Diário Económico – Terça-feira 28 de Dezembro 2010 U/2 TEMA DE CAPA “Tratamento especial previsto para 2011 é inteiramente merecido” O reitor da Universidade do Porto, José Carlos dos Santos, quer investir mais na área da ciência e investigação para criar produtos de valor acrescentado. O reitor da Universidade do Porto, José Carlos dos Santos, defende que as universidades foram as instituições públicas que mais evoluíram nos últimos 20 anos. N o centésimo aniversário da Universidade do Porto o reitor José Carlos dos Santos diz que a instituição ainda “quer ser muito melhor”. Na sua opinião, o sistema de ensino superior português “é demasiado alargado com demasiadas instituições e há que racionalizar a oferta”.Noentanto,oreitorconsideraqueasuniversidades portuguesas têm mérito por conseguirem gerir o magro orçamento que recebem do Estado. Que prioridades destaca para o futuro da Universidade do Porto? Não estamos satisfeitos com o que somos e queremos ser ainda muito melhores. Queremos investir mais na investigação para conseguir mais reconhecimento internacional e com uma formação de qualidade muito ligada à investigação. Queremos crescer sobretudo na área da pós-graduação, ao nível dos mestrados e dos doutoramentos e queremos também atrair mais alunos estrangeiros. Numa terceira via, queremos também contribuir mais para o desenvolvimento económico e social do país. Que projectos estão a desenvolver nesse sentido? Queremos contribuir através da valorização económica do conhecimento, da criação de empresas, do trabalho de voluntariado com a sociedade, de acções com empresas de investigação e de desenvolvimento para criar produtos de valor acrescentado e de marca nacional. Temos vários exemplos: a cerveja Super Bock sem álcool foi desenvolvida na Universidade do Porto, grande parte da linha de esquentadores da Bosch são desenvolvidos também aqui na universidade e a célebre garrafa de gás - a Pluma - da Galp foi desenvolvida por nós e pela Universidade do Minho. A Efacec e as tintas Cin também têm muitas coisas desenvolvidas na Universidade do Porto. Vamos continuar a desenvolver esta área porque entendemos que esta é uma maneira de devolvermos à sociedade o apoio que nos dá, através do financiamento parcial que recebemos. Qual é a sua opinião dos ‘rankings’? Os ‘rankings’ valem o que valem. Todos têm muitas críticas mas todos querem lá estar. Mas estar nos ‘rankings’ não é o nosso objectivo e sim um resultado dos nossos objectivos, porque se formos bons na investigação, na formação e no reconhecimento internacional acabamos por sentir um reflexo e aparecer nos ‘rankings’. É uma maneira de dizer às pessoas que temos sido bons em investigação e temos sido bons em formação e assim somos reconhecidos internacionalmente ao aparecer nos ‘rankings’. Como avalia a política de financiamento das universidades? As universidades portuguesas, na minha óptica, são as instituições públicas que se têm portado melhor. Desde há muitos anos que chegam ao ”Queremos contribuir mais para o desenvolvimento económico e social do país”. “Há que reduzir as estruturas dirigentes e os custos associados a novas entidades”. “Nota-se uma evolução da posição de Portugal no avanço tecnológico, na produção científica internacional e nos resultados de investigação”. fim do ano e não vão pedir mais dinheiro nenhum ao Orçamento de Estado. As universidades foram demasiado espezinhadas e criticadas injustamente. Penso que este tratamento especial previsto para 2011, para o ensino superior, é inteiramente merecido. Não somos perfeitos, mas temos vindo a aumentar a formação de quadros, o reconhecimento internacional, a ligação às empresas e há imensos casos de produtos que foram desenvolvidos em colaboração com as universidades. Acredito que nada é perfeito, de facto, o nosso sistema de ensino superior é demasiado alargado e há demasiadas instituições e há que se fazer um esforço no sentido de se racionalizar a oferta. Concorda com as fusões da rede das instituições de ensino superior? Não digo fusões. Penso que há outros esquemas como parcerias, conjuntos ou consórcios. Há que reduzir as estruturas dirigentes e os custos associados a novas entidades. Juntando entidades vai ser possível evitar que haja repetição de recursos nas entidades que se agregaram para fazer uma oferta conjunta e que teriam uma ligação única. Assim, o dinheiro que há disponível até pode ser melhor usado do que é hoje. Não temos ilusões e os nossos orçamentos são pobres em comparação com as universidades estrangeiras, mas ainda assim, é um grande mérito sermos capazes de trabalhar com elas. Há o risco de o Governo não cumprir com o Contrato de Confiança? Creio que não. É evidente que o País está com dificuldades, mas acredito que as dificuldades se resolverão. Temos de trabalhar muito e vamos perder algumas regalias. Mas uma coisa é certa, ninguém consegue viver com uma despesa superior à riqueza que consegue produzir. Como avalia a prestação do Governo nas políticas de ensino superior? Acho que tem sido positiva porque tem sido apoiada. Os governos têm mudado mas o ministro Mariano Gago tem sido aquele que tem apostado na ciência como estratégia para o ensino superior, que tem lutado e que tem cumprido com aquilo que tem dito em termos de financiamento. As universidades também têm que cumprir com a sua parte. A política tem sido correcta e que se nota uma evolução da posição de Portugal no avanço tecnológico, na produção científica internacional e nos resultados de investigação. E quais são os aspectos menos positivos que aponta? Integraria mais a investigação com o ensino superior. Isto é, a ciência é financiada por uns quantos canais e o ensino superior por outros, e penso que há aqui uma falta de coesão entre os institutos de investigação, que são financiados directamente, e as universidades. Percebo que as universidades também tinham que mudar para que aceitassem a investigação como uma área com uma certa autonomia interna e que não levantassem obstáculos a quem quer evoluir. ■ AnaPetronilho PRODUTOS DESENVOLVIDOS NA UNIVERSIDADE DO Super Bock sem álcool A Super Bock sem álcool, lançada em 2007, resultou de um projecto de investigação desenvolvido entre a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) – Departamento de Engenharia Química - e a Unicer. Um projecto inovador a nível mundial que obteve o Registo da respectiva Patente. Diário Económico – Terça-feira 28 de Dezembro 2010 U/3 100 A Universidade do Porto comemora 100 anos de existência. Bruno Barbosa “É injusto financiar quem prescreve” José Carlos dos Santos concorda com a nova norma técnica do aproveitamento escolar para aceder a bolsas. P ara o reitor da Universidade do Porto, José Carlos dos Santos, as bolsas “deveriam ser para quem tem capacidade de fazer o ensino superior e não tem capacidade financeira para o frequentar”. Qual a sua opinião acerca do novo regulamento de atribuição de bolsas? Se fossemos um País onde as pessoas que recebem o apoio social fossem as que realmente necessitam dele, não era necessário novas regras. Mas infelizmente posso apontar dezenas de casos de pessoas que declaram rendimentos que não têm e que depois têm acesso a bolsas quando não deveriam ter. Penso que os apoios sociais deveriam ser para quem tem capacidade para fazer o ensino superior e não tem capacidade financeira para o frequentar. Ninguém deve deixar de fazer o ensino superior. É uma obrigação da sociedade apoiar financeiramente todos aqueles que têm capacidade para fazer o ensino superior mas que não têm posses. Isto deve começar a ser feito desde a pré-primária para não se perder pelo caminho as pessoas com capacidades. Também penso que só deve ser apoiado quem tem aproveitamento escolar a sério. Quem faz menos de metade daquilo que se inscreve num ano, não deve ser apoiado. Porquê? Porque uma pessoa que faça 50% das disciplinas em cada ano que se inscreve, está na vertente de prescrever. Falha mais um pouco e prescreve, ao fim de 3 anos. Penso que não é justo estar a financiar quem prescreve. Em Portugal desresponsabilizamos o cidadão de tudo o que é mau. Tudo o que é mau acontece porque o Estado ou alguém é culpado. Há muitos cidadãos que vivem dos apoios sociais.Nãoháconsciênciacívicadequequemestá a apoiar essas pessoas são outros cidadãos que são honestos e que estão a pagar os seus impostos. Acho que é necessária uma consciência cívica nos cidadãosnosentidodequeoscidadãossãoresponsáveispelosseusactosequedevemosapoiarquem a natureza não dotou das capacidades necessárias para se ser feliz e para poder singrar na sociedade. Este novo regulamento vai excluir mais ou menos estudantes do que o anterior sistema? Pode excluir mais no sentido de que alguns que declaram que têm património acima de 100 mil euros já não vão ter apoio. Portanto, alguns serão excluídos. Mas, pelas regras técnicas de cálculo não me parece que seja injusto. Devemos esperar pela aplicação, agora no primeiro ano, e vamos ver os resultados, nas auditorias que vamos fazer, se de facto ficou alguém de fora que não deveria ter ficado. ■ Ana Petronilho PORTO EsquentadoresdaBosch Grande parte da linha de esquentadores da Bosch é desenvolvida na Universidade do Porto. Os produtos resultam de uma parceria firmada entre a empresa e a Faculdade de Engenharia da UP (FEUP), e alguns centros de investigação, que cruza a estratégia de inovação e áreas de I&D prioritárias da Bosch Termotecnologia e as competências de I&D da UP. Tintas Cin Foi em parceria com a FEUP que a Cin desenvolveu vários produtos entre os quais: as tintas intumescentes, com elevada resistência ao fogo, de base aquosa ou os novos vernizes parquet, também de base aquosa e com aumento significativo de resistência à abrasão. Garrafa Pluma da Galp A inovadora garrafa portátil de gás da Galp - a Pluma - também foi desenvolvida na Universidade do Porto, em parceria com a Universidade do Minho. Este produto foi distinguido com vários prémios internacionais de ‘design’ desde o seu lançamento. “Em Portugal desresponsabilizamos o cidadão de tudo o que é mau. Não há consciência cívica”.