Azulejaria portuguesa no Convento de Santo Antônio de Recife 235 Separado da “árvore do rosário” pela porta de madeira trabalhada, o painel que apresenta uma mulher que foi salva de queda em um poço. Por virtude do Santíssimo Rozario foi livre uma devota sua não só do perigo de cahir em hum posso como tambem de varias molestias que tinha [sic] diz a legenda deste painel. No centro da cena uma mulher é retirada do poço por um grupo de homens, sendo o fato testemunhado por algumas pessoas. Este painel, como outros da nave da igreja apresenta eventos ocorridos em momentos distintos. Do lado oposto, vê-se o que ocorreu anteriormente: a mulher teria ido pegar água no poço, como indica o vaso que está no chão, desequilibrou-se e caiu. No azulejo, a pintura apresenta o exato momento da queda. Apenas suas pernas estão de fora do reservatório de água. A legenda, no entanto, acrescenta que ela também havia sido curada de “várias moléstias”. A presença do rosário é marcante. Está no pescoço da mulher que é retirada do poço. O painel que está, atualmente, coberto por um grande altar que permite que vejamos apenas algumas de suas partes. Encoberto pelas cortinas do altar o registro: No tempo que ouve peste na cidade de Coimbra se viu emtre as chamas hum livro sem o fogo o ofender o qual constava de prodígios do Rozario [sic]. Apenas partes do painel podem ser observadas. Em uma delas um doente recebe alimento no leito e é acompanhado por um religioso48. Em outra parte do painel, um religioso, que tem um rosário preso ao cinto, lê um livro. Atrás dele, dois homens que também olham atentamente para o livro, um deles tem as mãos unidas em sinal de oração. Tal detalhe indica que se trata de obra religiosa. Diante deles, quase no centro do painel e ao lado do doente, uma grande fogueira de labaredas altas. No meio o fogo há um livro aberto, o livro de um rosário mencionado na inscrição. Em suas páginas as palavras: Misterios do Rozario. Os mistérios do rosário e estão vinculados a passagens da vida de Nossa Senhora e de seu filho. E seus usos aplicam-se diretamente à oração do rosário como instrumento de meditação e devoção. Os quatro painéis menores da capela. Da esquerda para a direita vê-se: um religioso vestido como eremita, com capuz, caminhando com um cajado; dois religiosos sentados; um religioso que leva o rosário; um religioso solitário que sentado lendo um livro. A identificação de tais personagens é tarefa bastante delicada, afinal, não há um padrão de representação nos quatro painéis, nem atributos bem definidos que garantam a precisão para identificação de cada um. Julgamos que se trate de representações dos patriarcas das ordens franciscana e dominicana. Em um dos painéis os dois religiosos aparecem unidos em consonância com a biografia sobre São Domingos de Gusmão49. Sua presença em tal conjunto está plenamente integrada aos demais painéis posto que, como dito anteriormente, São Domingos fora um dos difusores da crença no rosário. O rosário, desde a Batalha de Lepanto, é relacionado à luta católica contra “inimigos” de fé, chamados de hereges. E sua devoção assumiu um caráter combativo, como “arma em um tempo em que, cada vez mais, os católicos pareciam acreditar 48 Apesar da veste de duas cores, a tonsura e o cordão de três nós fazem-nos crer que se trate de um frade da menor franciscano. 49 LACORDAIRE, 1907: 15 e 94.