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ideias
dossiê
para o
sucesso
Saiba quais são as melhores práticas
e os fatores de sucesso das iniciativas
de inovação social brasileiras
A reportagem é de
Sandra Regina da Silva,
colaboradora de HSM Management.
66
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O
O que aumenta as probabilidades de sucesso de
uma inovação social? Conforme Kriss Deiglmeier,
que por muito tempo dirigiu o Centro de Inovação
Social da Stanford University, uma das principais
referências da área, o que constrói a inovação social é principalmente retroalimentação entre os setores privado, público e o terceiro setor, gerando três
mecanismos críticos de inovação social: “a troca de
ideias e valores, as mudanças nos papéis e relacionamentos, e a integração do capital privado com o
apoio de recursos governamentais e filantrópicos”.
Em outras palavras, quando ONGs, empresas e governos atuam juntos, a probabilidade de alcançarem
uma solução nova, que beneficie todos na sociedade,
para um problema social é muito maior do que quando ficam isolados. Sozinhos, limitam as ideias a seus
espaços e o resultado tende a ser ineficaz. Em fevereiro
de 2014, a própria Deiglmeier deixou Stanford para
ser CEO da Tides, facilitadora dessa retroalimentação.
inovação
social
Segundo ela, as empresas (com fins lucrativos)
estão liderando a luta em cada vez mais questões
sociais e, com elas, começa-se a estruturar os elementos que aumentam as chances de uma iniciativa de inovação social dar certo, com um conjunto
de melhores práticas bem similar ao das companhias que visam o lucro e alguns fatores de sucesso
mais específicos.
melhores práticas
e fatores de sucesso
Henrique Bussacos, empreendedor social ligado ao Impact Hub, considera difícil elencar as
melhores práticas de um negócio social. Em geral,
em sua opinião, “o empreendimento social não é
muito diferente de um empreendimento convencional; tudo o que contribui para ter sucesso em
um vale para o outro, somado à sensibilidade em
relação a questões sociais”. Pode-se dizer, contu-
+eficácia
do, que há alguns fatores de sucesso que podem
ser considerados mais específicos do ramo.
A seguir, fizemos uma lista de melhores práticas
e fatores de sucesso do setor 2.5. Contamos com a
ajuda de Bussacos, que mantém conexões com um
grande grupo de empreendedores sociais; de Fernanda Bornhausen Sá, presidente do Social Good Brasil,
evento voltado para a divulgação de tecnologia e conhecimento para a solução de problemas sociais, diretora da Clear Educação e Inovação e fellow do Synergos Institute, de Nova York; e de Carolina de Andrade, gerente para inovação do Instituto Comunitário
Grande Florianópolis, onde atua como coordenadora
do Centro de Apoio à Inovação Social (Cais), e também gestora do Social Good Brasil.
Priorizar a intersetorialidade. Não é apenas em
Stanford; no Brasil, essa também é a número um
entre as melhores práticas de inovação social. Tra-
como a inovação social tem
•As práticas•
•Os fatores de sucesso•
» Área de sustentabilidade
estruturada
» Intersetorialidade
1. Equipe > indivíduo
2. C anvas para definir
foto: istockphoto. ícones:the noun project
modelo de negócio
3. Gestão de excelência
4. Capacidade de focar
5. Comprometimento
6. Lean startup
7. Design thinking
» Definir os atores primeiro,
a solução depois
» Intensa experimentação
» Cultura de diálogo
» F oco no beneficiário
do projeto
» C ocriação com o beneficiário
» Vivência de campo
» Alinhamento com
atividade empresarial
» Projeto tratado à parte
» Governança com “dois olhos”:
um nos aspectos econômicos,
outro nos sociais
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dossiê
ta-se da capacidade de articular setores diversos e
especializados. Em uma inovação social, a academia pode dar contribuições tão importantes quanto as do setor privado, as do governo e as do terceiro setor. “Isso permite o acesso a expertises diferentes que se complementam para gerar o resultado
final ao beneficiário, tornando a iniciativa mais ágil
e direta”, diz Bornhausen Sá. Para ela, não basta a
interconexão formal; “a equipe tem de estar muito
bem afinada”.
Definir os atores primeiro, a solução depois. Trata-se praticamente da mesma receita do especialista em gestão Jim Collins –“primeiro quem, depois
o quê”. Determinar quem serão os principais atores antes de idealizar a solução de como transformar algo tende a facilitar sobremaneira a execução
dessa ideia –e seu êxito. Todos participam mais.
Atuar em equipe. Desprender-se da propriedade
intelectual de um projeto mostra-se bem importante, porque uma equipe complementar e parceira é
que costuma ser sinônimo de sucesso em inovação
social. Em empreendimentos com objetivos socioambientais, o apego autoral é mais comum do
que se pensa.
Definir bem o modelo de negócio –com o canvas.
Os melhores projetos de inovação social têm um
modelo de negócio cuidadosamente elaborado, esclarecendo qual a proposta de valor, o público-alvo
e como vão capturar recursos financeiros, seja com
patrocinadores, seja oferecendo serviços para gerar
receita. A ferramenta canvas tem sido muito utilizada para isso, como destaca Andrade.
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À esq., Carolina de
Andrade, gerente para
inovação social do
Instituto Comunitário
Grande Florianópolis e
coordenadora-geral do
Social Good Brasil; à dir.,
Fernanda Bornhausen Sá,
presidente do Social Good
Brasil e diretora da Clear
Educação e Inovação
Gerenciar com excelência. Analisar e tomar decisões que aumentem a eficiência e a eficácia das
atividades é um ponto comum
dos negócios sociais bem-sucedidos, porque só assim se lida bem
com a limitação dos recursos e as
urgências das comunidades.
Ter foco. Os melhores negócios
sociais já aprenderam que, quando se perde o foco, o beneficiário
potencial sai prejudicado, como
lembra Bussacos.
Obter o verdadeiro comprometimento dos gestores. É crucial
que estes tenham, além de amor
pela causa, um real compromisso
com a geração de um resultado
de impacto, como reforça Bussacos. “Isso é o que possibilita contornar as dificuldades que surgirão para quebrar os paradigmas
que será necessário quebrar.” O
compromisso costuma ser refor-
çado com a disseminação dos cases dentro da organização. Caso
contrário, a iniciativa estará fadada à superficialidade.
Desenvolver a iniciativa como
um projeto à parte. Pode ser
uma incubadora ou uma unidade de negócios separada, mas essa é a preferência entre grandes
empresas, como observa Bussacos. Requer, contudo, ainda mais
comprometimento com a causa.
Alinhar a inovação social com a
atividade da empresa privada envolvida. Isso é desejável não apenas em nome de criar valor compartilhado, como prega Michael
Porter [veja quadro na página 62],
mas, conforme Bussacos, porque
permite aproveitar as competências das pessoas que já estão na
companhia. “Ir por um caminho
diverso é desperdiçar competências e know-how existentes.”
Moldar a cultura da empresa para permitir diálogo com os diversos stakeholders. O ambiente mais propício para o diálogo,
que depende da cultura corporativa, é comum em casos de sucesso de inovação social, segundo Bussacos.
inovação
social
Empreendedores
inovadores
por Sílvio Anaz
Kriss
Deiglmeier,
ex-diretora-executiva
do Centro
de Inovação
Social de
Stanford,
referência
na área
Ter uma área de sustentabilidade convencional já
bem estruturada. Esta costuma puxar as demais
áreas organizacionais e a disseminação da inovação
social é facilitada.
Adotar a lean startup. O empreendedorismo enxuto
–ou lean startup, em inglês– veste como uma luva na
inovação social. “Assim como a lean startup é focada
em desenvolvimento de clientes para novos negócios
com etapas muito simples, nossas iniciativas precisam inovar com simplicidade com base no desejo do
público-alvo”, explica Andrade.
Praticar o design thinking. O pensamento do design se encaixa perfeitamente à inovação social,
conforme Andrade, na medida em que busca soluções de maneira criativa com empatia e colaboração radical.
fotos: divulgação e kleber marques
Focar o beneficiário do projeto. O foco sempre deve
ser no usuário, visando tanto a viabilidade como a
usabilidade do projeto por ele, e tem de ser reforçado da concepção da ideia a sua execução.
Fazer intensa experimentação. “A ordem é experimentar muito. É necessário fazer pequenas
apostas, protótipos e testes antes de partir para
um superplanejamento”, analisa Bussacos. Os
negócios sociais que atuam dessa maneira sabem
quanto isso é útil para não perder recursos e não
haver desperdício em nenhuma área –e, de quebra, também ajuda a ter mais insights.
Priorizar vivência de campo. Bussacos acrescenta
como imprescindível a vivência de campo. Segun-
O Global Entrepreneurship Monitor examinou as
características do empreendedor social. Entre os dados
que se destacam estão a relativamente alta presença de
mulheres e empreendedores sociais jovens e a diversidade
da formação acadêmica e da trajetória profissional.
Homens tendem mais a iniciar um empreendimento
social, mas a diferença da iniciativa entre gêneros nos
empreendimentos sociais não é tão alta quanto nos
empreendimentos comerciais tradicionais.
A relação de gêneros varia de país para país. Por
exemplo, na Malásia, Líbano, Rússia, Israel, Islândia e
Argentina, as mulheres prevalecem sobre os homens. Nos
Estados Unidos, Finlândia e China, a distribuição entre
homens e mulheres é quase igual. Os homens são maioria
no Brasil, Arábia Saudita, Marrocos e Bósnia, por exemplo.
Pelo mundo, pessoas com idade entre 25 e 44
anos têm a mais alta propensão a se envolver com
empreendedorismo social. Isso indica que indivíduos que
já estão estabelecidos mas ainda são jovens estão mais
propensos a iniciar um empreendimento social. De outro
lado, quanto mais perto da aposentadoria as pessoas estão,
mais improvável é que iniciem uma empreitada dessa.
Ao examinar o nível educacional dos empreendedores
sociais, o levantamento identifica a alta presença de
indivíduos com nível superior; o engajamento com
atividades de empreendedorismo social está, sim,
relacionado com o nível educacional. Isso é especialmente
verdadeiro para as economias com mais baixo nível de
desenvolvimento, inclusive. No Brasil, levantamento da
Ande Polo Brasil, Fundação Avina e Potencia Ventures
mostrou que 78% dos empreendedores sociais têm curso
superior. O mesmo levantamento indicou que quase 80%
deles já tiveram outros empreendimentos.
O status mais comum da pessoa envolvida com o
empreendedorismo social no mundo é o do profissional
autônomo, seguido pelo que trabalha meio período, pelo
estudante e por aquele que não trabalha.
No Brasil, as pesquisadoras Gilmara Tavares, Lui­za
Balduino,Tatiane Alexandre Silva e Vânia Nassif identificaram
algumas características do perfil comportamental desse
empreendedor: ele acredita na causa, ama o que faz, não
tem preconceitos, trabalha sem querer nada em troca, gosta
de planejar, estabelece metas, faz projetos na vida pessoal e
profissional, gosta de conviver com as pessoas e orientá-las,
é tolerante, compreensivo e determinado, aceita desafios.
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do ele, somente uma postura
teórica sobre o assunto, o que é
muito frequente em ONGs, representa um grande risco. “O
que acontece realmente lá na
ponta? Uma visita de campo, o
conhecimento das pessoas, uma
conversa próxima a elas fazem
muita diferença.”
Cocriar com o beneficiário.
Mais do que o público-alvo ter
empatia com o produto ou serviço social que será formatado, Andrade sugere que o beneficiário
seja cocriador. “É o ‘criar com’,
em vez de ‘criar para’. Assim há
maior engajamento e maior impacto”, garante ela.
Fazer uma governança com “dois
olhos”. Não há uma fórmula
única de governança que se aplique a toda e qualquer inovação
social, mas “um ponto comum é
sempre estar com o olhar sobre
os aspectos econômicos e sociais
e avaliar cada caso”, como diz
Bussacos. Segundo ele, rotineiramente, há momentos em que
há a necessidade de gerar um
impacto maior e outros em que
70
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encaixe
perfeito
Ferramentas novas das
empresas, como lean
startup e design thinking,
parecem feitas sob
medida para os negócios
sociais e são cada vez
mais utilizadas
o papel do Governo e o lucro
No Brasil, duas questões particularmente delicadas para uma atividade de inovação social dizem
respeito ao papel do governo e à destinação dada ao
lucro gerado, se for esse o caso.
Quanto ao governo, começa a haver um consenso: a parceria com o poder público continua a ser
fundamental, mas, no que tange a recursos financeiros públicos, a prioridade é caminhar com as próprias pernas, dependendo o mínimo possível dele.
Na maioria das vezes, o Estado ainda se mostra
indispensável na fase final de um projeto. Mas, segundo Bornhausen Sá, que também é presidente
do Instituto Voluntários em Ação e idealizadora do
Portal Voluntários Online, a preferência crescente é
por, cada vez mais, não começar um projeto buscando recurso público.
Quanto ao lucro, ainda está para ser definido
um parâmetro em relação a esse aspecto. Continua vivo o debate entre Muhammad Yunus,
economista bengalês que é o principal acionista
do Grameen Bank e considerado o “pai” do microcrédito, e Michael Chu, professor da Harvard
Business School e diretor-gerente do Ignia Fund,
baseado no México, além de sócio-fundador da
Pegasus Capital, empresa de private equity na Argentina. Se o primeiro defende ardorosamente o
reinvestimento do lucro na iniciativa social, o segundo prega a distribuição do lucro [leia também
entrevista com Paul Polak na página 118].
Evolução
Não restam dúvidas: a inovação social está se profissionalizando e evoluindo no Brasil, embora talvez
não na velocidade necessária.
Segundo Bornhausen Sá, por exemplo, as startups
ainda são mais propensas a investir em inovação social do que as companhias estabelecidas.
Para Bussacos, na maioria das cidades brasileiras
o conceito é pouco difundido, embora centros como
São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Florianópolis,
Belo Horizonte e Recife já tenham várias iniciativas
e negócios sociais mapeados.
O importante é que a inovação social vai deixando
de ser compreendida como uma “bala de prata”, nas
palavras de Bussacos. Mais e mais empreendedores
do setor não creem em soluções mágicas, da mesma
forma que não creem em vampiros, e preocupam-se
em ter a tecnologia e o conhecimento adequados para conseguir planejar e executar uma inovação social.
As 18 medidas aqui citadas confirmam o esforço.
foto: divulgação
Henrique Bussacos, empreendedor
social, cofundador de um negócio
social inovador, o Impact Hub
[veja case na página 76]
o foco é obter um rendimento financeiro melhor.
“Mesmo os negócios sociais
que alinham muito bem essas
duas necessidades –por exemplo,
um que ofereça um serviço de
saúde, em que vender mais causa
maior impacto social e financeiro– terão de pensar em precificação e precisarão definir o que
fazer com as pessoas que não podem pagar nada”, justifica.
Bussacos acha salutar que as
empresas envolvidas em negócios
sociais revejam seu sistema de governança em face da balança de
poder dos stakeholders. “Ao inovar na governança de uma organização, alteramos as relações de
poder entre os públicos de interesse, questionando nosso modelo
mental de como nos organizamos
e nos relacionamos. Esse processo pode ser transformador e nos
ajudar a gerar mais impacto social
positivo e realizar ações que de fato transformem a sociedade”, diz.
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