124 Assim, percebemos que nossa ação estava provocando algumas reflexões por parte dos professores. Para a terceira oficina, entregamos para leitura prévia: SOLÉ, I. Estratégias de leitura. Trad. Cláudia Schilling. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 1998, cap. 5, 6 e 7. 3.1.1.3 3ª oficina - Estratégias, etapas e objetivos de leitura Para desenvolver o trabalho proposto nessa terceira oficina, reportamo-nos aos estudos de Solé (1998), Kleiman (2008) e Koch e Elias (2011). Como os capítulos 5, 6 e 7 do livro de Solé (1998) haviam sido propostos para leitura prévia, eles foram utilizados como referência maior para as discussões. Embora considerássemos que a autora seja bem didática na apresentação de sua obra, alguns professores acharam difícil a leitura dos capítulos propostos. Consideramos que é importante apresentar aos professores que a leitura é realizada por nós no dia a dia para atender a diferentes objetivos. Dessa forma, Solé (1998) apresenta os seguintes objetivos de leitura: Ler para obter uma informação precisa; Ler para seguir instruções; Ler para obter uma informação de caráter geral; Ler para aprender; Ler para revisar um escrito próprio; Ler por prazer; Ler para comunicar um texto a um auditório; Ler para praticar a leitura em voz alta; Ler para verificar o que se compreendeu (SOLÉ, 1998, p. 9399). Julgamos necessário apresentar aos docentes os objetivos destacados por Solé, pois dependendo do objetivo que se tem, o modo de encarar a leitura vai sofrer alterações. A atenção dispensada à leitura de um romance, por exemplo, é diferente da que dispensamos a um texto que cairá em uma prova. Ao abordarmos os objetivos de leitura, comentamos com os professores que um dos objetivos que precisa ser enfatizado com os alunos, pois parece que está um pouco esquecido, é o de ler para revisar o próprio escrito, contudo, sabemos que além de ler o texto, após terminá-lo, é importante criar um afastamento, haja vista 125 que quando o aluno termina de produzir o conteúdo que ele pretendia escrever, está recente em sua memória e, devido a isso, nem sempre percebe onde há erro. E um participante disse: Esses dias eu fiz uma produção na sexta-feira e na segunda-feira eu entreguei novamente para eles e pedi para eles revisarem, porque eu só iria corrigir depois que eles revisassem. Daí eles pediam pode apagar? Eu falei esse é o objetivo. Mas foi a primeira vez que eu fiz, mas gostei (Docente E, 21/03/2013). Enfatizamos que essa atividade é interessante de ser feita. É claro que ao terminar de produzir um texto, vamos continuar solicitando aos alunos que leiam o que produziram, no entanto, podemos retomar essa produção em outro momento. É relevante que se tenha consciência de que, dependendo do objetivo que se tem, a estratégia de leitura que será empregada no processamento da leitura será diferente, pois podem auxiliar os alunos a controlarem sua própria leitura e assim proporcionar uma compreensão leitora mais eficiente. Nesse sentido, apresentamos as atividades de pré-leitura, leitura e pós-leitura. Koch e Elias (2011) tratam de quatro estratégias de leitura: antecipação, seleção, inferência e verificação. Na oficina detalhamos cada uma delas e ao fazer esse detalhamento, fizemos a ponte com o que Solé (2011) apresenta como atividades pertinentes para antes, durante e depois da leitura, haja vista que elas se complementam. Ao abordarmos a pré-leitura, explicamos que a sua função é a de ativar conhecimentos prévios, estabelecer previsões e formular hipóteses sobre o texto e essas atividades devem ser realizadas antes da leitura do texto. Assim, utilizamos as ilustrações e o título para fazer previsões a respeito do que será tratado no texto. Nesse caso, são interessantes as questões descendentes. Inclusive as atividades de pré-leitura são previstas no currículo de Cascavel. A partir do texto ―Dentes limpinhos‖, que foi utilizado na oficina anterior, elaboramos atividades de pré-leitura: A partir do título ―Dentes limpinhos‖, de que você acha que esse texto vai tratar? Você escova seus dentes todos os dias? Quantas vezes? Você costuma ir ao dentista? Por que é importante escovar os dentes? Você conhece a Revista Recreio? Quem escreve para essa revista? Com que finalidade os autores escrevem? Quem é o público leitor dessa revista? Por que você acha que no título e usado o diminutivo ―limpinhos‖? Com esses 126 questionamentos é possível levantar dados sobre o contexto de produção do gênero, bem como sobre o próprio texto. Explicamos, na sequência, que leitura é o momento em que de fato é lido o texto. Nesse processo também podem ocorrer estratégias como estabelecimento de coesão e coerência, inferência de palavras a partir do contexto, entre outras. Assim, podemos dizer que ―a leitura é um processo de emissão e verificação de previsões que levam à construção da compreensão do texto‖ (SOLÉ,1998, p. 115). Solé (1998) destaca que, durante a leitura, é importante que o professor conduza os alunos na elaboração de resumos daquilo que foi lido e nós apresentamos isso aos professores para mostrar que o resumo é uma atividade que precisa ser ensinada, assim, primeiro elaboram-se resumos com mediação para que depois os alunos possam fazê-lo com autonomia. Além do resumo, outras estratégias podem ser ensinadas como sublinhar as palavras importantes ou que não se conhece o significado. Um participante relatou: Durante esse trabalho de fazer resumo, eles podem também ir anotando as palavras chaves. Eu faço isso, também vai lendo e grifando (Docente M, 21/03/2013). Enfatizamos que ao atuar como mediador da leitura é fundamental que o professor realize a leitura compartilhada. Segundo Solé (1998), nessa atividade o docente seleciona o texto a ser trabalhado e executa a leitura junto com os alunos e durante essa leitura são estabelecidas estratégias, sendo essas definidas pela autora: Depois da leitura, o professor conduz os alunos através das quatro estratégias básicas. Primeiro se encarrega de fazer um resumo do que foi lido para o grupo e solicita sua concordância. Depois pode pedir explicações ou esclarecimentos sobre determinadas dúvidas do texto. Mais tarde formula uma ou algumas perguntas às crianças, cuja resposta torna a leitura necessária. Depois dessa atividade, estabelece suas previsões sobre o que ainda não foi lido, reiniciandose deste modo o ciclo (ler, resumir, solicitar esclarecimentos, prever), desta vez a cargo de outro ―responsável‖ ou moderador (SOLÉ, 1998, p. 119, grifos nossos). Conforme Solé (1998), o importante é entender que, para dominar as estratégias responsáveis pela compreensão - antecipação, verificação, 127 autoquestionamento - não é suficiente explicá-las; é preciso colocá-las em prática, compreendendo sua utilidade. Na sequência, abordamos a atividade de pós-leitura, assim, após realizar a leitura de um texto, é importante que o aluno continue utilizando algumas estratégias que possam facilitar a sua compreensão a respeito do que leu. Uma dessas estratégias de pós-leitura é a de identificar a ideia principal, neste caso o aluno tem que distinguir entre as informações acessórias que aparecem no texto, o que é mais relevante. Outra estratégia a ser utilizada após a leitura é a atividade de resumo. Conforme Solé, ―a elaboração de resumos está estritamente ligada às estratégias necessárias para estabelecer o tema de um texto, para gerar ou identificar sua ideia principal e secundária‖ (SOLÉ, 1998, p. 143). Nesse sentido, chamamos a atenção dos professores, pois não basta solicitar aos alunos que localizem a ideia principal de um texto ou façam o resumo. Antes disso devem ter sido realizadas essas atividades coletivamente, pois sabemos que essas são atividades extremamente importantes. Um professor relatou: É como quando a gente trabalha um filme e pede para os alunos resumirem, daí eles querem escrever tudo, eles escrevem páginas e páginas (Docente P, 21/03/2013). A partir desse relato, reforçamos o que estávamos dizendo, ou seja, se os alunos estão fazendo isso é porque eles ainda não conseguem perceber o que é principal, por isso, a necessidade de ensinar como se faz o resumo, como afirma Solé, ―a ler se aprende lendo, e a resumir se aprende resumindo‖ (SOLÉ, 1998, p. 144). Ainda abordamos os tipos de perguntas. Neste caso nos pautamos em Solé para exemplificar que temos, segundo a autora ―perguntas de resposta literal[...]; perguntas para pensar e buscar [...]; perguntas de elaboração pessoal [...]‖ (SOLÉ, (1998, p. 155). Nós trabalhamos as atividades de antecipação, seleção, inferenciação e verificação a partir do miniconto ―O retorno do patinho feio‖, que consta no livro: Ler e compreender os sentidos do texto, de Koch e Elias (2011). Nós realizamos essa atividade da forma como ela estava prevista no livro das autoras e fomos fazendo as previsões com os professores e eles se envolveram bastante na atividade. 128 Depois, apresentamos outro exemplo produzido por nós, a partir da crônica Vida Fácil, de Alexandre Azevedo. Figura 21 – Atividade de pré-leitura Olhando para o título que previsões podemos fazer sobre o texto? A ilustração favorece o estabelecimento de alguma relação com o título? Autor do texto: Alexandre Azevedo O que é para você uma vida fácil? Quem tem vida ‘fácil? A partir da ilustração e do título sobre o que você acha que o texto vai tratar? Você tem vida fácil? Gênero textual: Crônica Ilda de F. de L. Oliveira Fonte: Organizado pela pesquisadora. A partir do título e da ilustração presente na crônica, organizamos perguntas para que os professores procurassem antecipar o que seria tratado no texto. Elaboramos também outros questionamentos, como: ―O que é para você vida fácil?, para que os participantes fizessem previsões simulando como deveria ocorrer isso na sala de aula. 129 Figura 22 – Etapa da leitura Após fazer as previsões a partir do título e da ilustração iniciamos a leitura e para incentivar os alunos a elaborarem hipóteses para o que irão ler e assim ativar seus conhecimentos prévios. Iniciando a leitura: Ilda de F. de L. Oliveira Fonte: Organizado pela pesquisadora. Após os professores fazerem as suas previsões iniciamos a leitura do texto. O interessante foi que os professores se envolveram com o texto e ficaram curiosos para saber o que aconteceria. Figura 23 – Etapa da leitura. Neste trecho são apresentados dois personagens uma senhora e um rapaz. Como a senhora é descrita? E o rapaz? Qual seria o motivo da urgência do rapaz para usar o telefone? Será que a senhora permitiu que o rapaz usasse o telefone ante que ela? Ilda de F. de L. Oliveira Fonte: Organizado pela pesquisadora. 130 Como é possível perceber no slide, nós organizamos a leitura do texto como se fosse para uma aula com crianças, por isso, fazíamos as antecipações, em seguida após a leitura e confirmávamos ou não as previsões e na sequência elaborávamos novas antecipações para o que seria lido (apêndice 2). No trabalho proposto na oficina tínhamos outros slides. Apresentamos esses três para ilustrar como foi organizada a atividade. A aplicação dela foi muito produtiva, pois os professores se envolveram como se fosse uma turma de crianças, fazendo as previsões e confirmando-as ou não na sequência. Visando incentivar a leitura, os professores buscam formas de fazer isso e um professor relatou que: Na minha sala cada semana tem um responsável para colocar na parede, próximo ao lixeiro que é um lugar movimentado, uma leitura para as crianças lerem, a princípio eu colocava e ninguém olhava agora eles estão se interessando em ler. Tem vezes que eu coloco texto imagético. Às vezes eu esquecia propositalmente de colocar o texto e daí eles já cobravam (Docente O, 21/03/2013). Nessa oficina propusemos aos professores que elaborassem atividades de pré-leitura, leitura e pós-leitura, a partir da crônica a bola de Fernando Verríssimo (anexo C). Nessa atividade elaborada pelos professores percebemos que a maioria conseguiu planejar atividades pensando nas etapas de leitura. É claro que vários professores na atividade de pós-leitura elaboram questões que focavam mais no leitor. Acreditamos que isso se deve ao fato de que o conteúdo do texto aborda a relação das crianças de hoje com os brinquedos eletrônicos, em decorrência disso o menino não demonstrou interesse pela bola que ganhou de seu pai. No momento de preparar as atividades, os docentes pensaram em fazer com que seus alunos refletissem sobre essa situação. Desse modo, priorizaram questões descendentes. O texto sugerido para leitura prévia para o próximo encontro foi: HILA, Cláudia Valéria Doná. Ressignificando a aula de leitura a partir dos gêneros Textuais. In: NASCIMENTO, E. L.. Gêneros textuais: da didática das línguas aos objetos de ensino. 1. ed. São Carlos: Editora Claraluz, 2009. p. 151-194. 131 3.1.1.4 4ª oficina - Gêneros discursivos e leitura Retomamos a concepção de letramento apresentada na 2ª oficina, que preconiza que o trabalho com a língua deve ocorrer a partir de textos que circulem socialmente. Ao fazer esse resgate, apresentamos a necessidade que se impõe de trabalharmos com os mais diversos gêneros discursivos, já que o trabalho com os diversos gêneros está previsto nos três documentos analisados. Mesmo os PCN de Língua Portuguesa sendo o mais antigo dentre os documentos analisados, já apresentava os gêneros como objeto de ensino da Língua Portuguesa. Apresentamos o seguinte trecho do currículo de Cascavel para reforçar a importância do trabalho com o gênero: ―O texto será o material verbal mais importante no trabalho do professor com o aluno, não apenas um tipo de texto, mas todos os que concretizam um determinado discurso‖ (CASCAVEL, 2008, p. 330). A partir desse trecho, enfatizamos que hoje não podemos pensar o trabalho com a língua/linguagem que não seja por meio dos gêneros discursivos/textuais. Nessa oficina, revisitamos os estudos de Bakhtin (2003) para caracterizar os gêneros como tipos relativamente estáveis de enunciados por meio dos quais nos comunicamos nas mais diversas situações de interação. De acordo com Bakhtin (2010), a língua não é um ato individual, mas sim uma forma de interação entre sujeitos, é um ato social que se realiza e se modifica nas relações sociais. Nesse contexto, situa-se o trabalho com os gêneros que irão materializar e ampliar as interações entre os homens. Para Bakhtin, Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão sempre relacionadas com a utilização da língua, a qual efetuase por meio de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana (BAKHTIN, 2003, p. 279). Para esse autor, o ser humano, em quaisquer de suas atividades, vai servirse da língua, a partir do interesse, da intencionalidade e da finalidade específicos de cada atividade e, a essas diferentes formas de incidência dos enunciados, o autor denomina gêneros do discurso. A língua vive e evolui por meio da interação entre sujeitos e das situações concretas de produção. Assim, o trabalho com os gêneros é fundamental, uma vez que eles se constituem como ações sócio-discursivas para 132 agir sobre o mundo e dizer o mundo, constituindo-o de algum modo, ou seja, para conhecer um gênero discursivo é imprescindível conhecer suas condições de uso, adequá-lo ao contexto social e contextualizá-lo, provocando situações nas quais o sujeito possa agir criticamente sobre o texto. É necessário ter a compreensão de que não é mais possível trabalhar a Língua Portuguesa por meio de textos artificiais que existem apenas nas paredes da escola, como diz Soares (2010), mas que os educadores visualizem os textos que têm circulação no meio social em que o aluno está inserido, mostrando a eles que o texto pode ir muito além de um amontoado de palavras, frases e parágrafos, mas que em uma figura pode haver uma mensagem implícita que equivale, muitas vezes, a uma reflexão maior e mais qualitativa no que concerne ao conteúdo. É importante que se compreenda que, desde a Educação Infantil, os alunos precisam estar em contato com gêneros textuais diversificados, para a formação de um leitor/escritor competente. Fiorin faz a seguinte consideração sobre gêneros: Os gêneros são meios de aprender a realidade. Novos modos de ver e de conceptualizar a realidade implicam o aparecimento de novos gêneros e a alteração dos já existentes. Ao mesmo tempo, novos gêneros ocasionam novas maneiras de ver a realidade. A aprendizagem dos modos sociais de fazer leva, concomitantemente, ao aprendizado dos modos sociais de dizer, os gêneros (FIORIN, 2008, p. 69). Assim, defendemos que quanto maior for a diversidade de gêneros apresentados aos alunos, maiores serão suas possibilidades de compreender a realidade, haja vista que socialmente é por meio deles que nos comunicamos. Entender, portanto, as especificidades de cada gênero e os motivos de sua produção (função social) faz com que os educandos ampliem suas capacidades de realizar inferências com os conhecimentos prévios que já possuem a respeito de determinado assunto. É importante destacar que o trabalho com os gêneros deve iniciar desde a alfabetização, como afirma Fiorin: ―Fala-se e escreve-se sempre por gêneros e, portanto, aprender a falar e a escrever é, antes de tudo, aprender gêneros‖ (FIORIN, 2008, p. 69). Portanto, não podemos ter o medo de abordar os gêneros em sala de aula, subestimando, assim, a capacidade dos alunos e negando-lhes o direito de conviver com situações reais de fala, leitura e escrita. 133 Nessa oficina, procuramos convencer os professores de que a utilização do gênero em sala de aula se justifica por seu caráter social de uso e, quando se trata da leitura, temos que ter o cuidado com a didatização do texto, pois é isso que os livros didáticos muitas vezes propõem. Tanto é que na maioria das vezes não fazem nem sequer referência ao autor do texto, ou é produzido pelo próprio autor do livro, ou seja, são produzidos apenas com o fim escolar. Apresentamos o cartum seguinte para fazermos uma reflexão com os professores. Figura 24 – Cartum para reflexão sobre a intencionalidade do gênero Fonte: http://www.ccs.saude.gov.br/visa/humordown.html Questionamos o grupo sobre qual seria a intenção desse cartum. E as respostas foram: Conscientizar sobre os problemas de poluição (Docente A, 11/04/2013). Para pensar sobre a situação do planeta (Docente E, 11/04/2013). Para termos enunciação a partir desse cartum, não basta saber decodificar o que está escrito e observar as imagens, é preciso que haja a relação da imagem e da escrita com o que temos acompanhado socialmente, ou seja, temos que resgatar o contexto de produção, pois há aqui uma crítica a um problema ambiental muito sério que envolve o lixo hospitalar. 134 Ler, de acordo com Hila (2009), envolve uma série de capacidades de compreensão que nem sempre estão dadas no texto. É preciso mobilizar os conhecimentos prévios de mundo para conseguir chegar a uma enunciação. Nesse sentido, utilizamos uma charge para ilustrar que nem sempre podemos fazer a leitura literal de um texto. Figura 25 – Charge para refletir sobre a leitura literal. Fonte: http://omelhordolivro.wordpress.com/charges-e-tirinhas/ A partir dessa charge foi possível refletir com os professores sobre os problemas de compreender a leitura em seu sentido literal e de não ter domínio dos gêneros que circulam socialmente. Pois, no caso das duas senhoras representadas no slide (figura 25), o desconhecimento do gênero prejudicou totalmente a leitura, tendo em vista que nesse caso a leitura literal não tem sentido. Hila (2009) também chama a atenção para a significação do enunciado que se dará de acordo com o seu contexto de produção. Assim, o enunciado: ―A porta está aberta‖, terá sentido distintos dependendo do seu contexto de uso, portanto, se for utilizado pela esposa em uma discussão com o marido, pode querer dizer para ele, ―vá embora‖. Agora se o mesmo enunciado for utilizado por amigos, quer dizer volte sempre, a porta estará sempre aberta para você. E chamamos a atenção dos docentes para o fato de a estrutura do enunciado ser exatamente a mesma, contudo 135 a forma como ele é dito e o contexto em que é produzido proporciona a alteração em sua enunciação. Isso justifica o fato de que não basta ler o texto, tem-se que saber em que contexto ele foi produzido. Considerando a leitura, podemos afirmar ainda que o mesmo enunciado (escrito) poderá ter significados diferentes, dependendo de quem ler, pois a ideologia, os conhecimentos linguísticos, enciclopédicos e interacional variam de sujeito para sujeito, mas é claro que haverá momentos em que as leituras serão diferentes, mesmo se tratando de um mesmo texto. Quando isso acontecer é preciso voltar a ele e verificar se as marcas linguísticas deixadas possibilitam aquela leitura. Temos que considerar que as leituras são plurais. Para enfatizar a importância da esfera de circulação do gênero, utilizamos o exemplo apresentado por Hila (2009): Figura 26 – Esfera de circulação do gênero Fonte: Hila (2009, p. 162). Na sequência apresentamos outro slide que dá continuidade questionamentos quanto a esfera de circulação e a produção de sentido. aos 136 Figura 27 – Esfera de circulação do gênero. 3. Agora vamos imaginar que você foi ao dentista e pegou uma revista dirigida à saúde bucal na qual havia essa foto seguida de uma reportagem. Nesse caso a foto significaria um apelo para que você consumisse balas? Justifique. 4. Observando o que você respondeu na questão 2 e 3, a que conclusão você diria que um texto, mesmo sendo uma foto como essa, sempre vai significar a mesma coisa? Justifique. Fonte: Hila (2009, p. 162). A autora reforça que a enunciação também dependerá do suporte de circulação do gênero. E quando apresentamos os slides acima, os professores conseguiram visualizar essa questão, até porque eles comentaram que gostaram do texto de leitura prévia, pois Hila consegue explicar de forma acessível as questões referentes ao gênero, além, é claro, de apresentar sugestões práticas, como foi o caso desse exemplo. Para realização do trabalho com os gêneros, enfatizamos a relevância de considerar os três elementos apresentados por Bakhtin, Todos esses três elementos – o conteúdo temático, o estilo, a construção composicional – estão indissoluvelmente ligados no todo do enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de um determinado campo da comunicação (BAKHTIN, 2003, p. 261262). Com base nesses três elementos, fizemos coletivamente a análise de três textos: um cartum, uma charge e um artigo de opinião. Para essa análise, nós 137 buscamos o contexto de produção e os dados dos autores. Os textos trabalhados foram os seguintes: Figura 28 – Charge para análise Charge Conteúdo temático Estilo Construção composicional Fonte: http://borocoxo.blogspot.com.br/2011/11/se-santa-ceia-fosse-hoje.html Para analisar esse texto, trouxemos para os professores as seguintes informações sobre o autor: quem produziu essa charge foi o cartunista e chargista Ernani Diniz Lucas, mais conhecido como Nani. Esse cartunista brasileiro é o criador da tira Vereda Tropical, que é publicada em vários jornais brasileiros. Essa tira tem como objetivo satirizar a situação sócio-político-econômica cotidiana do mundo e principalmente do Brasil. Se analisarmos a charge acima perceberemos que o autor faz uma sátira à Lei Seca. A utilização do quadro da Santa Ceia nos remete à esfera religiosa, pois os padres durante a celebração da missa bebem vinho, que representa o sangue de Cristo, mas, com essa lei, surge à polêmica de que, se fossem parados por uma blitz e tivessem que fazer o teste do bafômetro, os padres seriam apreendidos. Cogitou-se, então, entre os religiosos a substituição do vinho tradicional pela bebida sem álcool, o que gerou muita polêmica dentro da igreja, haja vista que a maioria dos padres defendem a ideia de que não é possível fazer a substituição, pois o vinho que é utilizado nas celebrações é preparado 138 especialmente para esse fim, tendo em vista que faz parte da tradição católica. Assim, diante de todas essas discussões Nani procura satirizá-la com a publicação da charge. Chamamos a atenção dos professores para o fato de que para compreender o conteúdo da charge é necessário ter conhecimentos dos fatos que estão acontecendo naquele momento histórico, ou seja, é preciso saber que está havendo discussões sobre a Lei Seca e que esta tem abalado a tradição católica. Quanto à estrutura composicional, retomamos a fala de Bakhtin de que ―cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos de gêneros do discurso (BAKHTIN, 2003, p. 262, grifos do autor). Portanto, cada gênero produzido socialmente mantém algumas características que são comuns àquele tipo de enunciado. No caso da charge, por exemplo, embora se altere o conteúdo temático proposto, todas conservam elementos que são característicos daquele texto. Assim, podemos afirmar que toda charge apresenta o recurso não verbal e a maioria utiliza-se do recurso verbal para dar ênfase ao argumento apresentado. Em relação ao estilo presente no gênero, Bakhtin afirma que, ―O estilo integra a unidade de gênero do enunciado como seu elemento. Isso não significa, evidentemente, que o estilo de linguagem não possa se tornar objeto de um estudo especial independente‖ (BAKHTIN, 2003, p. 266). Aproveitamos o momento de análise do estilo do gênero para reafirmar aos professores que pensar o ensino da língua a partir dos gêneros discursivos não é sinônimo de abandono do estudo gramatical, pois, conforme Bakhtin, o estilo é constituinte do enunciado, portanto, ele precisa ser estudado e ensinado. Pensando no estilo presente na charge, nos remetemos à integração dos recursos não verbais e verbais para a produção de sentido. Desse modo, é necessário analisar as expressões dos 12 apóstolos e do próprio Jesus que não condizem com o quadro verdadeiro, isso porque há o conflito entre beber o vinho e adequar-se às normas previstas pela Lei Seca. Enfatizamos, ainda, que os alunos de 5º ano podem não ter a autonomia de buscar toda essa contextualização da situação de produção de gênero, por isso é importante o papel do docente de resgatar isso para apresentar aos discentes. Esse é, portanto, o papel de mediador do professor. 139 Na sequência apresentamos um cartum de Moa e juntamente com os docentes fizemos a análise do conteúdo temático, do estilo e da construção composicional. Figura 29 – Cartum para análise Fonte: http://viverparacontar.wordpress.com/category/meio-ambiente/ Com a apresentação desse cartum (figura 29), realizamos o mesmo trabalho de contextualização. Enquanto apresentávamos dados sobre o autor e fazíamos referência aos elementos presentes no cartum, os professores chamaram a nossa atenção para a cor da latinha que o menino tem na mão, que nos remete a um refrigerante muito conhecido. Então, constatamos que os participantes envolveramse com a atividade e começaram a buscar dados para chegar ao conteúdo temático do cartum, percebendo a diferença entre este e o tema trazido pelos livros didáticos. 140 Figura 30 – Artigo de opinião para análise. INDIO GALDINO O homícidio, por queimaduras, do índio Galdino, em Brasília, constituiu-se num episódio desumano e estarrecedor. Os autores, jovens nascidos em famílias de grande prestígio social e econômico, foram localizados, presos e indiciados. Pela maneira cruel, como cometeram o delito, usando grande quantidade de álcool, que derramaram sobre a vítima, ateando fogo em seguida, houve o enquadramento deles no chamado crime hediondo e que os levaria ao julgamento por jurados. Todavia, ao analisar o processo, a juíza desclassificou, de homícidio doloso para lesões corporais seguidas de morte. Seu entendimento foi de que os réus não queriam o resultado letal. Foi a sua convicção. Mas, pelas particularidades do evento, como é que ela pôde chegar a tal conclusão? Como pôde afirmar, categoricamente, que os delinquentes não tinham a intenção de matar? Ora, se quem provocou combustão numa pessoa, transformando-a em tocha humana, não tinha a intenção de matá-la, quem teria? Parece que a ilustre magistrada baseou a sua decisão em informações fornecidas por uma bola de cristal ou perscrutou o íntimo de cada um dos criminosos, como se fosse vidente. O sensato seria que os rapazes fossem a julgamento pelo júri popular. Só assim haveria a verdadeira justiça. DARIO LIVINO TORRES, Magistrado em Curitiba. Folha de Londrina, 21-08-97 Fonte: Dario Livino Torres, Magistrado em Curitiba. Folha de Londrina, 21-08-97 Ao fazer a análise do artigo de opinião ―Índio Galdino‖, devido à construção composicional desse gênero foi possível pensar em mais atividades de análise do estilo, como dos verbos presentes no texto. Percebemos que no primeiro parágrafo, quando o autor situa o leitor a respeito do tema tratado, são utilizados verbos no pretérito perfeito, já no segundo, à medida que apresenta sua opinião sobre o episódio ocorrido, os verbos passam a ser utilizados no futuro do pretérito. Coletivamente foi sendo avaliado que a partir desse texto poderia ser explorada a linguagem padrão e a utilização de referentes. 141 Esse trabalho foi produtivo, porque tivemos a oportunidade de retomar com os professores a questão do trabalho gramatical que eles tanto cobram, pois ao falar do estilo, relacionamos ao trabalho com a análise linguística. Evidenciamos, portanto, que o trabalho com o gênero não abandona o estudo da língua. Essa quarta oficina teve como leitura prévia o texto de Hila (2009), Ressignificando a aula de leitura a partir dos gêneros. Os professores gostaram do texto, pois consideraram que a autora, além de apresentar a fundamentação teórica sobre o trabalho com os gêneros discursivos/textuais, também apresenta atividades práticas que podem ser trabalhadas para abordar os três elementos citados por Bakhtin. Para a última oficina entregamos aos participantes para leitura prévia o texto: MARCUSCHI, Luiz Antônio. Exercícios de compreensão leitora ou copiação nos manuais de ensino de língua? Em aberto, Brasilia, ano 16, n. 69, jan./mar.,1996. 3.1.1.5 5ª oficina - A leitura no livro didático No início dessa oficina, começamos dizendo que esse seria nosso último encontro e que nele faríamos uma análise do material didático que é utilizado pelas escolas municipais de Cascavel. E, como sabemos, o livro didático é um material que, devido as suas limitações, nem sempre pode ser utilizado do início ao fim em uma sequência, sendo muitas vezes preciso adaptá-lo. Concordando com isso, um professor disse: Eu sempre falo que a gente tem que adaptar o livro (Docente P, 18/04/2013). Outro professor fez o seguinte apontamento: Ilda, assim, a minha preocupação depois que comecei a ver essas questões, mas meu Deus eu tenho conhecimento pra saber formular questões que os livros estão formulando de uma forma que não está correta? Eu uma simples professora, vou ter condições de fazer isso? (Docente B, 18/04/2013). 142 Respondendo ao professor, relatamos que é claro que essa atividade vai demandar bastante treino e prática, mas acreditamos que seja possível sim. Inclusive os outros professores disseram que eles têm condições sim, às vezes, mais do que muitos autores de materiais didáticos. Abordando a importância da formação continuada para a atuação do docente, Verdinelli, assim se posiciona: Defendemos a escola como locus privilegiado de formação, já que uma dimensão importante do processo de formação é a prática do professor. Além disso, é nesse espaço, por meio de um trabalho coletivo, construído de forma gradativa, que a prática pedagógica torna-se objeto de análise crítica. O trabalho coletivo favorece reflexões, análise das práticas e uma postura de intervenção, possibilitando a articulação prática-teoria-prática (VERDINELLI, 2007, p. 27). Concordamos com a autora, pois para que o professor tenha autonomia para alterar as atividades propostas no livro didático e repense a sua prática, é imprescindível a participação em formações continuada que acontecem fora da escola, ou seja, cursos ofertados pela secretaria municipal de educação, ou pela universidade. No entanto, também é importante que a equipe pedagógica e administrativa escolar tenha a prática de realizar grupos de estudo na própria escola, envolvendo os docentes de todos os anos, a fim de que esses momentos sirvam para refletir sobre a prática a partir de estudos teóricos e possam intervir na ação docente num sistema de cooperação entre os envolvidos no processo de ensino. O texto que propusemos para leitura prévia era de Marcushi (1996), e esse autor apresenta reflexões significativas a respeito do trabalho com a leitura no livro didático e, nesse texto, ele retoma algumas questões que foram exploradas por nós durante as oficinas. Um exemplo disso são os tipos de questões. Assim, o livro, na maioria das vezes, prioriza apenas a copiação, que são as questões de mera localização. Quando pensamos em trabalhar com os professores a análise do livro didático Projeto Buriti: Português, da editora Moderna (Sanchez, 2011), pretendíamos localizar nesse material os elementos que foram trabalhados nas oficinas anteriores. Assim, o primeiro passo seria constatar: se as atividades de leitura contemplam questões mais de ordem ascendente, descendente ou 143 interacional? Que gêneros são apresentados nas unidades? O livro foca em cada unidade um gênero apenas ou apresenta mais? São contempladas as etapas de leitura? Como é organizado o manual de orientações aos professores? Que concepção de leitura é possível constatar nessas orientações? Assim, a partir dos questionamentos acima, começamos a garimpar o livro e, para esse trabalho, selecionamos a unidade 2 (anexo D). Analisando com os professores essa unidade, percebemos que nela não se contempla o trabalho com a pré-leitura, pois isso é algo apresentado nas orientações ao professor que constam no final do livro, no entanto, ao longo da unidade é interessante que não há atividades pré-leitura. Nessa unidade, é apresentada uma imagem de crianças brincando, traz-se, em seguida, alguns questionamentos, no entanto, não há nenhuma relação entre a imagem, os questionamentos e o primeiro texto proposto. Quando olhamos para as questões apresentadas para o texto, percebemos que aparecem as três concepções de leitura: algumas são apenas de localização, outras exigem apenas a opinião do leitor, tornando o texto apenas pretexto e há também as interacionais, que fazem pensar para buscar e responder. Em relação ao gênero, constatamos que o livro não trabalha com um gênero por unidade, dessa forma ele apresenta diversos textos na unidade e cada um pertencente a um gênero e, quando cobra a produção, ele retoma o primeiro texto da unidade que, no caso da unidade em questão, era a crônica. Comentamos que para o aluno conseguir produzir um texto pertencente a determinado gênero, é importante que ele tenha acesso a diversos textos pertencentes àquele gênero. Portanto, se o professor for trabalhar com a produção proposta no livro, ele terá que levar outras crônicas para o aluno. Até porque a crônica não é um gênero fácil de produzir. Nesse sentido, o livro propõe a produção de uma paródia da crônica presente no livro. Sobre a apresentação de outros gêneros, um professor relatou sobre a prática que tem tido em sala: Eu faço assim, professora, começou lá com a crônica eu vou buscar no livro outras unidades onde tenha crônica. Para não confundir a criança, pois ela não consegue pular de uma coisa para outra (Docente P, 18/04/2013). 144 Percebemos, então, que alguns professores estão tendo a preocupação com o gênero e buscam adaptar o material didático para contemplar esse trabalho e isso consideramos um avanço para o ensino. Nesta última oficina, também solicitamos aos professores que fizessem análise do plano de aula que elaboraram no primeiro encontro e verificassem se a partir daquilo que discutimos nos cinco encontros, eles pretendiam alterar alguma coisa, fosse suprimindo, fosse acrescentando algo. No momento em que o plano foi entregue aos docentes alguns comentaram que consideravam que não havia nada para alterar, pois acreditavam que a aula estava adequada, outros disseram que poderiam complementar o que haviam feito pensando nas etapas da leitura e na concepção interacional de leitura. Antes de deixar que eles olhassem para o plano de aula, solicitamos a atenção para o seguinte cartum que circulou nas redes sociais: Figura 31 – Cartum para refletir sobre a importância da leitura Fonte: http://perguntasparvas.blogs.sapo.pt/tag/educa%C3%A7%C3%A3o Apresentamos esse texto para enfatizar a importância da leitura em nossa vida, pois, por meio dela, adquirimos conhecimentos, relaxamos, nos localizamos, 145 enfim ela nos auxilia em muitas atividades. Portanto, a leitura é o conteúdo essencial para se ensinar aos alunos. Ao final da oficina, questionamos os professores se as oficinas auxiliaram na compreensão do que é leitura. E os docentes disseram que com certeza contribuiu. O docente F fez o seguinte comentário: Relembrei, esclareci algumas coisas, então, foi ótimo! (Docente F, 18/04/2013). Questionamos se a formação contribuiu para a reflexão das questões que são apresentadas pelos materiais didáticos e por eles mesmos, ou seja, se estão atentos ao que cada questão avalia. Tivemos, então, o seguinte apontamento: Eu fui preparar uma atividade para os meus alunos e comecei a analisar quais atividades eu poderia apresentar. Eu peguei algumas sugestões suas e preparei atividades para os meus alunos no reforço, porque daí são menos alunos e é mais fácil para trabalhar a leitura, então eu acho que ajudou bastante. Porque essa questão de leitura eu sempre gostei muito e os alunos precisam (Docente O, 18/04/2013). Retomamos a questão: então vocês acham que o curso contribuiu? O docente K disse: Eu acho que contribuiu, mas a formação não deveria ser só para o 5º ano, teria que ser para os demais também (Docente K, 18/04/2013). Concordamos com o docente que esse trabalho com as concepções de leitura deveria ser realizado com todos os anos, mas, para a pesquisa, propussemos a formação apenas para o 5º ano, contudo, podemos pensar em trabalhar com os demais também. O docente M fez o seguinte apontamento: As oficinas foram ótimas, apesar de não poder estar presente em algumas. Compartilhei as sugestões com o pessoal da escola, principalmente com a nossa bibliotecária. As atividades sobre como trabalhar com a leitura estão ajudando muito. Meu olhar mudou ao fazer análise de textos e formular perguntas. Claro que esse trabalho 146 eu já venho fazendo, porém, agora, de uma forma diferente. Tudo o que foi abordado pode e deve ser aplicado em sala de aula a partir dos conteúdos das oficinas. Você é uma ótima professora (Docente M, 18/04/2013). Ao chegarmos ao final das oficinas sentimo-nos com o sentimento de pesa, por estarmos concluindo o trabalho, pois, durante a formação, acabamos nos envolvendo afetivamente com os participantes. Como eles traziam suas angústias para a formação, sentimo-nos responsáveis por tentar ajudá-los a superar suas dificuldades. Ao mesmo tempo, sentimo-nos felizes por ter cumprido aquilo a que nos propusemos realizar. É claro que, muitas vezes, diante de alguns questionamentos percebíamos nossas limitações como formadores, haja vista que nem sempre conseguimos respostas para todas as questões, haja vista a complexidade desse processo de ensino e aprendizagem da leitura. Na próxima seção apresentamos a análise dos dados coletados por meio da aplicação do questionário. 3.2 ANÁLISE DOS DADOS GERADOS PELO QUESTIONÁRIO O objetivo desta seção é apresentar a análise dos dados gerados por meio de questionário (anexo 3), aplicado aos dezesseis professores participantes da formação continuada ofertada aos docentes do 5º ano do Ensino Fundamental, o qual era composto de vinte e duas questões, sendo 13 objetivas e 9 discursivas. No primeiro encontro de formação compareceram dezesseis professores, assim todos responderam o questionário, contudo, destes, treze obtiveram carga horária para certificação. Visando à melhor visualização das informações atribuímos uma letra para cada participante, sendo estas de A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O e P. Para facilitar a sistematização da apresentação dos dados, as questões foram reagrupadas a fim de facilitar a visualização do perfil do grupo. Na primeira questão, indagamos sobre o sexo dos participantes. Tivemos na formação quinze pessoas do sexo feminino e uma do sexo masculino. Isso se evidencia pelo número muito superior de mulheres atuando na educação em 147 detrimento de um número restrito de homens atuando no quadro do magistério da rede pública municipal de ensino de Cascavel. Outra questão solicitava dos participantes que marcassem a faixa etária na qual se enquadram. Constatamos que tivemos a participação de professores de diversas faixas etárias, conforme apresentado no quadro abaixo: Quadro 4 – Idade dos participantes da formação Idade Número de participantes De 25 a 29 anos 2 (L, M) De 30 a 39 anos 4 (D, E, J, K) De 40 a 49 anos 6 (A, B, G, N, O, P) De 50 a 54 anos 3 (C, H, I) 55 anos ou mais 1 (F) Fonte: correspondente à questão n. 3 do questionário (apêndice 1). Observando o quadro, percebemos que os professores que participaram dessa formação, em sua grande maioria, têm mais de quarenta anos, o que poderia indicar um tempo maior de atuação na docência. Para verificar o tempo de atuação dos professores, questionamos qual era o tempo de atuação na rede municipal de ensino, como mostra o quadro a seguir: Quadro 5 – Tempo de atuação dos professores na rede municipal de ensino Tempo de atuação Número de professores 10 meses 1 (D) 1 ano 1 (L) 3 anos 2 (B, N) 5 anos 2 (G, M) 7 anos 1 (J) 9 anos 1( K) 10 anos 2 (F, O) 12 anos 1 (A) 13 anos 1 (P) 14 anos 2 (C, I) 15 anos 1 (E) 23 anos 1 (H) Fonte: correspondente à questão n. 8 do questionário (apêndice 1). 148 Percebe-se que o tempo de atuação desses professores varia bastante. Há aqueles que estão recém-adentrando na rede enquanto alguns já têm uma caminhada maior de atuação em sala de aula. Considerando o período de estágio probatório que é de três anos, percebemos que apenas dois professores ainda não concluíram essa etapa. Os demais já concluíram, tanto é que dez professores atuam há mais de cinco anos. Outra questão que consideramos importante para fazermos a caracterização dos sujeitos envolvidos na pesquisa é a que indaga sobre o tempo de experiência no 5º ano/4ª série. Em relação a esse item, constatamos que o tempo de experiência varia bastante. Vejamos o quadro abaixo. Quadro 6 – Tempo de atuação no 5º ano/4ª série Tempo de experiência no 5º ano Número de professores 1 mês 3 (O, K, L) 10 meses 2 (D, E) 1 ano 2 (A, B) 2 anos 2 (M, N) 3 anos 1 (G) 4 anos 1 (F) 5 anos 2 (I, J) 8 anos 1 (C) 10 anos 1(P) 15 anos 1 (H) Fonte: correspondente à questão n. 9 do questionário (apêndice 1). Observamos que, dos professores que se propuseram a participar da formação, a maioria possui menos de cinco anos de experiência em turmas de 5º ano, portanto podemos supor que seja um grupo que demonstra interesse pela formação. De acordo com Larsen-Freeman (1983) e Bailey et al (1997), citados por Castro e Romero, A formação de professores propriamente dita tem início muito antes do ensino formal nos cursos de graduação. Isto é, o futuro profissional docente já começa a se constituir discursivamente a partir de suas vivências como aluno muitos anos antes de exercer sua prática pedagógica (CASTRO; ROMERO, 2006, p. 126-127). 149 Nesse sentido, a formação em nível Médio constitui uma etapa importante para a formação do futuro professor e, portanto, é relevante para nossa pesquisa sabermos qual foi o curso feito por esses profissionais. Assim, uma das indagações é sobre qual foi a formação em nível Médio desses professores. Quadro 7 – Formação em nível médio Curso de nível Médio Número de professores Magistério 6 (B, C, E, F, H, I) Educação Geral 7 (A, D, G, J, L, M, N) Contabilidade 3 (O, K, P) Fonte: correspondente à questão n. 4 do questionário (apêndice 1). Por se tratar de professores que estão atuando com o Ensino Fundamental Anos Iniciais, esperávamos que houvesse mais professores com formação em Magistério, o que não foi confirmado pelos dados. Em relação à formação, questionamos ainda se os professores possuem formação em nível Superior e, em caso positivo, qual era o curso. Todos eles possuem formação superior e os cursos são os seguintes: Quadro 8 – Formação em nível superior Curso Número de profissionais Pedagogia 13 (A, B, C, D, G, H, J, K, L, M, N, O, P) História 2 (E, I) Letras 1 (F) Fonte: correspondente à questão n. 5 do questionário (apêndice 1). Para atuar na Rede Pública Municipal de Ensino, o professor precisa ter graduação em Pedagogia ou formação em Magistério, hoje denominado Formação Docente, e graduação na área da educação. E isso justifica os resultados, pois conforme constatado na formação em nível Médio, dez professores não têm formação em Magistério e, portanto, para poder atuar com turmas do Ensino Fundamental – anos iniciais, tiveram a necessidade de cursar Pedagogia. Nesse 150 sentido, somos levados a refletir que os professores licenciados em Letras e História fizeram o Magistério como curso de Ensino Médio. Também questionamos sobre a forma como fizeram a graduação, se foi presencial, semipresencial ou a distância. Os resultados foram: Quadro 9 – Forma como os professores cursaram o ensino superior Forma de curso Quantidade de docentes Presencial 14 (A, B, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, P) Semipresencial 1 (C) A distância 1 (O) Fonte: correspondente à questão n. 6 do questionário (apêndice 1). A partir da década de 90, o município de Cascavel recebeu várias instituições privadas de Ensino Superior, o que ampliou o número de vagas para a formação em licenciatura, haja vista que até então apenas a UNIOESTE ofertava cursos de licenciatura. Nos últimos anos, têm-se instalado em nossa cidade cursos na área da educação a distância. Contudo, dos participantes dessa formação, a maioria dos docentes cursaram a graduação de forma presencial. Interpelamos os professores se eles possuem curso de pós-graduação e em caso negativo, se pretendem ou não cursar. Como em Cascavel há diversas instituições de ensino superior, isso reflete também no aumento da oferta de cursos de pós-graduação lato sensu, e por isso, verificamos que grande parte dos professores que estão atuando na rede municipal de Ensino possui especialização. Tanto é que, dos professores que participaram da formação, muitos já fizeram duas especializações. Há inclusive professor com pós-graduação stricto sensu. Apenas dois participantes não possuem pós-graduação, contudo relatam que pretendem fazer. No quadro abaixo listamos os cursos de pós-graduação que esses professores cursaram: Quadro 10 – Cursos de pós-graduação cursados pelos docentes Cursos Lato Sensu Quantidade de profissionais História do Brasil 2 (E, G) Fundamentos da educação 4 (A, E, F, P) 151 Literatura 1( F) Educação Especial 1( I) Geografia 1 (G, I) Estratégias didáticas e ensino 1 (M) Psicopedagogia clínica e institucional 3 (B, D, L) Educação Inclusiva 2 (C, J) Alfabetização 1 (K) Docência do Ensino Superior 2 (B, H) MBA estratégias empresariais 1 (H) Ensino de Ciências e Matemática 1 (N) Curso Stricto Sensu Quantidade de profissionais Mestrado em Educação 1 (E) Fonte: correspondente à questão n. 7 do questionário (apêndice 1). A partir dos cursos apresentados acima, constatamos que, com exceção de um curso, que é o de MBA, os demais estão relacionados à educação. Assim, percebemos que os professores buscam os cursos de pós-graduação para contribuir com a sua prática docente e é claro que não podemos deixar de mencionar que esse curso contribui com a elevação de nível na carreira do professor. Contudo, percebemos que nesse grupo em especial há a preocupação com a formação, porque na rede municipal é possível protocolar para avanço apenas um curso de especialização. Os demais realizados pelos professores servem apenas para elevação como carga horária de curso, o que não representa grande avanço na carreira e como já citado vários professores possuem dois cursos desse nível. Perguntamos em quantos turnos os professores atuam e nenhum dos que respondeu ao questionário afirmou trabalhar em três turnos. Quadro 11 – Turnos trabalhados Turnos trabalhados Quantidade de profissionais Um turno 6 Dois turnos 10 Três turnos 0 Fonte: correspondente à questão n. 10 do questionário (apêndice 1). 152 Percebemos que a maioria dos docentes trabalha em dois turnos e podemos inferir que eles atuam no período da manhã e da tarde, haja vista que se dispuseram a participar de uma formação no período noturno. Contudo, um número significativo de profissionais (6), trabalham em apenas um turno. A partir dessa constatação podemos afirmar que os docentes que se propuseram a participar da formação não apresentam acúmulo de cargos. Ao serem questionados se costumam participar de cursos de formação continuada e a frequência desses cursos as respostas foram às seguintes: Quadro 12 – Frequência da participação em cursos de formação continuada Opções de respostas Número de pessoas Não 1 (C) Sim, 2 vezes por ano 8 (P, M, N, I, J, L, D, A) Sim, 3 vezes por ano 2 (O, B) Sim, mais de 3 vezes por ano 6 (K, F, G, H, E) Fonte: correspondente à questão n. 11 do questionário (apêndice 1). Analisando e contextualizando os dados, percebemos que os oito profissionais que responderam duas vezes por ano, participam apenas dos seminários ofertados pela Secretaria Municipal de Educação, pois a secretaria oferta o seminário no início do ano letivo, no mês de fevereiro e no final do primeiro semestre, antes das férias de julho. Os demais professores que dizem participar três vezes ou mais ao ano demonstram que, além de participarem dos seminários ofertados pela Secretaria Municipal de Educação, também buscam fazer outras formações ofertadas tanto pela própria secretaria quanto por outras instituições. Também há escolas que ofertam grupo de estudos no período noturno. Como nosso objetivo era o de propor uma formação que tivesse como foco a leitura, questionamos se os docentes já participaram de algum curso de formação continuada específico de leitura e qual a duração em horas desse curso. E o resultado obtido apresentamos na sequência: Quadro 13 – Participação em cursos de formação continuada sobre leitura Respostas Número de horas Participantes 153 Não 0 11 (B, C, D, G, I, J, L, M, N, O, P) Sim 8 a 20 h 1 (A, E, F) Sim 40 h 2 (H, K) Fonte: correspondente à questão n. 12 do questionário (apêndice 1). Conforme justificativa apresentada na introdução deste trabalho, propusemonos a ofertar uma formação com foco na leitura, haja vista que na rede municipal, ao menos nos últimos cinco anos, não foram ofercidos trabalhos específicos de leitura, pois as formações centraram-se mais na escrita, na análise linguística e na reestruturação textual. Perguntamos aos professores se eles consideram que a formação inicial os preparou para desenvolver o trabalho pedagógico com a leitura em sala de aula e o porquê dessa resposta. Nessa questão, dez professores consideraram que não, pois a ênfase era dada à escrita e a outros conteúdos e porque havia poucos materiais relacionados à leitura. Três professores consideram que sim. O professor G relatou que teve uma professora de literatura muito boa, que desenvolveu diversos projetos de leitura e escrita de livros infantis. O professor K disse que, na faculdade que cursou, o último ano foi dedicado à disciplina de técnica de ensino. O professor I considera que o magistério a preparou e o curso Superior incentivou a diversidade de leitura e o questionamento. O professor E considerou que o magistério preparou um pouco, pois na disciplina de didática da Língua Portuguesa foi trabalhada a leitura. Já na graduação não foram abordadas questões pedagógicas relacionadas à leitura. O professor J apontou que, em sua formação, não se focou na leitura como deveria e o professor L relata que houve muita teoria e pouca prática e complementa dizendo que a prática que possui se deve ao seu interesse de aprender mais e mais. Considerando as respostas e levando em conta que do grupo treze professores possuem graduação em Pedagogia, um em Letras e dois em História, percebemos que podem ter ocorrido falhas na formação, haja vista que o curso de Pedagogia deveria preparar o profissional para atuar em sala de aula. Assim, supõese que os elementos básicos para garantir o ensino e a aprendizagem da leitura, por exemplo, teriam que ser bem explorados na graduação. E acreditamos, ainda, que 154 a universidade deveria fazer a ponte com as escolas, a fim de contribuir com a melhoria da qualidade de ensino. Portanto, poderia ofertar cursos de formação continuada aos professores da rede municipal e estadual. Nesse sentido, concordamos com Flores, ao afirmar que ―[...] existe uma tendência para simplificar demasiado o debate sobre teoria e prática na formação de professores ao identificar a ―prática‖ com o que acontece na escola e ―teoria‖ com o que acontece na universidade‖ (FLORES, 2010, p. 183-184). De acordo com a autora, a universidade não está conseguindo trabalhar a teoria associada à prática e complementa sua tese dizendo, Muitas práticas existentes contradizem os princípios e os pressupostos da integração teoria/prática e da articulação entre os contextos de formação, na formação inicial de professores, sobretudo no que se refere à ausência de uma abordagem interdisciplinar do currículo e ao divórcio entre universidade e escolas no que diz respeito à filosofia de formação (FLORES, 2010, p. 184). Com base nos estudos da autora, e com a realidade constatada, por meio das respostas dadas à questão, percebemos que realmente tem ocorrido o distanciamento da universidade em relação à escola e as lacunas deixadas pela formação inicial deverão ser preenchidas pela formação continuada. Indagamos aos professores se eles costumam ler frequentemente e que tipo de textos costumam ler. Dos professores participantes apenas ―C, B e A‖ disseram que não costumam ler frequentemente, os demais dizem ler e, de acordo com as respostas, percebemos que eles costumam ler textos e materiais diversificados, tais como: romances, poemas, textos didáticos relacionados às áreas do conhecimento, revistas, notícias, panfletos, leis referentes à educação, livros sobre religião, gibis, crônicas, entre outros. Em outra questão apresentada, inquirimos os docentes sobre o que eles entendem por leitura. Há professores que consideram a leitura do ponto de vista ascendente, pois a compreendem como decodificação. Professor N: ―Decodificar e compreender as intenções do texto.‖ Professor P: ―É apropriar-se de conhecimento da linguagem, ampliar vocabulário é instrumentalizar-se.‖ Professor A: ―A compreensão da mensagem do locutor/autor.‖ Professor C: ―Tudo o que se vê é necessário uma leitura para entendimento e entender o seu significado. Em qualquer código ou símbolo é preciso ter uma leitura‖. Percebemos que esses docentes 155 atribuem mais valor à estrutura da língua e à ampliação vocabular do que à compreensão. Menegassi, ao abordar a leitura sob perspectiva do texto, faz o seguinte apontamento: Os estudos de leitura sob a perspectiva do texto centralizam-se no sistema lingüístico, correspondendo às teorias de decodificação – de base estruturalista (corrente teórica que propunha o estudo da língua a partir da sua estrutura, isto é, tudo deveria ser estudado e produzido a partir de uma estrutura certa, já marcada na língua), portanto uma visão imanentista da língua , com uma finalidade específica que reduz o estudo da língua a um fim único – que concebe o ato de ler como um processo de decodificação de letras em sons, e a relação destes com o significado (MENEGASSI, 2005, p. 18). Conforme exposto pelo autor, a língua ainda é trabalhada nas escolas sob a perspectiva do estruturalismo, haja vista que se concebe que ao ensinar aos alunos a decodificação por meio do acesso ao significado e ao significante eles serão bons leitores, no entanto não é isso que se percebe na prática. Há professores que não relacionam a leitura diretamente à decodificação, mas eles ainda conservam uma visão de que a leitura é uma pista de mão única, na qual o leitor se apropria de conhecimentos a partir do que lê. Contudo, fica a impressão de que essa seria na, concepção dos professores, uma ação que caberia apenas ao aluno realizar, não se atribui o devido valor ao autor do texto e não há resquícios de mediação nas atividades de leitura. Professor I: ―Proporciona conhecimento do que foi construído pela humanidade. Diversão.‖ Professor L: ―Busca por conhecimento de mundo, melhoria para o trabalho e entretenimento.‖ Professor O: ―É o meio informativo onde as expressões podem ser discutidas em grupo ou avaliadas individualmente, de acordo com o meu pensamento, podendo ser positiva ou negativa. Ela incentiva as mudanças na vida do sujeito e seu modo de ver as coisas.‖ Na sequência, apresentamos as considerações dos demais professores. Nesses discursos percebemos que aparece uma concepção de leitura voltada para o seu papel social e de interação. Embora alguns ainda façam referência à decodificação eles não ficam apenas nela: 156 Para o professor E, ―É o ato de ler, decodificar, interpretar/analisar textos e imagens, estabelecendo relações com outros textos, proporcionando a apropriação de conhecimentos produzidos pela humanidade.‖ Professor K: ―Tudo o que se visualiza e se pode entender o significado (textos impressos, imagens, placas de trânsito, sinais luminosos, etc.) Também o que se sente, percepções do corpo (toque, afago, soco), linguagem braile‖. Professor M: ―Processo no qual o indivíduo se apropria dos códigos escritos e a partir desse processo realiza a compreensão do que leu e compreende as relações sociais em que vive.‖ Professor B: ―Leitura não significa apenas passar o olhar e falar em voz alta o que está escrito. Para mim, ler é entrar no que se lê, viver, procurar entender o que está posto, porque foi colocado dessa forma, qual é o objetivo...‖ Professor D: ―Entendo que seja qualquer tipo de leitura de vários gêneros, tipologias. E que a leitura é de extrema importância na vida de qualquer pessoa, pois é através dela que o homem se apropria de conhecimentos, contribuindo para que os sujeitos entendam sua realidade.‖ Professor G: ―É essencial para a minha vida, e também um meio de conhecimento tanto científico, como conhecimento geral e também por divertimento. Há uma interação entre o leitor e o livro.‖ Professor F: ―Uma interação entre um texto e o leitor, capaz de informá-lo, propiciar lazer, trazer informações sobre o cotidiano, bem como instruir.‖ Professor H: ―Ler é compreender além dos símbolos, reconhecer o contexto, a intencionalidade dos sujeitos do discurso e as variações linguísticas.‖ Professor J: ―Saber entender o que se vê e além do que se vê, a leitura abre as portas para o conhecimento.‖ De acordo com as considerações dos professores, percebemos que eles já concebem a leitura como uma ação para além da mera decodificação, pois conforme Solé, ―[...] ler não é decodificar, mas para saber ler é preciso saber decodificar‖ (SOLÉ, 1998, p. 52). Portanto, a leitura envolve muito mais do que textos escritos, haja vista que, conforme Martins, ao tratar da valorização que a escola atribui ao escrito, relata que, ―[...] o ato de ler se refere tanto a algo escrito quanto a outros tipos de expressão do fazer humano, caracterizando-se também como acontecimento histórico e estabelecendo uma relação igualmente histórica entre o 157 leitor e o que é lido‖ (MARTINS, 2012, p.30). Ainda para a mesma autora ―a leitura vai, portanto, além do texto‖ (MARTINS, 2012, p. 33). Inferindo sobre as palavras da autora, podemos dizer que ler envolve muito mais do que apenas decodificar e compreender textos escritos; a leitura é muito mais abrangente, pois envolve diversas situações da nossa vida. Assim, cotidianamente realizamos diversas leituras de tudo o que acontece a nossa volta. Nesse sentido, Dell‘Isola acrescenta, que: ―Sendo sujeito leitor, simultaneamente, lê palavras, formas, cores, sons, volumes, texturas, gestos, movimentos, aromas, atitudes, fatos. Este sujeito interage com diversas formas de linguagem, através da sua leitura do mundo‖ (DELL‘ISOLA, 1996, p.70). Questionamos aos professores se eles consideram importante o trabalho com a leitura em sala de aula e o porquê disso. Todos os professores consideram importante esse trabalho, e em suas justificativas apresentaram as seguintes opiniões: Quadro 14 – Considerações sobre a importância do trabalho com a leitura Considerações sobre a importância do trabalho com a leitura Professores Proporciona ao leitor uma visão de mundo, compreensão e 1 (P) conhecimento do que acontece ao seu redor e fora dele, possibilitando argumentar sobre os temas abordados. Muito importante, pois sem leitura não consegue desenvolver 2 ( H, C) nenhuma das disciplinas. Contribui para o desenvolvimento da aprendizagem e 1 (D) conhecimento do aluno, dando condições para que os mesmos sejam sujeitos ativos praticando a cidadania. É importante a leitura silenciosa, coletiva e apontada. 1 (K) Possibilita 1 (A) a compreensão do conteúdo, mensagem, desenvolvimento das cognitivo e das funções psicológicas superiores. Desenvolve a interpretação, a criticidade em temas variados e 1 (B) proporciona o desenvolvimento da atenção entre outros. Melhora a escrita. 1 (N) Desenvolve a compreensão textual. 1 (L) Proporciona a interação e o conhecimento, melhora a escrita e a fala. 4 (M, O, I, G) 158 Importante para que o aluno não fique à margem da sociedade. 1 (F) Desenvolve a atenção, a curiosidade, amplia o vocabulário e o 2 (J, E) conhecimento. Fonte: correspondente à questão n. 16 do questionário (apêndice 1). O trabalho com a leitura, de acordo com os apontamentos dos professores, proporciona o conhecimento e amplia a capacidade de interpretação. Consideramos, portanto, que o trabalho com a leitura é fundamental. Nesse sentido, pactuamos com Cagliari ao dizer que A atividade fundamental desenvolvida pela escola para a formação dos alunos é a leitura. É muito mais importante saber ler do que saber escrever. O melhor que a escola pode oferecer aos alunos deve estar voltado para a leitura. Se um aluno não se sai bem nas outras atividades, mas for um bom leitor, penso que a escola cumpriu em grande parte a sua tarefa (CAGLIARI, 2008, p. 148). Nessa perspectiva, a leitura deve ocupar um lugar de destaque na escola. Ela não pode ser vista como uma atividade secundária, que exige apenas alguns minutos da aula, mas, pelo contrário, a leitura deve ser uma atividade bem preparada e planejada pelos professores. Indagamos os participantes sobre quais gêneros discursivos/textuais eles costumam utilizar. Ao responder a essa questão, os professores relataram que trabalham com gêneros diversificados, e ao citar quais eram os gêneros, houve uma variação muito grande nas respostas. Isso nos leva a refletir que, mesmo o município tendo um currículo que preestabeleça os gêneros que devem ser trabalhados, ainda não há uma unidade no trabalho. Dentre os gêneros destacados, os que mais tiveram ocorrência nas respostas dos professores foram os seguintes: poema, quadrinhos (história em quadrinhos, tira), reportagem, letra de música, conto, propaganda e crônica. É importante destacar que a tira é um gênero a ser trabalhado no 5º ano, por isso que, ao selecionar o gênero para que os professores elaborassem a atividade, escolhemos a tira. Também indagamos aos professores como costumam trabalhar a leitura em sala de aula. Essa questão nos proporcionaria analisar se a concepção que o professor diz ter de leitura corresponde a sua prática. 159 Em resposta a essa questão, verificamos que todos os docentes que apresentaram uma concepção ascendente de leitura relataram os seguintes encaminhamentos para ela: Professor A: ―Professor leitor, leitura apontada, leitura prazerosa, leitura individual silenciosa e em voz alta pelo aluno, exercícios de interpretação, apresentação de diferentes gêneros, levantamento de hipótese.‖ Professor P: ―Livros de literatura: fichamento e resumo. Panfletos, revistas, jornais, gibis, livro didático, etc.‖ Professor N: ―Escolher o gênero e entregar aos alunos para que leiam e depois comentem o que entenderam ou contem sobre o que leram para os colegas.‖ Professor C: ―De várias formas: silenciosa, oral, declamativa, com jogral, cantada, etc.‖ Professor E: ―Leitura silenciosa, coletiva, dividindo o texto para leitura individual e em voz alta, leitura do professor com pausas e explicações, leitura em duplas.‖ Professor J: ―Diariamente com textos dos livros dos alunos (coletivo ou individualmente), com textos deixados no cantinho da leitura, bem como gibis, livros infantis.‖ Professor I: ―Leitura do livro didático, dirigida – alguns alunos que se propõem a ler. Após produção de textos coletivos ou individuais.‖ Professor D: ―Eles têm toda semana 45 minutos de aula na biblioteca com outra professora. Em sala de aula, solicito leitura individual de textos do livro didático, conforme disciplina trabalhada no momento. Em relação aos gêneros, sempre trabalho interpretação. Qual é a função social de determinado texto?‖ Professor M: ―A partir de objetivos e encaminhamentos traçados. Exemplo: 15 minutos diários de leitura em diferentes ambientes da escola, momento da leitura (30 minutos 1 vez por semana) pesquisas, oratória, sarau, leitura de um livro por mês (leitura do professor aos alunos).‖ Professor L: ―Coletiva, individual, silenciosa.‖ Professor O: ―Uso multimídia para leitura de imagens, documentário, livros para leitura individual, experiências em Ciências para relatos de dados obtidos e resultados na oralidade, jogos educativos, material do aluno (livros das disciplinas).‖ Professor B: ―Diariamente dedicamos 10 a 15 minutos iniciais da aula para leitura. Algumas vezes o aluno escolhe o que irá ler na caixa da leitura, após 160 escreve um breve resumo do que leu no caderno de anotações. Outras vezes, distribuo vários textos, após a leitura sorteio três alunos para falar aos demais sobre o que leu. Em seguida escolhemos um dos textos lidos e o reescrevemos em conjunto.‖ Professor H: ―Há uma variação: leitura pela professora, aluno individualizado, coletivo, diálogo, sequenciado, com toda forma de recurso bibliográfico e midiático.‖ Professor K: ―Leitura silenciosa. Leitura coletiva. Leitura apontada. Leitura competitiva.‖ Professor F: ―Gosto muito de fazer com que leiam, depois peço para me falar o que entenderam do que leram, e com todos os tipos de questionamento sobre a compreensão, a parte estrutural do texto e inclusive os questionamentos nas áreas específicas, como ciências, matemática, etc.‖ Professor G: ―Uma vez por semana distribuo livros na sala, cada um tem um espaço para contar o que entendeu da história lida e como dever de casa fazer o resumo dela.‖ Pelos encaminhamentos apresentados por esses quatro professores, percebemos que não há foco na compreensão leitora e realmente a preocupação deles ao trabalhar a leitura concentra-se na apropriação do código e com a decodificação. De acordo com Solé, ―[...] não se intervém no processo que conduz a esse resultado, não se incide na evolução da leitura para proporcionar guias e diretrizes que permitam compreendê-la; em suma – e mesmo que possa parecer exagerado -, não se ensina a compreender‖ (SOLÉ, 1998, p. 35). Percebemos que os docentes P, B e G fizeram referência à atividade de resumo. Na quarta seção do primeiro capítulo, abordamos sobre as estratégias de leitura e pontuamos sobre a importância do resumo, como atividade que auxilia na compreensão, contudo, como afirma Solé (1998), essa é uma atividade que tem que ser ensinada. Desse modo, o professor precisa prever momentos para realizá-la coletivamente. Observando os relatos, percebemos que nenhum dos três docentes prevê momentos para realizar a atividade coletivamente, tanto é que G propõe que o resumo seja feito em casa. As respostas apresentadas pelos professores nos levam a refletir que não há ainda a compreensão de que a leitura deve ser trabalhada em diversos momentos, haja vista que ela tende a atender aos mais diversos objetivos: 161 A partir das respostas dos professores fica a impressão de que a leitura é um conteúdo à parte dos demais, não se pensa em leitura de uma forma interdisciplinar. Analisando algumas respostas, percebemos que prevalece ainda no planejamento dos professores a preocupação de como avaliar a leitura e de quais conteúdos podem ser explorados a partir dela. Ainda não há o consenso de que o gosto pela leitura pode ser desenvolvido e que essa é uma atividade que tem que ser mediada pelo professor. Nesse sentido, Geraldi, ao abordar os problemas do trabalho com a leitura em sala de aula, assim se posiciona, Somando-se a isto tudo alguns outros enganos metodológicos comuns ao ensino de Língua Portuguesa em nossas escolas (entre outros, exemplifico com o que chamo de imediatez de resultados – leu não escreveu o pau comeu: leu, responda às perguntas; leu, escreva um texto no mesmo gênero; leu, pesquise sobre o tema etc. – que revelam a expectativa de um resultado desejado como imediato após a leitura); a leitura deve ter se tornado uma coisa muito chata, a se dar ouvidos aos "aliciamentos" que tentamos todos fazer para "conquistar" leitores (GERALDI, 1988, p. 83). Conforme diz Geraldi, a leitura tem servido para avaliar a escrita ou a oralização do que é lido. Infelizmente, não temos pensado no trabalho da leitura como meio para desenvolver o gosto e o hábito pela leitura. Percebemos, ainda, nas respostas dos professores que não há a preocupação com a mediação nos momentos em que eles relatam trabalhar a leitura. Falta, algumas vezes, por parte do professor a estimulação do aluno para a leitura. Azambuja assim se posiciona, a esse respeito: Papel importante desempenha nesse processo o professor-incitador e mediador. É necessário, pois, que o professor tenha em mente que fundamental é conhecer e detectar as dificuldades de compreensão, assim como resolvê-las. Na memória, estão armazenados todos os nossos conhecimentos lingüísticos e extratextuais: conceitos, ideologia e aspectos sociais, entre outros. Quando o professor ativa esses conhecimentos em seus alunos, desperta neles o interesse pelo texto a ser lido, predispondo-os à leitura (AZAMBUJA, 1996, p. 156-157). Conforme o que é destacado pela autora, o professor precisa ter a clareza do seu papel de mediador durante as atividades de leitura, pois, muitas vezes, são 162 perdidas grandes oportunidades de incentivar a leitura, e isso com medidas simples como a ativação do conhecimento prévio. Nas respostas dos professores C, E, H, K e M, há a valorização da leitura em voz alta. De acordo com Kleiman (2004), é um ótimo exercício para avaliar se a criança aprendeu pontuação, a correspondência letra/som, contudo ela não serve para avaliar a compreensão. Nesse caso, percebemos que esses professores valorizam aspectos da concepção ascendente de leitura. Indagamos os professores se eles sabem o que os documentos norteadores para o ensino (Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN e o Currículo do município de Cascavel) dizem sobre o trabalho com a leitura. Quadro 15 – Conhecimento sobre os documentos norteadores do ensino Você sabe o que os documentos norteadores para o ensino (Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e Currículo do Município de Cascavel) dizem sobre o trabalho com a leitura? Número de professores Não. 1 (N) Sim, mas só sei o que dizem os PCN. - Sim, mas só sei o que diz o Currículo do 7 (M, D, L, G, E, P, A) Município de Cascavel. Sim, sei o que dizem esses dois 7 (K, B, O, J, H, F, C) documentos. Não respondeu. 1 (I) Fonte: correspondente à questão n. 16 do questionário (apêndice 1). Para compreender essa indagação e os números que aparecem no quadro é importante esclarecer algumas questões referentes aos documentos que norteiam o trabalho com a leitura. No ano de 1990, o estado do Paraná publicou o Currículo Básico para educação pública do estado. Esse documento regia a educação em nível Fundamental Anos Iniciais e Finais e Ensino Médio, sendo que, na época, denominavam-se Séries do Primeiro Grau e Segundo Grau. Durante quase duas décadas, o município de Cascavel utilizou esse documento enquanto referência para o trabalho educativo. Contudo, no ano de 1997 o governo federal lançou os Parâmetros Curriculares Nacionais, sendo que este documento tinha por objetivo traçar os conteúdos mínimos que deveriam ser trabalhados em cada Série/Ano. 163 Desse modo, esse documento não foi imposto aos estados e municípios, mas deveriam servir de referência para que cada rede elaborasse a sua proposta ou currículo. Em Cascavel, no ano de 2005, iniciaram-se as discussões juntamente com a Associação dos Municípios da Região Oeste do Paraná (AMOP) para construção de um currículo que atendesse às necessidades dessa região. No entanto, devido às próprias mudanças de governo e de equipe pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, em 2007, Cascavel, decidiu desvincular-se da AMOP para elaborar o seu currículo próprio. Assim, Cascavel tem hoje um documento próprio que rege a educação do município, que é o seu currículo, o qual apresenta as concepções filosóficas e teóricas para a educação e os conteúdos a serem trabalhados em cada ano do Ensino Fundamental Anos Iniciais. Dessa forma, muitos professores e mesmo as escolas não levam em consideração os demais documentos da esfera nacional e estadual. Também inquirimos os professores se eles sabem o que o Projeto Pedagógico (PPP) da escola em que cada um atua diz sobre a leitura. E quanto ao conhecimento desse documento obtivemos os seguintes dados: Quadro 16 – Conhecimento sobre o projeto político pedagógico da escola Você sabe o que o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola em que você trabalha diz sobre a leitura? Não. 2 (L, D) Sim. 14 (C, A, P, E, G, F, H, I, J, O, B, K, M, N) Fonte: correspondente à questão n. 20 do questionário (apêndice 1). Como percebemos, quase a totalidade dos professores afirmam ter conhecimento do PPP da escola. O professor D, que marcou não saber o que o documento dizia, acrescentou à sua resposta que naquela semana pegou-o para fazer a leitura. De acordo com Silva, Na dimensão organizacional ou institucional, podemos dizer que as atividades do professores voltam à construção coletiva do projeto político-pedagógico da escola e a sua execução através das 164 atividades curriculares. Esse projeto aponta a direção comum a ser perseguida e as ações didáticas para chegar às metas da instituição (SILVA, 2009, p. 27). Conforme citação do autor, percebemos que as escolas têm buscado fazer um trabalho coletivo com o PPP, tornando-o um documento de produção coletiva e de acesso a todos os professores. Assim, torna-se muito mais fácil ao professor conhecer o documento e colocá-lo em prática. Para favorecer o trabalho com a leitura é importante que a escola possa oferecer estrutura para esse trabalho. Para delinear como estão organizadas as escolas, solicitamos aos professores que respondessem a seguinte pergunta: a escola em que você trabalha possui estrutura adequada para o trabalho com a leitura? Justifique a sua resposta. As respostas e as justificativas apresentadas foram às seguintes: Quadro 17 – Considerações sobre a estrutura oferecida pela escola para o trabalho com a leitura Sim 7 (L, H, F, G, P, O, M, K) Não 4 (D, E, N, B) Poderia ser melhor 1(I) Parcialmente 3 (J, A, C) Biblioteca com horários exclusivos; Bom acervo; Contador de história, declamação de poesia, oratória; As dependências da escola são apropriadas e adequadas a todos os alunos; Temos livros pedagógicos, biblioteca, informática, momentos para leitura diversificada e inclusive reforço para recuperação das defasagens de leitura e Língua Portuguesa; Há diversos tipos de literatura, a biblioteca é bem equipada e disponibiliza empréstimo e eu como professora empresto quando o aluno solicita; Biblioteca arejada, iluminada, limpa, bons livros, a monitora da biblioteca é dinâmica e atenciosa. A escola está em reforma; Existem todos os recursos que podem ser utilizados pelo professor, mas a biblioteca está fechada pela falta de profissional e o espaço nas salas são obstáculos para a leitura de forma mais dinâmica e interativa; O espaço é pequeno. Na biblioteca é preciso melhorar o acervo e fica muito tempo sem profissional. Desse modo a leitura fica na maior parte do tempo restrita a sala de aula, não que aí não possa ser realizada, mas a biblioteca é um local imprescindível. Se oferecesse uma diversidade de textos como Xérox, livros para empréstimo. A escola está sem monitor de biblioteca o que impossibilita aos alunos de frequentar a biblioteca, porém a força de vontade da direção e coordenação fez com que montássemos um cantinho de leitura na hora do recreio com a participação dos professores. Porque a biblioteca não está em funcionamento desde de 2012 e há pouco espaço para exposição de textos. A escola está em reforma. 165 A escola possui biblioteca com um bom acervo de livros, mas o atendimento aos alunos não ocorre devido à falta de profissional. Os professores regentes utilizam a sala de aula para momentos de leitura. Porque só a biblioteca às vezes não oferece condições de ter profissional à disposição devido às reformas físicas existentes/ocorridas. Mas, sempre se consegue oferecer aos alunos materiais variados para leitura. Fonte: correspondente à questão n. 21 do questionário (apêndice 1). Ao pensar na estrutura adequada para trabalhar a leitura, a maioria dos professores faz referência ao espaço da biblioteca escolar. Dá a impressão de que para a maioria, a biblioteca seria o único lugar onde a leitura pudesse acontecer. Há, ainda, a valorização da oralização da leitura. Verificamos isso quando os professores consideram como incentivo à leitura atividades como sarau de poesia, oratória e contador de história. A próxima questão traz respostas que se assemelham às anteriores, por isso, consideramos que os comentários que faremos após a apresentação do quadro de respostas sirvam para as duas questões. A última questão perguntava se a escola em que o professor trabalha incentiva o trabalho com a leitura e, em caso afirmativo, solicitamos a eles que descrevessem como isso ocorre. Ao responder a essa questão apenas uma pessoa relatou que a sua escola não incentiva o trabalho com a leitura, duas pessoas posicionaram-se dizendo que parcialmente, as demais responderam afirmativamente. O quadro seguinte traz as justificativas apresentadas pelos professores. Quadro 18 – Incentivo proporcionado pela escola para o trabalho com a leitura Sim Leitura semanal na biblioteca; 14 (B, K, N, M, O, C, P, E, G, F, I, J, Horário estipulado na escola para leitura em sala de aula; L) Contador de história; Noite cultural; Feira do livro; Oratória; Cantinho da leitura na hora do recreio; Acervo de livros da biblioteca; Sarau de poesia; Há livros nas salas e momentos para leitura; Encaminhamentos individuais dos professores; 166 Hora cívica; Atividades pedagógicas extras como visitas a museu, emissora de TV e outros; Apresentações em datas comemorativas; Informática educacional; Aulas com foco na Língua Portuguesa; Trabalho coletivo dos professores; Incentivo da coordenação e da direção; Há livros disponíveis na sala para leitura, assim que vão terminando as atividades; Uma vez por semana uma professora faz a leitura com os alunos. Parcialmente Havia mais incentivo antes da reforma. Ao bater o sinal na 2 (A, D) entrada da aula, semanalmente direção/coordenação/professores contavam gradativamente partes de uma história infantil. No mural havia sempre informações sobre a escola, dicas de livros para empréstimo, piadas e adivinhas. Apenas na questão de ritmo, entonação e fluência. Não Todo trabalho é fruto do professor, não há incentivo da 1 (H) equipe pedagógica, apenas acesso aos livros concedidos ao professor. Fonte: correspondente à questão n. 22 do questionário (apêndice 1). De acordo com as justificativas apresentadas pelos professores, percebemos que eles atribuem à biblioteca grande responsabilidade pelo trabalho com a leitura. Villejo e Ribeiro afirmam que ―O papel da biblioteca escolar é ser um apoio ao sistema educacional, caracterizada pelo incentivo à leitura para os alunos‖. (VILLEJO; RIBEIRO, 2012, p. 4). O trabalho com a leitura, portanto, não pode resumir-se apenas às aulas na biblioteca, pois os textos selecionados pelo professor e a forma como ele encaminha a leitura em sala de aula são relevantes para a formação do leitor. Há outras atividades relatadas pelos professores nas quais eles consideram como incentivo à leitura as contações de história, os textos que são afixados no mural para leitura, sendo que essas não são atividades mediadas pelo professor. Azambuja nos leva a refletir sobre o papel do professor quando diz que, 167 É importante que o professor esteja atento, verificando se há, por parte dos alunos, participação efetiva e interação absoluta frente ao texto. Desse modo, através de levantamento de hipóteses na busca da compreensão, o aluno irá atuar realmente sobre o texto, transformando o ato de ler em uma ação produtora de sentidos (AZAMBUJA, 1996, p. 157). Segundo Solé, ―o importante é pensar que, por um lado, os alunos e alunas sempre podem aprender a ler melhor mediante as intervenções do seu professor [...]‖ (SOLÉ, 1998, p. 117). Outra resposta que nos leva a refletir, diz respeito ao relato de professores que consideram como incentivo à leitura os livros que ficam na sala e que os alunos podem fazer a leitura quando terminam a atividade. No entanto, isso é algo a se pensar, pois, de acordo com Solé (1998) e Kleiman (2009), é importante que os alunos tenham objetivos claros para ler. Acreditamos, portanto, que ler só para passar o tempo enquanto os demais colegas terminam as suas tarefas não serve de motivação para desenvolver o gosto pela leitura, nem para assegurar a compreensão. 3.3 Análise documental Conforme apresentado no capítulo do percurso metodológico, em nossa pesquisa faríamos a análise documental. Os documentos analisados são os planos de aula elaborados por três docentes, sendo estes elaborados em dois momentos: antes da formação e após a formação. Na sequência, apresentamos os resultados dessa análise. 3.3.1 Planos de aula anteriores à formação De acordo com o que já foi explicitado no capítulo da metodologia, nesse trabalho analisamos a concepção de leitura que subjaz a prática docente de professores do 5º ano do Ensino Fundamental, para tanto, na formação que propusemos aos professores, solicitamos a eles que elaborassem um plano de aula 168 (apêndice 3), no primeiro encontro, antes de iniciarmos as oficinas. Acreditávamos que essa atividade nos daria respaldo para estabelecer em qual ou quais concepção(ões) de leitura as atividades elaboradas se enquadrariam, bem como para perceber os objetivos de leitura que cada profissional propõe aos seus alunos quando solicita essa atividade. Para realizarmos a análise, selecionamos três planos de aula, sendo que, para fazer essa seleção, observamos entre os planos aqueles que elaboraram atividades para a tira proposta que proporcionasse inferir como o professor trabalharia com a leitura. Também selecionamos três professores que participaram das cinco oficinas. Considerando todos os planos de aula recolhidos, sentimos a dificuldade para selecionar três, pois a maioria dos docentes não registrou as questões que fariam a partir da tira, tanto que o professor A será um exemplo disso nessa análise. Quando planeja a aula, percebemos que esse professor, a exemplo de outros do grupo, descreve como seriam seus procedimentos passo a passo da aula. No entanto, não deixa evidente a pergunta que faria. Contudo, pela forma como descreve, é possível deduzir os questionamentos que seriam realizados aos alunos. Manteremos, nesta seção, a mesma denominação atribuída aos professores na análise do questionário, assim, selecionamos os seguintes profissionais: A, F e J. Retomando os dados levantados na análise do questionário, constatamos que A tem 1 ano de experiência com 5º ano e tem 12 anos de trabalho na rede municipal de ensino; F tem 4 anos de experiência no 5º ano e 10 anos na rede municipal de ensino e J 5 anos de experiência com o 5º ano e está há 7 anos na rede municipal de ensino. Os profissionais selecionados já têm uma caminhada na rede municipal de ensino que é superior a cinco anos e, embora A tenha apenas um ano de experiência no 5º ano, já atua há 12 anos como professora da rede municipal, portanto, tem bastante experiência como docente. Solicitamos a elaboração do plano de aula e atividades para trabalhar a leitura no 5º ano do ensino fundamental. Ao apresentar o objetivo que tinham para a aula a ser proposta tivemos os seguintes dados: Compreensão da estrutura do gênero e sua função e do discurso direto e indireto. Empregar corretamente os sinais de pontuação (! ?, ...), parágrafo e travessão (Docente A, 28/02/2013). 169 Observamos que nesse relato há a previsão de trabalhar com a estrutura do gênero discursivo/textual, porém não há, pelo menos, explicitamente a preocupação com a compreensão leitora, pois a apropriação do gênero não significa apropriação do conteúdo contido nele. E como a ênfase no trabalho docente consiste em questões gramaticais, percebemos que aparece a pretensão de explorar o discurso direto e indireto e a pontuação. É claro que entendemos que isso seja relevante, pois, se não houver a apropriação dos elementos gramaticais e estruturais da língua, pode haver dificuldade na compreensão do texto a ser lido. Contudo, entendemos que o texto não pode ser utilizado apenas como pretexto para atividades de estudo da língua, sendo necessário que primeiro o seu conteúdo seja bem explorado. O professor F apresentou o seguinte objetivo: Desenvolver a leitura, bem como a compreensão das informações presentes no texto, com segurança e rapidez (Docente F, 28/02/2013). Nesse objetivo, percebemos que a preocupação com a leitura fica mais evidente. Teremos que observar no encaminhamento da aula o que F denomina como desenvolvimento da leitura, se isso se remete à leitura em voz alta ou se se trata da compreensão em si, pois, pelo que o professor apresenta, pode dar margem a essas duas práticas. Quando diz ―Desenvolver a leitura‖, o que está considerando como leitura a passagem do escrito para o oral? Ou considera, conforme Colomer e Camps, que “Ler é entender um texto[...] (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 29 grifos das autoras). De acordo com essas autoras, as escolas têm priorizado atividades de leitura que se distanciam da compreensão do texto e isso se evidencia, segundo elas, pelas atividades pautadas pela concepção ascendente de leitura, que nem sempre consideram o texto em sua totalidade para a leitura, ou seja, trabalham apenas com fragmentos, frases ou palavras. O professor complementa seu objetivo dizendo: [...] bem como a compreensão das informações presentes no texto [...] (Docente,F, 28/02/2013). 170 Acreditamos que, nesse trecho do objetivo, realmente esteja remetendo a compreensão, mas será que se considera que ler não é compreender as informações e os possíveis sentidos do texto? Por fim, o professor apresenta: [...] com segurança e rapidez (Docente F, 28/02/2013). Aqui mais uma vez há a dúvida se a ênfase do professor consiste na fluência e ritmo da leitura ou se na compreensão do que está dito, pois falar em segurança e rapidez na leitura pode remeter à leitura em voz alta. Ao analisar como esse professor organizou a sua aula, buscamos as respostas ao que foi priorizado em sua aula: a compreensão ou a oralização do texto. O professor J traça como objetivo: Levar o aluno a identificar as ideias do texto, conhecer as especificidades e características dele; Desenvolver e ampliar as ideias (Docente J, 28/02/2013). Esse professor apresenta como objetivo principal a identificação das ideias do texto, que supomos ser a ideia principal contida nele, e também faz referência ao gênero quando diz ―conhecer as especificidades e característica dele‖. Solé (1998) diz que é muito importante o trabalho de identificação da ideia principal em sala de aula, mas assevera que, acima de tudo, esse processo de localização deve ser ensinado, isso por meio de atividades que a autora chama de compartilhadas e que nós compreendemos como sendo ações de mediação do professor. O professor J ainda espera que, por meio da leitura e do seu trabalho de mediação, possa ampliar as ideias de seus alunos. É claro que a partir do que os professores apresentaram como objetivo, realizamos as nossas inferências a respeito do que acreditamos que eles pretendem desenvolver a partir do trabalho com a leitura da tira, contudo nossas previsões serão confirmadas ou não de acordo com os encaminhamentos metodológicos e atividades propostas pelos docentes. Ao olharmos para os conteúdos elencados pelos docentes, percebemos a nítida relação com o objetivo apresentado. Nesse sentido, o professor A, que demonstrou em seu objetivo ênfase maior ao gênero discursivo/textual e com aspectos relacionados à pontuação, elencou os seguintes conteúdos: Leitura: 171 entonação, ritmo e fluência, interpretação, decodificação. Escrita: discurso direto e indireto e sinais de pontuação. Observamos que A, ao relacionar o conteúdo, voltou-se mais para uma concepção ascendente de leitura, pois embora diga que vai fazer a interpretação do texto, ele fala em decodificação. Portanto, somos levados a inferir que há grande preocupação com a oralização da leitura, pois aparecem como conteúdos: entonação, ritmo, fluência e decodificação. Tendo em vista que a aula proposta deveria ser para o 5º ano supomos que a decodificação do texto fosse algo já dominado pelos alunos e que, destarte, o professor deveria ocupar-se com questões que vão além da decodificação. O professor ainda destaca conteúdos que fazem parte do eixo da escrita, ou seja, percebemos a dificuldade dos professores em pensar em uma aula voltada para a leitura, pois sempre se busca atrelá-la a outros eixos da língua portuguesa, não que essa relação não seja válida e importante, contudo a nossa proposta estava relacionada à leitura. O docente F mantém ênfase na leitura e, desse modo, cita como conteúdo: leitura, compreensão e tema presentes no texto. Observamos que, quando o professor elenca o conteúdo, apresenta, além do aspecto da leitura e da compreensão que já constaram no objetivo, também o tema. O tema pode ser entendido como idéia principal do texto ou mesmo como conteúdo temático, sendo este definido por Bakhtin (2003), mas só teremos a confirmação de que tema é proposto pelo professor na sequência da aula. O professor J propõe os seguintes conteúdos: Especificidades e características da tira; Identificação de ideias implícitas e explícitas do texto; Consistência argumentativa; Concordância verbal; Pontuação e expressividade; Produção textual. Percebemos que relacionado ao eixo da leitura especificamente aparece a identificação das ideias explícitas e implícitas, os demais conteúdos estão relacionados à escrita, com exceção de especificidades e características da tira que envolve a leitura, pois conhecer o gênero a que o texto pertence, quem produziu e em que contexto social auxilia na compreensão leitora. Conforme observamos nos conteúdos apresentados pelos professores acima, apenas F não destaca conteúdos relacionados a aspectos gramaticais, assim, conforme Menegassi, para haver a compreensão leitora, o leitor precisa dominar alguns aspectos, nesse sentido, o autor assevera: 172 Compreender um texto é captar sua temática; é resumi-lo. Para que isso aconteça, o leitor deve conseguir reconhecer as informações e os tópicos principais do texto, assim como, também, dominar as regras sintáticas e semânticas da língua usada. Além, disso, é fundamental que o leitor conheça as regras textuais do gênero que está lendo, para depreender a significação pretendida pelo autor [...] (MENEGASSI, 2010, p. 45). Espera-se, portanto, que os dois professores tenham essa clareza de que o conhecimento sobre o gênero e a gramática textual seja aliado para a compreensão do texto em questão. Se não for desse modo, não há sentido no trabalho gramatical. Queremos, desse modo, afirmar, com base nas palavras do autor, que reconhecemos a importância da gramática textual. Conforme já destacamos anteriormente, ao olhar para o objetivo e para o conteúdo proposto pelos professores, fizemos nossas deduções a respeito do que acreditamos que eles poderão desenvolver em sua aula, e agora passaremos a olhar para o encaminhamento metodológico proposto, pois nele acreditamos que haverá as confirmações ou não daquilo que prevemos. Vejamos o professor A: O professor não fala em atividade de pré-leitura, mas aparentemente propõe essa atividade, pois, em seu encaminhamento diz que irá apresentar a tira, realizar questionamentos sobre os balões, personagens. Na sequência, propõe a leitura da tira, sendo esta realizada pelo professor e durante a leitura enfocam-se os sinais de pontuação: Questionar o que ocorreu com a árvore e se já leram outros textos sobre desmatamentos, queimadas. Explicar a estrutura desse gênero (apresentar outros textos com o mesmo tema e outras tiras), desenvolver perguntas no caderno, atividades para transformar discurso direto em indireto, partindo do próprio texto, atividades de pontuação, produção escrita coletiva e individual de tiras com reestruturação coletiva e individual (Docente A, 28/02/2013). Esse foi o encaminhamento apresentado por A. Se retornarmos à resposta desse professor quando questionamos o que ele entende por leitura, a afirmação foi a seguinte: ―A compreensão da mensagem do locutor/autor.‖ Analisando essa resposta e o encaminhamento apresentado pelo professor, percebemos que há um predomínio da concepção ascendente de leitura, pois há preocupação com a decodificação do texto e as atividades se centram na linearidade do texto. 173 Embora não sejam apresentadas as questões que o professor apresentaria para o texto, ele enfatiza os aspectos formais da língua, como os sinais de pontuação e o discurso direto e indireto, sendo estes os aspectos que mais se sobressaem em sua aula. Após ser realizada a leitura do texto, percebemos que em seu encaminhamento são apresentadas duas questões e podemos dizer que uma é ascendente e a outra descendente: O que aconteceu com a árvore? Você já leu outros textos sobre desmatamento e queimadas? Percebemos que o texto serve de pretexto para o trabalho com a língua e para discutir questões relacionadas aos conteúdos da disciplina de Ciências, não que essa interdisciplinariedade não seja importante, no entanto, a produção de sentido a partir da leitura do texto deveria ser mais explorada. O professor F, ao propor questões para a tira, mantém-se em uma concepção ascendente de leitura. Antes, porém, de propor as perguntas, apresenta os encaminhamentos que teria para a aula, os quais seriam: Após a distribuição da tirinha do Penadinho de Maurício de Sousa, pedir a leitura silenciosa de todos e em seguida que eles comentem o que entenderam com o colega. Após 10 minutos solicitar novamente o que entenderam, se perceberam a importância do tema para a vida futura do planeta (Docente, F, 28/02/2013). Nesse trecho do encaminhamento feito pelo professor, percebemos marcas de uma concepção ascendente de leitura, pois, de acordo com Leffa, nessa abordagem de leitura ―o mais competente pode ditar o significado ao menos competente, incluindo a situação típica de sala de aula, onde o texto significa aquilo que o professor diz que ele significa.‖ (LEFFA, 1999, p. 19). Conforme observamos na aula, o que se pretende é que os alunos primeiro discutam em dupla o que entenderam do texto e, após alguns minutos, o professor retoma a discussão para novamente solicitar o que os alunos entenderam e espera que eles percebam a importância do tema para a vida futura do planeta. No entanto, o autor está apresentando o retrato do que já existe, as causas do desmatamento já são sentidas nos dias atuais. Percebemos, portanto, que o professor não espera fomentar o debate sobre o tema apresentado, ou seja, não permite que os alunos exponham o 174 significado que o texto teve para eles, mas quer que se perceba aquilo que ele acredita. Das questões apresentadas pelo professor, constatamos que a maioria delas se enquadra em uma abordagem que tem o foco no texto, vejamos as questões elaboradas: 1- Quais são os personagens presentes na tirinha? 2- Onde estão estes personagens? 3- Sobre o que eles estão falando? 4- Qual é o personagem que aparece somente no último quadrinho? 5- O que aconteceu com ele? 6- Há algum culpado pelo que aconteceu com o personagem do último quadrinho? 7- Elabore um parágrafo manifestando sua opinião sobre o tema. As questões 1, 2, 3, 4 e 5 são classificadas como ascendentes, pois requerem apenas que o leitor localize as informações no texto. E como se trata de uma tira deve-se estar atento ao conteúdo verbal e ao não verbal presente nele. Observamos que para responder as questões 1, 2 e 4 os alunos deverão olhar para o não verbal, ou seja, para a ilustração da tira e para isso não precisam estabelecer nenhuma relação da imagem com conhecimentos que já tenham, basta simplesmente verificar quais são os personagens, onde eles estão e a questão 3 já remete para o último quadrinho, facilitando ainda mais a localização. Para responder à questão 3, deve-se ler os textos dos balões, mas logo no primeiro deles já é possível encontrar a resposta. A questão 5 poderia ter sido elaborada de uma forma que proporcionasse a interação maior do leitor com o texto, mas como pergunta diretamente o que aconteceu com a árvore, levando-se em conta o recurso visual será fácil perceber que se trata de uma morte por queimadas. As questões de localização propostas pelo docente na atividade são, segundo Menegassi, ―típicas da formação do leitor, que se prolonga pelos anos escolares até o final da Educação Básica, incluindo-se o Ensino Fundamental II e o Ensino Médio‖ (MENEGASSI, 2010, p. 41). Dessa forma, inferimos pelas palavras do autor que essas atividades são básicas para a formação do leitor, contudo, tendo em vista que o 5º ano está no final do Ensino Fundamental I, as questões de leitura deveriam ser aprofundadas passando a prever a interação do leitor com o texto. 175 As questões 6 e 7 estão solicitando a opinião do leitor, pois, na questão 6, ao solicitar se há algum culpado pelo ocorrido com a árvore, deixará o aluno livre para expor o que ele pensa. Essa questão poderia ser interacional se tivesse sido elaborada de uma forma que contemplasse os conhecimentos prévios do leitor e as informações presentes no texto, até mesmo se o professor tivesse acrescentado um ―por quê‖ ao final da questão. Já a questão 7 é puramente descendente, pois o que se espera é que o aluno dê a sua opinião sobre o tema apresentado no texto. É claro que consideramos que as questões descendentes são interessantes para trabalhar a formação da opinião e argumentação do leitor, porém temos que ter a clareza de que esse tipo de questão não serve para avaliar a compreensão leitora, é uma atividade de produção escrita. Conforme explicitado na análise do conteúdo apresentado por F, analisaríamos no encaminhamento metodológico se, ao falar sobre o tema, o professor referia-se ao tema como proposto por Bakhtin (2003), que leva em consideração o contexto de produção, o autor do texto para chegar à temática proposta no texto, mas, pelo que foi possível observar no encaminhamento, o professor tratou o tema como sinônimo de assunto. No encaminhamento proposto, também foi possível observar que o objetivo do professor em trabalhar a compreensão não foi atingido, haja vista que ele não permite ao aluno a produção de inferências a partir do que é lido, o que é proposto é apenas a localização de informações. O professor J propôs o seguinte encaminhamento metodológico: ―Entregar uma tira para cada aluno ou colocar em transparência. 1º Leitura individual e posteriormente coletiva. Questionamentos orais. Apresentar as características e especificidades da tira. Interpretação escrita envolvendo a identificação das ideias do texto, bem como o conhecimento que o aluno tem do tema. Atividades envolvendo pontuação e concordância verbal. Produção textual.‖ 176 Esse professor, além de propor a leitura individual, portanto silenciosa, que seria para a identificação do texto, também relata que fará a leitura coletiva, e a partir desta fará os questionamentos orais e escritos. Após realizar a leitura coletiva são propostas as seguintes questões (oralmente): ―Quem são os personagens? Onde estão? Sobre o que falam? São fictícios ou reais? Que tipo de texto é? Como você descobriu? Embora, aparentemente, não tenha consciência do que esteja fazendo, o professor propõe atividades que Solé (1998) denominaria de atividades de pré- leitura. O docente J ainda diz que antes de fazer a interpretação escrita apresentará as características da tira. As questões propostas pelo professor foram: 1- Responda: a) Qual o assunto do texto? b) O texto traz um problema ambiental sério? Que problema é este? c) O que a árvore quis dizer quando mencionou que no caso dela não foi acidente nenhum? d) Quais as causas prováveis ou possíveis para que haja tantas queimadas? e) O que podemos fazer para evitar este problema? 2- Marque a alternativa correta: a) Os personagens do texto morreram devido a: (A) Fogo (B) Susto (C) Acidente b) Quando Penadinho citou a palavra você, ele se referiu: (A) ao fantasma (B) a árvore c) Os pontos de interrogação foram utilizados nas duas falas do Penadinho, por quê? (A) Referem-se ao susto. (B) referem-se a uma pergunta. 3- Passe as frases a seguir para o tempo que se pede. a) Eu morri, foi um acidente horrível. (futuro) b) Mas no meu caso não foi acidente nenhum! (presente) 4- Propor aos alunos transformar a tira em um texto narrativo, acrescentando a opinião deles sobre o tema. Obs.: Antes dessa atividade poderá ser dada uma pesquisa mais aprofundada sobre o tema. 177 5- Caso o professor não queira solicitar a produção escrita, poderá também propor a confecção de um cartaz de alerta. Na última atividade elaborada pelo professor J percebemos que há certo desconhecimento do gênero, pois ao afirmar que se o professor não quiser propor uma produção textual, que certamente deve se tratar de uma redação escolar, poderá solicitar a produção de um cartaz de alerta, desconsidera, assim, que este também é um texto, embora tenha uma extensão menor. Mas, analisando as questões propostas, percebemos que o professor trabalha com questões que atendem as três concepções de leitura expostas neste trabalho. As questões que são propostas na oralidade apresentam perguntas tanto ascendente quanto interacional. São ascendentes: Quem são os personagens? Onde estão? Sobre o que falam? São fictícios ou reais? Já as questões: Que tipo de texto é? Como você descobriu? Podem ser classificadas como interacionais, pois exigem que o leitor, a partir do reconhecimento do texto, acione os seus conhecimentos prévios para determinar a que gênero ele pertence. No exercício 1, as questões ―a‖, ―b‖ e ―c‖ são interacionais, porque elas não exigem, conforme Kleiman (2008), apenas o pareamento das palavras da questão com as palavras idênticas no texto. Da forma como as questões foram elaboradas pelo professor, ―o leitor poderá interagir com o texto, produzindo seus significados, indo além das linhas do texto‖ (MENEGASSI, 2005, p. 33). As questões ―d‖ e ―e‖ são classificadas como descendentes, pois exigem do aluno que eles comentem sobre assuntos que não haveria a necessidade do texto para elaborar a resposta. Colomer e Camps asseveram que essas questões pertencem ao processamento descendente ―porque não atuam como anteriores, da análise do texto à compreensão do leitor, e sim em sentido contrário, da mente do leitor ao texto‖ (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 30). Já no exercício 2 a letra ―a‖ é a única questão ainda de interpretação do texto, pois as demais se referem a gramática textual. A questão ―a‖ é ascendente, haja vista que apenas solicita que se identifique a causa da morte da árvore e do fantasma e ainda o professor apresenta as alternativas, facilitando ainda mais a resposta. 178 Como já dissemos no parágrafo anterior, as demais atividades propostas pelo professor envolvem a gramática textual. Algumas são forçadas é o caso da atividade 3, em que se solicita a alteração do tempo verbal, no entanto, as frases não apresentam coerência quando sofrem a alteração solicitada. Percebemos que J apresenta questões que se inserem em sua maioria na concepção interacional de leitura, embora apresente em sua aula questões ascendente e descendente. Assim, concluímos que A e F apresentam em sua aula o predomínio de questões e encaminhamentos ascendentes, enquanto J elabora questões e encaminhamentos que priorizam a interação entre texto-leitor-autor. O docente A, conforme já citado, quando questionado sobre o que entende por leitura, apresentou um depoimento que nos remete a uma concepção ascendente. J relatou que ler é: Saber entender o que se vê e além do que se vê, a leitura abre as portas para o conhecimento (Docente J, 28/02/213). Percebemos que esse relato apresenta uma concepção interacional de leitura, pois de acordo com Leffa (1996), a leitura consiste na ação de olhar para uma coisa e ver outra e pelo que percebemos no plano desse professor, ele apresenta atividades que mantêm essa concepção. F apresentou nessa questão o seguinte relato: Uma interação entre um texto e o leitor, capaz de informá-lo, propiciar lazer, trazer informações sobre o cotidiano, bem como instruir (Docente F, 28/02/2013). Constatamos que essa concepção apresentada no questionário não se confirma na elaboração do plano de aula. O que verificamos, portanto, é que as práticas de leitura que visam à compreensão leitora realizadas na escola ainda repetem o descrito por Colomer e Camps: A forma adotada com mais frequência para essa atividade nas aulas é a de leitura de um texto oral ou silenciosa, seguida da resposta a um questionário que interroga sobre o significado. Frequentemente, as perguntas do questionário limitam-se a cobrar a lembrança 179 imediata de pequenos detalhes secundários e referem-se a informações obtidas segundo o desenvolvimento linear do escrito. Assim, o tipo de resposta resultante é o de uma simples verificação, concisa e facilmente localizável no texto, mesmo que o leitor não o tenha compreendido, já que não existe nenhum tipo de elaboração pessoal nem implícita sua compreensão global (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 72-73). Assim, analisando os três planos de aula, inferimos que se mantém essa concepção descrita pelas autoras e a escola ainda acredita que o fato de o aluno ler oralmente bem e responder questões que exigem apenas a localização de informações lhes garante a compreensão leitora. O que na realidade não acontece. O que percebemos em nossa pesquisa é que os professores apresentam dificuldade para pensar em uma aula de leitura e, devido a isso, a maioria deles não se dispôs a elaborar as questões para trabalhar a leitura e preferiu elencar os conteúdos que trabalhariam a partir do texto. E isso foi possível verificar nos planos analisados, com exceção de F, que não abordou questões de gramática, A e J demonstraram grande preocupação com esses aspectos. 3.3.2 Planos de aula posteriores à formação Conforme análise dos planos de aula elaborados por A, F e J, percebemos que A e F apresentaram atividades nas quais houve o predomínio da concepção ascendente de leitura e J apresentou atividades nas quais predominou a concepção interacional. Contudo, nosso objetivo, além de constatar a concepção de leitura que norteia ao trabalho docente, pretendeu verificar se as cinco oficinas de formação foram capazes de produzir alguma alteração no modo de conceber o trabalho com a leitura. Para atingir tal objetivo solicitamos aos professores que, no último encontro, olhassem para o plano elaborado no primeiro encontro e ficassem à vontade para realizar as alterações que julgassem necessárias. Assim, a partir de agora analisaremos as alterações realizadas por esses três professores. O professor A, ao reavaliar o seu plano de aula, apresentou alterações inclusive no conteúdo proposto, no primeiro plano constava: leitura: entonação, ritmo 180 e fluência; interpretação, decodificação. Escrita: discurso direto e indireto e sinais de pontuação. No segundo plano de aula constatamos que o professor apresenta como conteúdo: especificidades e características do gênero; Linguagem verbal e não verbal (balões). Observamos que o professor excluiu as questões relacionadas à escrita e deteve-se ao gênero discursivo/textual. Também percebemos que foi excluída do conteúdo a decodificação e acreditamos que isso se deve à formação, haja vista que, nas oficinas, discutimos bastante as questões relacionadas à decodificação e à compreensão textual. Em relação ao encaminhamento, percebemos que o professor acrescentou a atividade de pré-leitura. No primeiro plano, constatamos que o professor relatou que faria questionamento a respeito dos balões, no entanto, ele não reconhecia que esta etapa da leitura era a pré-leitura, sendo essa a etapa na qual o professor deve ativar os conhecimentos prévios dos alunos, bem como motivar a leitura. Para exemplificar essa fase, utilizamos os estudos de Solé e a autora pontua ―Com relação ao conhecimento prévio, algumas coisas podem ser feitas para ajudar as crianças a atualizá-lo‖ (SOLÉ, 1998, p. 105). Ainda abordando questões relacionadas à préleitura a autora orienta que nas aulas de leitura o professor deve: Dar alguma explicação geral sobre o que será lido. [...]. Ajudar os alunos a prestar atenção a determinados aspectos do texto que podem ativar seu conhecimento prévio. [...] Incentivar os alunos a exporem o que já sabem sobre o tema. [...] (SOLÉ, 1998, p. 105106). Percebemos, portanto, que a oficina de estratégias, etapas e objetivos de leitura proporcionou a reflexão do docente A e ecoou em sua prática. As questões de pré-leitura elaboradas por ele foram: Pela imagem, sobre o que você acha que eles estão conversando? O que será que ocorreu com a árvore? O professor mantém a leitura feita a princípio em voz alta pelo professor, depois a leitura em voz alta pelos alunos e a leitura apontada. Como observamos, a leitura em voz alta permanece muito presente na escola. Colomer e Camps, ao tratarem dessa oralização em sala de aula, afirmam: [...] a análise do ato de leitura questiona decisivamente essa prática que acostuma o aluno a adotar um comportamento diverso do que é próprio de um leitor, já que não lhe permite, por exemplo, controlar a leitura a partir da possibilidade de avançar e retroceder à vontade 181 para encontrar ou retificar informações. Ao contrário, obriga-o a concentrar-se para conseguir boa oralização. A consequência dessa atividade é que meninos e meninas não podem dedicar muita atenção à finalidade real da leitura: a construção de sentido, e habituam-se a decifrar mecanicamente sem procurar entender o texto (COLOMER; CAMPS, 2002, p. 68-69). Percebemos que a leitura em voz alta não traz contribuições para a compreensão do texto, contudo essa é uma prática que está muito arraigada nas escolas. No entanto, acreditamos que o trabalho visando a reduzi-la, demandaria um tempo maior de formação. Kleiman apresenta em seus estudos considerações que julgamos pertinente em relação a essa questão: Se, por exemplo, queremos descobrir se o aluno conhece as regras ortográficas da língua, a leitura em voz alta é bom instrumento de avaliação, considerando que a criança, para isso, deverá conhecer as correspondências entre grafia e som. Se estivermos interessados em saber se o aluno reconhece os valores dos diversos sinais de pontuação, também a leitura em voz alta é adequada, porque a evidência está na entonação com que se lê. Mas, se estivermos interessados na capacidade da criança para compreender um texto, fica difícil justificar a leitura em voz alta (KLEIMAN, 2004, p.152-153). Com base nos estudos da autora, reconhecemos a relevância da leitura em voz alta realizada na escola. Porém, é importante que o professor tenha em mente que, quando cobra esse tipo de leitura, estará avaliando as questões de ordem ortográfica e de pontuação, mas jamais poderá avaliar a compreensão leitora do texto. Para avaliar a compreensão, a autora sugere o seguinte encaminhamento, A leitura silenciosa, no entanto, excluindo a preocupação com a pronúncia e entonação, permite à criança envolver-se totalmente na busca de significados utilizando para isto seu próprio ritmo de leitura e as regressões ou releituras que se lhe fizerem necessárias (KLEIMAN, 2004, p. 153). Na formação, procuramos manter esse posicionamento em relação à leitura silenciosa e em voz alta, pois consideramos que, se a pretensão for avaliar a compreensão, é necessário que haja o momento para o aluno ler o texto silenciosamente, assim, é possível que depois se proceda à leitura em voz alta com toda a turma, contudo, se a leitura for feita apenas dessa última forma não adianta o 182 professor propor questões de compreensão do texto. Também é importante destacar que a leitura silenciosa para os alunos do 5º ano ainda pode admitir a leitura com movimentos labiais, ou seja, a subvocalização, que é característico nessa fase. O professor A nesse segundo plano de aula, apresentou questões que faria aos alunos para interpretação da tira. Apresentamos a seguir como estava o encaminhamento no primeiro plano e as perguntas formuladas no segundo plano: Questões elaboradas no 1º encontro Questionar o que ocorreu com a árvore e se já leram outros textos sobre desmatamentos, queimadas. Explicar a estrutura desse gênero (apresentar outros textos com o mesmo tema e outras tiras), desenvolver perguntas no caderno, atividades para transformar discurso direto em indireto, partindo do próprio texto, atividades de pontuação, produção escrita coletiva e individual de tiras com reestruturação coletiva e individual Questões elaboradas no último encontro 1. Qual foi a causa da morte do fantasma? 2. E da árvore? 3. Por que o fantasma diz ser acidental a sua morte? 4. E por que a árvore disse que a sua morte já não foi um acidente? 5. Pesquise no dicionário a palavra acidente. Qual significado se encaixa melhor ao texto? Veja que o professor conseguiu elaborar questões que são classificadas como interacionais. A questão 1 e 2 apresentam resposta literal, contudo elas não são copiadas exatamente iguais do texto, pois o aluno não pode dizer na questão 1, por exemplo, que o fantasma morreu de fogo, mas deve dizer que foi vítima de um incêndio. De acordo com Menegassi, para as questões de resposta literal: ―Todas as respostas a essas perguntas são retiradas literalmente do texto, porém não são copiadas, pois o aluno-leitor deve realizar um trabalho de interação com o texto para produzir as respostas‖ (MENEGASSI, 2010, p. 8). Nesse sentido, podemos afirmar que o aluno terá que fazer uma inferência para chegar à resposta correta. As questões 3 e 4 podem ser classificadas em perguntas para pensar e buscar. Segundo Solé, essas são ―perguntas cuja resposta pode ser deduzida, mas que exige que o leitor relacione diversos elementos do texto e realize algum tipo de inferência‖ (SOLÉ, 1998, p. 156). Quanto à questão, 5 percebemos que o professor solicita aos alunos que busquem qual o significado que melhor se adequaria ao contexto do texto e isso foi muito comentado por nós, nas oficinas, pois buscar o significado de uma palavra pode ser algo totalmente ascendente, se for solicitado apenas a busca dos 183 significados, porém se, além de buscar o sinônimo ter que analisar qual das entradas se ajusta ao contexto, essa tarefa faz com que o aluno seja levado a refletir a respeito do significado de determinada palavra naquela situação. Outra questão que se evidenciou no segundo plano realizado por A é que ele procurou focar na leitura, já que era isso que havíamos solicitado e excluiu, portanto, as atividades relacionadas ao estudo da língua. Constatamos que as oficinas proporcionaram algumas reflexões para o professor A, já para o professor F não visualizamos tantas marcas da formação. Esse professor manteve sua aula do modo como havia elaborado no primeiro encontro. A única alteração que ele fez foi acrescentar o seguinte: Trabalhar o gênero tira, focar mais na sua funcionalidade e intencionalidade. A partir desse acréscimo do professor, somos levados a deduzir que o que mais chamou a atenção dele foi a oficina sobre a leitura e os gêneros textuais, pois nossa quarta oficina abordou esse tema a fim de mostrar que a leitura proposta em sala de aula deve partir de situações reais/sociais de uso e como os gêneros discursivos/textuais são a materialização de todo discurso, é impossível pensar na leitura ou no trabalho com a língua que não ocorra por meio de gêneros. Essa perspectiva também foi abordada na oficina que tratou sobre o letramento. É claro que o professor poderia ter descrito melhor como trabalharia o gênero, mas apenas destacou que abordaria a funcionalidade e a intencionalidade, ou seja, qual é a função do gênero tira e a intencionalidade de quem o produz. Nesse sentido, percebemos que o professor, pelo menos aparentemente, compreendeu que é importante contextualizar o texto a ser trabalhado em sala de aula, buscando, ao falar da intencionalidade, trazer aspectos do contexto de produção. E, ao abordar a funcionalidade, apresentar qual a função social do gênero em questão. O professor J fez algumas reorganizações em sua aula. Percebemos que ele, assim como A, destacou a atividade de pré-leitura e acrescentou em sua aula: ―Fazer antes da leitura coletiva e individual‖, ou seja, quis marcar que tinha consciência de que realizaria a atividade antes de ler o texto. Para marcar essa atividade o professor reorganizou as questões que, segundo ele, no primeiro plano de aula faria oralmente após a leitura, na sequência transcrevemos como ficou a organização da aula, apresentando as questões que o professor elaborou no primeiro plano e como foi reorganizado no segundo plano. 184 Responda: Atividades de pré-leitura: a) Qual o assunto do texto? 1. Que tipo de texto é esse? b) O texto traz um problema ambiental 2. Onde estes textos circulam? sério? Que problema é este? 3. Qual o público desse tipo de texto? c) O que a árvore quis dizer quando 4. Quem são os personagens? mencionou que no caso dela não foi 5. Onde estão? acidente nenhum? 6. Sobre o que falam? d) Quais as possíveis causas para que prováveis haja ou 7. São fictícios ou reais? tantas queimadas? e) O que podemos fazer para evitar este problema? Observamos que o professor traz para a pré-leitura questões relacionadas ao reconhecimento do gênero. De acordo com Solé, ―Pode-se considerar que informar sobre o tipo de texto – ou superestrutura textual – que vão ler também é uma forma de lhes proporcionar conhecimentos úteis para sua tarefa‖ (SOLÉ, 1998, p. 105). Conforme verificamos na contribuição da autora, é importante que o aluno saiba que tipo de texto irá ler antes de iniciar a leitura, pois, dessa forma poderá ativar conhecimentos que lhe permitam compreender melhor o texto a ser lido. A autora complementa dizendo que [...] esta informação vai orientar os alunos para que eles saibam se se trata de um conteúdo real ou de ficção; se nos informa sobre algo que aconteceu recentemente ou se, ao contrário, descreve fatos do passado; se ele vai nos expor determinados conceitos; se vai nos ajudar a saber como podemos fazer alguma coisa (SOLÉ, 1998, p. 105). Analisando as questões que J propõe para pré-leitura, percebemos que ele tentou demonstrar que compreendeu a importância da ativação dos conhecimentos prévios, contudo, ele trouxe todas as questões referentes ao gênero para essa atividade. Ao fazer isso, trabalhou com a formulação de hipóteses que o aluno 185 deveria confirmar durante a leitura. Como foi possível constatar pela afirmação de Solé, é importante que os alunos saibam a que gênero pertence o texto antes mesmo de realizar a leitura, mas as questões referentes à circulação do gênero e ao público alvo que pretende atingir poderiam ser realizadas ou retomadas após a leitura. E é claro que as questões elaboradas poderiam estar inseridas em um processamento descendente, isso porque pretendemos na atividade de pré-leitura ativar os conhecimentos prévios e levantar hipóteses a respeito do que será lido, então, nesse caso, esse tipo de questão seria mais apropriado. Todavia, percebemos que o professor sentiu a necessidade de trabalhar com a pré-leitura, trazendo, assim, para seu segundo plano de aula marcas da formação. As questões que o professor apresenta na pré-leitura também refletem o trabalho com o gênero discursivo/textual, pois em seu primeiro planejamento não demonstrou preocupação em contextualizar questões relativas à circulação e ao público a quem o texto se dirige. Na primeira versão do plano de aula, o professor pontuou que antes da interpretação apresentaria as características da tira e na segunda, acrescentou que nessa apresentação das características da tira exploraria o discurso e os recursos como os balões presentes nesse texto. Acreditamos que isso seja reflexo da 4ª oficina, na qual abordamos os gêneros discursivos e a leitura. Naquela oportunidade, explicamos que para haver a compreensão leitora, é necessário dominar alguns aspectos relativos ao gênero, como é o caso da tira, mas se o leitor não conhecer os tipos de balões que são comumente utilizados nesse gênero, haverá a dificuldade para inferir o sentido do que está lendo. Concluímos, portanto, que as oficinas deixaram algumas marcas nos professores, embora tenhamos a clareza de que o tempo de formação foi limitado. Por isso, para obter resultados mais significativos, seria preciso uma carga horária maior. Contudo, foi possível encontrar vestígios da formação no segundo plano elaborado pelos professores. No quadro a seguir apresentamos o que ficou evidenciado da formação no plano de aula dos docentes no final dos encontros: Quadro 19 – Resultados da formação Antes da formação Não havia consciência das etapas de leitura Depois da formação É possível ver as etapas de leitura bem