26| PARTE I | DOIS PROJETOS AMBICIOSOS | A NOVA LUSITÂNIA A VIDA DE EMPRESÁRIO DO AÇÚCAR NOS A atividade prosperou com dificuldades em torno da área central da Capitania. Décadas se passariam até o estabelecimento TEMPOS DA COLÔNIA de todos os grandes engenhos do século XVI e início do XVII. O tipo de empreendimento implantado por Duarte Coelho exigia a presença constante do proprietário em período de trabalho integral. Dessa forma, esse proprietário necessitava Alguns deles denominam bairros do Recife de hoje: Engenho Madalena, Engenho Torre, Engenho Casa Forte, Engenho Apipucos, Engenho Camaragibe e Engenho do Meio. morar dentro da própria empresa, criando relações sociais entre Já o donatário tinha mais poder de manobra em termos serventes e servidos que se tornaram o molde mais fortemente políticos e econômicos. Ele podia sempre subestabelecer o direito gravado na sociedade nordestina. Segundo Gilberto Freyre, sobre a terra que lhe era entregue pelo rei. As capitanias hereditárias eram estabelecimento de uso para o donatário, O escravocrata terrível, que só faltou transportar da África para a América, em navios imundos, que de longe se adivinhavam pela inhaca, a população inteira de negros, foi, por outro lado, o colonizador europeu que melhor confraternizou com as raças chamadas inferiores. O menos cruel nas relações com os escravos. É verdade que, em grande parte, pela impossibilidade de constituir-se em aristocracia européia nos trópicos: escasseava-lhe, para tanto, o capital, senão em homens, em mulheres brancas. Mas, independente da falta ou escassez de mulher branca, o português sempre pendeu para o contato voluptuoso com mulher exótica. concedido pelo rei na tradição medieval de lealdades e de honrarias distintas. Lotes de terras eram concedidas pelo capitão a pequenos e grandes “proprietários” (os sesmeiros), que ficariam à sua mercê, dividindo os trabalhos e garantindo a posse da capitania. Quem recebia ficava devendo lealdade. Ao longo do tempo, as relações sociais entre apaniguados, agregados e protegidos vão reproduzindo os mesmos princípios de favores, lealdade e usufruto de propriedades “indiretas”. Freyre, 1999, p. 189. As responsabilidades de um senhor de engenho eram muitas. Incluíam: 1. Comprar escravos, que eram geralmente pagos com parte da própria produção. No mais das vezes, o escravo era comprado com dinheiro tomado de empréstimo junto a financiadores autorizados — ou não! — pelo rei e pelo donatário, com juros elevados devido ao alto risco do empreendimento. 2. Manter esses escravos às próprias custas: alimentação, moradia, vestimenta e “assistência” na doença. Havia o que chamaríamos hoje de um turnover excessivo, devido a doenças e mortes. Os custos ficavam dentro do orçamento da empresa, sem subvenções públicas. 3. Tentar evitar a propagação das pragas que destruíam a plantação. 4. Arcar com as conseqüências financeiras de naufrágios, ataques de índios, pilhagens, quebra de safras. 5. Policiar com os seus as terras do engenho e aplicar as penalidades aos crimes cometidos. 6. Facilitar o trabalho dos catequizadores, inclusive com donativos. 7. Pagar impostos sobre a produção e a exportação. O Caminho dos Engenhos, da Avenida Caxangá, relembra a história e mostra como nasceram vários bairros da capital pernambucana. PARTE I | DOIS PROJETOS AMBICIOSOS | A NOVA LUSITÂNIA |27 CAMINHO DOS ENGENHOS DA AVENIDA CAXANGÁ A antiga Estrada de Caxangá, atualmente avenida de mesmo nome, hoje, por iniciativa da Prefeitura da Cidade do Recife/Empresa de Urbanização do Recife, apresenta, ao longo do seu percurso, em seus canteiros centrais, totens que sintetizam a história dos engenhos do Recife. Abaixo, seguindo a seqüência cidade-subúrbio, a transcrição dos textos dessa louvável iniciativa pública. 1| ENGENHO DA MADALENA Construído no século XVI por Pedro Afonso Duro, casado com Madalena Gonçalves. O bairro da Madalena originou-se desse engenho, conhecido como Engenho da Madalena ou Engenho Mendonça, por pertencer a João Mendonça, em 1630. No fim do século XVIII, teve como proprietário João Rodrigues Colaço e família, até ser extinto como engenho de açúcar. A casa-grande, conhecida como Sobrado Grande da Madalena, pertenceu ao Conselheiro João Alfredo de Oliveira, no século XIX. Hoje, abriga o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan. 2| ENGENHO DA TORRE Fundado no século XVI, era conhecido como Engenho Marcos André. Passou a ser chamado de Engenho da Torre em alusão à torre da capela, do engenho, dedicada a Nossa Senhora do Rosário. O bairro da Torre originou-se desse engenho. Em 1653, os holandeses dominaram o engenho e construíram uma fortaleza para atacar o Forte do Arraial Novo do Bom Jesus. Com a derrota holandesa, em 1654, o engenho foi destruído. Restaurado por seu proprietário, Antonio Borges Uchoa, posteriormente pertenceu à família Rodrigues Campelo, até ser extinto como engenho de açúcar. Hoje, no local da casagrande, funciona o Grupo Escolar Martins Júnior. 28| 3| ENGENHO DE AMBRÓSIO MACHADO Localizado no atual bairro do Zumbi, o Engenho de Ambrósio Machado, assim chamado em alusão a seu proprietário, situava-se na margem direita do Rio Capibaribe. Durante a ocupação holandesa, o engenho foi abandonado, tendo seu proprietário se refugiado na Bahia, em 1635. Uma parte das terras do engenho foi, então, incorporada aos bens da Companhia das Índias Ocidentais. A outra parte, após 1654, foi ocupada por João Cordeiro de Medanha, ajudante de ordens do Governador João Fernandes Vieira. 4| ENGENHO CASA FORTE Fundado no século XVI, por Diogo Gonçalves, deu origem ao bairro de Casa Forte. A casa do engenho e a capela de Nossa Senhora das Necessidades ficavam numa campina, onde está situada, atualmente, a Praça de Casa Forte. Em 17 de agosto de 1645, ocorreu a Batalha da Casa Forte, para libertar senhoras pernambucanas presas pelos holandeses, na casa-grande, pertencente a Ana Paes. Em 1810, o engenho foi adquirido pelo Padre Roma, uma das figuras da Revolução Republicana de 1817. Em 1911, no local da casa-grande, a Congregação da Sagrada Família fundou um colégio, em funcionamento até hoje. 5| ENGENHO DE SÃO PANTALEÃO MONTEIRO Existente desde o século XVI, o Engenho de São Pantaleão do Monteiro situava-se na margem esquerda do Rio Capibaribe, lugar de origem do bairro do Monteiro. Pertencia a Manuel Vaz e sua mulher, Maria Rodrigues. Foi vendido, em 1577, a Jorge Camelo e sua mulher, Isabel Cardoso. Em 1593, foi adquirido por Maria Gonçalves Raposo. Em 1606, tinha como proprietário Francisco Monteiro Bezerra, passando a ser conhecido como Engenho do Monteiro. No Largo Monteiro, existem, até hoje, a coluna e a mureta, em ruínas. São os últimos resquícios do Engenho de São Pantaleão do Monteiro. 6| ENGENHO DO CORDEIRO Formado por partes das terras do Engenho de Ambrósio Machado, local onde se originou o bairro do Zumbi, o Engenho do Cordeiro deu origem ao bairro do Cordeiro. Nome em alusão ao seu proprietário, o capitão João Cordeiro de Medanha, ajudante-de-ordens do Governador João Fernandes Vieira, que passou a ocupar as terras depois de 1654. Em 1707, seu proprietário, José Campelo Pessoa, incorporou as terras desse engenho às do Engenho de São Pantaleão do Monteiro, local do Bairro do Monteiro. 7| ENGENHO DE APIPUCOS Surgido no final de 1577, originário do desdobramento das terras do Engenho de São Pantaleão do Monteiro, situava-se na margem esquerda do Rio Capibaribe, dando origem ao bairro de Apipucos. Seu proprietário era Leonardo Pereira. Pertenceu a Jerônima de Almeida e posteriormente a Gaspar de Mendonça, seu proprietário em 1630, época da ocupação holandesa. Em 1645, os holandeses saquearam a capela do engenho, destruíram as imagens, as alfaias, os paramentos e os móveis. O gado e as mercadorias foram levados para o Engenho Casa Forte, pertencente a Ana Paes. 8| ENGENHO DOIS IRMÃOS Foi levantado em terras que pertenciam ao Engenho de Apipucos, pelos irmãos Antonio Lins Caldas e Tomás Lins Caldas, no início do século XIX. Deu origem ao bairro de Dois Irmãos. O engenho funcionou até o ano de 1875. A Companhia do Beberibe, já extinta, adquiriu parte da propriedade para utilizar as águas do Açude de Apipucos e dos mananciais do Lago da Prata, garantindo, assim, o abastecimento d’água do Recife. As residências dos antigos proprietários do engenho foram reformadas para a instalação da usina, que impulsionaria as águas com pressão necessária. 09| ENGENHO BRUM-BRUM Construído por volta de 1667, pelo Capitão Miguel Bezerra Monteiro, que militou na guerra contra os holandeses, o Engenho Brum-Brum situava-se na margem esquerda do Rio Capibaribe, em frente à povoação de Caxangá. Suas terras chegavam até a propriedade de Camaragibe. Posteriormente foi herdado por sua sobrinha Sebastiana de Carvalho. Ainda existia em 1882, quando pertencia aos herdeiros de Bernardo Antonio de Miranda. |29 10| ENGENHO DO MEIO Situava-se na margem direita do Rio Capibaribe e deu origem ao bairro do Engenho do Meio. Confiscado pelos holandeses no século XVII, foi totalmente destruído, restando apenas as terras. Posteriormente foi vendido a Jacob Estacour e a João Fernandes Vieira, que reconstruiu o engenho. Nas suas terras, em 1645, foi levantado um forte de terra chamado Arraial Novo do Bom Jesus. Em 1686, pertencia a Maria Cezar, viúva de João Fernandes Vieira. A casa-grande do engenho existiu até a década de 40. Situava-se no câmpus da Universidade Federal de Pernambuco, quando foi demolida. Visconde de Camaragibe, faleceu. O engenho foi vendido em 1891. E, em 1893, construiu-se a Fábrica de Tecidos de Camaragibe na propriedade. A casa-grande é o único prédio que restou do antigo engenho, atualmente pertencente a Maria Anita Amazonas MacDowell. 13| ENGENHO POETA 11| ENGENHO SANTO ANTONIO Situava-se na margem direita do Rio Capibaribe, onde hoje está localizado o Caxangá Golf & Country Club. Durante os séculos XIX e XX, teve vários proprietários: as famílias Amorim Rodrigues Campelo, Corrêa de Araújo, Heráclito do Rego, Cleofas de Oliveira e Genésio Guerra. Até 1942, ainda funcionava como engenho de açúcar. Em 1945, foi vendido ao Caxangá Golf & Country Club. Conhecido como Engenho da Várzea do Capibaribe, deu origem à povoação e paróquia do bairro da Várzea. No local da antiga moenda do Engenho Poeta, funciona hoje um restaurante. Foi levantado por Diogo Gonçalves, casado com Isabel Gonçalves Fróes, em meados do século XVI, em uma extensa terra, que lhe fora doada pelo donatário da Capitania de Pernambuco, Duarte Coelho. Esse engenho, hoje desaparecido, pertenceu aos descendentes de Diogo Gonçalves e, antes de 1645, a João Fernandes Vieira, um dos heróis das lutas contra os holandeses. 12| ENGENHO CAMARAGIBE Construído no século XVI, nas terras doadas a Diogo Fernandes, marido de Branca Dias, e seus sócios, Pedro Álvares Madeira e Bento Dias de Santiago, originou o município de Camaragibe. O engenho funcionou até 1875, quando seu proprietário, Pedro Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque, o 14| ENGENHO SÃO JOÃO Situava-se na margem esquerda do Rio Capibaribe, próximo ao bairro da Várzea. Pertenceu a João Fernandes Vieira, herói das lutas contra os holandeses, entre 1645 e 1654. A partir do século XIX, passou a pertencer à família Brennand. Nessa área, em 1917, foi fundada a Cerâmica São João, por Ricardo Brennand. Desativada em 1945, foi reconstruída em 1971, pelo seu filho, o artista plástico Francisco Brennand, que transformou o local em Oficina Cerâmica. Em 2002, nas terras do engenho, Ricardo Brennand, sobrinho do fundador, instalou o Instituto Ricardo Brennand, onde acontecem exposições e eventos culturais.