A INFLUÊNCIA DO JOGO E DO MODELO DE JOGO NA PERFORMANCE DOS ATLETAS A preparação física como norte do processo ou subordinada às variáveis da partida? Uma análise sob a ótica sistêmica. Por Cyro Bueno* De modo que a cada ano aumenta-se a necessidade de treinar um ‘’x’’ número de variáveis, monitorar a evolução do processo de treino, controlar as cargas e amenizar o efeito da fadiga, ao mesmo tempo em que proporcionalmente diminui-se o tempo para tais atividades, buscouse na Pedagogia do Jogo, na Teoria da Complexidade, na Teoria do Caos, na Periodização Tática e na Periodização de Contexto/Jogo, possibilidades de otimização do contexto e justificativas para a chamada Visão Sistêmica. No decorrer dessa temporada, numa frustrada tentativa de justificar resultados negativos da equipe profissional do S.C. Corinthians Paulista, alguns órgãos da imprensa apontaram possíveis falhas no processo de treino durante o Período Preparatório Geral, a pré-temporada. Realizada quase inteiramente nos EUA, questionou-se os direcionamentos das atividades, que teriam sido de cunho quase inteiramente tático-técnico, tendo assim sido ‘’isolado’’ ou ‘’negligenciado’’ o segmento físico, e que supostamente em algum momento no decorrer da temporada isso teria ficado evidente com as eliminações em competições importantes. Exemplo típico de como pensar nas ‘’partes’’ isolando o ‘’todo’’, ou no ‘’todo’’ isolando as ‘’partes. Segundo Sargentim (2010), o Período Preparatório Geral deve englobar os treinamentos de ordem técnica e tática, simultaneamente à carga de força máxima. Concomitantemente, é importante a realização de jogos amistosos, para que sejam treinados estímulos de resistência específica. Será mesmo que houve um erro na elaboração da periodização (seja qual for a metodologia), ou algum equívoco em determinado microciclo? Ou teria o departamento de Preparação Física do clube agregado conhecimentos pertinentes ao seu segmento com outros departamentos do clube, pensando assim em visão sistêmica e, descartando erros de prétemporada como justificativa para derrotas posteriores?! No 1° jogo entre S.C. Corinthians Paulista e São Paulo F.C (vencido pelo Corinthians por 2 x 0) na Copa Libertadores da América de 2015, a partida apresentou os seguintes dados: - posse de bola: 43% do Corinthians, 57 % do São Paulo; - finalizações: 14 do Corinthians, 9 do São Paulo; - passes: 335 do Corinthians, 521 do São Paulo; - desarmes: 41 do Corinthians, 27 do São Paulo; - lançamentos: 55 do Corinthians, 31 do São Paulo. É perfeitamente aceitável que se conceba ideias claras sobre o jogo proposto e o modelo de jogo das equipes naquele momento. Associando o fato da equipe do Corinthians ter trocado quantidade consideravelmente inferior de passes e ter tido menos posse de bola, com o fato de ter finalizado, desarmado e lançado mais do que a equipe do São Paulo, podese entender que o jogo agressivo com alto grau de concentração e intensidade proposto pela equipe do Corinthians, no qual as linhas estiveram muito próximas, o sistema de coberturas muito eficiente, e as bolas retiradas das zonas de pressão com alto parâmetro de qualidade, foram cumpridos naquele dia com excelência. Sendo assim, certamente a equipe se desgastou fisiologicamente quase sempre apenas para tomar as decisões previstas em treinamento. No popular, ‘’correu certo’’. A plataforma posicional adotada pela equipe do Corinthians nessa temporada é a 1-4-1-4-1. Para Pivetti (2012), essa plataforma explora a capacidade técnica dos pontas no momento 1 x 1 e os laterais normalmente apenas apoiam a circulação da bola, com tarefas rígidas à cumprir defensivamente. Nos jogos contra a equipe do Guarani-PAR, a equipe perdeu um de seus laterais e um componente da segunda linha defensiva de 4 sob circunstâncias de expulsão, o que fatalmente prejudicou o jogo proposto, tendo influência direta nas variáveis fisiológicas dos atletas restantes em campo e consequentemente no resultado final. Apenas mais um exemplo da influência do jogo e do modelo de jogo na performance, e de como devemos ter uma análise qualitativa do contexto final. Ainda segundo Pivetti (2012), metodologias convencionalmente cartesianas tendem a fragmentar os treinamentos, propondo processos de treinos descontextualizados com a realidade do jogo. Quando um jogador não consegue alcançar, por exemplo, um passe em profundidade entrelinhas, ouve-se muito que o mesmo não está com níveis satisfatórios de força, ou que há um déficit de resistência. Dificilmente se pensa na tomada de decisão errada ou atrasada, ou que o atleta teve insucesso na tarefa por alguma circunstância da partida. A literatura também aponta dados fidedignos de performance satisfatória das capacidades físicas pertinentes ao futebol em treinamentos contextualizados e com maior grau de especificidade. Por exemplo, a relação entre treinar resistência aeróbia em metodologias intervaladas fora do ambiente do jogo, ou treiná-la em jogos reduzidos, manipulando regras que induzam a comportamentos táticos/técnicos próximos à realidade da modalidade, fazendo os atletas percorrerem distâncias similares ou iguais às encontradas em partidas (independentes do modelo de jogo proposto), e atingirem demandas metabólicas encontradas nas avaliações dos jogos. Para tal, a principal metodologia utilizada no futebol para coleta, exposição e discussão de dados contextualizados com o jogo e o modelo de jogo são os aparelhos GPS. De diferentes marcas e valores, é acessível no mercado tanto para os menores quanto os maiores clubes. Concomitantemente, o preparador físico deve ter seu trabalho alinhado com o departamento de Fisiologia (se houver), pois tanto as avaliações subjetivas (Escala de Borg, por exemplo) quanto as diretas (CK, por exemplo) nos oferecem dados próximos da realidade do jogo, desde que sejam interpretados dentro do CONTEXTO. Vale ressaltar que essas concepções não são verdades absolutas. A comunidade científica também é composta de grandes profissionais defensores de outras metodologias, sendo estes recheados de ótimos argumentos e defesas que normalmente geram discussões do mais alto gabarito, que devem servir exclusivamente para engrandecer aquilo que estamos em falta e, enquanto profissionais da área, temos por obrigação fazer: ESTUDAR FUTEBOL. Será uma enorme honra discutir futebol com os leitores desta coluna. Para isso, deixo nesse espaço meu email para contato: [email protected] Muito obrigado, e até a próxima! *Preparador Físico/Auxiliar Técnico das Categorias sub15 e sub17 da Associação Atlética Portuguesa Santista, disputante do Campeonato Paulista de Futebol (FPF) das respectivas categorias; Treinador de Futsal Masculino da Engenharia Unisanta, participante dos principais campeonatos universitários do Estado de São Paulo; Graduado em Educação Física e Esporte com ênfase em Futebol e Futsal pela Unisanta; Pós-graduado em Futebol e Futsal: Ensino-Aprendizagem-Treinamento pela Universidade Estácio.