DISCURSO DA PRESIDENTE DA COMISSÃO NACIONAL PARA O ANO INTERNACIONAL DOS VOLUNTÁRIOS, SENHORA D. MARIA JOSÉ RITTA 1. Estamos a chegar ao fim do Congresso do Ano Internacional dos Voluntários. E aproximamo-nos também do fim desse Ano. Ao longo dele, recordámos o passado e louvámos a acção altamente meritória de tantos voluntários que nos precederam, e de todos os que hoje mantêm viva a mesma chama. Clarificámos a identidade do trabalho voluntário, analisámos as condições do seu exercício e esboçámos linhas de orientação para o futuro. Contribuímos para a sua visibilidade, ouvimos voluntários e dirigentes benévolos, e talvez tenhamos contribuído para o lançamento de uma nova fase na história do voluntariado. 1. Do passado recebemos um conceito de trabalho voluntário já consolidado há muitos séculos. Nesse conceito realça-se a gratuitidade como elemento distintivo, associado naturalmente a outras características e valores já consagrados, tais como a solidariedade, a participação, a complementaridade, a responsabilidade e a convergência. Mas o nosso senso comum associa-lhes frequentemente os valores “serviço”, 2 “disponibilidade”, “dedicação” e tantos outros, de acordo com a experiência e as motivações de cada um de nós. Ficou bem claro, ao longo do Ano, que o trabalho voluntário não é superior nem inferior ao trabalho profissional remunerado. Ambos são iguais em dignidade e radicam no mesmo impulso espontâneo para a actividade, para a realização pessoal e para o bem estar articulado com o bem comum. 2. Na abertura de horizontes para o futuro, vêm ganhando relevo cinco áreas de acção: a formação; o encontro entre a oferta e a procura de voluntários; a organização e a representatividade; o relacionamento com o Estado; e a dinamização local. Tudo isto já foi objecto de clarificação no Congresso, nos Encontros Regionais e noutras iniciativas. A Comissão Nacional retirará daí as medidas concretas a sugerir, no seu relatório final, para a facilitação futura do trabalho dos voluntários. Como ficou bem claro ao longo do Ano e neste Congresso, o voluntariado emana da sociedade civil e afirma-se através dos voluntários e de suas organizações. Daí que o relacionamento com o Estado seja tipicamente de parceria aberta, marcada pelo respeito mútuo. De acordo com esta orientação, o que se espera do Estado é o reconhecimento do voluntariado, a facilitação do seu trabalho e a 3 concessão de alguns apoios para formação e outros fins. O relatório final da Comissão Nacional também terá em conta estes aspectos, baseando-se nas conclusões do Congresso e no esforço de auscultação, estudo e concretização que tem caracterizado todo este Ano e se prolongará até ao fim. 3. Nestas minhas palavras finais, gostaria de vos dar a conhecer aquelas que me parecem ser as linhas de força estratégicas para o futuro do voluntariado. Linhas de força que integram as referidas cinco áreas temáticas e outras que, por consenso dos voluntários se justifique acrescentar. Essas linhas, que destaco, a título de contribuição pessoal, são a cidadania, a participação e o desenvolvimento. O voluntariado brota da cidadania, promove-a e renova-a permanentemente. Na maior parte das pessoas, toda a sua vida política e cívica se processa em regime de voluntariado – mesmo que não seja reconhecido como tal. E, por outro lado, todo o voluntariado é exercício de civismo e de co-responsabilidade pelo bem comum. O conceito de co-responsabilidade conduz-nos à segunda linha de força: a participação. O voluntariado, integra-se nos grandes dinamismos da sociedade. Bom é que seja reconhecido como tal e que ele próprio se 4 organize para valorizar os seus contributos a favor do bem-estar geral. Bom é também que os voluntários tomem parte na orientação e funcionamento das organizações em que exercem a sua actividade. Participação e cidadania - dimensões fortes da democracia - não podem dissociar-se da terceira linha de força – o desenvolvimento – sob pena de o bem-estar pessoal e geral ficarem bloqueados. O voluntariado tradicional não deixou de contribuir para o desenvolvimento, apesar das contingências que o afectaram na sua longa história. Creio no entanto – como ficou demonstrado ao longo do Ano e do Congresso – que agora se exige um pouco mais. Ou melhor: exige-se o que é próprio do tempo que estamos a viver. Exige-se a integração em processos de desenvolvimento local, regional, nacional e internacional. Exige-se que os voluntários se assumam claramente como agentes e promotores de desenvolvimento, em cooperação com outras entidades que participam na vida da sociedade. Que sejam agentes e promotores de um desenvolvimento baseado na co-responsabilidade, na justiça, na equidade, no respeito de direitos, na diferenciação positiva em relação aos mais fracos, e na abrangência de todos os problemas e de todas as pessoas. Torna-se necessário, para tanto, que o voluntariado se organize em todos os recantos do país, junto das comunidades sendo pioneiro – como sempre foi – na identificação de problemas e na procura de soluções, mas reforçando as vertentes da cooperação, da parceria, e da participação activa em projectos locais que melhorem de facto a vida das pessoas. Por 5 esta via chegará a toda a parte, assumirá todos os problemas e actuará em todas as causas, de acordo com a sua identidade e missão. 4. Resta-me a grata missão dos agradecimentos. Registo, com todo o apreço, a instituição do Ano Internacional dos Voluntários pela Assembleia-Geral das Nações Unidas. Registo, com igual apreço, a adesão do Governo português a esta feliz iniciativa, e a criação da Comissão Nacional para o Ano Internacional dos Voluntários, com mandato bem preciso e adequado. Agradeço à Comissão Nacional e ao Núcleo de Apoio Técnico o papel decisivo que desempenharam na organização do Congresso e em todas as iniciativas do Ano Internacional. A Comissão Nacional assegurou o quadro geral orientador de todos os actos comemorativos. E o Núcleo de Apoio Técnico, coadjuvado pelo Círculo de Apoio à Integração dos Sem Abrigo (CAIS) e com a cooperação, a título gratuito, da empresa Edson F C B, excedeu-se em dedicação e esforço permanentes, preenchendo todas as lacunas e limitações próprias de uma estrutura precária. Na ligação entre a Comissão Nacional, justo é referir a Dra. Maria de Belém Roseira, presidente da Comissão Organizadora do Congresso, e a Dra. Maria do Rosário Carneiro, coordenadora do processo de elaboração dos estudos realizados ao longo do Ano. 6 Justificam uma referência especial o cantor Paulo de Carvalho e o poeta Joaquim Pessoa, autores do hino do Ano Internacional. Hino que foi a nossa música de fundo e fonte de inspiração em muitos eventos. Na mesma referência envolvo todos os artistas, profissionais e amadores, os técnicos e outras pessoas que, em regime de voluntariado ou não, animaram e viabilizaram connosco este Congresso, os Encontros Regionais e outras iniciativas. À Culturgest e à Caixa Geral de Depósitos é devido o maior apreço pelo invulgar patrocínio que ofereceram à realização do Congresso. Desse modo explicitaram a sua inserção numa das grandes vertentes da cidadania empresarial que é o apoio ao voluntariado. A minha última expressão de reconhecimento vai para todos vós e para todos os outros voluntários portugueses que actuam no país e fora dele, nos diferentes domínios do voluntariado. Infelizmente, o número de lugares disponíveis ficou muito aquém do número de inscrições no Congresso. Tal facto – que muito me penaliza – indicia por outro lado que, felizmente, o dinamismo do voluntariado excede, muitas vezes, as previsões e expectativas mais optimistas. 7 Mas é sobretudo em vós e em todos os voluntários que está o futuro do voluntariado. É pela acção de todos que o voluntariado contribuirá para o futuro do país e do mundo. Um futuro baseado, cada vez mais na afirmação dos valores humanistas da tolerância, da justiça, e da paz .