TECNOLOGIA DE APLICAÇÃO DE DEFENSIVOS Prof. Dr. Ulisses Rocha Antuniassi FCA/UNESP - Botucatu/SP R. José Barbosa de Barros, 1780 - Botucatu/SP CEP 18610-307 - Fone: (14) 3811-7165 [email protected] 2 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Conceitos básicos de tecnologia de aplicação de defensivos Introdução O tamanho de gotas e o volume de aplicação são fatores básicos que devem ser considerados em primeiro lugar para o planejamento de uma aplicação. Os demais fatores importantes, como o momento da aplicação, as condições climáticas, a recomendação do produto e as condições operacionais, devem ser considerados em conjunto para que todo o sistema esteja ajustado, visando o máximo desempenho com o mínimo de perdas, sempre com o menor impacto ambiental possível. De maneira geral, os produtos com maior ação sistêmica, quando direcionados ao solo ou às folhas, podem ser aplicados com gotas maiores. Isso facilita a adoção de técnicas para a redução de deriva, melhorando a segurança ambiental da aplicação e aumentando a eficiência operacional das mesmas. Se usadas de maneira correta, gotas maiores geralmente oferecem bom nível de depósito (quantidade de defensivo depositado nos alvos), apesar de não proporcionarem as melhores condições de cobertura das folhas das culturas. Para os produtos de contato ou de menor ação sistêmica, o uso de gotas menores e/ou de maior volume de calda é necessário, devido à maior dependência dessa técnica com relação à cobertura dos alvos. Como exemplo, se o alvo da aplicação inclui a parte interna ou inferior das plantas, como no caso típico de uma aplicação preventiva de fungicidas para a ferrugem da soja, é necessária uma boa penetração da nuvem de gotas e, para tanto, devem ser usadas gotas finas ou muito finas. O estudo das características dos alvos deve incluir a análise de outros fatores, como movimentação das folhas, estágio de desenvolvimento das plantas, cerosidade, pilosidade, rugosidade, face da folha em que a cobertura é mais importante (superior/inferior) e arquitetura geral da planta. Na diferenciação entre plantas como alvos de aplicações, a posição e o formato das folhas apresentam importância fundamental. Por exemplo, as folhas das monocotiledôneas são geralmente mais estreitas e se posicionam na vertical, enquanto as folhas das dicotiledôneas são mais largas e permanecem na horizontal. Esses fatores são fundamentais para a definição da retenção das gotas nas folhas e na própria eficiência de penetração dos defensivos nos tecidos vegetais. Por esse motivo, em muitos casos, a tecnologia de aplicação que é mais adequada ao milho pode não ser a melhor para a soja, e vice-versa. A cobertura dos alvos de uma aplicação pode ser definida genericamente pela fórmula de Courshee (1967): VRK2 C = 15 AD Onde: V = Volume de aplicação R = Taxa de recuperação da calda nas folhas K = Fator de espalhamento de gotas A = Área foliar D = Diâmetro das gotas Assim, em termos genéricos, para melhorar a cobertura de uma aplicação deve-se adotar gotas mais finas ou volumes maiores; na aplicação de volumes mais baixos, as gotas mais finas devem ser preferidas, para que se consiga uma boa cobertura com a calda pulverizada, e se a escolha recair sobre as gotas maiores, o volume de calda deve ser igualmente aumentado para que se possa garantir um nível mínimo de cobertura para o tratamento. Por esses motivos, um dos princípios básicos da tecnologia de aplicação é que não existe uma solução única que atenda a todas as necessidades. É necessário, primordialmente, que a tecnologia seja ajustada para cada condição de aplicação. 3 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Para que se faça o ajuste do tamanho das gotas e do volume de calda, várias ações podem ser planejadas dentro do manejo dos parâmetros de uma aplicação. Para reduzir o tamanho das gotas, as pontas de jato plano (leque) podem ser substituídas pelas pontas de jato plano duplo (duplo leque) ou cônico vazio; a pressão de trabalho das pontas pode ser aumentada e um adjuvante espalhante (surfactante) pode ser adicionado à calda. Para aumentar o tamanho das gotas, as pontas de jato plano (leque) podem ser substituídas pelas pontas de pré-orifício ou indução de ar; a pressão de trabalho pode ser reduzida e um adjuvante pode ser adicionado à calda (óleos ou espessantes de calda, cuja ação produza gotas de maior tamanho). No caso do volume de calda, sua variação deve ser feita tanto pela troca das pontas como pela variação da velocidade de deslocamento do pulverizador. Condições climáticas Outro parâmetro fundamental para o sucesso do tratamento é a adequação da tecnologia de aplicação às condições climáticas. Para a maioria dos casos, devem ser evitadas aplicações com umidade relativa inferior a 50% e temperatura ambiente maior que 30oC. No caso do vento, o ideal é que as aplicações sejam realizadas com vento entre 3 e 10 km/h. Ausência de vento também pode ser prejudicial, em função da chance de ocorrer ar aquecido ascendente, o que dificulta a deposição das gotas pequenas. Esses limites, entretanto, devem ser considerados e eventualmente flexibilizados de acordo com a tecnologia de aplicação que será utilizada. Como exemplo, o uso de gotas grossas ou muito grossas pode facilitar o trabalho um pouco além dos limites, sempre com o cuidado para que a aplicação não seja feita em condições muito extremas com relação ao clima. Mesmo dentro das faixas de trabalho relativas a esses limites, as características da técnica utilizada devem ser consideradas no momento da tomada de decisão. Um exemplo de otimização da escolha do tamanho de gotas em função das condições climáticas (umidade e temperatura, neste caso) pode ser observado na Tabela 1. Nesta forma de raciocínio o princípio a ser utilizado é o da adoção da gota mais segura dentro dos limites de cada situação. Assim, se a umidade permite uma gota muito fina, mas a temperatura indica que o melhor seria uma gota fina, a gota maior (fina) deve ser a escolhida, por ser a mais segura para tal situação (menor risco de perdas por deriva e evaporação). Tabela 1. Exemplo de relação prática entre as condições climáticas e a escolha do tamanho das gotas (Fonte: Antuniassi et al., 2005) Limites climáticos X Classe de gotas Classes de gotas Muito Finas ou Finas Finas ou Médias Médias ou Grossas Temperatura abaixo de 25oC 25 a 28oC 28 a 30oC Umidade relativa acima de 70% 60 a 70% 50 a 60% 4 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S O início da manhã, o final da tarde e a noite são períodos em que a umidade relativa é maior e a temperatura é menor, sendo considerados mais adequados para as aplicações. Na prática, é possível e recomendável a utilização de gotas finas nesses horários. Porém, é necessário um monitoramento das condições ambientais com o passar das horas do dia, pois, no caso de haver um aumento considerável da temperatura (com redução da umidade relativa), o padrão de gotas precisa ser mudado (passando-se a usar gotas maiores). Neste caso, o volume de aplicação deve ser aumentado, para não haver efeito negativo na cobertura dos alvos. Chuva e orvalho são fatores climáticos que também requerem atenção no momento do planejamento das aplicações. No caso da chuva, recomenda-se bastante cuidado na observação do intervalo mínimo de tempo entre a aplicação e a ocorrência da chuva, visando permitir o tempo mínimo para a penetração e absorção dos ingredientes ativos. No caso do orvalho, a presença de água nas folhas pode causar interferência na técnica de aplicação. O risco de um eventual escorrimento está ligado ao uso de espalhantes (surfactantes) na calda. Entretanto, existem situações, dependendo da técnica empregada e do tipo de defensivo utilizado, em que a ação do orvalho pode ser benéfica (muitos fungicidas se posicionam nesta situação). A aplicação noturna apresenta vantagens no que se refere às condições climáticas (umidade, temperatura e vento mais adequados à aplicação de gotas mais finas), mas esta opção deve considerar a possível existência de limitações técnicas relativas aos próprios defensivos, no que se refere às questões de eficiência e velocidade de absorção/penetração nas situações de ausência de luz ou baixas temperaturas. Tamanho de gotas Atualmente, as gotas produzidas por uma ponta são classificadas como “muito finas”, “finas”, “médias”, “grossas” e “muito grossas” (em algumas normas de classificação de pontas existe também a classe “extremamente grossa”). Para a classificação de uma determinada ponta usando-se esse conceito, o seu diâmetro mediano volumétrico (DMV), medido em micrômetros (μm), deve ser comparado ao obtido por pontas de referência avaliadas utilizando-se o mesmo método de determinação do tamanho das gotas. Tomando-se como base a norma ASAE S572, se uma ponta apresenta DMV inferior ao obtido para uma ponta 11001 operando a 4,5 bar, o spray é classificado como “gotas muito finas”; se o DMV é intermediário entre o obtido por uma ponta 11001 (operando a 4,5 bar) e uma ponta 11003 (operando a 3,0 bar), o spray é classificado como “gotas finas”; se o DMV é intermediário entre o obtido por uma ponta 11003 (operando a 3,0 bar) e uma ponta 11006 (operando a 2,0 bar), o spray é classificado como “gotas médias”; se o DMV é intermediário entre o obtido por uma ponta 11006 (operando a 2,0 bar) e uma ponta 8008 (operando a 2,5 bar), o spray é classificado como “gotas grossas” e, finalmente, se o DMV é maior do que o obtido por uma ponta 8008 operando a 2,5 bar, o spray é classificado como “gotas muito grossas”. A classe de tamanho de gotas é um bom indicativo da capacidade da pulverização em cobrir o alvo e penetrar na massa das folhas. Gotas menores possuem melhor capacidade de cobertura (oferecem maior número de gotas/cm2), assim como propiciam maior capacidade de penetração, e são recomendadas quando é necessária boa cobertura e boa penetração. Entretanto, gotas pequenas podem ser mais sensíveis à evaporação e aos processos de deriva. Na T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S maioria dos sistemas de produção, as gotas grossas são preferidas para aplicação de herbicidas de grande ação sistêmica, enquanto as gotas finas são mais utilizadas para inseticidas e fungicidas. É importante ressaltar, entretanto, que, mesmo quando é utilizada uma ponta que produz gotas predominantemente grossas, há uma pequena parte do volume aplicado que é formada por gotas finas (sensíveis ao processo de deriva). Isso significa que uma determinada ponta não produz todas as gotas do mesmo tamanho, mas sim uma faixa de tamanhos de gotas (chamada de espectro da pulverização). Para uma determinada ponta, quanto maior a porcentagem de gotas finas que fazem parte do espectro produzido, maior o risco de deriva. Esse conceito tem sido utilizado em diversos países para fundamentar uma nova classificação de pontas, a qual avalia o seu “risco de deriva”. Essa classificação baseia-se na comparação da porcentagem de redução da deriva entre a ponta avaliada e uma ponta-padrão. Nos países onde esse conceito foi implantado (principalmente na Europa), alguns produtos fitossanitários passaram a ter reco- 5 mendação no rótulo da embalagem quanto ao tipo de ponta que deve ser utilizado, em função de seu potencial de redução de deriva. As perdas reduzem a dose real dos produtos sobre os alvos e podem ser classificadas como “perdas físicas” e “perdas químicas” (Tabela 2). Apesar do termo deriva ser utilizado de maneira geral, existem vários tipos de deriva. A deriva é o desvio do produto aplicado, fazendo com que esse não atinja o alvo da aplicação; endoderiva é a perda do produto dentro dos domínios da planta (ex.: escorrimento causado por excesso de calda ou gotas muito grandes); exoderiva é a perda do produto fora dos domínios da planta (ex.: gotas muito pequenas levadas por correntes de ar); evaporação é a perda de gotas pequenas em condições climáticas desfavoráveis (baixa umidade e alta temperatura do ar). Tabela 2. Resumos das perdas que podem reduzir a dose real dos produtos sobre os alvos das aplicações. Perdas físicas Perdas químicas Deriva e evaporação Inativação dos ativos pela presença de cátions e coloides na água Escorrimento e rebote das gotas Degradação dos ativos por pH inadequado e fotodegradação (raios UV) Lavagem do produto pela chuva Misturas de tanque inadequadas (decantação, floculação e antagonismo de produtos) 6 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S ADJUVANTES O uso de adjuvantes de calda tem se tornado muito popular, havendo necessidade de ampla discussão sobre as reais funções dos produtos disponíveis no mercado. Os adjuvantes podem atuar em todas as etapas do processo de aplicação de um produto fitossanitário, desde a formação das gotas (pulverização) até a ação biológica do ativo no alvo. A Figura 1 apresenta todas as etapas do processo de aplicação em que os adjuvantes podem ter influência no comportamento do sistema. A Tabela 3 mostra uma classificação dos principais adjuvantes de acordo com a função esperada e a recomendação de necessidade de uso. Pulverização Transporte até o alvo Impacto das gotas Melhoramento, espalhamento e retenção Figura 1 (ao lado). Etapas do processo de aplicação onde os adjuvantes podem ter influência no comportamento resultado da aplicação. Fonte: Knowles (2006). Evaporação Efeitos dos depósitos Absorção e translocação Efeito biológico Tabela 3. Classificação funcional e recomendação de uso de alguns tipos de adjuvantes. Classe de função (exemplos de produtos) Recomendação de uso Espalhantes (surfactantes) Folhas com dificuldade de molhamento, grande superfície foliar a ser coberta, necessidade de emulsificação de produtos. Adesivos (óleos e derivados de látex) e penetrantes (óleos e surfactantes) Necessidade de acelerar ou incentivar a penetração, absorção e adesão do defensivo nas folhas (ex.: risco de chuva). Umectantes (poliglicol, sorbitol) Redução do risco de evaporação. Condicionadores de calda: acidificantes (ácidos), tamponantes (ácido cítrico), sequestrantes (EDTA) Risco de inativação e/ou degradação dos ativos devido a características da água: água dura (sequestrantes), pH inadequado (acidificantes e tamponantes). Espessantes (polissacarídeos) Risco de deriva: redução da formação de gotas muito finas no espectro de gotas. Antiespumantes (organossilicones) Formação de espuma. Protetores (“extenders”): filtro de UV Risco de fotodegradação. 7 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Espalhantes (surfactantes) Os surfactantes têm como função principal aumentar a área de contato das gotas com os alvos, melhorando o espalhamento da calda e o molhamento da superfície tratada. A maior área de contato é obtida pela redução da tensão superficial (TS), que é a força interna do líquido que mantém suas moléculas unidas, dificultando o seu espalhamento em uma determinada superfície. A Figura 2 mostra o comportamento da TS de acordo com a concentração de um agente surfactante. Um efeito importante do aumento da área de contato é o potencial de melhoria da penetração e absorção dos defensivos, justamente devido a essa maior área de contato. Nesse caso, para alguns defensivos, pode ocorrer inclusive o aumento da penetração pelos estômatos das folhas. Os surfactantes atuam também nas interfaces entre as diferentes fases de uma calda formada pela mistura de componentes, permitindo a formação de emulsões (misturas de água e óleo). Os surfactantes, assim como a maioria dos demais adjuvantes, devem ser recomendados pela concentração em relação à calda preparada, de forma que se possa reduzir a chance de erros por deficiência ou excesso de produto, no caso da alteração do volume de calda de uma aplicação. 80 Tensão Superficial (mN/m) 70 60 50 40 30 20 10 0 0 0,25 0,5 0,75 Concentração do adjuvante (%) Figura 2. Comportamento da TS de acordo com a concentração de um agente surfactante (Fonte: Antuniassi, 2006) 1 8 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Óleos A adição de óleo na calda tem como funções principais melhorar a penetração e adesão dos defensivos nas folhas. Os óleos atuam também no processo de formação de gotas, induzindo o aumento no tamanho médio das gotas e a redução da formação de gotas muito finas no espectro, atuando, dessa maneira, como um agente antideriva. Em alguns casos o óleo pode também melhorar o espectro de gotas de uma pulverização, reduzindo a variabilidade do tamanho das gotas produzidas. Os óleos adjuvantes são disponibilizados normalmente nas seguintes categorias: • Óleo mineral formulado: contendo 95 a 99% de óleo mineral + 1 a 5% de surfactante; • Óleo vegetal formulado: de 93 a 98% de óleo vegetal + 2 a 7% de surfactante; • Óleo vegetal modificado (MSO): ésteres metilados ou etilados, obtidos a partir de óleos de sementes (soja, algodão, etc.). Esses adjuvantes são óleos vegetais com maior poder solvente (próximos ao de um óleo mineral), apresentando melhor poder penetrante do que os óleos vegetais comuns; • Óleo vegetal (ex.: óleo degomado de soja ou algodão): são óleos vegetais não modificados, de menor poder solvente, normalmente recomendados em maiores concentrações. São óleos que precisam ser usados em conjunto com os emulsionantes para que possam ser misturados na calda. O uso de óleo como adjuvante com as funções de adesão e penetração se baseia nas características do óleo como solvente das ceras e das camadas superficiais das folhas das plantas. Neste sentido, os óleos minerais são solventes melhores do que os vegetais e, por isso, as concentrações normalmente utilizadas para os óleos minerais são sempre menores do que no caso dos óleos vegetais. No que se refere a esta característica, o tipo de óleo e a concentração do mesmo devem ser referenciados por uma recomendação do fabricante do defensivo em questão, visto que algumas formulações apresentam recomendações específicas quanto ao uso ou não de óleo adjuvante na calda. Ainda, a ação dos óleos na adesão e penetração dos produtos pode ajudar na proteção das aplicações no caso da ocorrência de chuvas. Em geral, óleos minerais e óleos vegetais modificados são recomendados em concentrações de até 1%. Os óleos vegetais não modificados podem ser utilizados em concentrações maiores, que podem alcançar até 20%. Em termos ambientais, os óleos vegetais possuem uma vantagem: como são produtos naturais e biodegradáveis, os adjuvantes à base de óleo de origem vegetal apresentam menor efeito poluente. Por essa razão, existe uma tendência mundial de substituição dos óleos minerais pelos vegetais no uso como adjuvantes nas pulverizações agrícolas. T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S A substituição de óleo vegetal por mineral, e viceversa, deve ser precedida de uma análise da real necessidade do sistema de aplicação. Se o óleo está sendo usado como adjuvante para modificar o espectro de gotas e reduzir o risco de deriva, o volume de óleo presente na calda é o fator mais importante, ou seja, quanto mais óleo, melhor. Assim, a preferência é para o óleo vegetal, que normalmente é usado em maiores concentrações na calda. Se o óleo está sendo usado para facilitar a penetração do produto, então o óleo mineral ou o vegetal modificado podem ser eficazes mesmo em baixas concentrações, devido ao maior poder de solvente. 9 Influência de adjuvantes e formulações na tecnologia de aplicação Um fator importante a ser considerado na definição da técnica de aplicação é a influência dos componentes da calda no processo de formação de gotas a partir da ponta, o qual pode ser significativamente alterado pela modificação de características físicas do líquido em questão. Assim, fatores básicos como tamanho médio e espectro de gotas podem ser alterados de maneira tão significativa por variações na calda quanto pela própria troca das pontas de pulverização. Por esse motivo, o uso de adjuvantes de calda deve ser precedido de um rigoroso estudo das possíveis interações com as formulações dos produtos a serem aplicados. De maneira geral, os surfactantes utilizados isoladamente podem induzir a redução do tamanho médio das gotas, ocorrendo o oposto quando da mistura de óleo na calda (formação de emulsão). As Figuras 3 e 4 mostram o comportamento de diferentes caldas quando da utilização de diferentes adjuvantes. 10 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S 310 290 DMV (µm) 270 250 230 210 190 0,5 % de surfactante 170 Apenas água 150 0,5 % de óleo 0 11002 11004 Figura 3. Diâmetro médio das gotas no espectro gerado por uma ponta 11002 e uma 11004, aplicando calda com 0,5% de surfactante, apenas água e 0,5% de óleo (adaptado de Butler-Ellis, 2004) % do volume pulverizado 10 Água 0,5 % surfactante 8 0,5% emulsão 6 0,5 % emulsão + 0,5% surfactante 4 2 0 2 3 4 5 6 7 Distância (m) Figura 4. Percentual de deriva gerada por uma ponta 11002 aplicando caldas com diferentes adjuvantes, em função da distância de coleta a partir da projeção da ponta de pulverização (adaptado de Butler-Ellis, 2004) 11 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S As formulações dos produtos fitossanitários e a tecnologia empregada na pulverização respondem de maneira diferente às diferentes classes de adjuvantes. A Figura 5 mostra o exemplo de uma calda contendo glifosato que recebeu a mistura de dois tipos de adjuvantes: um surfactante e um antideriva (Li 700). É possível observar que o uso de surfactante aumentou o percentual de gotas abaixo de 100 µm e diminuiu o percentual de gotas na faixa de 200 a 300 µm, ocorrendo o inverso quando do uso do produto Li 700. Essa mudança no espectro das gotas produzidas pela ponta indica a interação entre a técnica, a formulação e o adjuvante, representando o efeito esperado de um adjuvante antideriva e de um espalhante quando misturados à calda. % do volume pulverizado 45 40 35 30 25 20 15 10 5 0 < 100 100-200 200-300 300-400 > 400 Classe de gotas glifosato+surfactante glifosato+Li 700 Figura 5. Espectro de gotas de uma ponta de pulverização quando da aplicação de caldas contendo glifosato e diferentes adjuvantes. Fonte: De Sangosse (2007) Condicionadores de calda O pH da calda e a dureza da água são fatores que podem influenciar no desempenho de um tratamento fitossanitário. O pH é uma função do CO2 presente na água, de sua temperatura, da presença de carbonatos e bicarbonatos, entre outros fatores. Essa característica pode induzir à inativação ou degradação de alguns ingredientes ativos. No caso da água dura, o fator preponderante é a presença de cálcio e magnésio, que podem se ligar às moléculas dos ativos dos defensivos. Em ambos os casos o uso de adjuvantes deve ser programado de acordo com as necessidades. Como exemplo, os agentes acidificantes e tamponantes são utilizados para ajuste de pH, enquanto os quelatizantes são úteis no caso do uso de água dura. 12 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S SISTEMAS DE APLICAÇÃO TERRESTRE O avanço no desenvolvimento da tecnologia de aplicação permite a opção de uso das aplicações terrestres em baixo volume com desempenho similar ao das aplicações convencionais, desde que realizadas dentro dos critérios de respeito aos limites climáticos. As diversas famílias de pontas hidráulicas oferecem opções variadas dentro das classes de tamanho de gotas, desde aquelas direcionadas ao controle do risco de deriva (indução de ar e pré-orifício) até os modelos cujo objetivo é maximizar a cobertura dos alvos (jato plano duplo ou cone). Ainda, os acessórios que permitem a aplicação simultânea com mais de uma ponta em cada posição na barra (Figura 6) oferecem a flexibilidade necessária para a adequação do tamanho de gotas às necessidades de cada momento da aplicação, aliada à angulação das pontas, para obtenção de melhor distribuição da calda. Os pulverizadores de barras podem ser também equipados com sistemas eletrostáticos (Figura 7), assistência de ar (Figura 8) ou mesmo atomizadores rotativos (Figura 9), aumentando ainda mais a disponibilidade de opções para a melhor adequação da técnica de aplicação com os requisitos de cada tipo de trabalho. Figura 6. Sistema de capa dupla Twin Cap/Hypro Figura 7. Sistema de aplicação eletrostática ESP/AGCO Figura 8. Barra com assistência de ar Vortex/Jacto Figura 9. Barra com atomizadores rotativos de discos Turbotrator/CBB (foto: Paulo Coutinho) (foto: Ulisses Antuniassi) (foto: Ulisses Antuniassi) (foto: Ulisses Antuniassi) T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S A escolha de um sistema de aplicação deve ser pautada na avaliação das características de cada alvo e nos parâmetros de desempenho esperado de cada tecnologia. Como exemplos, a aplicação de herbicidas pós-emergentes de grande ação sistêmica (como o glifosato) pode ser realizada com pontas de indução de ar ou pré-orifício, buscando-se reduzir ao máximo o risco de deriva, enquanto os jatos planos duplos podem ser utilizados para as aplicações de gotas finas no caso de defensivos que necessitem de maior cobertura dos alvos. A tecnologia de aplicação eletrostática é uma das opções para a viabilização de baixos volumes, principalmente quando os alvos se encontram nas partes intermediárias ou superiores da massa de folhas das plantas. No caso das barras com assistência de ar, seu uso possibilita um potencial de redução do risco de deriva e melhoria da deposição e cobertura das folhas. Ainda, quando a cultura se encontra com grande enfolhamento, a assistência de ar pode ajudar na capacidade de penetração da pulverização e na redistribuição das gotas por entre as folhas das plantas. A aplicação com pulverizadores de barras em baixo volume também foi beneficiada com o desenvolvimento dos atomizadores rotativos para equipamentos terrestres. Nesses sistemas é possível obter um espectro mais adequado (menor variação no tamanho das gotas geradas) do que com as pontas hidráulicas convencionais, melhorando ainda mais o desempenho quando da utilização de volumes reduzidos. 13 As pontas de pulverização têm papel fundamental no desempenho dos pulverizadores de barras. A Tabela 4 mostra a cobertura das folhas de soja de acordo com diferentes tratamentos de aplicação terrestre. Observa-se que as gotas muito finas apresentam maior potencial de cobrir as folhas nas partes baixas das plantas, notadamente em comparação às gotas muito grossas. Esse fato evidencia a necessidade de se utilizar gotas menores quando há necessidade de maximizar a cobertura dos alvos. Por outro lado, as Figuras 10 e 11 mostram que, apesar das gotas muito finas cobrirem melhor os alvos, elas nem sempre são responsáveis pelas melhores condições de depósito de produto (quantidade de ativo sobre as folhas). Esse fato acontece devido ao maior potencial de deriva das gotas muito finas, comparadas às gotas médias, entre outros fatores. Por essa razão, quando a aplicação precisa fornecer a máxima cobertura das folhas, como num tratamento com fungicida de menor ação sistêmica, a preferência deve ser dada para as gotas mais finas. No caso de produtos de maior ação sistêmica, pode haver vantagem no uso de gotas médias, visto que as mesmas vão aumentar a deposição (quantidade) de ativo, notadamente pelo menor índice de deriva observado. 14 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Tabela 4. Porcentagem de cobertura da face superior das folhas de soja proporcionada pela aplicação terrestre com volume de calda de 100 L/ha, de acordo com a posição de amostragem das folhas nas plantas e as características de cada tratamento (Fonte: Antuniassi et al., 2004b) Posição da folha Tipo de ponta Pressão (kgf/cm2) Classe de gotas % de cobertura das folhas Alta XR 11002 Plano Alta AI 11002 Plano com indução de ar Alta TX VK6 Cone vazio 20,0 Alta TJ 60 11002 Plano duplo Média XR 11002 Média AI 11002 Média TX VK6 Cone vazio Média TJ 60 11002 Plano duplo Baixa XR 11002 Plano Baixa AI 11002 Plano com indução de ar Baixa TX VK6 Cone vazio 20,0 Muito fina Baixa TJ 60 11002 Plano duplo 4,0 Muito fina 7,23 ab 4,0 Fina 76,70 a 4,0 Muito grossa 70,83 a Muito fina 82,67 a 4,0 Muito fina 72,90 a Plano 4,0 Fina 28,50 ab Plano com indução de ar 4,0 Muito grossa 14,77 b 20,0 Muito fina 36,17 a 4,0 Muito fina 31,17 ab 4,0 Fina 6,53 ab 4,0 Muito grossa 2,87 b 14,00 a Em cada análise, as médias seguidas de mesma letra não diferem entre si pelo teste T ao nível de 5% de probabilidade. 0,45 0,40 Depósitos (uL/cm2) 0,35 0,30 0,25 0,20 0,15 0,10 0,05 XR 11003 TX VK8 0 Alta Média Baixa Posição na planta Figura 10. Depósitos médios de fungicida nas folhas de soja em cada posição de amostragem nas plantas, de acordo com tratamentos de aplicação terrestre onde foram utilizadas as pontas XR 11003 (gotas médias) e TX VK8 (gotas muito finas). Fonte: Antuniassi et al. (2004a) 15 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S 90 % de cobertura das folhas 80 70 60 50 40 30 20 10 XR 11003 TX VK8 0 Alta Média Baixa Posição na planta Figura 11. Porcentagem de cobertura da face superior das folhas de soja em cada posição de amostragem nas plantas, de acordo com tratamentos de aplicação terrestre onde foram utilizadas as pontas XR 11003 (gotas médias) e TX VK8 (gotas muito finas). Fonte: Antuniassi et al. (2004b). Um fator de grande interesse no planejamento das aplicações terrestres é o potencial de danos mecânicos devido ao amassamento causado pelo tráfego dos pulverizadores sobre a cultura. Muitas informações desencontradas sobre o tema podem ser encontradas, notadamente, quando se busca informações na internet. Entretanto, no período 2007/2008 alguns trabalhos científicos foram publicados discutindo o tema, tanto no Brasil como no exterior. Os pesquisadores observaram que os danos mecânicos são variáveis de acordo com a cultura e o tipo de equipamento, podendo ser bastante reduzidos em condições de tráfego controlado (passar com o pulverizador sempre no mesmo rastro). A utilização de pulverizadores autopropelidos com pneus estreitos e barras de grande dimensão (situação comum no Centro-Oeste brasileiro) também é fundamental para a redução das perdas. A Tabela 5 apresenta um sumário dos resultados dessas pesquisas. 16 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Tabela 5. Percentual de perdas de produtividade devido aos danos mecânicos causados pelos pulverizadores autopropelidos em condições de tráfego controlado, considerando equipamentos com rodado estreito. Autor País Cultura Abi Saab et al. (2007) Brasil Trigo 12 9,3 Abi Saab et al. (2007) Brasil Trigo 24 4,6 Abi Saab et al. (2007) Brasil Soja 12 1,4 Abi Saab et al. (2007) Brasil Soja 24 0,7 Camargo et al. (2008) Brasil Soja 27,5 1,0 Conley et al. (2007) EUA Soja 27 1,1 Hanna et al. (2007) EUA Soja 36 0,8 Alguns dos autores pesquisados argumentam que, se a aplicação é realizada em sistema de tráfego controlado, com todas as aplicações sendo realizadas precisamente no mesmo rastro, as perdas são minimizadas, independente do sentido de deslocamento das faixas (longitudinal ou transversal às linhas de Barra (m) Perdas % plantio). Com efeito, para que se possa trabalhar nessas condições, é importante o uso de tecnologia avançada para a demarcação das faixas e controle do deslocamento dos pulverizadores, como os sistemas de GPS com barra de luzes e piloto automático. T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S 17 CALIBRAÇÃO DE PULVERIZADORES Anualmente, cerca de 70% dos pulverizadores inspecionados no Projeto IPP (Inspeção Periódica de Pulverizadores) apresentam erros significativos na calibração da taxa de aplicação. Esse fato é muito importante, pois mostra que não basta que a melhor técnica seja utilizada, mas é necessário que essa técnica seja utilizada de maneira adequada e precisa. Para tanto, é importante que operadores e técnicos sejam treinados para realizar as calibrações de maneira adequada, procurando evitar erros que possam comprometer a viabilidade do controle fitossanitário. Avaliação das pontas de pulverização O primeiro passo para a calibração de um pulverizador é a avaliação da qualidade das pontas de pulverização. O processo é realizado pela determinação da vazão individual de cada ponta, utilizando o sistema gravimétrico (pesagem da calda, visando a estimativa do volume coletado). Para tanto, a coleta do líquido é realizada nas pontas durante um intervalo de 2 min (dois minutos), utilizando mangueiras fixadas aos corpos das pontas e baldes plásticos (Figuras 17 e 18). A seguir o líquido é pesado em balança com escala mínima de 5 g, calculando a vazão individual de cada ponta através da adoção do valor de densidade igual a 1, ou seja, 1,0 kg = 1,0 L. Esse método é mais preciso que a determinação volumétrica feita através de copos de calibração, onde ocorrem grandes erros ligados tanto à precisão do dispositivo quanto à forma de fazer a leitura do volume (nivelamento do copo, deformação do mesmo, erros de escala e erros de visualização dos valores na escala do copo, entre outros). A pesagem da calda pulverizada em cada ponta (determinação da vazão) deve ser realizada de acordo com o seguinte procedimento: A. Instalar a mangueira em cada ponta, de forma que a calda pulverizada seja facilmente coletada nos baldes. Essas mangueiras são compostas de um segmento de câmara de ar de pneu de bicicleta (15 cm) fixado na ponta de um pedaço de mangueira de 40 cm de comprimento (Figura 18a); B. Posicionar um balde na frente de cada mangueira. Esses baldes não precisam ser todos iguais, mas a capacidade mínima deve ser de 5 litros (Figura 18a); C. Montar duas equipes de duas pessoas. Cada equipe deve ter um cronômetro, visando fazer a coleta sequencial da calda nos baldes. Em cada equipe, uma pessoa maneja o cronômetro e a outra movimenta os baldes; D. Disparar os dois cronômetros ao mesmo tempo. A primeira equipe vai colocando os baldes debaixo das mangueiras a cada 5 s, sendo o primeiro balde colocado debaixo da primeira mangueira no instante “zero” (momento de disparo dos cronômetros). Essa equipe segue colocando um balde debaixo de cada mangueira a cada 5 s: a. Sequência: o primeiro balde no instante “zero”, o segundo balde aos 5 s, o terceiro balde aos 10 s, o quarto balde aos 15 s, e assim por diante; b. A segunda equipe fica com o outro cronômetro, aguardando posicionada próximo do primeiro balde. Quando o cronômetro completar 2 min de contagem, a equipe inicia a retirada dos baldes debaixo de cada mangueira, interrompendo a coleta de vazão: o primeiro é retirado aos 2 min, o segundo aos 2 min e 5 s, o terceiro aos 2 min e 10 s, o quarto aos 2 min e 15 s, e assim por diante; c. Após o término da coleta, quando a segunda equipe terminar de retirar o último balde, eles devem ser pesados na sequência de coleta. Deve ser considerada a primeira ponta (ou a ponta número 1) aquela mais à esquerda da barra, olhando por trás do pulverizador; 18 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S d. Na pesagem, deve ser descontado o peso do balde (tara da balança). Para tanto, é recomendado que a pesagem seja feita sempre num mesmo balde, vertendo o líquido coletado de cada ponta nesse balde de referência (Figura 18b); e. O valor do peso do líquido representa a vazão de calda em 2 min. Portanto, para determinar a vazão em L/min, os valores dos pesos do líquido de cada balde devem ser divididos por 2; f. A última etapa é a montagem de um gráfico de distribuição da vazão em cada ponta, ao longo da barra (Figura 19). Esse gráfico pode ser relacionado diretamente à vazão (L/min) ou ao volume aplicado (L/ha). Para a transformação de L/min para L/ha deve ser utilizada a Equação 1, juntamente com os dados de espaçamento entre pontas e velocidade de deslocamento: Figura 17. Exemplo do processo de coleta da calda para aferição da vazão de todas as pontas do pulverizador. A B Figuras 18. (a) Cronometragem para a coleta do líquido num intervalo de 2 min, com as mangueiras instaladas em cada ponta para facilitar a coleta no balde; (b) Processo de pesagem na balança. 19 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Taxa de aplicação (L/ha) 120 100 80 60 40 20 0 0 5 10 15 20 25 30 35 40 Bicos Figura 19. Exemplo de gráfico com as vazões das pontas transformadas em valores de L/ha. Neste caso, podem ser observados problemas nas pontas 3, 17, 21, 23 e 33: o número 3 com entupimento e os demais com excesso de vazão, o que pode caracterizar desgaste excessivo. Equação 1 L/ha = L/min x 600 km/h x E Onde: L/min = vazão da ponta L/ha = volume de calda km/h = velocidade de aplicação E = espaçamento entre pontas (em metros) A seguir, os dados de vazão das pontas são processados em planilha eletrônica para o cálculo do número de pontas inadequadas. Esse cálculo é feito em duas etapas. Inicialmente, são eliminadas da amostra as pontas que apresentaram vazão menor do que 85% da média geral do lote. Nesse processo, é considerado que uma ponta com restrição de vazão superior a 15% em relação à média representa um caso provável de entupimento. Assim, as pontas consideradas entupidas, nessa determinação de vazão, são eliminadas do cálculo da média real da vazão do lote. A seguir, numa segunda fase, deve-se calcular uma nova mé- dia da amostra (desconsiderando os entupimentos). Essa média é então utilizada para o cálculo e identificação das pontas que apresentam variação superior a ± 10% com relação a essa nova média calculada, as quais são consideradas inadequadas. A ocorrência de uma ponta inadequada no lote configura um caso de ausência de conformidade, indicando necessidade de manutenção. Após a determinação do número de pontas que ultrapassam o valor-limite de variação (± 10%), a decisão de troca de todo o lote é tomada de acordo com o seguinte critério: quando mais de 10% do número de 20 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S pontas do lote apresenta problemas, é recomendada a troca de todo o lote. No caso de haver um número pequeno de pontas nesta situação (menos de 10% deles), é sugerida a substituição individual de cada ponta. Entretanto, quando a substituição parcial é realizada, deve-se aferir a vazão das novas pontas e refazer o cálculo, pois a mistura de pontas novas e usadas pode causar grande variação na vazão entre estas. Seleção das pontas Para obtenção do máximo desempenho, é necessário que o equipamento de pulverização esteja muito bem ajustado ou calibrado, de forma a proporcionar uma qualidade mínima da aplicação. A calibração do pulverizador não só objetiva ajustá-lo para a aplicação do volume de pulverização desejado, mas também para a detecção e correção de possíveis falhas de funcionamento. A calibração deve ser realizada no início dos trabalhos de pulverização, assim como toda vez que houver alguma mudança das condições de aplicação, como troca de pontas, troca de defensivo ou dose deste. Além disso, o pulverizador deve ser recalibrado periodicamente, mesmo se a aplicação for realizada durante um longo tempo com as mesmas condições. Essa calibração periódica deve ser realizada devido aos desgastes de alguns componentes, como as próprias pontas, ou em função de perda de ajustes causada pela vibração, situação inerente ao trabalho de campo. Mesmo os sistemas que apresentam computadores para controle de fluxo precisam de calibração periódica. Durante a calibração, alguns passos básicos devem ser seguidos: •Abastecer o tanque com água limpa e usar EPI; •Funcionar o pulverizador na procura de vazamentos; •Determinar a distância entre as pontas, em metros; •Determinar a velocidade de trabalho em um terreno plano, de características semelhantes às condições de pulverização. Para um maior rendimento da operação, a velocidade de pulverização pode ser a máxima possível, desde que esteja no limite de manter a barra operando com estabilidade adequada, sem comprometer a qualidade da pulverização. Para a determinação da velocidade deve-se medir uma distância entre duas marcas (estacas ou marcas no solo), preferencialmente acima de 50 m. O pulverizador deve percorrer essa distância, iniciando o percurso, pelo menos, 5 m antes da marca inicial e na marcha e rotação de trabalho. Para a anotação do tempo de deslocamento, em segundos, deve ser considerada a média de duas repetições. A velocidade pode ser obtida pela Equação 2: velocidade = (km/h) distância (m) x 3,6 tempo (s) •A partir dos dados de volume de calda desejado, velocidade aferida e espaçamento, calcular a vazão necessária, em cada ponta, utilizando a Equação 3: L/min = L/ha x km/h x E 600 Onde: L/min = vazão da ponta L/ha = volume de calda km/h = velocidade de aplicação E = espaçamento entre pontas (em metros) •Selecionar a ponta mais adequada: a seleção depende, diretamente, da análise de todas as características do processo de aplicação. Isso ocorre em função da dependência do tamanho das gotas em relação ao tipo de ponta e à pressão de trabalho, entre outros fatores. Em termos gerais, o tamanho da gota se comporta de maneira inversamente proporcional à pressão de T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S trabalho de uma ponta. Assim, para a obtenção de gotas maiores a pressão tem que ser reduzida, sendo o inverso também verdadeiro. A denominação de “famílias” ou “séries” de pontas depende de cada fabricante e das características específicas de cada produto. Os principais tipos de pontas disponíveis são descritos a seguir: •Jato plano comum (séries TP, SF, API, etc.): pontas com perfil de tendência mais uniforme de tamanho de gotas em função da pressão; •Jato plano de uso ampliado (XR, UF, AXI, etc.): apresenta maior variabilidade no tamanho de gota em função da variação da pressão (gotas maiores em baixa pressão e gotas menores em alta pressão); •Jato plano de baixa deriva (séries DG, LD, ADI, etc.): pontas com perfil de gotas grandes, visando diminuir o risco de deriva; •Jato plano duplo (série TJ): cada ponta de jato plano duplo é formada por duas pontas de jato simples, unidas no mesmo corpo. Por esse motivo apresentam, normalmente, perfil de gotas mais finas do que as pontas de vazão equivalente de jato simples. Como exemplo, uma ponta de jato duplo 11002 equivale à união de duas pontas 11001; •Jato cônico vazio (séries TX, JA, entre outros): apresentam perfil de gotas finas e muito finas, com grande capacidade de penetração e cobertura, mas com alto risco de deriva e evaporação; •Jato com indução de ar (séries AI, BJ, entre outros): apresentam perfil de gotas grossas e muito grossas, com inclusões de ar (bolhas de ar dentro das gotas). Em geral são caracterizados por apresentar baixa deriva. A cobertura de alvos planos pode ser melhor do que a proporcionada por gotas grandes de pontas sem indução de ar. Dependendo do fabricante, podem estar disponíveis no mercado pontas de indução de ar com jato plano, jato plano duplo ou jato cônico. 21 A classificação das condições de trabalho das pontas utilizadas no Brasil pode ser obtida em catálogos (impressos ou obtidos on-line nos sites das empresas), sendo que alguns fabricantes fornecem informações com maior ou menor grau de detalhamento. As informações mínimas necessárias devem indicar o padrão de tamanho de gotas (classificação de acordo com as normas internacionais, tal como a ASAE S572), assim como a vazão e a pressão de trabalho para cada classe indicada. Com base nos dados dessas tabelas, a seleção das pontas mais adequadas deve seguir o seguinte roteiro: a. definir as características técnicas da aplicação, como tipo de alvo, cobertura necessária, importância da penetração das gotas na massa de folhas, volume de calda, tamanho e densidade de gotas, risco de deriva, ou outras; b. definir as características operacionais da aplicação, como velocidade de trabalho e espaçamento entre pontas; c. a partir dos dados de volume, velocidade e espaçamento, calcular a vazão necessária, em cada ponta, utilizando a Equação 2; d. utilizando a vazão calculada, procurar nas tabelas a ponta que satisfaça os requisitos técnicos (características desejáveis da aplicação) e que forneça a vazão necessária. Exemplo do procedimento para a seleção de uma ponta Definir a seleção de pontas para a aplicação de herbicida pós-emergente com ação sistêmica em operação de dessecação para a cultura da soja: 22 T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S Dados da aplicação: • velocidade de trabalho: 12 km/h; • volume de calda: 100 L/ha; • Espaçamento entre pontas: 0,5 m. L/min = 100 x 12 x 0,5 = 1,0 600 Ou seja, a vazão em cada ponta deverá ser de 1 L/min. Considerando as características do trabalho pretendido (dessecação, tipo de herbicida, entre outros), a escolha pode ser feita para a aplicação com gotas grossas ou muito grossas. Assim, podem ser selecionadas duas opções: para aplicar gotas grossas, usar pontas de baixa deriva 11003, trabalhando com pressão entre 2 bar e 2,5 bar; para aplicar gotas muito grossas, a opção seria uma ponta com indução de ar 11002, que produz gotas muito grossas, trabalhando com pressão entre 4 bar e 5 bar. Calibração final Após a seleção da ponta e a sua instalação na barra, o pulverizador deve ser colocado na rotação do motor e na pressão de trabalho selecionadas, coletando a água pulverizada de acordo com a metodologia de inspeção descrita anteriormente (coleta de vazão de todas as pontas, usando os baldes e a balança). O procedimento de checagem de todas as pontas deve ser realizado periodicamente. É possível então calcular a média dessas vazões, determinando o volume de pulverização aplicado nessas condições. Se houver necessidade, a válvula reguladora de pressão deve ser ajustada para aumentar ou diminuir a vazão do sistema, buscando um volume de pulverização o mais próximo possível daquele desejado. Nas máquinas com computador de bordo, ajustar o volume desejado no painel de controle. No caso de comandos com retorno regulável para cada seção, tais válvulas também devem ser ajustadas quando há uma nova regulagem de pressão. Esse ajuste é realizado colocando o pulverizador em funcionamento, abrindo todas as seções das barras e visualizando a pressão do sistema pelo manômetro do pulverizador. Então, uma seção por vez é fechada e a válvula de retorno regulável, correspondente àquela seção, é regulada até o ponto onde a pressão se torna igual à pressão inicial antes do fechamento daquela seção. Uma vez calibrada uma seção, a mesma é aberta e uma próxima é fechada, repetindo o procedimento para todas as seções. Avaliação de erros na taxa de aplicação No cálculo de erros na calibração da taxa de aplicação, são consideradas inadequadas as máquinas com diferenças superiores a 5% entre a calibração real e aquela pretendida na aplicação. Tais erros dependem, fundamentalmente, dos erros cometidos pelo operador na calibração geral do pulverizador. Assim, parâmetros como velocidade (tempo aferido para o deslocamento em um determinado espaço), vazão das pontas, espaçamento entre pontas e pressão de trabalho apresentam grande importância na magnitude dos erros encontrados. Além disso, a maioria das máquinas que possuem computadores de bordo (controladores eletrônicos da pulverização) apresenta necessidade de recalibração periódica dos sensores de vazão e velocidade. Os erros de calibração nesses componentes são muito importantes para definir a porcentagem de erro de taxa de aplicação. No cálculo dos erros de calibração devem ser considerados fatores como a largura de trabalho (incluindo os erros de espaçamento) e a velocidade aferida. O valor real da calibração final deve ser obtido usando-se a média de vazão de todas as pontas (obtida dos dados de pesagem dos baldes). T E C N O LO GI A D E A P L I C A Ç Ã O D E D E F E N SI V O S 23 LITERATURA CONSULTADA ABI SAAB, O.J.G., COUTO, D.T.A., HIGASHIBARA, L.R. Perdas de produtividade causadas pelo rodado de pulverizadores. In: Congresso Brasileiro da Ciência Aeroagrícola 2007, Anais, Botucatu/SP: FEPAF, 2007, p.1-4. ANTUNIASSI, U.R. Tecnologia de aplicação de defensivos na cultura da soja. Boletim de pesquisa de soja, 2007. Rondonópolis/MT: Fundação MT, v.1, p.199-215, 2007. ANTUNIASSI, U.R. Tecnologia de aplicação para a cultura da soja. In: FMT em campo: é hora de cuidar da soja 2006. CD-ROM: Rondonópolis/MT: Fundação MT, 2006. ANTUNIASSI, U.R., BAIO, F.H.R., BIZARI, I.R. Sistema de suporte à decisão para seleção de pontas de pulverização em sistemas de aplicação de defensivos. In: V Congresso Brasileiro de Agroinformática, 2005, Londrina/PR. Agronegócio, Tecnologia e Inovação. Londrina/PR: SBI-Agro, 2005. v.1, p.1-2. ANTUNIASSI, U.R., BONELLI, M.A.P.O., CAMARGO, T.V., SIQUERI, F.V. Desempenho de sistemas de aplicação terrestre para o controle da ferrugem da soja. Documentos - Embrapa Soja. Londrina/PR, v.257, p.217-218, 2005a. 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