A possibilidade de análise de ofício das matérias de ordem pública pelo Superior Tribunal de
Justiça no julgamento do recurso especial
Por Maria Angélica Jobim de Oliveira
Introdução
O presente artigo visa uma breve reflexão acerca da possibilidade do conhecimento
de ofício das matérias de ordem pública pelo Superior Tribunal de Justiça, quando do
julgamento do recurso especial. Atualmente, há bastante divergência no âmbito do próprio
Tribunal Superior acerca desta questão, havendo precedentes em diversos sentidos.
É sabido que as matérias de ordem pública não se submetem ao instituto da
preclusão, de maneira que podem ser alegadas a qualquer tempo pelas partes, bem como devem
ser analisadas ex officio e em qualquer grau de jurisdição pelo juiz. No entanto, a divergência surge
justamente quando nos deparamos com os pressupostos específicos dos recursos de feição
excepcional, dentre os quais se destaca a necessidade de prequestionamento das matérias
suscitadas.
Confrontam-se, nesse sentido, dois posicionamentos acerca da questão: A primeira
corrente entende que não é possível a análise das matérias de ordem pública que não foram
objeto de prequestionamento na decisão hostilizada, ainda que o recurso especial tenha sido
admitido por algum outro fundamento, e o Tribunal, ao analisá-lo, venha a se deparar com tal
questão; E a segunda corrente, se posiciona no sentido de que as questões de ordem pública,
ainda que desprovidas do prequestionamento, devem ser analisadas pelo Tribunal Superior,
tendo em vista que, superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito
devolutivo amplo, devendo o Tribunal julgar a causa, aplicando o direito à espécie, nos moldes
do que dispõem o artigo 257 do RISTJ 1, e a Súmula 456 do STF 2.
Destarte, buscou-se uma reflexão crítica acerca das duas correntes existentes,
contrapondo-se as diferentes visões doutrinárias e jurisprudenciais.
1
Artigo nº 257 do RISTJ: No julgamento do recurso especial, verificar-se-á, preliminarmente, se o recurso é
cabível. Decidida a preliminar pela negativa, a Turma não conhecerá do recurso; se pela afirmativa, julgará a
causa, aplicando o direito à espécie.
2
Súmula nº 456: O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa,
aplicando o direito à espécie.
1
O papel do Superior Tribunal de Justiça à luz da Constituição Federal de 1988
Inicialmente, para se compreender o papel do Superior Tribunal de Justiça, é
necessário que se faça uma análise de como era a divisão do Poder Judiciário antes da
Constituição Federal de 1988: O Supremo Tribunal Federal era o responsável por fazer todo o
controle referente à interpretação do direito constitucional, bem como do direito
infraconstitucional, através do chamado recurso extraordinário. O STF era, assim, o Órgão de
Cúpula do Poder Judiciário.
No entanto, conforme bem salientado pelo Ministro aposentado e Ex-Presidente do
Superior Tribunal de Justiça Antônio de Pádua Ribeiro, o Supremo Tribunal Federal quase
sempre manteve a sua constituição em onze ministros, de modo que, com o aumento da
população ao longo dos anos, bem como com a evolução da economia, o número de
demandas cresceu de maneira significativa, dando início à chamada “crise” do Supremo
Tribunal Federal 3.
Sustenta o Ex-Presidente do Superior Tribunal de Justiça que, diante do grande
número de processos, várias foram as tentativas para se solucionar o aludido problema, dentre
as quais se destacou a criação do Tribunal Federal de Recursos, advindo da Constituição
Federal de 1946, que absorveu parte da competência antes atribuída ao Supremo Tribunal.
Posteriormente, com o advento da Constituição Federal de 1988, foi criado o
Superior Tribunal de Justiça, bem como o antigo Tribunal Federal de Recursos fora dividido em
cinco Tribunais Regionais Federais, alterações essas que visavam dar fim à “crise” que, apesar
de todas as medidas realizadas, ainda atingia o Poder Judiciário.
A criação do Superior Tribunal de Justiça foi resultado de muitos estudos acadêmicos
e debates políticos no século XX. Em 1965, foi realizada uma mesa-redonda na Fundação
Getúlio Vargas, presidida pelo Ministro Themístocles Brandão Cavalcanti, na qual se discutiu a
possibilidade de criação de um Tribunal Superior, que seria encarregado do julgamento de
recursos extraordinários contendo matéria de índole infraconstitucional. O STJ, então, ostenta
a função precípua de “pacificar a jurisprudência, assegurando a integridade do direito
infraconstitucional”. 4
3
RIBEIRO, Antônio de Pádua. O Superior Tribunal de Justiça no contexto do Poder Judiciário.
Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/639/O_STJ_no
_Contexto_do_Poder.pdf?sequence=4>. Acesso em: 26 fev. 2013.
4
NORONHA, João Otávio de. Breves considerações sobre a atuação do superior tribunal de justiça.
Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/42621/Breves_
consideracoes_sobre.pdf?sequence=1>. Acesso em: 25 fev. 2013.
2
A competência do STJ está prevista no artigo 105 da Constituição Federal. No que
tange à competência recursal, a sua principal atividade é a do julgamento do recurso especial.
Tal recurso está previsto no inciso III do artigo supra, e cabe, em apertada síntese, quando o
acórdão contrariar (i) tratado, (ii) lei federal, (iii) julgar válido ato de governo local contestado
em face de lei federal, bem como quando (iv) houver divergência jurisprudencial entre
Tribunais de diferentes estados da federação.
Os Tribunais Superiores possuem competência recursal de cassação e de revisão da
decisão vergastada. No juízo de cassação o Tribunal Superior apenas analisa a validade da
decisão recorrida, enquanto que no juízo de revisão, o Tribunal Superior age como se tribunal
de apelação fosse, examinando todas as questões, e aplicando o direito à espécie (inteligência
da Súmula 456 do STF, bem como artigo 257 do RISTJ).
Neste contexto, o STJ é o Tribunal que detém a última palavra do direito
infraconstitucional. Constata-se, portanto, que ao Supremo Tribunal Federal restou a missão de
zelar pela correta aplicação e interpretação da Constituição Federal, de modo que o trabalho a
ele destinado fora reduzido. No entanto, vários são os autores que sustentam que a criação do
Superior Tribunal de Justiça não deu fim à “crise” do Supremo Tribunal Federal, tendo, inclusive,
nela mergulhado.
Não obstante a quantidade de demandas destinadas ao Superior Tribunal de Justiça,
bem como o fato de que tal Corte não foi criada com o objetivo de ser uma “terceira instância”
na sociedade jurídica, é inevitável que, através do juízo de revisão que o recurso especial pode
proporcionar, o Superior Tribunal de Justiça acabe sendo esse terceiro grau de jurisdição,
tendo em vista que, ao conhecer do recurso especial, o STJ passa a apreciação do mérito da
causa, podendo inclusive modificar o que restou decidido pelo Tribunal a quo. Neste contexto,
o STJ, ao se deparar com uma questão de ordem pública, não poderia deixar de corrigi-la, sob
pena de se mergulhar em um formalismo exacerbado.
Possibilidade da análise de ofício pelo STJ das matérias de ordem pública
Preliminarmente, antes de adentrar na análise dos diversos posicionamentos
existentes, convém rapidamente tecer algumas considerações acerca do conceito de
prequestionamento e de matéria de ordem pública.
Pois bem. O recurso especial é um recurso de feição excepcional, de maneira que,
além dos requisitos que estão presentes em todas as espécies recursais 5, possui seus
5
Há uma série de requisitos ou condições que devem ser observadas para que o remédio recursal seja
apto a atacar a decisão judicial. Esses requisitos de admissibilidade podem ser divididos em requisitos
3
pressupostos próprios, dentre os quais se destaca a necessidade do prequestionamento da
matéria suscitada.
O prequestionamento consiste, em apertada síntese, na necessidade de que o
Tribunal de Origem tenha previamente debatido a questão ventilada no recurso especial. Logo,
os Tribunais Superiores não analisam questões que não foram apreciadas na decisão
hostilizada.
Vale lembrar, ainda, que o prequestionamento pode ser explícito ou implícito. O
primeiro se verifica quando o artigo de lei federal apontado como violado nas razões do
recurso especial foi expressamente mencionado no aresto hostilizado; ao passo que o
prequestionamento implícito se verifica quando, embora o artigo apontado como afrontado
não esteja expressamente mencionado na decisão atacada, a matéria contida nele restou
debatida. No mais recente posicionamento do STJ, não é necessário que haja indicação
explícita da lei federal violada na decisão vergastada, sendo suficiente que o tema ventilado no
recurso especial tenha sido objeto de discussão na decisão impugnada, de maneira que é
aceito tanto o prequestionamento explícito quanto o implícito.
No que tange às matérias de ordem pública, vale destacar, por primeiro, que seu
conceito é muito impreciso na doutrina. Vale dizer, a doutrina não conceitua o que vem a ser
uma matéria de ordem pública, apenas afirma que pode ser conhecida de ofício pelo juiz, bem
como que essas matérias não estão sujeitas à preclusão, podendo ser alegadas e examinadas a
qualquer tempo e grau de jurisdição 6.
O Código de Processo Civil, em seus artigos 267, §3º e 301, §4º, prevê a possibilidade
de o juiz conhecer de ofício as questões referentes, sobretudo, as condições da ação e os
pressupostos processuais, configurando-se, portanto, como matérias de ordem pública. Essas
questões, quando verificadas no processo, ensejam vícios que impedem a análise do mérito.
Assim, pode-se concluir que as matérias de ordem pública se referem às matérias
relacionadas aos requisitos de admissibilidade da tutela jurisdicional que, quando
intrínsecos e extrínsecos. Os requisitos intrínsecos são: cabimento do recurso, legitimação da parte
recorrente, interesse em recorrer, e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer.
Os requisitos extrínsecos, por seu turno, são: tempestividade, regularidade formal, e preparo recursal.
6
OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Recursos de efeito devolutivo restrito e a possibilidade de
decisão acerca de questão de ordem pública sem que se trate da matéria impugnada. In: ALVIM,
Eduardo Pellegrini de Arruda; NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos
polêmicos e atuais dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 238.
4
desatendidas, irão viciar o processo, pois estaremos diante de uma nulidade absoluta ou de
uma inexistência jurídica 7.
No entanto, quando se está tratando de recurso especial a questão não está tão
pacificada assim. Vale dizer, de um lado temos a necessidade do prequestionamento da
questão ventilada, e do outro, uma questão grave no processo que deve ser sanada.
Conforme anteriormente mencionado, existem dois posicionamentos a respeito. A
primeira corrente ao argumentar acerca da impossibilidade de o Superior Tribunal de Justiça
analisar matéria de ordem pública desprovida do requisito do prequestionamento, utiliza o
fundamento de que o STJ possui função delimitada na Constituição Federal, e a expressão
“causas decididas”, prevista no artigo 105, inc. III não abre espaço para se alegar, pela primeira
vez, qualquer que seja a matéria. Além disso, sustentam que o Superior Tribunal de Justiça não
foi criado com o escopo de ser uma terceira instância no nosso ordenamento jurídico 8.
Teresa Arruda Alvim Wambier sustenta que o efeito devolutivo no recurso especial é
muito estreito, de modo que tal efeito não abre espaço para a aplicação da inocorrência da
preclusão das questões de ordem pública, cuja incidência se estende apenas aos recursos
ordinários 9.
Ainda, os adeptos desta corrente argumentam que o cabimento do recurso especial
está expressamente previsto na Constituição Federal, e que, portanto, as disposições contidas
nos artigos 267, §3º e 301, §4º do Código de Processo Civil não se aplicam, haja vista se tratar
de leis inferiores, ou seja, defendem a aplicação do Princípio da Hierarquia das Normas 10.
Em sentido diametralmente oposto, a segunda corrente acredita que, uma vez
ultrapassado o juízo de admissibilidade recursal, o recurso especial possui efeito devolutivo
amplo, e segundo o artigo 257 do RISTJ, bem como a Súmula 456 do STF, é necessário que se
aplique o direito à espécie.
Os adeptos a esta teoria sustentam que o requisito do prequestionamento para as
matérias de ordem pública refere-se apenas ao juízo de admissibilidade do recurso
excepcional, de maneira que, caso o recurso especial traga apenas a matéria de ordem pública
7
OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Recursos de efeito devolutivo restrito e a possibilidade de
decisão acerca de questão de ordem pública sem que se trate da matéria impugnada. In: ALVIM,
Eduardo Pellegrini de Arruda; NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos
polêmicos e atuais dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 241.
8
SARAIVA, José. Recurso especial e o STJ. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 262.
9
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. São Paulo: RT, 2007.
10
WAMBIER, op. cit.
5
não prequestionada em suas razões, apresenta-se inadmissível pela ausência de requisito
indispensável ao conhecimento do recurso. Todavia, se o recurso for admitido por algum outro
fundamento, deverá o Tribunal Superior se manifestar ex officio acerca da matéria de ordem
pública, tendo em vista que não se mostra plausível ignorar tal nulidade, e proferir julgamento
de mérito viciado.
Nesta linha de raciocínio, argumentam que o que os recursos de feição excepcional
têm de “excepcional” está em seu juízo de admissibilidade, tendo em vista suas estritas
hipóteses de cabimento previstas na Constituição Federal. No entanto, depois de superado o
juízo de admissibilidade, o efeito devolutivo desses recursos não possui nenhuma
particularidade 11.
Corroborando com tal tese, Patrícia Torres Barreto Costa Carvalho sustenta que, caso
o Tribunal Superior se depare com uma matéria de ordem pública que comprometa o mérito
do recurso, e que seja evidente, isto é, que não necessite uma reanálise do conjunto fáticoprobatório dos autos, é eficaz, célere e justo que o Superior Tribunal de Justiça a aprecie,
evitando, assim, que a parte venha a se socorrer de outros meios de impugnação 12.
Barbosa Moreira, ao analisar os efeitos do recurso especial aduziu que o Superior
Tribunal de Justiça é competente para “julgar as causas”, a teor do que dispõe o artigo 105,
inc. III, da Constituição Federal, de maneira que, em conhecendo o recurso especial, o Tribunal
Superior não apenas fixa a tese jurídica que entenda por correta, mas também aplica o direito
à espécie 13.
Com efeito, a divergência não se encontra apenas no âmbito da doutrina, podendo
ser verificada, inclusive, no âmbito do próprio Superior Tribunal de Justiça. Vejamos.
No julgamento do Agravo Regimental nos Embargos de Declaração nº 1252991, o
Ministro Benedito Gonçalves, entendeu que, em que pese a questão relativa à necessidade de
inclusão do INSS no polo passivo da demanda configurar matéria de ordem pública, tal matéria
não havia sido ventilada na decisão hostilizada, de maneira que lhe faltou o requisito do
prequestionamento. Dessa forma, não proveu o agravo regimental, sob o fundamento de que
11
12
13
CUNHA, Leonardo José Carneiro da; DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil. 7. ed.
Salvador: JusPodivm, 2009, v. 3.
CARVALHO, Patrícia Torres Barreto Costa. Efeito translativo nos recursos excepcionais. Revista de
Processo, ano 34, n. 171, p. 280, maio 2009.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O novo processo civil brasileiro: exposição sistemática do
procedimento. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
6
o STJ “concluiu pela necessidade do requisito do prequestionamento na instância
extraordinária” 14.
Igualmente, no julgamento dos Embargos de Declaração nº 32.420, o Ministro
Humberto Martins concluiu que, ante a ausência de manifestação no Tribunal de origem
acerca da ilegitimidade passiva do Tribunal de Contas, tal tema não poderia ser debatido na
Corte Especial 15.
Em contrapartida, o Ministro Arnaldo Esteves Lima, no julgamento do Agravo
Regimental nº 44.971, analisou a questão referente à ilegitimidade das Casas Legislativas em
recorrer em ações visando direitos estatutários de servidores, inobstante tal matéria não ter
tido o devido prequestionamento. Neste sentido, afirmou que “os temas que gravitam em
torno das condições da ação e dos pressupostos processuais podem ser conhecidos ex officio no
âmbito deste egrégio STJ, desde que o apelo nobre supere o óbice da admissibilidade recursal,
no afã de aplicar o direito à espécie, nos termos do art. 257 do RISTJ e Súmula n.º 456 do
STF” 16.
Neste mesmo sentido, foi o posicionamento adotado pelo Ministro Francisco Falcão
no julgamento dos Embargos de Declaração nº 1043561, no qual sustentou que “as matérias
de ordem pública, ainda que desprovidas de prequestionamento, podem ser analisadas
excepcionalmente em sede de recurso especial, cujo conhecimento se deu por outros
fundamentos, à luz do efeito translativo dos recursos” 17.
Dessa forma, pode se constatar que não há um posicionamento majoritário no
âmbito do Superior Tribunal de Justiça, existindo entendimento em todos os sentidos.
De qualquer sorte, para se resolver o embate se faz necessária uma ponderação de
princípios, pois de um lado temos as hipóteses de cabimento do recurso especial
consubstanciadas na Constituição Federal, e de outro, temos os princípios ensejadores do
processo civil contemporâneo brasileiro. Conforme assevera Daniel Mitidiero “processo justo,
na verdade, constitui antes de tudo processo substancializado em sua estrutura íntima mínima
pela existência de direitos fundamentais” 18.
14
AgRg nos EDcl no REsp 1252991/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado
em 20/09/2012, DJe 25/09/2012.
15
EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp 32.420/PB, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA,
julgado em 21/06/2012, DJe 28/06/2012
16
EDcl no AgRg no REsp 1043561/RO, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIZ
FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 28/02/2011.
17
EDcl no AgRg no REsp 1043561/RO, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIZ
FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 28/02/2011.
18
MITIDIERO, Daniel. Colaboração no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
7
Os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, do devido processo
legal, da duração do processo por tempo razoável, entre outros, representam diretrizes que
devem ser seguidas no processo contemporâneo, visando o alcance de um processo justo e
democrático, permitindo, com isso, que o processo cumpra com as pretensões do direito
material.
Com efeito, o processo civil brasileiro está vivenciando uma época de formalismo
valorativo 19. Dessa feita, em homenagem aos princípios constitucionais supramencionados, e,
levando-se em consideração a necessidade de que o processo civil não seja mero instrumento
do direito material, mas, em algumas situações, também uma constituição deste 20, é que
parece mais razoável o entendimento sustentado através da segunda corrente.
Conclusão
Conforme o exposto, a questão relativa à possibilidade de o Superior Tribunal de
Justiça analisar uma matéria de ordem pública de ofício é muito divergente. E, tal divergência
encontra-se tanto no âmbito da doutrina como no âmbito da jurisprudência.
Como se viu, não há, na jurisprudência, uma corrente majoritária. Existem julgados
mais rígidos, no qual não se analisa matéria de ordem pública desprovida do requisito do
prequestionamento, bem como existem julgados mais moderados, no qual se pode observar
uma flexibilização das regras acerca das questões de ordem pública no recurso especial. Neste
contexto, é necessário que haja um entendimento uniforme na Corte Superior, para se evitar
que o resultado do julgamento dependa de qual Ministro, ou ainda, qual Turma irá proferir o
julgamento.
De qualquer sorte, o que se faz necessário para dirimir o embate é uma ponderação
dos Princípios Constitucionais que devem estar presentes no processo civil contemporâneo.
Vale dizer, de um lado há o Princípio do Dispositivo, bem como o Princípio da Hierarquia das
Normas, tendo em vista que os casos de cabimento do recurso especial estão previstos na
Constituição Federal, e, portanto, as regras acerca da matéria de ordem pública presentes no
Código de Processo Civil não são aplicáveis; mas do outro lado, temos o Princípio do Devido
Processo Legal, tão difundido na atualidade, segundo o qual não poderíamos deixar de analisar
uma nulidade no processo, proferindo decisão viciada.
19
20
MITIDIERO, op. cit.
MITIDIERO, Daniel. Elementos para uma teoria contemporânea do processo civil brasileiro. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2005.
8
Dessa forma, verifica-se que ambas as correntes possuem argumentos muito sólidos,
e se reconhece que ambas as correntes não deixam de estar dotadas de razão. No entanto
parece mais acertada a tese de que o Superior Tribunal de Justiça pode analisar uma matéria
de ordem pública ex officio, tendo em vista a razão de ser do processo civil contemporâneo,
isto é, a noção de que o processo civil nada mais é do que o meio para a concretização do
direito material, e, portanto, não pode estar dotado de vícios tão graves, tais como as
nulidades absolutas ou até mesmo uma inexistência jurídica.
Ainda, não se pode olvidar que o Superior Tribunal de Justiça deve “julgar as causas”,
a teor do que dispõe o artigo 105, III, da Constituição Federal. Dessa feita, o Tribunal Superior,
em conhecendo o recurso especial, não irá apenas fixar a tese que entende por correta, mas
também irá aplicar o direito à espécie.
Por fim, através do juízo de revisão que o recurso especial pode proporcionar, o
Superior Tribunal de Justiça analisa o mérito da causa, podendo modificar o que restou
decidido no Tribunal de origem, de modo que não seria crível que ignorasse uma nulidade, sob
pena de se cair em um formalismo exacerbado, o que, repisa-se, não é o objetivo do processo
civil contemporâneo.
9
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