UERJ – Instituto de Matemática e Estatı́stica
Especialização em Aprendizado em Matemática
II/2002
Cálculo e Computação – Palestras 26/8-2/9
Carlos A. de Moura†
Instituto de Matemática e Estatı́stica – UERJ
†
Departamento de Análise Matemática
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Versão Resumida
Nestas duas palestras discutimos essencialmente as noções de cardinalidade de um conjunto,
ou seja, como contar o número de elementos. Introduzindo a noção de conjunto infinito, vemos
algumas surpresas, como um conjunto “com mais elementos” que outro, mas ter o mesmo
“tamanho”
A primeira referência mencionada foi o artigo
R.S.Kubusly & C.A.deMoura(2002): QUANTOS INFINITOS?, Portal da Cincia Hoje,
URL = http://www.uol.com.br/cienciahoje/che/vol08/infinito .
A referência clássica é a tradução do livro
Paul Halmos: TEORIA INGÊNUA DOS CONJUNTOS, Ed. Ciência Moderna.
Mostramos que os racionais têm a mesma cardinalidade dos naturais, exibindo-os em uma
matriz infinita
1/1 1/2 1/3 . . . 1/n
2/1 2/2 2/3 . . . 2/n
3/1 3/2 3/3 . . . 3/n
,
·
·
·
...
·
m/1 m/2 m/3 . . . m/n
·
·
·
...
·
1
cujos elementos podem ser contados, isto é, trata-se de um conjunto infinito enumerável, o
“primeiro dos infinitos”.
Observamos a existência de outros infinitos, chamando a atenção para o fato de que as partes de um
conjunto são sempre “maiores” do que o conjunto.
E, finalmente, a surpresa de que os racionais, apesar de ser um conjunto pequeno comparativamente
à reta real, enchem toda a reta, pois qualquer número pode ser aproximado por racionais.
Uma forma de construir uma seqüência de números racionais que aproxima qualquer elemento do
intervalo [0,1] é com a seguinte enumeração dos racionais de (0,1):
1/2, , 1/3, 2/3, 1/4, 2/4, 3/4, 1/5, 2/5, 3/5, 4/5, . . .
Denotemos essa seqüência como {aı }ı ∈ IN . Os elementos a1 , a2 , a4 , a7 , a11 , . . . convergem para
0. Já os elementos a1 , a3 , a6 , a7 , a10 , . . . convergem para 1. E dado um elemento de (0,1), ele pode
ser aproximado por elementos desta seqüência, por meio de uma subseqüência, pois:
Suponhamos que ele tem a representação decimal
α = 0, α1 α2 α3 α4 . . .
Claro que os números
α1 α1 α2 α1 α2 α3
,
,
, ...
10 100
1000
estão na seqüência construı́da e convergem para α .
Exercı́cio Qual o termo genérico das duas subseqüências que exibimos acima, aproximando 0 e 1?
Falamos em subseqüência, o que quer isso exatamente dizer?
Dada uma seqüência {xı }ı ∈ IN , seja
 : IN → IN
uma função estritamente crescente. Então a seqüência { xı } é chamada de subseqüência da seqüência
inicial. Trata-se portanto de uma função composta, função de função, pois uma seqüência é uma função
dos naturais em um dado conjunto.
Apesar de estarem os racionais tão presentes na reta real, a probabilidade de escolhido um real
qualquer, ser ele racional é muito pequena, é zero. Que quer isso dizer?
A idéia é comparar o peso dos reais e dos racionais, “medir” esse peso! Efetuamos a seguinte construção que mostra ser o peso dos racionais desprezı́vel.
Dado um intervalo [a, b] , (a, b) , [a, b) ou (a, b] , a ele atribuı́mos uma medida, ou um peso,
que é seu comprimento, b − a . O que isto implica para o conjunto dos racionais?
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Já sabemos que os racionais são enumeráveis, podemos construir uma seqüência que contém todos
eles, cada um aparecendo uma única vez nessa seqüência:
q 1 , q2 , q3 , . . . , qn , . . .
Coloquemos um intervalo de comprimento variável ao redor de cada qı : com medida 1, para o
primeiro, 1/2 para o segundo, 1/4 para o terceiro, 1/8 para o quarto, e assim sucessivamente, ou seja,
tomemos a seqüência de intervalos
In = (qn −
1
2n−1
, qn +
1
2n−1
)
Evidentemente esses intervalos contêm todos os racionais, de fato, cada racional comparece mesmo
a mais de um – seria uma infinidade? – de intervalos. Além disso, ou por isso, os intervalos se
intersecionam. Qual a medida total do conjunto formado como a união de todos esses intervalos?
Por causa das observações que acabamos de fazer, não podemos escrever esse valor exatamente, mas
poderemos fazer o que se chama em matemática, e se faz freqüentemente, estimar.
Dados dois intervalos [a, b] , [c, d] , se eles não se tocam – ou se tocam só com os extremos, a medida
da união dos dois é a soma das medidas, (b − a) + (d − c) . Quando se tocarem, temos que subtrair a
medida da interseção para obter a medida correta da união. Mas sabemos que não vai ela ultrapassar
(b − a) + (d − c) , esta é uma estimativa superior para a medida procurada.
Da mesma forma, podemos estimar a medida de um conjunto que contém todos os racionais somando
os comprimentos dos intervalos In . Para os N primeiros:
medida (∪N
n=1 In ) ≤
N
X
n=1
1
2n−1
.
Chegamos, ao tomar o limN →∞ , ao valor 1 para a estimativa.
Agora, a surpresa: por que não tomar os intervalos com comprimento > 0 qualquer, dividido por
1, por 1/2, por 1/4, etc? Continuamos aprisionando todos os racionais, e agora com um conjunto que
não tem mais do que > 0 , como comprimento. Então os racionais estão condenados a possuir uma
medida muito pequena para poder apresentar satisfazer uma tal estimativa. E, sendo um número não
negativo, deve ser zero.
Qual a diferença na demonstração acima se fosse outro o conjunto escolhido, apenas com a restrição
de ser também enumerável? Nenhuma! Assim:
Todo conjunto enumerável da reta tem medida nula.1
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Além disso, é importante saber que ele tem uma medida, o que não ocorre para qualquer conjunto!
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Palestras 2-3 - Instituto de Matemática e Estatística UERJ