Doc. 194 – Carta a Dom JEAN-BAPTISTE-FRANÇOIS POMPALLIER,
Vigário Apostólico da Oeania.
1) Breve comentário
a) Carta manuscrita e expedida pelo Pe. Champagnat. Curiosamente, é uma carta do
Fundador que não está conservada nos arquivos da Congregação, em Roma, mas que é
conservada nos arquivos da Província Marista de Sydney, na Austrália. Em 1905, o Irmão
Stanislas, Superior Provincial da Austrália marista, fez uma visita a Dom F. Lenihan, Bispo de
Auckland, Nova Zelândia. No decorrer da conversa, foi relembrado o bom relacionamento que
Marcelino Champagnat tinha com Jean-Baptiste Pompallier, padre marista, depois sagrado
como primeiro Bispo da Nova Zelândia, tendo ali chegado em 1837, na qualidade de
Administrador Apostólico, para dar início ao trabalho missionário naquelas terras da Oceania.
Dom Lenihan, confirmou tais informações, dizendo que a Diocese conservava uma carta de
Champagnat dirigida a Dom Pompallier. Diante do interesse do Irmão Stanislas por tal carta, ela
lhe foi entregue. Desde então, como preciosa relíquia, é conservada nos arquivos da Província
de Sydney.
b) A Carta foi escrita durante a segunda estada de Marcelino em Paris, quando
procurava obter a legalização do Instituto junto ao governo francês. Entretanto, o final da carta
foi escrito em Hermitage. Nessa carta encontramos expressões que mostram a profunda
convicção de Marcelino na proteção de Maria sobre o Instituto. Nela se encontra, também,
aquela que, talvez, seja a mais bela afirmação de Marcelino sobre Nossa Senhora, expressão
correta do ponto de vista teológico, quando diz que o poder de intercessão de Maria é grande
por causa da sua ligação com Jesus: - Com Maria temos tudo, porque Maria está sempre com
Jesus ou no colo ou no coração”.
2) O texto da Carta:
Paris, 27 de maio de 1838. Missões Estrangeiras, rue du Bac, 120
Senhor Vigário Apostólico,
É com grande prazer que, sem detença, aproveito um momento de folga para responder
à sua amável missiva.
Estou em Paris, como o senhor vê, desde o dia 18 de janeiro, procurando conseguir para
os Irmãos a autorização que ainda não obtive, mas que estou cada dia mais esperançoso de
conseguir. Parece que tudo está em ordem, mas as formalidades nunca se encontram
completamente satisfeitas. Quantas andanças dentro de Paris, quantas visitas! Difícil é fazer
uma idéia de toda essa correria.
Foi de batina que realizei todas as minhas visitas, todas as viagens, sem nunca ter
sofrido um insulto nem sequer me chamarem de jesuíta!.
Paris está o máximo de tranqüilidade; o comércio funciona mais ou menos bem. Na
Capital há mais prática religiosa nas pessoas do que se imagina. O senhor bem pode imaginar
como o tempo me custa a passar, afastado como estou das minhas ocupações. Mesmo com todo
este transtorno que tenho em Paris, eu me sinto melhor de saúde do que em L'Hermitage.
O Padre Dubois fala muitas vezes do senhor. Poucos dias se passam sem que ele me
diga: Não esqueça aquela missão.
Santo homem aquele! Seria preciso multiplicá-lo e fazê-lo viver muito tempo.
Nesse tempo, a França está mandando missionários para todos os países que precisam.
Durante minha estada em Paris, vi partir seis do Seminário das Missões Estrangeiras; outros se
estão preparando. Quantos motivos de edificação encontro nesta casa! A religião não morrerá
tão cedo na França, ela possui ainda muita vitalidade. A obra da Propagação da Fé se
desenvolve mais e mais cada dia.
O Padre Mioland foi nomeado bispo de Amiens; tomou posse ontem. Os Cartuxos
nomearam novo superior, é pena que não me lembre do nome.
Continuamos a receber muitos noviços. Somos atualmente duzentos e vinte e cinco ou
seis (Irmãos). Temos trinta e oito ou trinta e nove estabelecimentos e setenta pedidos. Sofremos
um verdadeiro assédio por parte daqueles que querem conseguir Irmãos; empregam toda sorte
de estratagemas para arrancá-los. Os que não gozam de alguma influência, servem-se de pessoas
às quais não podemos recusar.
Estamos em vésperas de abrir uma nova casa mãe (noviciado). É possível que a
estabeleçamos no Departamento do Var.
O Padre Matricon continua comigo, estou muito contente com ele. Faz-se estimar pelos
Irmãos e sabe julgar com muito acerto. Tenho também o Padre Besson, que continua muito bom
rapaz. O Irmão François é meu braço direito; governa a casa durante minha ausência como se eu
estivesse presente. Todos o acatam sem resistências.
Maria mostra visivelmente sua proteção sobre l’Hermitage. Como tem força o santo
nome de Maria! Quão felizes somos de nos termos ornamentado com ele! Há muito que não se
falaria mais de nossa Sociedade sem este nome milagroso! Maria, está aí toda a riqueza
(ressource) de nossa Sociedade.
Terminamos a Capela. Está muito bonita; nós a consideramos infinitamente cara a
nosso coração, abençoada que foi por nosso primeiro missionário e primeiro bispo da
Sociedade. A todos esses títulos espero que se acrescentará um terceiro, como consequência
natural: o primeiro que.
O Padre Terraillon continua como pároco de Saint Chamond. Penso, contudo, que não
vai parar lá por muito tempo.
O senhor Arcebispo manifesta mais do que nunca sua benevolência para conosco e da
mesma maneira o bispo de Belley.
Neste ano, começamos o estabelecimento da Grange-Payre. Já começa a prosperar,
tendo já matriculado um bom número de alunos. Maria, sim só Maria é nossa prosperidade; sem
Maria não somos nada e com Maria temos tudo, porque Maria está sempre com seu adorável
Filho ou no colo ou no coração. Como pode o senhor imaginar, é também por Maria que espero
conseguir a autorização que estou pleiteando.
Seja feita a santa, a santíssima vontade de Deus! Ouço o senhor responder: Amém! Que
todos os que acompanham V. Excia., a saber, Irmãos e Confrades respondam o mesmo, e que
rezem por mim, que me recomendo às fervorosas orações deles, sobretudo às suas, Excia. Por
minha parte, nunca subo ao santo altar, sem lembrar-me de nossa querida missão e dos que para
ela são enviados. Continue mostrando-se o pai dos que lhe enviamos, do mesmo modo como
procedeu com os primeiros.
Digne-se V. Excia. acolher os protestos do meu sincero devotamento e de sentimentos
verdadeiramente afetuosos com que, Ex.mo Vigário Apostólico, tenho a honra de ser, com
respeito, seu servo muito humilde.
Champagnat
Estou de volta a l’Hermitage, sem ter chegado ao fim em Paris. O senhor Fulchiron que
entrevistei logo ao chegar de Paris, me diz que meus papéis tinham finalmente saído dos
escritórios da Universidade, para serem encaminhados ao conselho de Estado, com uma apostila
favorável emanada do senhor Ministro.
Vamos fundar uma escola em Saint-Pol (Pas-de-Calais), foi-me pedido pelo Ministro.
Parece que quereriam que fosse uma casa mãe (noviciado). Outra está sendo pedida para
Montpellier e uma para o Departamento do Var, onde todos os gastos serão por conta dos
peticionários.
Estamos sendo assediados pelos numerosos pedidos que todos os dias batem à nossa
porta. Estou desejoso de encontrar quem me substitua.
Reze por mim, estou muito precisado de orações. Estou convencido de que suas orações
são agradáveis ao bom Deus.
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Carta doc. 194 a Dom Pompallier