A EXECUÇÃO PENAL NO TJRS: O CASO DA PRISÃO DOMICILIAR1
LUIZA COSTA HESS2
RESUMO
O presente trabalho tem por finalidade uma maior compreensão acerca
dos votos exarados pelos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio Grande
do Sul, no tocante à concessão da prisão domiciliar em situações excepcionais às
previstas na Lei de Execuções Penais. Para tanto, utilizou-se como método de
pesquisa revisão bibliográfica sobre a matéria; entrevista com juiz de direito atuante
na Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, momento em que se averiguou
como a prisão domiciliar era trabalhada no primeiro grau e, por fim, busca na sessão
de jurisprudência do sítio do TJRS, utilizando como data-base o ano de 2009, bem
como a realização de entrevistas com parcelas dos Desembargadores lotados nas
Câmaras Criminais para se apurar qual o entendimento majoritário, além das
particularidades existentes em cada voto proferido. Com base nesse conjunto de
dados apresentado, pode-se apurar que de 2009 até a presente data, algumas
Câmaras Criminais mudaram seu posicionamento frente à prisão domiciliar,
passando a conceder em caráter excepcional diante da ausência de vagas nos
estabelecimentos penais. Fora isso, se pode perceber uma preocupação muito
maior por parte dos julgadores frente à prisão domiciliar, para que se pudesse haver
justiça no caso concreto, ao darem maior valoração às informações prestadas pelo
juízo singular quanto a real situação vivida pela penitenciária da comarca objeto de
exame no agravo em execução.
1
Artigo extraído de Trabalho de conclusão de Curso como requisito parcial para a obtenção de grau
de Bacharel em ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul. Aprovação com grau 9,5 pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. Rodrigo
Ghiringhelli de Azevedo, pela Profª. Rosa Maria Zaia Borges e pelo Prof. Rodrigo Moraes de Oliveira
em 02 de dezembro de 2011.
2
Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul – PUCRS. E- mail: [email protected]
Palavras-chave: Prisão domiciliar. Sistema Prisional. Lei de Execuções Penais.
Regime aberto. Superlotação. Posicionamento.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo a análise das decisões
proferidas pelas Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no
tocante ao benefício da prisão domiciliar, nas hipóteses não elencadas na Lei de
Execuções Penais, bem como observar qual a motivação do julgador ao conceder,
ou não, a benesse.
A principal motivação para esta pesquisa é a grande divergência
existente nas Câmaras Criminais quanto ao tema, que emerge dentro de uma
discussão maior, que é a superlotação carcerária.
Para tanto, no primeiro capítulo, analisar-se-á como a questão da
prisão domiciliar vem sendo enfrentada no juízo de primeiro grau, por meio de
entrevista com o magistrado em substituição na Vara de Execuções Criminais da
comarca de Porto Alegre, momento em que se questionarão os critérios para
concessão, além de demais questões referentes ao procedimento adotado para o
deferimento da medida. Apurar-se-á, também, por meio de jurisprudência,
divergência quanto ao juízo competente para a fiscalização da prisão domiciliar.
No último capítulo do trabalho, abordar-se-á o elemento cerne da
presente pesquisa, qual seja, a análise dos julgamentos proferidos pelo TJRS no
tocante à prisão domiciliar para além do rol apresentado pelo art. 117 da LEP.
No primeiro ponto, serão examinados por meio de pesquisa na
jurisprudência do TJRS, quais os fundamentos utilizados pelos Desembargadores,
bem como eventuais particularidades em cada voto. No segundo ponto, será
discorrido o conteúdo das entrevistas realizadas com parcela dos Desembargadores
lotados nas Câmaras Criminais, instante em que apresentarão a sua opinião sobre o
tema. O último ponto tem como meta a contextualização do conteúdo apresentado
no capítulo, instante em que se trarão as conclusões pertinentes à pesquisa
especificamente no que se refere ao segundo grau de jurisdição.
Nota-se, a partir dos vieses trabalhados, que a questão da prisão
domiciliar gera bastante divergência no Tribunal de Justiça gaúcho, fazendo com
que a discussão do tema levante questões mais abrangentes, como a execução
penal, no todo, além de aspectos relacionados à segurança pública, na medida em
que a atual situação dos estabelecimentos penais é precária. Nesse sentido, o que
se pretende com o presente trabalho é uma maior compreensão sobre os
fundamentos utilizados pelos julgadores, e o que está por detrás destes argumentos.
1 A PRISÃO DOMICILIAR NO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU
1.1 ANÁLISE LEGAL E DOUTRINÁRIA
A prisão domiciliar tem previsão legal no art. 117 da Lei de Execuções
Penais e tem como finalidade o recolhimento de beneficiário de regime aberto em
residência particular, quando se tratar de condenado maior de 70 anos; acometido
de doença grave; condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental, ou
condenada gestante.3
O cumprimento de pena em regime de prisão domiciliar, como já
afirmado, anteriormente, tem gerado grandes discussões jurisprudenciais, uma vez
que já há alguns anos tem sido aplicada para condenados que cumprem pena em
regime aberto, em estabelecimento incompatível com esse regime, porque
superlotadas as casas prisionais.
E essa divergência se estende, também, aos doutrinadores do tema, o
que se passa, então, a analisar.
SCAPINI4, ao tecer considerações acerca da prisão domiciliar frisa,
primeiramente, que o art. 117 da LEP, não à toa, aparece na Seção II, Capítulo I da
Lei 7.210/84, uma vez que constitui uma forma de cumprimento da pena privativa de
liberdade, em específico, no regime aberto.
3
BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Diário Oficial da
União: p. 10227, Brasília, DF, 13 jul. 1984.
4
SCAPINI, Marco Antonio Bandeira. Prática de execução das penas privativas de liberdade. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 117.
Salienta, também, que nenhuma das condições previstas no art. 115 da
5
LEP apresenta-se em dissonância com a prisão domiciliar. Pelo contrário, tal
dispositivo sequer traz, de forma expressa, qual o local em que deverá ocorrer o
cumprimento da pena no regime aberto, o que leva a crer na viabilidade de
concessão do aprisionamento residencial.
Ademais, o referido autor discorre acerca da problemática constante no
sistema penitenciário e pontua que o dispositivo não apresenta hipóteses
exaustivas, utilizando como fundamento para tal assertiva, o fato de que a hipótese
prevista no inciso III, em face do princípio da igualdade, pode ser igualmente
aplicada nos casos de homem condenado, desde que anteriormente mantivesse a
guarda do filho menor ou deficiente.6
No mesmo diapasão, MESQUITA JÚNIOR7, ao discorrer sobre o tema
afirma que, muito embora a prisão domiciliar seja considerada para hipóteses
excepcionais, além do fato de o STF se posicionar no sentido de que a enumeração
do art. 117 seja taxativa, entende que o condenado deve ser beneficiado com esse
regime nos casos em que não exista casa de albergado na comarca, já que este não
pode sofrer gravames simplesmente porque o Estado deixou de cumprir seu papel.
Ainda, critica o posicionamento do Supremo Tribunal Federal ao asseverar que a
manutenção do apenado em regime incompatível ao de seu cumprimento viola os
direitos do condenado, constituindo excesso na execução.
MARCÃO8, ao tratar da prisão na modalidade domiciliar, elenca o rol de
possibilidades previstas no art. 117 da LEP e frisa o entendimento de que tais
5
Art. 115 da LEP: O Juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime
aberto, sem prejuízo das seguintes condições gerais e obrigatórias:
I - permanecer no local que for designado, durante o repouso e nos dias de folga;
II - sair para o trabalho e retornar, nos horários fixados;
III - não se ausentar da cidade onde reside, sem autorização judicial;
IV - comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas atividades, quando for determinado.
6
Op. cit., p. 118.
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática: doutrina,
jurisprudência, modelos. São Paulo: Atlas, 2005, p. 234.
8
MARCÃO, Renato Flávio. Curso de execução penal. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 133.
7
hipóteses são taxativas, não havendo falar, pois, em qualquer ampliação das
hipóteses constantes no dispositivo legal.
Tal posicionamento firmado por Marcão é mais latente quando se trata
das questões relativas ao regime semiaberto. O autor9 sustenta que, muito embora
seja razoável o argumento utilizado para a concessão da domiciliar, qual seja, a
ausência de vagas para presos do regime semiaberto, entende que essa solução
não é a mais adequada, por considerar que o condenado, ao se determinar para o
crime, assume o risco previsível de ficar trancafiado.
Todavia, diverso é o posicionamento do referido autor quando se trata
dos apenados que cumprem pena no regime aberto, pois, segundo ele, é no instante
em que o preso cumpre a pena neste regime que o descaso do Poder Executivo é
mais latente haja vista que no caso deste regime, o problema não está relacionado à
superlotação das casas prisionais, mas sim na ausência destas:10
Assim, em razão dos motivos por ele expostos, mas sempre frisando
seu posicionamento – e o do STF11 – em sentido contrário, reconhece que uma das
soluções alternativas ao problema da falta de casas prisionais que comportem
presos do regime aberto é a concessão de prisão domiciliar.
MIRABETE12, antes de tratar da prisão domiciliar narra que a sua
finalidade, antes da previsão contida na LEP, era completamente diversa, qual seja,
a de recolher o preso provisório à própria residência nas localidades onde não havia
estabelecimento adequado para o recolhimento dos que tinham direito à prisão
especial.
Posteriormente, com a introdução do regime aberto ao Código Penal e
diante da ausência de estabelecimentos para o cumprimento da prisão albergue, os
aplicadores da lei tiveram que adotar penosas alternativas, tais como: admitir o
alojamento noturno em celas superlotadas das cadeias públicas; não conceder o
9
Op. cit., p. 125.
Op. cit., p. 133.
11
Oportuno frisar que à época da publicação do livro de MARCÃO, o STF tinha posicionamento em
sentido contrário à concessão de prisão domiciliar que não estivesse vinculada às hipóteses do art.
117 da LEP. Atualmente, já existem precedentes em sentido contrário e até, recente decisão no
sentido de declarar repercussão geral ao tema, conforme Recurso Extraordinário nº 641.320,
interposto pelo Ministério Público do estado do Rio Grande do Sul.
12
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei nº 7.210/84. São Paulo: Atlas,
2004, p. 467.
10
regime, embora o sentenciado preenchesse os requisitos legais; ou conceder a
prisão domiciliar.13
Em razão da ausência de previsão legal quanto à fiscalização da prisão
domiciliar, bem como das desenfreadas concessões desse benefício pelo Poder
Judiciário frente ao omisso Poder Público, foi estabelecido na LEP a prisão
domiciliar com um rol de hipóteses excepcionais para a concessão, com o fim de
reduzir a sensação de impunidade até então sentida.14
Por toda análise acerca da criação da modalidade de aprisionamento
domiciliar, MIRABETE se mostra contrário a qualquer interpretação extensiva, ou
concessão fora das hipóteses legais, fundamentando que a própria exposição de
motivos à Lei 7.210/84 – em seu item 124 - expõe expressamente a impossibilidade
de deferimento do benefício a hipóteses não elencadas no dispositivo.15
Todavia, reconhece o autor a necessidade de eventual aplicação
extensiva frente ao total descaso do Poder Estatal quanto aos problemas
enfrentados pelos presídios do país: 16
Da mesma maneira, BITENCOURT17 entende que a concessão da
prisão domiciliar fora das hipóteses elencadas na Lei de Execuções Penais é, no
mínimo, perigosa, uma vez que vai a desencontro com a própria proposta da LEP,
quando criada, bem como aflora a sensação de impunidade na sociedade:
Quem ousaria deixar de recolher à prisão perigoso delinquente, condenado
a cumprir pena em regime fechado, sob o argumento de que as prisões não
13
Op. cit., p. 467.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei nº 7.210/84. São Paulo: Atlas,
2004 p. 467.
15
Dispõe o Item 124 da exposição de motivos à Lei 7.210/84:
Reconhecendo que a prisão-albergue não se confunde com a prisão-domiciliar, o Projeto declara,
para evitar dúvidas, que o regime aberto não admite a execução da pena em residência particular,
salvo quando se tratar de condenado maior de setenta anos ou acometido de grave doença e de
condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental ou, finalmente, de condenada gestante (art.
116). Trata-se, aí, de exceção plenamente justificada em face das condições pessoais do agente.
Disponível em:
http://portal.mj.gov.br/services/DocumentManagement/FileDownload.EZTSvc.asp?DocumentID=%7B
C116F62C-19FB-4F25-8625-E6D3D415537D%7D&ServiceInstUID=%7B4AB01622-7C49-420B9F76-15A4137F1CCD%7D. Acesso em 20 de agosto de 2011.
16
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei nº 7.210/84. São Paulo: Atlas, 2004, p. 467.
17
BITENCOURT. Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, volume 1. São Paulo:
Saraiva, 2004, p. 481.
14
oferecem boas condições humanas e materiais para recuperar criminosos?
Ademais, diante do sistema progressivo adotado no sistema brasileiro, há
um momento em que a pena, através da progressão, chega ao regime
aberto. Então, como proceder? Conceder a prisão domiciliar
indiscriminadamente, oficializando a impunidade? Acreditamos que essa
não é a melhor solução, embora seja a mais fácil, com graves prejuízos à
coletividade e à segurança pública.
NUCCI18 também acredita que a concessão de prisão domiciliar para
presos que não apresentem as situações excepcionais previstas no art. 117 da LEP
caracteriza a impunidade, uma vez que ausente fiscalização para atestar o
cumprimento das condições fixadas pelo juiz.
1.2. PROCEDIMENTO ADOTADO NA VEC/POA
De acordo com o Magistrado Alexandre Pacheco, em entrevista
concedida em 12/09/2011, a prisão domiciliar vem sendo deferida, atualmente, de
ofício, para todos os presos que foram condenados em regime aberto, no momento
em que as peças principais do processo criminal são remetidas à Vara de
Execuções Criminais para a formação do Processo de Execução Criminal, bem
como no instante em que o apenado é beneficiado com a progressão do regime
semiaberto para o aberto.
No que tange aos critérios utilizados para o deferimento do benefício, o
magistrado referiu que, antes de ser iniciada a concessão de prisão domiciliar a
todos os presos do regime aberto, foi realizada a experiência do monitoramento
eletrônico, por meio de tornozeleiras. Para isso, adotaram-se critérios para inclusão
no teste, excluindo-se os condenados por crimes hediondos e os condenados por
crimes com violência à pessoa.
Foram disponibilizadas 200 tornozeleiras, mas apenas 142 presos
aceitaram utilizá-la. Todavia, de acordo com o magistrado, o efeito desejado, que
era a criação de vagas nos regimes aberto e semiaberto, não se concretizou, uma
vez que havia mais de 400 presos em regime fechado, já com a progressão
deferida, aguardando há mais de 45 dias a remoção para o semiaberto.
18
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008, p. 503.
Então, a partir de dezembro de 2010, passou-se a conceder a prisão
domiciliar a todos os presos do regime aberto. Estimou o Dr. Alexandre que, até a
presente
data,
tenham
sido
concedidas
aproximadamente
1.500
prisões
domiciliares. Salientou que mesmo com as domiciliares, ainda há cerca de 300
presos com progressão de regime concedida, aguardando a remoção, do regime
fechado para o regime semiaberto.
1.3. COMPETÊNCIA PARA FISCALIZAÇÃO: VEC OU VEPMA?
Devido à concessão de prisão domiciliar em caráter excepcional, pela
Vara de Execuções Criminais, tornou-se divergente a questão, também, no que se
refere ao juízo competente para fiscalização do benefício.
Preliminarmente, cumpre referir o que motivou a criação da Vara das
Execuções das Penas e Medidas Alternativas.
A VEPMA foi instituída, em 2001, por meio da Resolução nº 353 do
Conselho da Magistratura19, com a finalidade principal de desafogar o acúmulo de
processos existentes na VEC. Tal resolução estabeleceu que a VEPMA seria
competente para a execução de penas e medidas alternativas, excluídas aquelas de
natureza corporal (vale dizer: regimes fechado, semi-aberto e aberto).
Em 2004, sobreveio a Resolução 48720 do Conselho da Magistratura a
qual estendeu a competência da VEPMA para os feitos que tratassem de medidas
de segurança, tanto na modalidade ambulatorial quanto na de internação.
Nesse passo, a Vara de Execuções Criminais - VEC - manteve sua
competência para execução das penas privativas de liberdade, independentemente
da ampliação da competência da VEPMA, estabelecida pela resolução de 2004.
Feitas as considerações oportunas sobre a distribuição da competência
entre a VEC e a VEPMA, é possível compreender que a concessão de prisão
domiciliar a todos os presos que cumprem pena em regime aberto, indistintamente e
19
Art. 2º - na vara de execuções criminais permanecerão, tão-somente, os feitos cuja pena aplicada
for de natureza corporal (nos regimes fechado, semi-aberto e aberto), redistribuindo-se todos os
demais, com exceção daqueles suspensos por força do art. 89 da lei nº 9099/95, em que não há
aplicação de pena.
20
Art. 1º - atribuir à vara de execuções de penas e medidas alternativas – VEPMA – a competência
para execução das medidas de segurança, seja na forma de tratamento ambulatorial, seja na forma
de internação.
com a inobservância ao artigo 117 da LEP, gerou profundas discussões no judiciário
gaúcho acerca do juízo competente para o processamento do pedido, concessão e
fiscalização do benefício.
Isso porque, ao concederem o benefício, os juízes de direito titulares
da VEC passaram a remeter os processos à VEPMA para fiscalização, sob o
argumento de que se tratava então de pena cuja modalidade inseria-se em sua
competência.
Questionado sobre o seu posicionamento acerca da competência para
tal fiscalização, o magistrado Alexandre Pacheco afirmou que não cabe à VEC a
fiscalização porque sua competência se restringe às penas privativas de liberdade.
Ressaltou, também, que no momento em que concedida a prisão domiciliar ao preso
do regime aberto, este passa a ter outro regime de cumprimento.
Ele criticou o fundamento exposto pelo juízo da VEPMA – quanto à
precária estrutura de funcionários – pois a VEC também não tem serventuários que
possam fiscalizar o benefício. Logo, por esse aspecto, torna-se indiferente o fato de
a competência jurisdicional ser de uma ou de outra vara.
Em contrapartida, entendimento diverso é o manifestado pelo juízo da
VEPMA, o qual asseverou que, como não se tratava de modalidade típica de prisão
domiciliar, não competia ao seu juízo fiscalizar o benefício.
Tal discordância de ambos os juízos ensejou diversos Conflitos
Negativos de Competência21, suscitados pelo magistrado da VEPMA, momento em
que sustentou a ausência de previsão legislativa para a modalidade de prisão
domiciliar a qual vinha sendo concedida, a não alteração da natureza do regime do
apenado, na medida em que o benefício somente estava sendo deferido como uma
forma
diversa
de
cumprimento
de
pena
ante
a
precária
situação
dos
estabelecimentos penais e, por fim, a ausência de estrutura de funcionários na Vara
para fiscalização de inúmeros processos.
Porém, até o presente momento não há entendimento dominante sobre
o tema no TJRS.
21
A título de ilustração, válido citar alguns Conflitos Negativos de Competência já apreciados pelo
TJRS: 70042302554, 70044372381, 70043641430, 70043912161 e 70044065589.
A primeira Câmara Criminal22, a Quinta23 e a Sétima Câmara24
entendem que a competência para a fiscalização da prisão domiciliar é da Vara de
Execuções Criminais, sustentando que o caso em tela não altera o regime dos
apenados sob prisão domiciliar, qual seja, o regime aberto.
Os desembargadores fundamentam que a concessão do benefício
possui natureza excepcional e temporária, tendo por limite enquanto perdurar a
precária situação dos estabelecimentos prisionais sob a jurisdição da VEC/POA.
Em sentido contrário, a Quarta25, Sexta26 e Oitava27 Câmaras Criminais
sustentam que compete à VEPMA a fiscalização da prisão domiciliar –
independentemente do motivo pelo qual ela foi concedida – uma vez que o
fundamento, por si só, não altera o status do benefício.
A Segunda Câmara Criminal, por sua vez, não apresenta entendimento
unânime quanto à competência, pois alguns desembargadores entendem que cabe
à VEC fiscalizar, enquanto outros firmam o posicionamento no sentido de que a
competência é da VEPMA.
Verificou-se, portanto, que após a concessão da prisão domiciliar a
todos os apenados em regime aberto, indistintamente, criou-se um celeuma acerca
do juízo competente para a fiscalização desta medida, sem que se tenha, até então,
posição definitiva pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado.
2
A PRISÃO DOMICILIAR NO TJRS
2.1 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA
Para a análise da jurisprudência do TJRS, foi utilizada como
metodologia de pesquisa a coleta de dados no sítio do TJRS, na sessão de
22
Nesse sentido: Conflito de Jurisdição Nº 70042305243, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 17/08/2011.
23
Nesse sentido: Conflito de Jurisdição Nº 70044088441, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Luís Gonzaga da Silva Moura, Julgado em 10/08/2011.
24
Nesse sentido: Conflito de Jurisdição Nº 70044066140, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Naele Ochoa Piazzeta, Julgado em 11/08/2011.
25
Nesse sentido: Conflito de Jurisdição Nº 70044065589, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em 18/08/2011.
26
Nesse sentido: Conflito de Jurisdição Nº 70043904028, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Ícaro Carvalho de Bem Osório, Julgado em 11/08/2011.
27
Nesse sentido: Conflito de Jurisdição Nº 70042925487, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Isabel de Borba Lucas, Julgado em 13/07/2011.
jurisprudência, utilizando-se como data-base os julgamentos ocorridos a partir de
janeiro de 2009 até o presente momento e as palavras-chave: “prisão domiciliar” e
“regime aberto”.
Antes de se discorrer sobre a jurisprudência, importante frisar que
compete a todas as Câmaras Criminais o julgamento de processos de execução
criminal, uma vez que a distribuição da competência se dá em relação à matéria, ou
seja, ao delito pelo qual o apenado fora condenado.28
A
Primeira
Câmara
Criminal
é
atualmente
composta
pelos
Desembargadores Marco Antonio Ribeiro de Oliveira, Newton Brasil de Leão,
Manuel José Martinez Lucas, Marcel Esquivel Hoppe e pela juíza convocada Osnilda
Pisa.
Com base nas chaves de pesquisa utilizadas, apurou-se que o primeiro
recurso de agravo em execução julgado foi pelo Des. Marco Antonio, em
18/03/2009. O referido agravo foi interposto pela defesa do apenado contra a
decisão de juízo da VEC da comarca de Caxias do Sul que indeferiu o pleito de
concessão da prisão domiciliar ao reeducando.
O eminente relator votou no sentido da manutenção da decisão, por
entender que as hipóteses para concessão são taxativas e que, caso fosse
concedida, abriria margem para diversas prisões domiciliares sem que houvesse
efetiva fiscalização:
[...]
Outrossim, é posicionamento da Câmara, embora não se desconheça a
orientação do Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário, que a
ausência de casa do albergado ou estabelecimento similar adequado para o
cumprimento da pena no regime aberto não autoriza a prisão domiciliar, sob
pena de, em prosperando a tese, abrir-se perigoso precedente,
possibilitando a todos apenados cumprirem suas penas no aconchego do
lar, sem qualquer controle ou fiscalização efetiva da administração, o que
29
redundaria na mais absoluta impunidade .
[...]
28
Art. 12, da Resolução nº 01/98: Às Câmaras Criminais serão distribuídos os feitos atinentes à
matéria de sua especialização, assim especificada [...]
29
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Primeira Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº. 70028008167. Relator Marco Antonio Ribeiro de Oliveira. Porto Alegre – RS, j.
18/03/2009. Diário Oficial: 01/04/2009.
Tal entendimento, no sentido do indeferimento da prisão domiciliar
seguiu unânime na Câmara Criminal30 ao longo do período de 2009 a 2010, havendo
modificação tão somente neste ano, mais precisamente, quando do ingresso da
Magistrada Osnilda Pisa, na Câmara, a qual sustentou a possibilidade de concessão
da prisão domiciliar quando ausente estabelecimento penal compatível com o
regime de cumprimento da pena, utilizando por fundamento diversos precedentes do
Egrégio Superior Tribunal de Justiça31. Este entendimento passou-se a ser adotado
pela Primeira Câmara Criminal, à unanimidade.
A Segunda Câmara Criminal é composta pelos Desembargadores
Jaime Piterman, José Antonio Cidade Pitrez, Lais Rogéria Alves Barbosa e Marco
Aurélio de Oliveira Canosa, e apresenta algumas peculiaridades quanto aos
posicionamentos adotados.
Isto porque, a Câmara vinha mantendo o posicionamento no sentido da
impossibilidade de concessão da prisão domiciliar para apenados do regime aberto
que não se enquadrassem nas hipóteses preconizadas no art. 117 da LEP.
Nesse sentido, trecho de voto exarado pelo Desembargador Marco
Aurélio de Oliveira Canosa:
[...]
É sabido que a prisão domiciliar só é admitida nas restritas hipóteses
previstas no artigo 117, da Lei de Execuções Penais. Deve beneficiar, em
regra, apenas os apenados em regime aberto, que estejam nas hipóteses
do artigo 117 da LEP:
“Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime
aberto em residência particular quando se tratar de: I- condenado maior de
70 (setenta) anos; II- condenado acometido de doença grave; III condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV- condenada
gestante”.
30
Nesse sentido, os seguintes precedentes: 70028885994, 70029381860, 70031102965 e
70032106478.
31
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Primeira Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70043121532. Relatora Osnilda Pisa. Porto Alegre – RS, j. 27/06/25011. Diário
Oficial: 23/08/2011.
Verifica-se, portanto, que o rol contido no mencionado dispositivo legal é de
numerus clausus, não admitindo outras possibilidades de concessão da
32
benesse.
[...]
Entretanto, tal entendimento deixou de ser unânime quando o
Desembargador Jaime Piterman passou a se posicionar pela viabilidade da prisão
domiciliar, com a ressalva de que dependeria da situação apresentada na espécie.
Quanto ao ponto, trago excerto de voto exarado pelo Desembargador
Jaime Piterman, em agravo em execução interposto pelo Ministério Público,
irresignado com decisão do juízo da VEC da comarca de Itaqui, o qual concedeu o
benefício em razão da interdição do estabelecimento penal:
[...]
Referente à prisão domiciliar, a par de sustentar serem taxativas as
hipóteses elencadas no artigo 117 da LEP, penso que é possível, em
situações excepcionais, a concessão do referido benefício.
No caso dos autos, a solução alcançada pela MMª Juíza De Direito se
mostra correta e consentânea com as finalidades da pena, de harmônica
integração social do condenado, consoante se verifica dos fundamentos do
decisum, os quais, com a devida vênia, vão reproduzidos e adotados como
razões de decidir:
[...]
Cumpre ressaltar a ausência de estabelecimento adequado para a
execução da pena, tendo o agravado obtido a progressão para o regime
aberto, em novembro de 2007 (fl. 36). Outrossim, releva anotar a
circunstância de que o Presídio foi interditado, tudo a indicar cuidar-se de
uma situação peculiar, sendo admissível em caráter excepcional a prisão
domiciliar, mediante o cumprimento de condições.
33
Diante do exposto, nego provimento ao agravo em execução .
[...]
Importante frisar que, muito embora o Des. Jaime Piterman seja
favorável à concessão do benefício, o seu voto fica vencido frente aos demais
32
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70026036087. Relator Marco Aurélio de Oliveira Canosa. Porto Alegre – RS, j.
18/06/2009. Diário Oficial: 14/08/2009.
33
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Segunda Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70031743362. Relator José Antônio Cidade Pitrez. Porto Alegre – RS, j. 08/10/2009.
Diário Oficial: 18/11/2009.
integrantes da Colenda Câmara, mantendo-se o entendimento, por maioria, pela
impossibilidade de concessão da benesse.
A Terceira Câmara Criminal apresentou algumas modificações quanto
ao entendimento sobre o tema, devido à alteração da composição dos
Desembargadores, de 2009 até a presente data.
Quando a referida Câmara era composta pelos Desembargadores
Vladimir Giacomuzzi, Elba Aparecida Nicolli Bastos, José Antônio Hirt Preiss, Marcel
Esquivel Hoppe, Odone Sanguiné e Ivan Leomar Bruxel, entendia-se à unanimidade,
que para concessão da prisão domiciliar, era imprescindível que o apenado
cumprisse pena em regime aberto, além de se encontrar em alguma das hipóteses
previstas no art. 117 da LEP.
Nesse sentido:
AGRAVO EM EXECUÇÃO PRISÃO DOMICILIAR REQUISITOS DO
ARTIGO 117 DA LEP INEXISTÊNCIA DE ALBERGUE ANEXO AO
PRESÍDIO INDEFERIMENTO. Apenado cumprindo pena no regime aberto
só tem direito a prisão domiciliar nos casos expressos no artigo 117 da LEP.
O albergue na comarca é anexo ao presídio, apenas fisicamente, pois
separados os condenados do regime aberto e fechado. NEGADO
34
PROVIMENTO.
AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. APENADA QUE
CUMPRE PENA EM REGIME ABERTO. FILHAS MENORES.
RECOLHIMENTO EM RESIDÊNCIA PARTICULAR. PREENCHIMENTO
DOS REQUISITOS. Faz jus ao benefício do recolhimento em residência
particular, a apenada que cumpre pena em regime aberto e possui duas
filhas menores. Exegese do art. 117, III, da LEP. Precedentes do STJ e da
35
Câmara. AGRAVO MINISTERIAL DESPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.
Posteriormente, filiou-se o Desembargador Odone Sanguiné à corrente
a qual defende a concessão de prisão domiciliar, fundamentando que a atual
jurisprudência passou a entender que o rol apresentado no art. 117 da LEP é
exemplificativo, autorizando o juízo a conceder a prisão domiciliar de forma
excepcional, para o fim de preservar garantias do preso preconizadas tanto na Lei
de Execuções Penais quanto na Carta Magna.
34
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Terceira Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70028886950. Relatora Elba Aparecida Nicolli Bastos. Porto Alegre – RS, j.
02/04/2009. Diário Oficial: 08/04/2009.
35
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Terceira Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70028906121. Relator: José Antonio Hirt Preiss. Porto Alegre – RS, j. 07/05/2009.
Diário Oficial: 12/05/2009.
Salientou, também, que o que se trata, no momento, não são de
condições ideais para o alojamento de apenados, mas sim o mínimo para
manutenção da própria destinação da Casa Prisional. Por fim, cita a Súmula 719 do
STF, a qual dispõe sobre a necessidade de fundamentação idônea para a imposição
de regime de cumprimento de pena mais gravoso do que o compatível com a pena
do apenado36.
Atualmente, sendo a Câmara composta pelos Desembargadores Nereu
José Giacomolli, Catarina Rita Krieger Martins, Francesco Conti, além do
Desembargador Ivan Leomar Bruxel, passou-se a concessão, por maioria – vencido
o Des. Bruxel – da prisão domiciliar quando inexistente vaga em estabelecimento
penal para presos do regime aberto.
Alguns dos fundamentos utilizados por estes Julgadores para o
deferimento da medida são o respeito à integridade física e moral dos presos, bem
como o cumprimento da pena em estabelecimentos distintos, considerada a
natureza do delito, além de normas preceituadas pela Organização das Nações
Unidas no que concerne às regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil.37
A Quarta Câmara Criminal do TJRS tem por composição os
Desembargadores Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Marcelo Bandeira
Pereira, Gaspar Marques Batista, Constantino Lisbôa de Azevedo, e pela Magistrada
convocada Marlene Landvoigt.
Durante o período de 2009, era unânime o entendimento de que o art.
117 da LEP apresentava um rol taxativo e que, portanto, a inexistência de condições
na casa do albergado ou sua ausência, por si só, não autorizava, ao condenado em
regime aberto, o cumprimento da pena em prisão domiciliar.
Nesse sentido, sustenta o Desembargador Constantino que a tão-só
ausência provisória de vagas não significa que o Estado deve deixar de executar a
36
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Terceira Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70038540142. Relator: Odone Sanguiné. Porto Alegre – RS, j. 16/12/2010. Diário
Oficial: 10/01/2011.
37
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Terceira Câmara Criminal, Agravo
em Execução nº 70042563544. Relator Nereu José Giacomolli. Porto Alegre – RS, j. 21/07/2011.
Diário Oficial: 02/08/2011.
pena regularmente aplicada; provisoriamente, pois, deve o paciente ser mantido em
cárcere, de acordo com as reais condições e não deixado em inteira liberdade38.
Em meados do ano de 2010, todavia, com a modificação na
composição da referida Câmara com a entrada do Des. Marcelo Bandeira Pereira,
houve uma “flexibilização” do posicionamento até então adotado, pois, no
entendimento deste juízo, a concessão de prisão domiciliar deveria ser analisada
conforme a peculiaridade de cada caso a ser julgado.
De acordo com o referido desembargador, não se pode simplesmente
preponderar os direitos e as garantias do acusado – abrangidas por lei – frente à
segurança da sociedade, a qual precisa se manter a salvo daqueles que a agridem e
que precisa saber que o Estado castiga aquele que errou.
Seguindo este raciocínio, ele entende que é necessário o exame
peculiar de cada caso, com a proporcionalidade devida, para o fim de exercitar a
missão de todo julgador, que é a de concretizar o Direito.
Como forma de exemplificação, oportuno citar dois trechos de votos
exarados pelo Des. Marcelo. O primeiro, no qual não concede a prisão domiciliar, e
o segundo, em que mantém a prisão domiciliar concedida. Em ambos os casos,
colocou-se questões subjetivas dos apenados como elemento para concessão ou
não do benefício, valorando se o preso teria condições efetivas para cumprir pena
na modalidade domiciliar.
No primeiro caso, considerou-se o apenamento imposto ao condenado
bem como os delitos cometidos, para chegar ao indeferimento do benefício:
[...]
Com esses olhos, ocupando-me, especificamente, da hipótese em
julgamento, observo que ao agravado foram impostas condenações que
fizeram totalizar seu apenamento em 9 anos, 3 meses e 20 dias de reclusão
pelo cometimento de dano qualificado contra o patrimônio público, extorsão
mediante sequestro e roubo majorado. Oportuna, ainda, a observação de
que obteve a progressão para o regime semiaberto em meados do ano que
passou, e, agora, com a progressão de seu regime para o aberto, e
38
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quarta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº 70043770288. Relator Constantino Lisbôa de Azevedo. Porto Alegre – RS, j.
18/08/2011. Diário Oficial: 26/08/2011.
concomitante à prisão domiciliar, restam, ainda, a cumprir mais de 4 anos
de seu apenamento.
Assim, percebe-se que, sequer tendo experimentado qualquer período no
regime menos gravoso, sua imediata colocação em prisão domiciliar
caracteriza insuficiência da execução.
Nessas condições, embora os méritos da proposta contida na decisão
hostilizada, que, como declinou, já teria encontrado respaldo, em situações
outras, em decisões do Colendo Superior Tribunal de Justiça, não vejo
possível, modo generalizado, simplesmente converter toda e qualquer
prisão do regime aberto em prisão domiciliar, o que, em cidade do porte de
Caxias do Sul, teria aptidão para produzir efeitos quiçá nefastos. Solução
como a de que se trata, se necessária, por superlotação ou razões outras,
haveria de ser passada à vista de critérios que compreendessem situação
global da massa carcerária. Por exemplo, atingindo apenados que já
estivessem há bom tempo no regime aberto, e não aqueles, como o
agravado, que alcançaram esse regime concomitante à prisão domiciliar.
Também, haveria de levar em conta a espécie de crime perpetrado e o
histórico criminal do apenado, sendo facilitada sua aplicação aos crimes
39
menos graves.
[...]
No segundo caso, considerou o Desembargador, para manter a prisão
domiciliar à apenada, o parecer psicológico favorável para a concessão bem como a
quantidade de pena já cumprida, além de observar que a reeducanda já cumpria
pena em prisão domiciliar por algum tempo:
[...]
Observo que à agravada foram impostas condenações que totalizaram 5
anos e 4 meses de reclusão pelo cometimento dos delitos de roubo
majorado e dois furtos qualificados, todos pelo concurso de pessoas e na
forma tentada, cometidos entre março de 2005 e junho de 2006 (fls.
14/20).4
[...]
Assim, implementado o lapso temporal para o livramento condicional,
sobreveio parecer psicológico, do qual segue transcrição de trechos:
“Utilizou psicofármacos durante certo período, em função da abstinência
das drogas, mas não tem mais apresentado demanda para este tipo de
tratamento. Rovena demonstra, de um modo geral, boa adesão ao
acompanhamento psicológico e social, sugerimos por isso que a concessão
do benefício ocorra atrelado ao engajamento a um programa da rede de
atendimento na cidade onde mora com a família.
Considerando o percurso carcerário de Rovena, observamos que o
aprisionamento tem contribuído para a sua degradação pessoal, uma vez
que as relações sociais da prisão não lhe têm garantido melhoria na
39
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quarta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº 70037476348. Relator Marcelo Bandeira Pereira. Porto Alegre – RS, j. 05/08/2010.
Diário Oficial: 24/09/2010.
qualidade das relações que estabelece em sociedade mais ampla. Além
disso, constatamos que a manutenção de pessoas de baixa renda na
prisão, tal como no caso em tela, onera as despesas familiares e resulta em
um empobrecimento ainda maior desta família. Assim, sugerimos, com base
no tempo de pena já cumprido e na necessidade de que Rovena reassuma
a responsabilidade da maternidade do filho, que a albergada seja
beneficiada com o livramento condicional.” (fls. 68/69)
Não se descarta uma eventual insuficiência de execução. Entretanto,
na situação em julgamento, que trata de apenada sem aptidão, em
princípio, para causar desassossego social mais significativo, somente
justificativa bastante forte para, após cinco meses em que se encontra
em prisão domiciliar, tendo, por razoável período, cumprido o regime
aberto, ainda, sem qualquer registro de não cumprimento de
condições, retirar-lhe do âmbito familiar e da oportunidade de
cuidados do filho que possui menos de dois anos de idade (fl. 68).
[...]
Não impressiona decisivamente, outrossim, a alegação de
descumprimento ao artigo 117 da LEP, que limita a prisão domiciliar a
certas situações, bem caracterizadas, ao que não se afeiçoaria à
espécie. Afinal de contas, não se pode olvidar que a mantença de
apenado em presídio superlotado, com a natural supressão de
condições materiais idealizadas de sobrevivência, também não se
ajusta aos propósitos e comandos contidos na LEP. A questão, pois,
quando se cogita de descumprimento formal da lei, é apenas de
40
escolha.
[...]
A Quinta Câmara Criminal é composta pelos Desembargadores Luís
Gonzaga da Silva Moura, Amilton Bueno de Carvalho, Genacéia da Silva Alberton e
Diógenes Vicente Hassan Ribeiro. Desde a data-base de pesquisa utilizada, janeiro
de 2009, e inclusive anteriormente, já estava assentado o entendimento nesta
Câmara, por maioria, no que concerne à viabilidade de concessão de prisão
domiciliar para presos do regime aberto, quando cumpriam a pena em
estabelecimento penal que comportava apenados em cumprimento de pena mais
gravosa.
Tanto
na
atual
composição
desta
Câmara
Criminal,
como
anteriormente – quando o Desembargador Aramis Nassif a integrava – prevalecia tal
entendimento.
Válido citar o fundamento do Desembargador Aramis Nassif, quando
da relatoria do Agravo em Execução nº. 70034593392, julgado em 16 de junho de
40
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quarta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº. 70041949314. Relator Marcelo Bandeira Pereira. Porto Alegre – RS, j. 05/05/2011
2010, interposto pelo Ministério Público o qual negou provimento, por entender que o
preso não deve sofrer com a desídia estatal:
Deixar de perceber o apenado como titular de direitos elementares é
negligenciar com o ser humano e deixar desenvolver seu processo de
demonização, afeita às ideologias mais autoritárias do direito.
Portanto, decidiu dentro do espírito da lei a douta e competente magistrada
de primeiro grau.
Se persistisse a contenção integral, o regime carcerário não seria o aberto,
mas um simulacro de semi-aberto e, mesmo, fechado para quem estivesse
condenado a cumprir a pena pelo regime aberto.
O apenado não deve pagar física e moralmente pelo fracasso do Estado na
execução da política criminal, mormente ao esquecer, completamente, da
construção de albergues e outras casas prisionais que propiciassem aos
41
contidos a sua dignidade enquanto pessoa.
Da mesma forma, o Desembargador Gonzaga, ao julgar o agravo em
execução nº 70039652870, mantendo a decisão que concedeu a prisão domiciliar de
apenado que cumpre pena em Soledade, salientou que a ausência de casa de
albergado na comarca justifica a autorização de prisão domiciliar a presos do regime
aberto, em atenção aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e
da humanidade das penas:
Vejo inadmissível privar o agravado de um direito expressamente
contemplado na lei, em razão da injustificada omissão do Estado, que não
adquiriu, não desapropriou e não construiu, no prazo assinalado na lei, o
42
estabelecimento adequado ao cumprimento de pena em regime aberto.
Importante ressaltar que a Quinta Câmara Criminal, além de julgar
agravos em execução em sentido favorável a prisão domiciliar, também está
determinando este benefício em apelações criminais cuja fixação do regime de
cumprimento da pena é o aberto, consoante se verifica da Apelação Crime nº.
70029301231:
A Câmara, em maioria, entende que o Judiciário não pode mais ser
conivente com o caos prisional instalado no Estado do Rio Grande do Sul –
é notório que os presídios gaúchos estão entre os piores da nação e que
neles não são observadas as regras cogentes da LEP que disciplinam as
condições mínimas de humanidade e dignidade para o encarceramento.
41
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quinta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº 70034593392. Relator Aramis Nassif. Porto Alegre – RS, j. 16/06/2010. Diário Oficial:
19/07/2010.
42
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quinta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº 70039652870. Relator Luís Gonzaga da Silva Moura. Porto Alegre – RS, j. 15/12/2010.
Diário Oficial: 10/02/2011.
[...]
Assim, o ora condenado, que não registra qualquer condenação em
cumprimento, somente irá ao cárcere se e quando for preservada a vida
prisional de acordo com a lei. Enquanto isso não for providenciado, o
condenado será recolhido em prisão domiciliar.
[...]
Inexistindo casas prisionais que atendam a todos os requisitos acima, se
disse, o acusado será recolhido em prisão domiciliar até que a
burocracia estatal tudo supere – registro, nesse ponto, ter me curvado ao
entendimento dominante na Câmara, defendido pelos eminentes Colegas
Luís Gonzaga da Silva Moura e Aramis Nassif, em detrimento da minha
orientação pessoal, exposta na Apel. Crim. 70029175668 (onde me inclinara
a determinar até mesmo a suspensão da expedição do mandado de prisão,
43
enquanto não atendida a legalidade).
Oportuno
salientar,
também,
que
o
posicionamento
da
Desembargadora Genacéia, via de regra, era desfavorável a concessão de prisão
domiciliar fora das hipóteses invocadas pela LEP, por entender que o argumento de
que o Albergue encontra-se em péssimas condições, sem condições de
habitabilidade porque construído na mesma área do Presídio, cercado e superlotado
não é impedimento de caráter absoluto.44
Todavia, ao deparar-se com situações de maior complexidade no
Sistema Prisional, como o caso da Penitenciária Industrial de Caxias do Sul,
inclinou-se à viabilidade de prisão domiciliar aos apenados do regime aberto, pois
não há na comarca casa de albergado capaz de abrigá-los.45
A Sexta Câmara Criminal tem por composição os desembargadores
Aymoré Roque Pottes de Mello, Cláudio Baldino Maciel, João Batista Marques Tovo
e Ícaro Carvalho de Bem Osório, e tem o posicionamento unânime de que a prisão
domiciliar é, sim, cabível, uma vez que o art. 117 da LEP não apresenta um rol
taxativo, cabendo ao magistrado de primeiro grau avaliar a excepcionalidade do
caso concreto. Salientam os Desembargadores, também, que a concessão do
43
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quinta Câmara Criminal, Apelação
Crime nº 70029301231. Relator Amilton Bueno de Carvalho. Porto Alegre – RS, j. 28/07/2010. Diário
Oficial: 23/08/2010.
44
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quinta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº. 70032907479. Relatora Genacéia da Silva Alberton. Porto Alegre – RS, j. 28/04/2010.
Diário Oficial: 27/05/2010.
45
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Quinta Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº. 70039605456. Relatora Genacéia da Silva Alberton. Porto Alegre – RS, j. 01/06/2011.
Diário Oficial: 09/06/2011.
benefício pode ser revista a qualquer tempo, porquanto tomada em caráter
transitório46.
A Sétima Câmara Criminal tem por composição os Desembargadores
Sylvio Baptista Neto, Naele Ochoa Piazzeta, Carlos Alberto Etcheverry e José
Conrado Kurtz de Souza e, atualmente, vem decidindo, à unanimidade, pela
possibilidade do deferimento da prisão domiciliar quando ausente estabelecimento
penal para cumprimento de pena no regime aberto.
Importante consignar que, muito embora o posicionamento seja
unânime, há discordância no que tange à questão da taxatividade do rol
apresentado pelo art. 117 da LEP.
A Desa. Naele, mesmo votando no sentido da concessão da prisão
domiciliar, frisa que a LEP apresenta hipóteses pontuais para ser beneficiário desta
modalidade de prisão, todavia, sob a análise do caso concreto, é possível a
concessão47.
Por fim, a Oitava Câmara Criminal é, à unanimidade, contrária ao
benefício da prisão domiciliar, por entender que o art. 117 da LEP deve ser
interpretado de forma restritiva e deve atender à situações excepcionalíssimas.
Comungam deste entendimento os desembargadores Danúbio Edon
Franco, Fabianne Breton Baisch, Isabel de Borba Lucas e Dálvio Leite Dias
Teixeira48.
2.2 ENTREVISTAS COM OS DESEMBARGADORES
Para
uma
maior
compreensão
sobre
o
que
motiva
os
Desembargadores a votar no sentido da concessão ou denegação do benefício da
prisão domiciliar em hipóteses excepcionais, foi elaborada uma série de
questionamentos pertinentes ao tema, bem como relacionados à formação
acadêmico/profissional de cada julgador.
46
Nesse sentido: Agravo Nº 70044018935, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Aymoré Roque Pottes de Mello, Julgado em 11/08/2011.
47
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Sétima Câmara Criminal, Agravo em
Execução nº. 70041269937. Relatora Naele Ochoa Piazzeta. Porto Alegre – RS, j. 28/04/2011. Diário
Oficial: 09/05/2011.
48
Nesse sentido: Agravo em Execução Nº 70043502517, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Dálvio Leite Dias Teixeira, Julgado em 17/08/2011.
Inicia-se
a
análise
das
entrevistas
com
a
apresentação
do
posicionamento isolado, em comparação aos dos demais magistrados entrevistados,
qual seja, o do Desembargador Gaspar Marques Batista, integrante da Quarta
Câmara Criminal do TJRS.
O Des. Gaspar cursou a faculdade de Direito de Santo Ângelo, e entrou
na Magistratura no ano de 1975. Antes de ser promovido a Desembargador, atuou
na área criminal jurisdicionando a Vara do Júri da comarca de Porto Alegre.
Questionado sobre a possibilidade de intervenção do Poder Judiciário
frente ao problema da superlotação carcerária, o Desembargador respondeu que
cada Poder deve atuar de acordo com a sua competência, cabendo ao Poder
Executivo a criação de mais casas prisionais e ao Judiciário a execução das penas
prisionais. Salientou que: “a preocupação deve se dar com a sociedade em geral,
não unicamente com o condenado.”
Em consequência, o Desembargador não considera viável a concessão
de prisão domiciliar fora das hipóteses previstas na LEP, em razão da precária
estrutura para fiscalização do benefício, o que acaba no descumprimento.
Em contrapartida, os demais julgadores entrevistados mostraram-se a
favor da prisão domiciliar fora das previsões expressas em lei – em que pese alguns
não considerarem tal concessão sob o enfoque legal, frente à afronta ao dispositivo
da LEP – bem como em relação à possibilidade de intervenção do Poder Judiciário
frente à omissão Estatal, utilizando os mais diversos fundamentos.
O Desembargador Manuel José Martinez Lucas, lotado na Primeira
Câmara Criminal, cursou a faculdade de direito na Universidade de Pelotas e
ingressou na magistratura no ano de 1982, tendo atuado por período relativamente
curto na área criminal (de 1982 a 1987), nas Comarcas de São Vicente do Sul,
Panambi e Canoas.
Questionado sobre os seus autores de referência na área do direito
processual penal e no direito penal, citou Júlio Fabbrini Mirabete, Fernando Capez e
Guilherme de Souza Nucci. Sobre matérias específicas, como o Tribunal do Júri,
mencionou Saulo Brum Leal e relativo à legislação do Estatuto do Desarmamento o
autor Gilberto Thums. Ainda, eventualmente, utiliza alguns doutrinadores mais
antigos, como Nelson Hungria e Damásio E. de Jesus.
O Desembargador acredita que a autonomia do Poder Executivo deve
ser respeitada, referindo: penso que nem se cogita qualquer interferência do Poder
Judiciário nessa gestão, ainda que frequentemente, em razão da situação
calamitosa em que se encontram, alguns presídios sejam ‘interditados’ pelos
magistrados.
Disse, também, que o problema da superlotação tem por causa o
aumento da população e da criminalidade, sendo que tal aumento não foi
acompanhado pela construção de novas casas prisionais, o que acredita ser a
solução mais simples para a questão.
Todavia, muito embora não considerar válida a interferência do Poder
Judiciário frente a atos competentes do Poder Executivo, salientou que a câmara em
que está lotado vota pela concessão da prisão domiciliar, entendimento este
modificado recentemente, diante da problemática enfrentada pelos presídios no que
tange à ausência de vagas, com a ressalva de que o apenado deve se encontrar em
gozo do regime aberto e que a decisão concessiva em primeiro grau esteja
devidamente fundamentada.
O Desembargador Nereu José Giacomolli é integrante da Terceira
Câmara Criminal. Formou-se em direito na UNISINOS e ingressou na magistratura
em 1986, atuando na área criminal por mais de dez anos.
Utiliza como referencial teórico os seguintes doutrinadores: Jescheck,
Roxin, Hassemer, Mir Puig, Costa Andrade, Bittencourt, Chiavario, Cordero, Montero
Aroca, Oliva Santos, Paccelli, Lopes Jr.
Ele acredita que a questão da superlotação carcerária influi
diretamente nas decisões do Poder Judiciário e, sendo assim, a intervenção é
fundamental, justamente porque cabe ao último a decisão sobre entradas e saídas
do cárcere.
Por fim, entende que a previsão legal contida no art. 117 da LEP é
meramente exemplificativa, o que autoriza, portanto, a concessão para situações
não previstas e mais gravosas.
O Desembargador Luis Gonzaga da Silva Moura integra a Quinta
Câmara Criminal, onde se tem concedido, por maioria, a prisão domiciliar fora das
previsões elencadas em lei.
Ele cursou a faculdade de direito na antiga Universidade do Estado da
Guanabara, atualmente Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ingressou na
magistratura em 1978, atuando na área criminal quando jurisdicionava em varas
judiciais e na comarca de Porto Alegre, na Quinta Vara Criminal.
Ele se vale dos seguintes doutrinadores: na formação acadêmica:
Nelson Hungria, Aníbal Bruno, Magalhães Noronha, Heleno Fragoso, Eduardo
Espínola Filho, Frederico Marques, etc. Mais recentemente: Eugenio Raúl Zaffaroni,
Luigi Ferrajoli, Salo Carvalho, Amilton Bueno de Carvalho, Aury Lopes Júnior, Cezar
Roberto Bitencourt, Nereu Giacomolli, etc.
Em conformidade com o posicionamento da Câmara que integra,
entende que a intervenção do Poder Judiciário, na questão, é necessária e
obrigatória, pois que prevista na LEP, art. 66, especialmente os incisos VI, VII e VIII
ante a caótica situação dos estabelecimentos penais que, na visão do
Desembargador, se tornaram “depósitos de presos” sem qualquer possibilidade de
reinserção social.
Ele acredita, consequentemente, ser viável a concessão de prisão
domiciliar, seja por ausência de casas prisionais adequadas, seja porque elas
estejam superlotadas, citando precedente do Superior Tribunal de Justiça, e
fundamentando que o que se defere é uma medida de caráter emergencial, podendo
ser revista a qualquer tempo, caso não haja mais a necessidade do benefício.
A Desembargadora Genacéia da Silva Alberton, também integrante da
Quinta Câmara Criminal, se formou na UFRGS e entrou na magistratura em 1982.
Atuou na área criminal como juíza de direito na Sexta Vara Criminal e na Turma
Recursal Criminal, ambas na comarca de Porto Alegre. Como referencial doutrinário,
citou Nucci e Mirabete.
Quando a julgadora respondeu o questionário, via e-mail, ela deixou de
responder as duas últimas perguntas, pois, no seu entendimento, estas estariam
prejudicadas pelo fato de não conceder a prisão domiciliar fora das hipóteses
previstas em lei, restando vencida na Câmara.
Todavia, seu posicionamento tem sido flexibilizado na medida em que
o caso concreto necessite, como, por exemplo, nos casos de apenados da comarca
de Caxias do Sul. Nessa hipótese específica, em razão da inexistência de casa de
albergado,
a
Desembargadora
concede
o
aprisionamento
residencial,
excepcionalmente.
O Desembargador Claudio Baldino Maciel integra a Sexta Câmara
Criminal, Câmara esta que também mantêm o posicionamento unânime quanto a
viabilidade da prisão domiciliar fora das hipóteses elencadas na LEP.
O julgador se formou em direito pela UFRGS e ingressou na
magistratura no ano de 1984, como pretor, e no ano seguinte como juiz de direito.
Atuou na área criminal em todas as varas judiciais que jurisdicionou no interior do
Estado e, em Porto Alegre, na Décima Vara Criminal.
Ao ser questionado sobre seus autores de referência, afirmou não
utilizar nenhum em específico, mas que procura manter-se atualizado sobre a
bibliografia em geral.
O Desembargador se mostra inteiramente favorável a concessão da
prisão domiciliar frente a superlotação carcerária. Ele faz comparações interessantes
ao discorrer sobre o problema existente nos presídios do país, tais com a situação
destes na Idade Média e atualmente, bem como o tratamento dado aos apenados e
aos animais, salientando que os defensores dos últimos, ao se deflagrarem com
situação parecida aos dos encarcerados, hoje, acontecer com animais, iriam se
insurgir, o que não ocorre quando há seres humanos em condições degradantes.
Pontua,
também, acerca
da
importância
do
Poder Judiciário
quanto ao
enfrentamento da questão, já que compete a ele a expedição de mandados de
prisão, além de outras atuais atribuições, tais como interdição parcial ou total de
penitenciárias que não atendam a condições mínimas para abrigar detentos.
O Desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello, também integrante
da Sexta Câmara Criminal, formou-se em direito na UNISINOS, tendo ingressado na
magistratura em 1980, como pretor e em 1982, como juiz de direito. Trabalhou na
área criminal em todas as varas judiciais bem como na Décima Vara Criminal da
comarca de Porto Alegre.
Questionado sobre os autores de sua preferência, respondeu que não
seguia nenhuma obra específica, consultando livros de Guilherme de Souza Nucci,
Aury Lopes Júnior, entre outros.
Quanto a viabilidade de intervenção do Poder Judiciário no Poder
Executivo e a possibilidade de concessão da prisão domiciliar em si, o
Desembargador mostrou-se a favor, salientando que a falência do sistema
penitenciário estadual não pode ser debitado ao apenado. Invocou como
fundamento para tal afirmação o princípio da dignidade da pessoa humana, que
assume primazia no trato da questão, permitindo o aprisionamento domiciliar em
face da inexistência e/ou indisponibilidade de casas prisionais ao cumprimento da
pena.
O Desembargador Carlos Alberto Etcheverry, integrante da Sétima
Câmara Criminal, se formou em direito pela UFRGS e ingressou na magistratura,
como pretor, em 1980 e como juiz de direito, em 1982. Ele atuou na área criminal
em varas judiciais das comarcas de Coronel Bicaco, Tramandaí e Esteio. Como
bibliografia de referência, citou Guilherme de Souza Nucci.
No que concerne a intervenção do Poder Judiciário em relação à
situação da superlotação carcerária, entende ser necessária, salientando que a
situação atual dos estabelecimentos penais decorre da total desídia estatal, que se
absteve de ampliar o número de vagas ao longo das décadas. Em razão disso,
compete ao Poder Judiciário a intervenção para evitar que os condenados venham a
cumprir penas em regime mais gravoso do que aquele determinado na sentença
condenatória.
Por fim, disse ser favorável à concessão da prisão domiciliar além das
hipóteses previstas na LEP, asseverando que o rol elencado no art. 117 é
exemplificativo, podendo o juízo deferir o benefício, em atenção ao caso concreto.
Aduz, também, a impossibilidade de se aceitar presídios que não atendam os
requisitos mínimos exigidos na LEP e que visam diretamente assegurar a
integridade física e moral dos condenados, sendo que tal omissão estatal influi
diretamente na sociedade, uma vez que não tratará nem recuperará os cidadãos
que lá permanecerão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa mostrou, primeiramente, que o tema relativo à prisão
domiciliar é bem divergente, havendo diversos posicionamentos, tanto na seara da
jurisprudência, quanto na própria doutrina relacionada ao tema.
No que concerne ao primeiro grau, se pode perceber que a
preocupação com a atual situação das casas prisionais sob a sua jurisdição é
latente, tanto que a concessão do benefício da prisão domiciliar, atualmente, tem
sido de forma indiscriminada, bastando o apenado gozar do regime aberto para
estar apto a cumprir pena na modalidade domiciliar.
Presídios e mais presídios são interditados, sofrem depredações e
nenhuma resposta vem sendo dada pelo Poder Executivo, o que acaba obrigando
os magistrados à concederem a prisão domiciliar em caráter excepcional.
E em razão da concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses
expressas previstas na LEP, surgiu a problemática referente ao juízo competente
para a fiscalização do benefício. Em que pese a competência da VEC e da VEPMA
esteja bem delimitada por meio do Conselho da Magistratura, devido à peculiaridade
da modalidade, não há posicionamento pacífico no TJRS quanto a quem compete a
fiscalização, entendendo algumas Câmaras Criminais que cabe a VEC, sob o
argumento de que a prisão domiciliar é em caráter excepcional e, portanto, não
alterou o regime do apenado; enquanto outras Câmaras sustentam que cabe a
VEPMA
a fiscalização porque mesmo sendo uma modalidade atípica, continua
sendo uma espécie de pena corporal não privativa de liberdade.
Importante salientar que a análise de como a prisão domiciliar vem
sendo administrada pelo juízo de primeiro grau é de extrema relevância, haja vista
que foram as decisões concessivas que deram ensejo à discussão no Tribunal de
Justiça, por meio de agravos em execução interpostos.
Relativamente às observações feitas na jurisprudência do TJRS bem
como nas entrevistas feitas com alguns Desembargadores, as conclusões foram
surpreendentes.
Iniciou-se a pesquisa jurisprudencial tendo como data de início o ano
de 2009, época em que já se discutia com fervor a questão. Naquele período, podese constatar que as discussões levantadas pelos julgadores não fugiam da mesma
seara, no caso, sobre a possibilidade efetiva de concessão da prisão domiciliar fora
do rol elencado pelo art. 117 da LEP.
Nesse passo, os que se apresentavam desfavoráveis ao deferimento,
afirmavam que a lei era taxativa, logo, não haveria que se discutir sobre prisão
domiciliar porque ausente estabelecimento penal compatível com o regime de
cumprimento de pena.
Em contraponto, os favoráveis apresentavam argumentos baseados
em princípios constitucionalmente previstos, além de garantias constantes na própria
LEP, o que autorizava, pois, a medida.
Com o decorrer do tempo, leia-se, cerca de um, dois anos atrás,
algumas Câmaras Criminais modificaram o seu posicionamento firmado até então,
passando a considerar viável a prisão domiciliar em caráter emergencial.
Quanto ao ponto, importante frisar que a Primeira, Terceira e Quarta
Câmaras Criminais foram as que modificaram seu posicionamento, seja por maioria,
seja por unanimidade, utilizando como fundamento a superlotação carcerária e
tendo entendimento corroborado por precedentes de Instâncias Superiores.
Por meio das peculiaridades observadas nos votos exarados pelas
Câmaras
Criminais,
aliado
à
análise
das
respostas
concedidas
pelos
Desembargadores, a conclusão mais latente que se extrai é de que a visão do Poder
Judiciário frente à problemática da superlotação carcerária mudou, em sua maioria.
Antes, limitava-se o julgador a analisar se cabia a aplicação de
determinado dispositivo legal sem, contudo, observar o contexto fático as
implicações decorrentes do voto nesse, ou naquele sentido.
O que se quer dizer é que atualmente, os Desembargadores têm
priorizado o problema existente nas penitenciárias gaúchas, obtendo informações do
juízo singular, e passaram a votar não só por uma questão de garantir ao apenado
direitos que estão previstos, mas sim, preocupam-se com a questão da segurança
pública como um todo.
Os julgadores passaram a examinar de maneira mais específica cada
caso, para poder julgar da maneira mais correta no caso concreto, seja para
conceder a prisão domiciliar quando ausente Casa de Albergado, por exemplo, seja
para não conceder o benefício porque desnecessário na espécie.
Assim, o que se conclui neste trabalho é que, atualmente, o que
encontra-se por detrás dos votos exarados, em sua maioria, está muito mais
vinculada à questões de política criminal e segurança pública – ante a preocupação
com o sistema prisional – do que com a legislação propriamente dita o que é muito
positivo, em se tratando da área da execução penal.
REFERÊNCIAS
BITENCOURT. Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, volume 1.
São Paulo: Saraiva, 2004.
BRASIL. Site do Supremo Tribunal Federal. STF. 2011. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp>. Acesso: 05 de set. de 2011.
BRASIL. Site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. TJRS. 2011.
Disponível em: <http://www1.tjrs.jus.br/site/> Acesso: 05 de set. de 2011.
MARCÃO, Renato Flávio. Curso de execução penal. São Paulo: Saraiva, 2004.
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática:
doutrina, jurisprudência, modelos. São Paulo: Atlas, 2005.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal: comentários à lei nº 7.210/84. São
Paulo: Atlas, 2004.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo e execução penal. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005.
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