra de Cristo atender:
Importa renascer!
Se amados no céu desejais encontrar,
Deveis vossas culpa a Deus confessar
E a ordem de Cristo com fé acolher:
Importa renascer!
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Conclusão
S
ão Nicodemus!!! Todas as páginas desta publicação estiveram
voltadas para a sua vida e sua permanência aqui no Cais do
Carvão, no Porto de Salvador, em companhia de todos os
trabalhadores que lhes dedicam fé e confiança.
Valeu a pena toda a peregrinação empreendida pela comissão dos
festejos, da qual faço parte com muita honra e alegria.
São Nicodemus, conseguimos. Conseguimos reunir dados, informações,
imagens e outros, em um mínimo espaço de tempo, mas que permitirá aos
seus devotos e admiradores refletirem sobre as condições e o momento
que o Senhor ancorou no Porto de Salvador, lá no Cais do Carvão; que o
Senhor se tornou o Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador e,
como os “inventores”, os “construtores” dos Festejos prestaram-lhe
homenagens.
A Festa, por exemplo, ao longo do trabalho, foi uma das partes que mais
exigiu em termos de informações e de sistematização, face ao quantitativo de elementos acrescidos aos festejos nos últimos vinte anos.
Organizar uma festa é algo compensador, mas implica, necessariamente,
no desprendimento e na disposição para acertar. Implica, além de tudo,
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COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA - CODEBA
na capacidade de sentir que algo emana de outra esfera da vida corrente
- a dos espíritos e das idéias. Não macular os espíritos e as idéias deve
ser a finalidade primeira.
A Festa continua, mas aqui está registrada, buscando fazer sentir os
espíritos e as idéias que a gestaram e que lhes dão continuidade.
Por isso mesmo, às futuras comissões uma sugestão: empenharem-se na
implementação de um memorial a São Nicodemus como Padroeiro dos
Trabalhadores do Porto de Salvador.
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Referências Bibliográficas
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dos Santos Gamaliel, Nicodemos e Abibão. In: Vida dos Santos. São
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Universidade de Brasília, 1993. 419 p.
BÍBLIA SAGRADA. 49ª ed . São Paulo, Ave-Maria , 2004.
ENGLEBERT, Omer. La Fluer des Saints : 1910 prénoms et leur histoire
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HOBSBAWM, Eric. A Invenção das Tradições. 2ª ed. São Paulo, Paz e
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INFORMATIVO OGMOSA no 19, dezembro de 1999.
INFORMATIVO OGMOSA no 29, dezembro de 2000.
INFORMATIVO OGMOSA no 34, setembro-outubro de 2001.
INFORMATIVO OGMOSA no 40, novembro-dezembro de 2002.
Festa de São Nicodemus, in: Jornal A Tarde. 23-11-1985. Cad. 2, fl. 3.
Salvador, 1985.
Festa de São Nicodemus acontece este ano sem participação popular, In:
Jornal Correio da Bahia, 25-11-1995
MANDINO, Og. A Ressurreição de Cristo. 4ª ed. Rio de Janeiro,
RECORD, 1980. 264 p.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. O conceito de Representações Sociais
dentro da sociologia clássica In: Textos em Representações Sociais. 8a ed.
Rio de Janeiro, Vozes, 1995. pgs. 89 a 111.
Portuários Festejam São Nicodemus, in: TRIBUNA DA BAHIA 01-121987. Cad. Cidade, fl. 3. Salvador. 1987.
REVISTA DOS ANAIS LXVIII nº 8.
www.terranatal.com.br. Acesso em 18/09/2005.
pág.8.
Disponível
REVISTA BAHIA HOJE. Cidades da Bahia, 28-11-1994. fl. 1, Salvador.
1994.
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SÃO NICODEMUS - PADROEIRO DOS TRABALHADORES DO PORTO DE SALVADOR
SADOCK, Monsenhor Gaspar. Quem foi São Nicodemus. Anotações
fornecidas pelo Centro de Documentação e Informação - CDI. 2003.
SÃO NICODEMUS, Padroeiro dos Trabalhadores do Porto de Salvador.
Folheto SÃO NICODEMUS. Centro de Documentação e Informação CDI. 1985.
SITE- www.google.com.br - Santo Stefano, Martire. P. 1, acessado em
09/10/05 às 22:00 h.
TEIXEIRA, Marli Geralda(org.). O Imaginário das Grutas. Ilhéus,
UESC/CEDOC, 2003. 114 p.
VARAZZE, Jacopo. Legenda Áurea: vidas de santos.
Companhia das Letras. 2003. 1040 p.
57
São Paulo,
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Anexo
Portaria DPR no. 055, de 04 de julho de 2005, expedida pelo Diretor
Presidente da CODEBA, Geraldo Simões de Oliveira.
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Rita de Cássia Santana
de Carvalho Rosado é
professora universitária
graduada em História e
Mestra em História Social
pela Universidade Federal da
Bahia - Ufba. Professora de
História Econômica e de
História do Brasil da
Universidade do Estado da
Bahia - Uneb, onde exerceu o
cargo de Diretora do então
Centro de Educação Técnica
da Bahia - CETEBA.
Atualmente exerce o cargo de
Coordenadora de Projetos do
Arquivo Público da Bahia APB. Dentre seus trabalhos
destacam-se:
n
O Porto de Salvador:
modernização em projeto
1854 a 1891;
n
Cronologia: Portos da
Bahia: Salvador, Ilhéus e
Aratu;
n
Cronologia: São João do
Piauí 80 Anos;
n
Memória Histórica do
Colégio Dois de Julho 70
Anos.
A fé que nos move
Uma das características de
Salvador é a fé de seu povo,
manifestada sob diversas formas
de crenças e religiões, que muitas
vezes se interligam e se completam.
É a fé que faz do baiano um
povo acolhedor, humano,
empreendedor. Que faz da Bahia
uma nação singular dentro dessa
imensa nação brasileira.
No momento em que resgata,
através deste importante trabalho,
a história de São Nicodemus,
Padroeiro dos Trabalhadores do
Porto de Salvador, a Companhia
das Docas do Estado da Bahia CODEBA mais uma vez reforça
seu compromisso de integração e
inserção na comunidade onde o
sistema portuário está localizado.
Esse resgate histórico se dá num
momento especial, em que a
CODEBA participa de um
ambicioso projeto de revitalização
do Comércio, transformando esta
área num efervescente pólo
comercial, de lazer e de
entretenimento.
Que São Nicodemus abençoe
não apenas os portuários, mas
também, os cidadãos baianos
comprometidos na
construção de
uma cidade
com qualidade
de vida para
todos.
Geraldo Simões
Diretor Presidente
da CODEBA
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A fé que nos move