REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ® O grande sentido da “inova?” A “inovação” e seu conceito equivocado têm sido propagados como a solução para o sucesso das empresas, como único remédio para a sua sobrevivência nestes tempos de competição desenfreada. O que muitos estão pensando é que a empresa que mais “inventar” coisas novas, produtos novos, estará à frente da concorrência. Uns sugerem inovações “radicais”, se referindo à necessidade de inventos de produtos radicalmente diferentes, para vencer a concorrência. A todo o momento falam que a única salvação da empresa é inventar produtos “radicalmente novos”. O “P” de P&D é sempre o de pesquisa aleatória de “novidades” e “inovações” e não de “P” de pesquisa do valor desejado do consumidor – Outros falam que é preciso incrementar a velocidade e intensidade de produção do departamento de P&D, mas o “P” é sempre o de pesquisa de novas invenções “radicais”, aleatórias, e não o “P” de pesquisa (ou de prospecção usando diversas técnicas) para conhecer a escala de valor desejado do consumidor, que revela a forma perfeita de como se faz o produto mais vendável. É exatamente por isso que os custos em P&D crescem e os lucros diminuem. A “inovação“ com baixa, alta ou nenhuma tecnologia é um segundo movimento. P&D com “P” de pesquisa de produtos, de invenção de produtos, acompanhada de seu “D” de desenvolvimento, é um segundo movimento, após saber qual o produto, qual a “inovação” a ser criada e sua receita perfeita de como ele é, revelada por quem precisa dele, por quem vai usá-lo, extraída de sua escala de valor desejado para todos os produtos. A partir daí, sim, os inventores, o pessoal do departamento de P&D tem um norte seguro para onde direcionar seu entusiasmo criativo, inventivo, tendo certeza absoluta de que caminham para uma solução técnica comercializável. O que realmente importa não é a engenhosidade da invenção, a alta tecnologia empregada, mas a pertinência de sua aplicação para dar a solução perfeita desejada pelo comprador. Porque a “inovação” é feita para que ele a compre e o consumidor só compra o que quer. Só compra o produto que mais perfeitamente atende às suas necessidade, aos seus desejos. Ninguém pode obrigar alguém a comprar o que não quer. O problema das empresas voltadas à “inovação” é que elas não sabem qual “inovação” o consumidor deseja – Que importa toda a minha criatividade para a inovação, se eu não sei o que o consumidor deseja que eu invente? Se eu não sei exatamente como é a “inovação” que o consumidor deseja? O que as empresas têm de fazer é encontrar todas as maneiras possíveis (e, aí sim, ela tem de ter conhecimento, criatividade e feeling) para “extrair” do consumidor este modelo perfeito de como deve ser feito o seu produto. Uma grande “inovação” velha: O motor “flex”, bicombustível – Exemplo de que “inovação” não consiste somente de novas idéias: O Ford modelo “T” de 1908 era “flex”, bicombustível. Funcionava a álcool e a gasolina. O motor “flex” de hoje (feito com nova tecnologia, mas utilidade para o consumidor igual), para o consumidor é uma “novíssima” “inovação” que vem atender ao seu valor desejado de poder optar entre dois combustíveis e fugir do alto preço da gasolina quando lhe der vontade. Uma “desinovação” de grande sucesso: a calculadora pessoal – Outro exemplo de “desinovação” de grande sucesso: a calculadora de seis dígitos da Casio. Esta gigante japonesa surgiu no final dos anos 50 e nos 60 era líder do mercado de calculadoras eletrônicas. Em 1970 ela se viu apertada por mais de 40 concorrentes e em vez de fazer uma “inovação” “nova”, ou um aprimoramento em suas calculadoras que tinham 8 dígitos, criou um modelo com menos 2 dígitos, sem casas decimais, menos funções e ao preço de 100 dólares, a Casio Mini (eu tive uma quando garoto). Antes da Casio Mini o preço de uma calculadora chegava a milhares de dólares. Estaria o conceito equivocado da “inovação” entranhado na natureza do homem? Reportagens comentam que nem os vendedores acreditavam no produto. Pelo visto nesta época já existia esta mentalidade equivocada da tal “inovação” e seu conceito – que o cliente só compra invenção nova e com a mais alta tecnologia. Também lá, ninguém conhecia o princípio lapidar da comercialização que ensina a razão pelas quais as pessoas compram: a sua percepção de valor. Em apenas um ano venderam-se dois milhões de unidades. A Casio Mini foi a primeira das calculadoras pessoais. Segundo a revista exame, a estratégia da Casio sempre foi baseada “na criatividade e na intuição” de seu diretor (não havia pesquisa ou outro método de estudo da escala de valor do consumidor). Grandes “inovações” que ninguém comprou porque não precisava delas – Veja estes exemplos de grandes “inovações” que ninguém quis. Que não serviam para nada. Mas eram grandes inovações, grandes inventos! Mas não eram um valor desejado pelas pessoas e por isso ninguém comprou. E inovação que o consumidor não deseja, não vende. O vídeo fone. Que maravilha. O telefone com vídeo, com uma telinha na qual você é visto e vê a pessoa que está falando do outro lado da linha. À primeira vista, qualquer pessoa diria na posição de vendedor, que seria um produto de sucesso. Mas o vendedor não sabe qual é o produto de sucesso, o produto que vende. Só o comprador é quem sabe. Por incrível que pareça, o vídeo-fone não era um item de valor desejado da escala de valor do consumidor para o produto telefone. Na posição de vendedor as pessoas tem um modo de pensar. Na posição de comprador, tem outro completamente diferente. Faz mais ou menos 40 anos que foi inventado e até hoje ninguém quis ter um vídeo-fone. Coloque-se agora na posição de usuário do vídeo-fone e você vai entender, fácil, porque foi um grande fracasso. Somente os consumidores conhecem o produto perfeito, a “inovação” perfeita – As pessoas querem inovações? Não. Querem que a cada dia seja satisfeito mais um item (senão todos de uma só vez) de valor desejado de sua escala de valor desejado para todos os produtos (na verdade, quando os consumidores dizem produtos, querem dizer soluções para o seu valor desejado), que ele tem guardada dentro dele, e da qual nem ele mesmo tem total consciência. Querem outra “inovação” indesejada? As TVs em miniatura da Casio. O famoso “parece mais não é”. À primeira impressão seria um sucesso. Mas ninguém quis ter uma TV de 5 polegadas. Ela quase não existe hoje no mercado, porque simplesmente não era um item de valor de desejado das pessoas para o produto televisão. Fruto de mais um surto de “intuição”. A “intuição” de maior sucesso da Casio: a Exilim – O mesmo Kashio que teve a “intuição” da “desinovação” de grande sucesso que foi a primeira calculadora pessoal, também teve a intuição de outra “inovação” de grandes vendas porque “encaixou” perfeitamente (mais uma vez por “sorte”) em itens de grande valor desejado do consumidor, quando a empresa estava a um passo de fechar as portas por culpa de “intuições” de outros produtos que o consumidor não comprou: a câmera digital Exilim, apesar de sua resolução pequena, era um valor desejado tão alto, guardado no coração das pessoas (aonde é mesmo que está escondida a escala de valor desejado dentro das pessoas?) para o produto fotografia –poder levar a máquina para todos os lugares, uma festa por exemplo, da maneira mais discreta (no bolso, na bolsa) e portátil, deixando as mãos completamente livres. O problema é que quando a “intuição” do Kashio ou de algum outro seu irmão (são quatro os diretores-fundadores da Casio) falha, como aconteceu com o Cassiopeia, o primeiro minicomputador da Casio, o prejuízo é grande. Exemplefiquemos, agora, mais uma “inovação”, porém, mais que perfeitamente “encaixada” na escala de valor do consumidor. Um exemplo de um produto que é um item de valor que está na parte mais alta da escala de valor do consumidor para o produto telefone: o celular. Mas será este o item final da lista para este produto cujo verdadeiro nome (dado por quem tem o seu modelo perfeito em sua escala de valor, o consumidor) é comunicação pessoa a pessoa da forma mais privativa possível e que o fabricante chama de telefone? Sabemos o item final da lista? Não, mas sabemos onde a “lista completa” está. Só temos que aprender cada vez mais a “prospectar”, (e esta é a parte mais difícil, pois se nem o proprietário da lista, o consumidor, racionaliza, conhece todos os seus itens) para conhecer todos eles. Esta condição é imperativa para a sobrevivência das empresas. Visualize abaixo de forma simplificada, a escala de valor desejado do consumidor para todos os produtos – Para melhor entendimento, visualize a escala de valor desejado do consumidor para qualquer produto através de um pequeno gráfico simplificado de seus itens principais. Tomemos como exemplo a escala de valor para o produto música. Na lista numerada abaixo, está listado o valor desejado e logo após, a solução correspondente (produtos) materializada: 1. A simples audiência da música –as apresentações em teatro (para poucas pessoas) 2. O som para ouvir em casa a qualquer hora –o som gravado em gramofones (som de péssima qualidade) 3. O aparelho para ouvir e conhecer novas músicas a custo baixo –o rádio 4. O som transportável para ouvir em qualquer lugar – o rádio portátil 5. As músicas preferidas para ouvir em todo lugar –o walkman 6. O som de alta qualidade – o toca discos em estéreo e hi-fi 7. O música transportável de alta qualidade –o discman 8. A música ao vivo para ver em casa –a televisão 9. Músicas escolhidas em apresentações ao vivo do cantor para ver em casa –o vídeo-cassete 10. O item anterior com imagem e som de alta qualidade –o dvd 11. Um aparelho para ouvir músicas, assistir vídeos ou qualquer outra coisa e que possa armazenar centenas delas com som de altíssima qualidade, transportável no bolso da camisa –o iPod etc. De posse da lista de itens desta escala é bem mais fácil para as cabeças pensantes do departamento de P&D criar uma “inovação” com mercado comprador certo. Será que somente o Michael Dell, da Dell Computers, tem consciência do equívoco que é a tal da “inovação” e seu conceito? – A entrevista concedida a Thomas A. Stewart, editor da Harvard Business Review e Louise Obrien, editora consultora desta revista, revelam a lucidez e conhecimento dos princípios da verdadeira ciência do marketing do presidente e fundador da Dell Computers, Michael Dell. Nesta entrevista, ele e seu CEO Kevin Rollins ensinam que a excelência de sua empresa está em conhecer e monitorar momento a momento a escala de valor desejado de seu comprador e não em inventar meras “inovações” pirotécnicas. Abaixo, algumas frases e comentários em seguida a cada uma delas: “A Dell mudou aquilo que era o fator estratégico em nosso setor (de computadores), que foi do gasto com P&D para a produção de tecnologia padrão ao mais baixo custo. Na história da humanidade nenhuma empresa que tenha fornecido a baixo custo, saiu perdedora.” Um exemplo para entender um dos aspectos a que ele se refere nesta afirmação: a grande maioria das pessoas jamais vai precisar de um computador que tenha um processador com a velocidade maior que 2 e meio megahertz, por exemplo. Esta configuração e seu baixo custo tornam este computador um alto valor desejado para um número imenso de pessoas, aumentando o faturamento e a fatia de mercado da empresa. O que se quer com “inovação” não é tornar a empresa líder? Esta “desinovação” do Michael Dell é a verdadeira “inovação”. A “inovação” que o cliente deseja. Daí a opção da Dell por tecnologia padrão a baixo custo. “O gasto elevado em P&D para criação de produtos exclusivos leva a uma estratégia de nicho, não a uma estratégia de base ampla. Ainda assim, muitas empresas continuam a dizer que o vencedor será aquele que mais gasta em P&D.” Quando ele fala em “criação de produtos exclusivos”, leia-se “inovações” (“intuitivas” ou baseadas na escala de valor do consumidor). Mesmo sendo a estratégia de nichos, uma opção válida para qualquer empresa para atender o valor desejado, ele explica que este posicionamento leva a muito mais trabalho, mais investimento em P&D e talvez a menos lucro, para quem está mirando ser líder de mercado. Aqui ele também se refere ao equívoco de pensar que quanto mais alta a tecnologia da “inovação” mais a empresa crescerá. “Nossos concorrentes não vão bater a Dell enquanto gastarem uma fortuna em P&D e tentarem ser empresas voltadas a “inventar”. Estas duas metas são mutuamente excludentes.” Aqui ele põe “o dedo na ferida”. Quando diz “empresas voltadas a inventar”, refere-se à prática da famigerada “inovação”, a invenção de produtos novos, desenfreada, sabe-se lá para quem comprar. Em seguida, sobre as metas excludentes, ele se refere às duas escolhas que toda empresa tem à sua frente: ou luta para conhecer, pesquisar e monitorar para atender a escala de valor desejado do consumidor, isto é, vender produtos do jeito que o consumidor quer comprar, como a Dell faz, ou prossegue com a produção louca de “inovações” de alta tecnologia, com seus imensos gastos em P&D, na crença equivocada de que o consumidor só gosta de “novidades tecnológicas”, quaisquer que sejam elas. Ele continua: “Usamos parceiros quando faz sentido, em vez de tentar reinventar coisas já inventadas.” Se a “reinvenção” não for para acrescentar um valor ao produto, fazer um mesmo produto de uma forma que atenda melhor o consumidor (uma “inovação incremental”, como chamam os que defendem a “inovação” e seu conceito) uma “melhoria no produto” desejada pelo consumidor, mas somente pelo orgulho de uma tecnologia proprietária, é preferível fazer parcerias. Ou seja, se a questão é ter uma empresa rica e líder de mercado como a Dell, é preciso economizar os gastos da vaidade. A finalidade de toda empresa é lucratividade, através de quaisquer meios lícitos. “A Sony investe 1 bilhão de dólares e consegue de volta apenas 200 milhões em lucro. A Sony está inventando demais. Ela investe em coisas que podem ser empolgantes, mas que não são valorizadas pelo cliente. Com isso, não consegue gerar bons retornos. O verdadeiro teste da inovação é se o cliente está disposto a pagar por ela” A inovação não precisa ser tangível. No caso da Dell, a maior inovação foi o modelo de negócios. Invenção é criação, inovação é aceitação.