Salvar a Democracia
Talvez porque tenhamos sido colônia por muito tempo e experimentado
longos períodos sob o tacão da ditadura
só no último século 35 anos , ainda
hoje, em pleno regime democrático, temos uma relação subvertida com os nossos
governantes e com a autoridade em geral. Embora a democracia exista por e para
o eleitor nossos representantes uma vez no poder parecem se deslocar dos
interesses da sociedade e ganham vida própria. E o brasileiro, de uma maneira
geral, aceita passivamente seu papel de mero espectador.
A cordialidade do nosso povo, de que falava Sérgio Buarque de Holanda é,
sem dúvida, uma qualidade, mas se torna um defeito quando é apenas a outra
face da sua incapacidade de exercitar seus direitos. Ou quando serve para que
tudo acabe em rapapés e cumprimentos calorosos e os problemas nunca sejam
enfrentados, estamos contribuindo para que as coisas não cessem de piorar.
Demonstrar insatisfação e exercer a crítica não são um atentado à
democracia. Pelo contrário. O que caracteriza, alimenta e aperfeiçoa a democracia
é justamente a possibilidade de falar quando as coisas não estão bem. Aliás, a
esta altura dos acontecimentos, é talvez a única coisa que pode salvá-la de um
processo já avançado de degradação. A nossa democracia esta falhando e corre o
risco de perecer justamente pela anêmica participação e capacidade crítica da
sociedade.
Só que assumir uma postura crítica pressupõe trocar a velha passividade e
subalternidade por uma postura altiva, o que não nos parece ser muito fácil.
Somente com instituições e entidades efetivamente representativas e participativas
a democracia poderá ganhar legitimidade e, aos poucos, começar a corrigir seus
defeitos. A menos disso, os governantes e o grupo de pressão organizados
continuarão mandando sozinhos em total detrimento da absoluta maioria da
população.
Há pouco saímos de um regime ditatorial, e, perigosamente, assistimos
hoje a índices de desordem, corrupção e desmando político. É preciso abandonar
a crença de que colocar panos quentes é uma forma de preservar a democracia e
o melhor a fazer para que as coisas se ajeitem naturalmente. Essa postura
assassina a democracia. E produz ambiente perfeito para que os ovos da serpente
continuem sendo fecundados em paz.
Sérgio Lewim - Advogado
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