Velhice
Na semana passada, toquei em um assunto muito importante: a velhice. Importante por
dois motivos: um, que muitas pessoas que convivem conosco são de mais ou de muita
idade, dois, que um dia nós seremos velhos. De onde é uma questão de justiça e de
sensatez pensar em um bom modo de encarar a velhice.
Na verdade, faz pouco tempo que a velhice vem se tornando um fato comum. Antes, as
pessoas morriam muito mais cedo. Hoje, por causa de uma série de fatores, há muito
mais pessoas velhas.
O problema número um que indiquei é que por causa dos nossos tempos tecnológicos e
consumistas (especialmente de novidades) “velho” ficou sinônimo de obsoleto,
ultrapassado. E com as pessoas não é diferente.
Embora, as pessoas de mais idade não estejam familiarizadas com muitos assuntos mais
“modernos”, como microcomputadores e telefones celulares, o fato é que há muitas
coisas no mundo e na vida que sempre foram iguais e serão sempre do mesmo jeito.
Pelo menos por muito tempo. Por exemplo: as pessoas não são diferentes, em uma série
de coisas. Platão já se queixava da inconstância e da falta de amigos verdadeiros, por
exemplo. Logo, há muita sabedoria a aprender com os mais velhos. Esquecemos de
olhar as pessoas mais velhas como fonte de consultas, simplesmente porque elas não
sabem mexer em uma TV com controle remoto. Como elas olham o mundo cheio de
coisas novas que não conhecem e nós mesmo estamos o tempo todo dando indiretas
nesse sentindo, todo mundo acaba acreditando nisso: que a experiência dos mais velhos
não é útil nesse mundo “moderno e diferente do tempo dele...”
As pressões políticas são as mesmas, as invejas, as brigas pelo poder... Tudo igual.
Muda o cenário, mas o texto é o mesmo. As nossas necessidades de companhia, os
impulsos que nos atrapalham, não mudam só porque o código de conduta é outro.
Por outro lado, as coisas diferentes podemos muito bem ter um pouco de paciência e
explicar. Logo colheremos os frutos disso: as pessoas mais velhas e experientes
começarão a entender o que ser passa e a nos ajudar com pontos de vista enriquecidos.
Se não conseguimos fazer isso é que, na verdade, nunca tivemos intimidade ou um bom
relacionamento com essas pessoas. Ou que as pessoas estão muito fechadas em si
mesmas e não conseguem mais se abrir para nada. Isso não é velhice, é doença. Aliás,
velhice não é doença.
Por outro lado, adoramos enquadrar as pessoas. Esse comportamento não é bom, aquele
não é próprio, isso não pode fazer, aquilo fica feio... isso é ridículo... e assim por diante.
De modo que não sobra nada “adequado” para a pessoa de mais idade fazer a não ser
ficar sentado na poltrona, vendo o tempo passar. Não podemos nos conformar com isso
e não estimular esse tipo de controle. É necessário que saibamos acolher todas as
pessoas que têm iniciativas e desejo de realizar coisas na vida. Todo mundo fica
comentando quando aparece alguém de mais idade que quer estudar ou coisa assim.
Deveria ser uma coisa comum. Afinal, não haviam tantas pessoas velhas antigamente,
logo, os mais velhos de hoje, precisam inventar uma maneira de ser, de gastar o tempo,
de viver, de buscar coisas. É nosso dever, então, não só levar os velhinhos no médico,
mas ajudá-los a achar um sentido para a vida e um lugar na sociedade. Como disse, isso
é um dever por justiça e uma atitude muito sensata, porque, muito antes do que a gente
imagina ou gostaria, vamos estar na mesma situação. Logo, precisamos inventar um
novo modo de ver a vida para os mais velhos. Vamos ajudá-los nisso e todos terão mais
saúde, inclusive nós mesmos, pois teremos relacionamentos mais saudáveis com todos e
teremos uma visão mais realista da vida. É! Porque a imensa maioria das pessoas pensa
que não vai envelhecer nunca. Que os mais velhos já nasceram assim e que ele vai ficar
do jeito que está para sempre.
Pois é, aprenda com os mais velhos, antes de mais nada, a arte de envelhecer.
Quando você menos esperar, vai precisar disso...
João Paulo Correia Lima
Psicólogo clínico – Diretor Científico da Associação Brasileira de Medicina
Psicossomática
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