EDUCAÇÃO PROFISSIONAL: TEORIA E PRÁTICA Aula 9- AS PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL: A PEDAGOGIA TAYLORISTA-FORDISTA E A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS OBJETIVOS E CONTEÚDO PROGRAMÁTICO • Os temas abordados nesta aula são: A pedagogia taylorista/fordista. As formas tradicionais de Educação Profissional – propostas pedagógicas, espaços, atores, e formas de gestão definidos a partir de um sistema produtivo organizado segundo o paradigma Taylorista/Fordista. O modelo de competências no interior das organizações e a pedagogia das competências: desafios e contradições. O modelo das competências e as práticas didáticas em construção. • Os objetivos são: Caracterizar a pedagogia taylorista fordista e relacioná-la às características da organização do trabalho e da produção taylorista/fordista; Caracterizar pedagogia das competências em seus aspectos metodológicos e curriculares; Analisar as implicações do conceito de competência como ordenador das ações de educação profissional. OS CONDICIONANTES DOS PROJETOS PEDAGOÓGICOS • No modo de produção capitalista, a finalidade do trabalho pedagógico é o disciplinamento para a vida social e produtiva, em conformidade com as especificidades que os processos de produção vão assumindo, em decorrência do desenvolvimento das forças produtivas. Em uma sociedade dividida em classes, em que as relações sociais são de exploração, o trabalho pedagógico desempenhará a função de desenvolver subjetividades tais como são demandadas pelo projeto hegemônico: o do capital. • Assim, em cada etapa do processo de acumulação capitalista da atualidade vão sendo desenvolvidos projetos pedagógicos específicos, adequados à formação dos sujeitos requeridos pelas diferentes formas de organização da produção capitalista. A CLASSIFICAÇÃO DAS PEDAGOGIAS - KUENZER • Foi exatamente essa compreensão a respeito do fato de que a vida social e a produção condicionam o trabalho pedagógico realizado nos diferentes espaços educativos que propiciou a Acácia Kuenzer realizar uma classificação das pedagogias adotadas na contemporaneidade. • Segundo a autora, convive-se hoje com três propostas pedagógicas: a pedagogia taylorista-fordista (predominante até os anos 80 na vigência do paradigma tecnológico correspondente), a pedagogia das competências ou toyotista (voltada para a formação dos sujeitos na vigência do paradigma flexível) e a pedagogia socialista e/ou emancipatória (em construção). A PEDAGOGIA PREDOMINANTE SOB O FORDISMO • Assim, durante o paradigma taylorista-fordista foi desenvolvida uma pedagogia, orgânica às formas de divisão social e técnica do trabalho e da sociedade. Essa pedagogia tinha por finalidade atender às demandas de educação de trabalhadores e dirigentes a partir de uma clara definição de fronteiras entre as ações intelectuais e instrumentais, em decorrência de relações de classe bem demarcadas que determinavam o lugar e as atribuições de cada um. • A realidade do fordismo demandava uma pedagogia que priorizava modos de fazer e o disciplinamento, sem se comprometer com o estabelecimento de uma relação mais profunda entre o trabalhador e o conhecimento, capaz de propiciar que ele dominasse intelectualmente as práticas sociais e produtivas. Com a separação entre concepção e execução dos processos de trabalho, cabia aos trabalhadores a execução de parcelas fragmentadas. Não era necessário compreendê-lo como um todo. O domínio das funções intelectuais ficava restrito aos dirigentes. AS DEMANDAS DE FORMAÇÃO PARA OS TRABALHADORES NO PARADIGMA TAYLORISTA-FORDISTA • No paradigma taylorista-fordista, a tecnologia utilizada era de base metal mecânica, rígida. As máquinas tinham um número restrito de possibilidades de operações que exigiam dos operários comportamentos operacionais prédeterminados e com poucas variações. Bastava compreender os movimentos necessários a cada operação, memorizá-los e repetí-los em uma determinada seqüência, prescrita pela gerência. • Assim, no taylorismo/fordismo, os trabalhadores executavam, ao longo de sua vida produtiva, praticamente as mesmas tarefas e atribuições, para o que era suficiente alguma escolaridade, curso de treinamento profissional e muita experiência. A PEDAGOGIA TAYLORISTA-FORDISTA • • A pedagogia taylorista-fordista, em decorrência, propõe conteúdos que, fragmentados, organizam-se em seqüências rígidas, tendo por meta a uniformidade de respostas para procedimentos padronizados, separa os tempos de aprender teoricamente e de repetir procedimentos práticos, além de exercer um controle externo sobre o aluno. Na escola, a seleção dos conteúdos era pautada por uma visão positivista de ciência, as áreas de conteúdo eram organizadas de modo rígido, com sequenciamento igualmente rígido, e os conteúdos eram organizados e repetidos de forma linear e fragmentada. Essa repetição era realizada através do método expositivo (aulas e demonstrações), combinado com a realização de cópias, ditados e exercícios. O fordismo demandava uma pedagogia que tinha por objetivo a uniformidade de respostas para procedimentos padronizados. A habilidade cognitiva fundamental era a memorização, valorizada como evidência da aprendizagem. O livro didático era o responsável pela qualidade do trabalho escolar. A PEDAGOGIA TAYLORISTA-FORDISTA • Assim, do paradigma taylorista / fordista decorrem várias modalidades de fragmentação do trabalho pedagógico, escolar e não-escolar: a) a dualidade estrutural, a partir da qual se definem tipos diferentes de escola, segundo a origem de classe e o papel a elas destinado na divisão social e técnica do trabalho; b) a fragmentação curricular, que divide o conhecimento em áreas e disciplinas, trabalhadas de forma isolada, que passam a ser tratadas como se fossem autônomas entre si e desvinculadas da prática social concreta, c) a separação da formação intelectual da formação prática, supondo- se que a teoria é separada da prática. • A expressão desta fragmentação é a grade curricular, que distribui as diferentes disciplinas com suas cargas horárias por séries e turmas de forma aleatória, ficando por conta do aluno a reconstituição das relações que se estabelecem entre os diversos conteúdos disciplinares; as estratégias de formação de professores, que promovem capacitação parcelarizada, por temas e disciplinas, agrupando os profissionais por especialidade, de modo a nunca discutir o trabalho pedagógico em sua totalidade. A PEDAGOGIA TAYLORISTA-FORDISTA E A DUALIDADE ESTRUTURAL DO SISTEMA DE ENSINO • A pedagogia taylorista-fordista, assim, definia um trabalho pedagógico adequado a um sistema escolar organizado de forma rígida, hierarquizada. Um sistema centralizado para assegurar o pré-disciplinamento necessário à vida social e produtiva. Um sistema organizado em duas versões: uma para a formação dos dirigentes, composta pela rede regular de ensino, e outra para a formação dos trabalhadores, composta pela rede de ensino profissional. • A pedagogia taylorista-fordista foi, ao longo dos anos, orgânica às demandas de uma sociedade cujo modo de produção estava pautado em uma divisão entre as tarefas intelectuais (dirigentes) e as operacionais (trabalhadores). Assim, era uma proposta pedagógica a serviço da dualidade estrutural, a partir da qual se definem tipos diferentes de escola, segundo a origem de classe e o papel a elas destinado na divisão social e técnica do trabalho. A PRODUÇÃO FLEXÍVEL • Vimos como a crise do fordismo acaba por dar lugar a um processo de reestruturação, favorecido pela crescente incorporação da ciência e da tecnologia à produção. Os processos de trabalho de base rígida vão sendo substituídos pelos de base flexível. A microeletrônica assegura muitas possibilidades produtivas. A padronização cede lugar à produção de uma gama diversificada de produtos, a linha de montagem vai sendo substituída pelas células de produção, o supervisor desaparece e o antigo controle externo sobre o trabalhador vai dando lugar ao controle de qualidade, agora internalizado pelo próprio trabalhador. • Nas células de produção os produtos são desenvolvidos por completo e os trabalhadores, além de responsáveis pela produção, também são encarregados pelo ajuste e manutenção das máquinas e pelo controle de qualidade. Assim, o trabalhador é levado a conhecer etapas amplas do processo de produção e não somente uma etapa específica. As palavras de ordem são qualidade e competitividade. O NOVO PERFIL DO TRABALHADOR • O novo discurso refere-se a um trabalhador de novo tipo, para todos os setores da economia, com capacidades que lhe permitam adaptarse à produção flexível. No atual mundo do trabalho, o multiprofissional ocupa o lugar daquele que domina apenas uma tarefa. A produção flexível requer trabalhadores flexíveis, evidenciando-se a polivalência da mão-de-obra e a multiqualificação. Entre as principais capacidades exigidas do trabalhador se destacam: a capacidade de comunicar-se, a autonomia para resolver problemas, a criatividade, a liderança, o aperfeiçoamento contínuo. • Essas determinações mudam o perfil de uma parcela dos trabalhadores, uma vez que a realidade opera com a polarização das qualificações. Assim, cria-se uma casta de trabalhadores muito qualificados e incluídos no mercado, ao lado de alguns trabalhadores, ainda incluídos no mercado, mas de forma precária. Esse conjunto se completa com uma grande massa de excluídos, em função do caráter concentrador do capitalismo neste novo regime de acumulação. A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL • Esse novo perfil, exigido de fato apenas para uma parcela dos trabalhadores, muda o eixo de sua formação, alterando a relação entre formação humana e conhecimento. O desenvolvimento das habilidades psicofísicas do fordismo cede espaço para a necessidade de trabalhar teórico-praticamente. A demanda de educação dos trabalhadores recebeu um impacto muito forte das mudanças no mundo do trabalho. • Estas demandas de educação exigem dos trabalhadores maior escolaridade e trazem uma nova concepção de competência, que passou a ser compreendida em contraposição a um saber de natureza psicofísica com foco na ocupação, predominantemente tácito e, portanto, desvinculado do conhecimento científico propiciado pela escolaridade. Competência entendida como a capacidade de agir, em situações previstas e não previstas, com rapidez e eficiência, articulando conhecimentos tácitos e científicos a experiências sociais e produtivas vivenciadas ao longo das histórias de vida. Em decorrência, passou-se a exigir dos trabalhadores o que até então era prerrogativa da burguesia: o domínio do trabalho intelectual, não apenas no plano teórico, mas integrado à capacidade de atuar com criatividade e rapidez. AS COMPETÊNCIAS • O conceito de competências se desdobra em duas importantes dimensões. A primeira no interior das empresas, propiciando um novo modelo de gestão do trabalho. A segunda, no interior dos espaços educativos, configurando uma nova pedagogia: a pedagogia das competências, voltada para a formação dos sujeitos requisitados no paradigma flexível. • No âmbito das empresas, o modelo de competências altera os processos relativos: a) à organização do trabalho; b) à seleção de pessoal; c) aos processos de capacitação profissional e de formação continuada de funcionários d) à avaliação de desempenho profissional. O MODELO DE COMPETÊNCIAS NAS EMPRESAS • a) As competências passam a ser consideradas elementos estruturantes da organizanização do trabalho. A organização do trabalho, a evolução das situações de trabalho e a definição de empregos passam a se dar mais pelos arranjos individuais do que pelas classificações dos postos de trabalho que se referiam às qualificações. O centro da divisão do trabalho passa a ser dado pelas competências demonstradas pelos sujeitos. • b) As competências dos indivíduos passam também a ser o centro do processo de seleção de pessoal. Ao analisar o currículo do candidato não basta mais verificar a sua titulação e a sua experiência. Agora o candidato deve demonstrar possuir as competências requeridas e deve ser, no processo seletivo, submetido a provas de desempenho, pois deve demonstrar que sabe agir com competência. As competências estão centradas no desempenho. O MODELO DE COMPETÊNCIAS NAS EMPRESAS • c) Na medida em que as competências são instáveis, é necessário uma formação profissional consistente e continuada. Muitas empresas centralizam iniciativas de educação na empresa, criando espaços de educação coorporativa, visando superar a fragmentação e a superficialidade dos treinamentos presentes no paradigma fordista. A educação corporativa corresponde a uma proposta ampla de educação, que compreende a aprendizagem como contínua, voltada para a construção de competências que gerem vantagens competitivas para as empresas. Com o novo modelo, as ações de treinamento e desenvolvimento são ampliadas. Além disso, os processos educativos passam a incluir menos palestras e atividades teóricas, e mais ações educativas centradas no contato direto com situações de trabalho reais (treinamentos em serviço, on the job), de modo a favorecer a construção de competências. • d) Por fim, a introdução da gestão de competências faz com que os funcionários passem a ser avaliados constantemente, já que as competências são sempre instáveis e, por isso, a avaliação de competências é sempre incerta e temporária. COMPETÊNCIAS E A NECESSIDADE DE UMA NOVA PEDAGOGIA • Em decorrência do fato de que a qualificação profissional passa a depender de conhecimentos e habilidades cognitivas, que permitam ao produtor trabalhar intelectualmente, sendo capaz de dominar os conhecimentos científicos para resolver os problemas da prática produtiva, é também necessário outro tipo de pedagogia nos espaços escolares. • Uma pedagogia pautada na ampliação da educação básica. Reconhecer que as transformações no mundo do trabalho, mais do que conhecimentos e habilidades demandadas por ocupações específicas, exigem conhecimentos básicos, implica constatar a importância que assumem as formas sistematizadas e continuadas de educação escolar. A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS • Essa nova pedagogia defende patamares mais elevados de educação para os trabalhadores, até porque a concepção de competência privilegia a capacidade de trabalhar intelectualmente, contrariamente ao taylorismo / fordismo, que privilegiava o conhecimento tácito. Ainda, é preciso considerar que a nova base microeletrônica exige que o conhecimento passe a se dar também sobre os processos, e não mais apenas sobre os produtos, uma vez que as possibilidades de uso das tecnologias passam a depender do conhecimento do usuário. • Estas mudanças levam a substituir a centralidade dos conteúdos, compreendidos enquanto produtos do conhecimento humano, pela centralidade da relação processo/produto. Não basta apenas conhecer o produto do conhecimento, mas é preciso apreender e dominar os processos de sua produção. A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS • Essa nova pedagogia, denominada de pedagogia das competências ou toyotista, tem por finalidade formar profissionais flexíveis, capazes de dinamismo, eficiência e de lidar com as incertezas. • Ela está centrada na idéia do esforço individual e muda o eixo da memorização para o desenvolvimento de competências cognitivas superiores. • Utiliza um conjunto de métodos e procedimentos de ensino diferenciados: não mais as exposições da pedagogia taylorista-fordista, mas agora são adotados métodos como os projetos e o método de solução de problemas, que estimulam o aluno a pensar, a pesquisar, a resolver situações desafiadoras. A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS • O ensino fica centrado não mais nos conteúdos, mas na produção de competências verificáveis em situações específicas. Assim, os conteúdos disciplinares são ensinados na medida das necessidades. Na medida em que o desempenho é central, em que é importante saber agir, privilegia-se a prática, em detrimento da teoria. A pedagogia das competências confere um sentido prático aos saberes escolares. Ensina-se o que é útil, os processos que orientarão um desempenho de qualidade, trazendo para o interior das escolas uma concepção pragmática. • A pedagogia das competências rompe, assim, com a hierarquia entre o saber e as práticas. A prática ganha lugar central. O saber escolar é dessacralizado, é retirado do lugar de honra que ocupava na pedagogia taylorista-fordista. A PEDAGOGIA DAS COMPETÊNCIAS • Ramos (1998) afirma que a pedagogia das competências opera uma inversão pedagógica, ou seja, a teoria, que era central e destinada à elite na pedagogia taylorista-fordista, é agora secundarizada. É como se a escola não precisasse mais transmitir o saber científico de forma sistematizada. Espera-se que os profissionais não tenham uma relação com o saber acadêmico, uma vez que a validade dos conhecimentos transmitidos é dada pela aplicabilidade do conhecimento ao exercício das atividades produtivas. Ensina-se o que será utilizado, o que será aplicado, o que contribui para o agir competente. AS CONTRADIÇÕES DA NOVA PEDAGOGIA • Apesar da pedagogia das competências enfatizar a prática em detrimento da teoria, ela traz novas possibilidades para a construção de uma pedagogia emancipadora. • Na medida que o novo paradigma exige um pequeno grupo de trabalhadores mais qualificados intelectualmente, abrem-se as portas para a reivindicação de que o domínio da ciência, da cultura e das formas de comunicação, dos conhecimentos científicos e tecnológicos presentes no mundo do trabalho e nas relações sociais contemporâneas seja uma realidade para todos os trabalhadores. Para a reivindicação de que a educação de todos os trabalhadores, envolva uma sólida educação básica inicial, complementada por processos educativos que integrem, em todo o percurso formativo, conhecimento básico, conhecimento específico e conhecimento histórico, ou seja, ciência, tecnologia e cultura, em uma perspectiva de democratização da escola.