Pensamento do Dia
Economistas analisam a Economia, o Brasil
e o mundo,
05 06 2009
mundo, na mídia diária
---------------------------------------------------------------------------------------------- Estado
de S.Paulo 04 06 2009
''Não vejo por que mudar a política''
Henrique Meirelles: presidente do Banco Central; Meirelles descarta a
sugestão para a adoção de uma política que ora se voltaria para o controle da
inflação, ora para o câmbio
Beatriz Abreu, BRASÍLIA
A uma semana da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o presidente
do Banco Central, Henrique Meirelles, faz uma defesa enfática da política executada
pela instituição, tanto em relação ao sistema de metas de inflação como a opção
pelo câmbio flutuante. Essa política, segundo Meirelles, garante o equilíbrio da
economia brasileira e está permitindo ao Brasil atravessar e sair da crise financeira
mundial em condições mais favoráveis que outros países. "Não vejo, portanto, por
que mudar uma política que está dando certo", disse Meirelles em entrevista à
Agência Estado.
Na entrevista - as respostas foram enviadas por e-mail -, Meirelles aborda a
sugestão para a adoção de uma "política cambiante", ou seja, ora mirando o
controle da inflação, ora a taxa de câmbio. Ele descarta essa opção. Para o
presidente do Banco Central, esse tipo de regime "envolveria maior incerteza" e
"mais risco", o que resultaria na tendência de taxas de juros de mercado mais
elevadas. A seguir, principais trechos da entrevista.
O sr. tem afirmado que os capitais que ingressam no País não estão
direcionados às operações de arbitragem. Quais são os instrumentos
disponíveis para que o banco tenha garantia de que, de fato, esses capitais
estão direcionados a investimentos estrangeiros diretos ou ações, por
exemplo?
O Banco Central monitora diariamente o fluxo de capitais e tem total controle sobre
as informações disponíveis. A sociedade também pode acompanhar esses dados,
pois o BC os divulga periodicamente, com toda a transparência. O forte ingresso de
capitais está motivando uma discussão na sociedade a propósito da relação entre a
taxa de juros e a taxa de câmbio.
O sr. considera que a redução mais forte da taxa Selic pode inibir a
desvalorização do dólar?
A política monetária tem apenas um instrumento, a taxa de juros de curto prazo, e,
portanto, pode ter apenas um objetivo a cada momento. Pode, por exemplo, buscar
o equilíbrio interno ou pode visar o equilíbrio externo. O sistema de metas de
inflação visa a assegurar o equilíbrio macroeconômico doméstico através da política
monetária, enquanto o equilíbrio externo é obtido por meio da flutuação da taxa de
câmbio.
Não existem alternativas?
A alternativa seria usar a política monetária para atingir o equilíbrio externo, com
uma taxa de câmbio arbitrariamente definida pelo governo.Vários países usaram
esse sistema, concedendo soberania monetária ao país emissor da moeda âncora.
Isso recorrentemente causou desequilíbrios no balanço de pagamentos. Uma
segunda alternativa seria fixar uma taxa de câmbio móvel que assegurasse a
rentabilidade de alguns setores exportadores, deixando em segundo plano o
equilíbrio macroeconômico doméstico, em detrimento do bem-estar da maioria da
população.
Em recente pronunciamento, o senhor disse que alguns parecem defender
um sistema cambiante. O que significa isso?
Alguns parecem propor um tipo de sistema cambiante, onde a política monetária
ora visaria o equilíbrio doméstico ora o externo, de forma discricionária e pouco
transparente. Como tal regime envolveria maior incerteza, pois não se saberia
exatamente qual é o mandato da autoridade monetária, e mais risco, as taxas de
juros de mercado tenderiam a ser mais elevadas.Vale notar, também, que a busca
do equilíbrio externo por vezes se choca frontalmente com as necessidades da
economia doméstica; imaginemos, por exemplo, quanto teria subido a Selic em
dezembro se tentássemos estabilizar o câmbio via taxa de juros e quais teriam sido
as consequências para a economia brasileira. Não vejo, portanto, por que mudar
uma política que está dando certo.
O sistema de metas tem atingido os seus objetivos? A valorização do
câmbio não pode significar que está fracassando?
O sistema de metas para a inflação com câmbio flutuante assegurou, ao mesmo
tempo, a estabilização da economia brasileira com uma taxa média de crescimento
do PIB de quase 5% nos últimos 5 anos (o que deve ser comparado com um
crescimento médio de cerca de 2% nas últimas duas décadas até 2003), inflação na
trajetória de metas e juros reais cadentes. Ao mesmo tempo equilibrou o setor
externo, pois gerou saldos no balanço de pagamentos que permitiram a
acumulação de mais de US$ 200 bilhões de reservas. Um sucesso inquestionável de
equilíbrio interno e externo.
Quais são os fatores que mais influenciam a taxa de câmbio?
O real tem mostrado uma alta correlação com o preço das commodities e com os
índices de aversão ao risco. Quando o preço das commodities sobe, o real se
valoriza e vice-versa. Essa correlação já chegou a ser muito alta, de 0,98. A
correlação com os índices de aversão ao risco é um pouco mais baixa, mas ainda
assim significativa. Além do mais, devemos levar em conta a própria flutuação do
dólar frente às principais moedas, o que é uma questão norte americana.
Qual o efeito do fluxo positivo de entrada de capitais?
Ele permite ao Banco Central prosseguir sua política de acumulação de reservas
que tantos benefícios tem prestado ao País. Uma análise cuidadosa dos dados
divulgados pelo BC é esclarecedora a esse respeito. É importante observar também
que uma parte significativa desse fluxo de capitais é constituída por investimentos
estrangeiros diretos, vale dizer, são investimentos em máquinas e equipamentos
que vão elevar a capacidade produtiva do Brasil. Outra parte dos recursos destinase à Bolsa de Valores, que é uma fonte importante de capitalização para as
empresas brasileiras.
O Brasil está sendo apontado como um dos países que se sairá melhor da
crise financeira. Quais são os fatores que sustentam essa avaliação? Não
se trata de um otimismo exagerado, sem lastro na realidade?
Esta avaliação é lastreada no fato de que o Brasil é um dos poucos países que estão
fortalecendo seus fundamentos macroeconômicos durante a crise, enquanto a
maioria dos países sairá da crise mais vulnerável, como resultado das medidas
adotadas para superar os problemas. Os fatos são: o Brasil sairá da crise com
reservas internacionais maiores do que quando entrou, uma relação dívida pública
líquida em comparação com o PIB menor, uma situação monetária equilibrada, um
sistema financeiro saudável e competitivo e com as empresas brasileiras com
acesso ao mercado de capitais para financiar o seu crescimento. Apesar dos riscos
do excesso de euforia, não há dúvida que estamos em posição mais confortável do
que diversos outros países para o pós-crise.
-------------------------------------------O Estado de S.Paulo 05 06 2009
Emergentes dão sinais de esperança no
fim da crise
Vikas Bajaj* e Keith Bradsher*, THE NEW YORK TIMES
Se os investidores em Nova York e Londres observam os primeiros sinais frágeis de
recuperação, seus contrapartes em países em desenvolvimento estão presenciando
um período de grande entusiasmo.
Depois de uma queda esmagadora nos últimos 18 meses, os mercados de ações
nos países em desenvolvimento experimentam uma fase de otimismo na
recuperação da economia global.
Embora os mercados emergentes permaneçam bem abaixo das altas enormes de
um ano atrás, os investidores já estão novamente considerando que suas chances
de crescimento são melhores do que nos Estados Unidos e na Europa.
Como resultado, o índice Nifty da Índia saltou 64% nos últimos três meses. O
índice CSI de 300 ações, em Xangai e Shenzen, subiu 37% e a Bovespa aumentou
41% em relação ao mesmo período. Em comparação, o ganho de 28% do índice de
500 ações da S&P parece modesto.
Analistas atribuem alguns ganhos recentes no índice S&P à crença dos investidores
de que a economia chinesa está se restabelecendo. E não é só a China que está
provocando otimismo. A produção industrial se recupera na China, assim como as
vendas de autos na Índia e as vendas no varejo no Brasil.
Pode ser uma exuberância irracional? As atuais valorizações são extremamente
ricas. O preço das ações do índice Nifty indiano é 15 vezes maior que os ganhos.
Na Bovespa, a relação é de 21 vezes, e no CSI 300, de 29 vezes.
A opinião otimista é que essas relações entre preço e ganhos refletem o retorno de
um apetite pelo risco nos mercados, que costuma acompanhar uma perspectiva
mais positiva, e a crença de que esses países estão prontos para retomar um forte
crescimento econômico.
A perspectiva mais cética é de que as economias teriam um salto para taxas de
crescimento de dois dígitos para justificar as valorizações, e isso só pode significar
que uma bolha estaria se formando.
Os mercados emergentes geralmente oscilam de modo mais descontrolado do que
os dos países desenvolvidos. E os grandes emergentes, do grupo dos Brics - Brasil,
Rússia, Índia e China -, enfrentam fragilidades que podem dificultar uma
recuperação.
Para o Reserve Bank da Índia a economia deve crescer 6% neste ano fiscal, uma
queda em relação aos 6,7% do ano passado. Otimistas dizem que o crescimento
econômico na Índia pode chegar a 7,5%, enquanto a previsão do Banco Mundial é
de 4%.
Na China, a produção industrial mostra recuperação, e as importações de
commodities aumentaram. Mas a recuperação está concentrada em setores
domésticos que se beneficiam do programa de estímulo do governo. As exportações
ainda enfrentam dificuldades.
Um aumento nos empréstimos bancários provocou uma retomada dos mercados
imobiliário e automotivo. O governo também deu subsídios de US$ 1,02 bilhão para
moradores da área rural comprarem eletrodomésticos e carros, o que contribuiu
para uma alta de 14% nas vendas de carros nos primeiros quatro meses do ano,
ante o mesmo período de 2008.
*Correspondentes em Mumbai e Hong Kong
----------------------------Folha de S.Paulo 05 06 2009
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Uma mudança na agenda da economia
Não posso imaginar a reação dos
mercados no dia em que os títulos do
Tesouro dos EUA perderem a
condição de "AAA"
AO LONGO dos últimos 60 dias, alguns dos fantasmas que assustavam os mercados
voltaram ao nível da fantasia. Os porta-vozes mais expressivos do caos econômico
perdem espaço na mídia à medida que a racionalidade volta a prevalecer. Com isso,
monstros imaginários passam a ser substituídos por dúvidas e questões reais.
A agenda econômica claramente mudou nas últimas semanas. Afastado o cenário
de um colapso no estilo da Grande Depressão, o esforço analítico dos economistas
volta-se para a forma da recuperação do crescimento, que ocorrerá a partir de
2010. O ano de 2009 já está perdido na maioria das economias do mundo, e por
isso o calendário se inicia no próximo ano.
Estou convencido de que a economia mundial vai estar dividida em dois grandes
grupos de países. Fazem parte do primeiro os que terão que passar por um ajuste
estrutural de grandes proporções, que condicionará a dinâmica da economia por
período longo. O Estados Unidos são seu integrante mais importante, tanto pela
dimensão de sua economia como pela dificuldade das mudanças que enfrentará.
Mas, de modo geral, quase todo o mundo desenvolvido encontra-se em situação
similar.
Outro grupo é formado por economias que sofreram menos com o colapso
financeiro iniciado em Wall Street e com o desarme da bolha de consumo gerada
pela especulação imobiliária. Não será um grupo homogêneo, pois o principal
elemento que os une é o fato de não terem sido afetados pela bolha imobiliária e de
crédito. Por exemplo, China, Coreia e outros países da Ásia, na medida em que
parcela importante de seu crescimento estava associada ao boom de consumo nos
Estados Unidos, vão viver um processo de ajuste diverso do que vai acontecer no
Brasil e na Índia. Mesmo com dinâmica heterogênea, esse será o polo mais
dinâmico na segunda década do século, gerando um aumento da participação dos
emergentes no PIB mundial.
A intensidade da recuperação econômica mundial estará associada de maneira
importante ao que vai acontecer nos EUA, que sairão desta crise com cicatrizes
profundas. Algumas são superficiais e de cura mais fácil, embora choquem à
primeira vista. O melhor exemplo é a General Motors estatal, uma espécie de
Automóvel Brás, para usar uma imagem cabocla. Já outras cicatrizes menos
superficiais exigirão cuidados médicos mais sofisticados. Como exemplo, eu citaria
a tremenda expansão do balanço do Fed, transformado em agente financeiro do
Tesouro para evitar o colapso dos grandes bancos americanos.
Mas a cicatriz mais profunda e que maior perigo representa para a recuperação e
estabilidade da econômica mundial é o endividamento do governo americano. O
órgão responsável pelo Orçamento admite que a relação dívida/PIB pode chegar a
82% em 2019. Nessas condições, o total de juros a serem pagos chegaria a US$
800 bilhões, ante US$ 170 bilhões em 2009. Esses números certamente afetariam
a credibilidade dos títulos do Tesouro, obrigando o governo a trabalhar com a
restrição do chamado superávit primário para estabilizar seu endividamento.
Nós, brasileiros, sabemos bem o que é isso, mas na maior economia do mundo será
uma novidade. Não por outra razão, nesta última quarta-feira o presidente do Fed
fez uma dura advertência ao governo Obama e ao Congresso para que reduzam o
déficit fiscal nos próximos anos. Não posso imaginar a reação dos mercados no dia
em que os títulos do Tesouro norte-americano perderem sua condição de "triplo A".
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da
Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando
Henrique Cardoso).
-----------------------------------Valor Econômico 05 06 2009
O cisne negro e seus patinhos
Marcio Garcia
A crise atual é um exemplo do que Nassim Taleb chamou de cisne negro, um
evento raríssimo, inesperado e com desdobramentos surpreendentes. Este cisne
negro tem gerado muitos patinhos feios. Mas, ao contrário da história de Andersen,
esses não estão fadados a se tornarem garbosos cisnes (na história original, o cisne
era branco, mas Andersen bem poderia tê-lo feito negro, assim antecipando-se, em
muito, a Taleb). Em matéria de política econômica, tanto no exterior quanto no
Brasil, parece haver vários desses patinhos feios: bancos estatais, déficits públicos
vultosos, multinacionais estatizadas, baixo nível de crédito, economia fechada e
outros. Muito do que antes era defeito passou a ser vendido como virtude devido à
crise financeira internacional. E não são só os empedernidos defensores do Estado
obeso que falam isso. Até um insuspeito e muito bem sucedido administrador de
fundos, em recente apresentação, teceu loas à nossa, geralmente enxovalhada,
herança lusitana, por pretensamente promover o congraçamento entre patrões e
empregados, o que constituiria vantagem competitiva de nossa economia.
Avaliar as lições da crise para a política econômica é tarefa para muitas décadas.
Demonstração clara que o processo de aprendizado funciona é que, desta vez, pelo
menos, não se cometeram muitos dos erros cometidos durante a crise de 1929. Os
erros que engendraram e agravaram a crise atual foram, em geral, novos. Para não
os repetir, é preciso separar o joio do trigo, evitando críticas generalistas, e
elaborar propostas específicas e concretas.
A principal lição a ser retirada é que a regulação e a supervisão do sistema
financeiro internacional falharam grotescamente, a despeito de todos os avanços na
mensuração e gerência de risco. Mostrou-se claramente equivocada a presunção de
que a boa saúde de cada instituição financeira em separado (embora nem isso
tenha ocorrido) garantiria a higidez do sistema como um todo. Quando a maioria
dos bancos faz operações financeiras semelhantes e o crédito torna-se fácil e
barato, os preços dos ativos financeiros elevam-se substancialmente,
aparentemente convalidando as operações financeiras que foram os motores iniciais
do processo. Mas a percepção de segurança é ilusória, pois se baseia em preços
que não resistem a um choque mais forte (o cisne negro) que, via de regra, acaba
ocorrendo.
Diversas propostas de alteração da regulação financeira estão sendo debatidas.
Certamente, a regulação e supervisão financeiras no futuro serão mais rígidas e
presentes, bem como terão ênfase macroeconômica muito mais forte. A regulação
e supervisão financeiras deverão ter característica "macroprudencial". Ou seja, de
acordo com Claudio Borio (www.voxeu.org, 14/4/2009), deverão focar o sistema
financeiro como um todo, com o objetivo de limitar os custos macroeconômicos dos
episódios de crises financeiras, e tratar o risco agregado como endógeno, isto é,
dependente do comportamento coletivo das instituições financeiras. A implantação
de tal mudança no foco da regulação e supervisão financeiras não é simples e
levanta uma série de questões práticas a resolver. Não obstante, é daí que podem
sair as medidas de política econômica mais importantes para que o setor financeiro
possa voltar a realizar sua função fundamental de intermediar recursos a baixo
custo para alavancar o desenvolvimento econômico.
Quanto a várias das outras medidas anticrise, o mais provável é que boa parte
desses patinhos feios usados no combate à crise não se tornem garbosos cisnes,
mas, sim, voltem à condição original. Com a regulação e supervisão financeira
reformadas, bancos privados deverão voltar a constituir base mais sólida para o
desenvolvimento econômico do que estruturas baseadas em bancos estatais. O
mesmo deverá ocorrer com empresas não financeiras, muitas hoje de fato
estatizadas, como a GM.
No Brasil, por mais que seja importante combater a crise, é preciso cautela para
não voltar a dar ao Estado empresário papéis que não pode desempenhar com
eficiência. Os males do Estado empresário são bem conhecidos por nós. A eficiência
das empresas públicas sempre foi, com honrosas exceções, bastante inferior à das
empresas privadas. Os problemas de incentivo em empresas públicas são notórios
e de difícil resolução. Ademais, há o grave problema das influências políticas
indevidas, que nem a nossa jovem democracia, nem outras mais vetustas, ainda
conseguiram resolver. Assim, é melhor não tornar permanente o que pode nos
custar muito em termos de diminuição de crescimento no futuro.
É importante ressaltar que a avaliação de medidas de política econômica não pode
ser feita levando em conta apenas se diminuem os efeitos nocivos da crise. É
preciso levar em consideração todo o ciclo econômico. Por exemplo, o enorme
aumento de gastos públicos correntes de caráter permanente que vem tendo lugar
é positivo para mitigar o efeito da crise hoje, mas, quando a crise passar,
constituirá pesado fardo que reduzirá as taxas de crescimento econômico. O
mesmo se aplica à reduzida penetração do crédito em nossa economia, ou à grande
participação de bancos estatais. Em suma, não se pode pensar em vencer o
campeonato de Fórmula 1 com um carro que corre pouco em pista seca mas anda
na frente dos outros quando chove a cântaros. É claro que medidas tomadas
durante a crise podem ser revertidas ao final da mesma. E é exatamente isso que
se quer preservar, não tomando medidas permanentes quando o objetivo é
combater a crise. Afinal, quando se colocam pneus para chuva, há que se ter pneus
lisos para serem usados caso a pista seque. Generosos aumentos de salários a
algumas carreiras do funcionalismo com alto poder de pressão são pneus de chuva
que serão mantidos até o final do campeonato, faça sol ou chuva.
As perspectivas econômicas do Brasil são, hoje, muito boas. Quão bem irá nossa
economia dependerá, é certo, da economia internacional. Mas, em qualquer caso,
estamos relativamente muito bem posicionados. Seria excelente para nossos filhos
e netos se conseguíssemos maximizar nosso crescimento nos anos futuros,
evitando retornar a práticas que já se mostraram equivocadas no passado, e dando
sequência ao aprimoramento de nossa economia que vem ocorrendo, sobretudo
desde o Plano Real.
Márcio G. P. Garcia, PhD por Stanford e professor do Departamento de
Economia da PUC-Rio, escreve mensalmente às sextas-feiras
(www.econ.puc-rio.br/mgarcia )
------------------------------------Valor Econômico 05 06 2009
Via de regra, vê-se o gasto público apenas do lado do passivo, não do ativo
A dívida pública e as gerações futuras
José Carlos de Assis
Tomando emprestado o dinheiro parado nas empresas, por meio de títulos
públicos, o Estado pode investi-los
O imperativo da sobrevivência está impondo a todas as economias importantes do
mundo a realização de grandes déficits públicos para salvar seus sistemas
financeiros e estimular a demanda. É tempo, pois, de revisitar as teses acadêmicas
segundo as quais o déficit, que leva a um aumento da dívida pública, deve ser
evitado a todo o custo para não sobrecarregar as gerações futuras com as
crescentes obrigações por conta de juros e de amortizações, e o risco de aumento
de tributos.
Houve tempo, dos anos 70 para cá, em que economistas neoclássicos, depois
chamados neoliberais, como os americanos Robert Lucas e Robert Barro,
encantavam políticos conservadores de todo o mundo com suas teses de que o
déficit público, mesmo em recessão, era fonte de desequilíbrios permanentes na
economia e não funcionavam como estímulo à recuperação. Era melhor esperar e
deixar que as livres forças do mercado promovessem o relançamento, que seria
inevitável.
Vivíamos num mundo inocente, no qual ocorriam recessões periódicas e crises
financeiras periódicas, mas nunca as duas juntas. Ou seja, pensava-se que
estávamos vacinados contra crises globais do tipo da Grande Depressão. Vemos
agora que não é bem assim. Uma crise de demanda sem a ocorrência simultânea
de uma crise financeira pode ser revertida com adequadas políticas monetárias,
mediante uma redução consistente da taxa de juros básica. Uma crise financeira
podia ser revertida em sua própria órbita, sem comprometimento fiscal. As duas
juntas não aconteciam desde os anos 30. O que é melhor fazer quando acontecem?
A melhor maneira de compreender isso é pela lente de um notável economista
americano do século passado, Abba Lerner, autor da teoria das Finanças
Funcionais. Lerner, embora keynesiano, abandonou a trilha das especulações de
Keynes para explicar flutuações cíclicas na base de expectativas subjetivas dos
empresários e seguiu o caminho da identificação de interações objetivas entre o
setor privado e o setor público, tanto na esfera monetária e financeira quanto na
esfera real, no sentido sobretudo de apontar o caminho da recuperação nas crises.
Uma crise de demanda, objetivamente, supõe elevados estoques e reduzida
propensão a investir do empresariado. O investimento cai, mas não a
disponibilidade de recursos por parte de muitas empresas. Elas tendem a
entesourá-los sob alguma forma, em lugar de aplicar produtivamente. Em
consequência, o desemprego aumenta, realimentando a queda da demanda. O
sistema não tem como recuperar-se a partir de sua própria órbita, pois, para
investir, é necessário haver um aumento esperado da demanda. E para a demanda
aumentar, é preciso haver investimento.
Como ninguém é capaz de levantar-se do chão puxando-se pelo próprio cabelo, é
preciso que haja a intervenção de uma força externa ao setor privado para
empurrar uma economia em crise de demanda. Essa força é o Estado. Tomando
emprestado o dinheiro parado nos caixas das empresas superavitárias, mediante o
lançamento de títulos públicos, o Estado pode investi-los na compra de serviços
públicos e de grandes obras públicas, criando empregos e estimulando a demanda,
e, finalmente, incentivando o próprio investimento privado, fomentando um círculo
virtuoso de emprego, demanda e investimento.
É de notar-se que, de um ponto de vista funcional, não basta um aumento do
investimento público. É preciso que seja um investimento deficitário. Um
investimento financiado por tributos estará retirando recursos do setor privado na
mesma proporção em que os está injetando, sem efeito na demanda global.
Portanto, o déficit público não é um "mal" tolerável, mas um recurso funcional
necessário.
A consequência óbvia é o aumento da dívida pública. Em que medida isso
representa uma carga insuportável para as gerações futuras? Em nada. A
verdadeira carga insuportável recai sobre a geração presente na ausência do
déficit, sob a forma de alta intolerável do desemprego e da queda da demanda.
Além disso, vê-se o gasto público apenas do lado do passivo, não do ativo: obras
de infraestrutura e serviços de educação e de saúde constituem uma base de
produtividade e de bem-estar social para as gerações futuras, ao mesmo tempo em
que aliviam os ônus da crise no presente.
Do ponto de vista financeiro, o déficit também se paga, desde que haja efetiva
recuperação. Com o aumento do produto e da renda, a receita tributária se eleva
sem aumento de carga, sendo que, do lado monetário, a expansão da economia
requer expansão também de sua base, liberando receita de senhoriagem para o
setor público. Tudo isso faz com que, em poucos anos de recuperação, o déficit se
reduza ou seja eliminando, possibilitando gradual redução da dívida pública em
relação ao PIB, numa atmosfera de crescimento auto-sustentável e sem ônus
social.
Seria o caso de se pensar que todo déficit público deve ser encarado como bom
para a economia? Claro que não. É preciso que ao déficit corresponda um gasto que
eleve gradualmente a produtividade e a base de bem estar da sociedade. Além
disso, ninguém de bom senso iria aprovar aumentos de dívida pública do tipo que
aconteceu no governo Fernando Henrique, quando ela dobrou de cerca de 30% do
PIB para quase 60%, sem qualquer investimento relevante em contrapartida. Esse
foi um aumento criminoso da dívida, puxado exclusivamente por aumento de juros,
além de paralelo a um dos mais amplos programas de privatização do planeta.
E o que dirão as agências de risco sobre um eventual aumento da dívida pública
brasileira como consequência de um vigoroso programa de estímulo à demanda
para enfrentar a crise? Bem, as agências ficarão muito ocupadas com a União
Europeia, que está estourando todos os parâmetros do Tratado de Maastricht e do
Pacto de Estabilidade e Crescimento que criou o euro (máximo de 3% do PIB do
déficit e de 60% da dívida), com o Japão, cuja dívida vai para 205% do PIB, com a
Inglaterra, com déficit de quase 10%, e com os próprios Estados Unidos (12,3% do
PIB). Sem falar, obviamente, nos riscos que elas não viram no Lehman Brothers,
no Bank of América e no Citi!
José Carlos de Assis é economista e professor, presidente do Instituto
Desemprego Zero.
---------------------------------Valor Econômico 05 06 2009
A ameaça nuclear não representa o perigo mais imediato, mas sim o
combate real
As consequências do extremismo coreano
Sung-chul Yang
A opinião pública em todo o mundo necessita de um esfriamento,
especialmente na Coreia do Sul e no Japão
Mais uma vez, a península coreana está experimentando um dos seus periódicos
acessos de extremismo, desta vez marcados pelo suicídio, em maio, do expresidente da Coreia do Sul, Roh Moo-hyun, e pelo segundo teste de um artefato
nuclear da Coreia do Norte. O suicídio de Roh é um desastre para a sua família e
uma vergonha nacional, ao passo que a explosão nuclear do líder da Coreia do
Norte Kim Jong-il é algo que se assemelha a um ataque de raiva, mas que poderá
trazer graves consequências para as duas Coreias e o mundo.
A bomba norte-coreana, estimada em quatro quilotons, nem chega perto da
magnitude das bombas atômicas de 15 a 21 quilotons que a América lançou sobre
o Japão há 64 anos. Na verdade, esta tentativa arrogante de Kim Jong-il relembra o
sapo-boi mãe nas fábulas de Esopo, que se inchava para imitar um boi.
A beligerância desafiadora do mundo da Coreia do Norte não é uma rematada
loucura. É, pelo contrário, um subproduto dos seus próprios temores graves sobre o
colapso do regime.
Na condição de coreano, sempre fico intrigado pelo extremismo coreano. Em que
lugar do mundo é possível encontrar uma mutação dinástica militarizada de sistema
totalitário comunista mais isolada e organizada do que na Coreia do Norte? Em que
lugar na face da terra podemos ver um pedinte disparador de mísseis, munido de
armas nucleares, como Kim Jong-il? Existe algum outro país onde apenas um pai e
seu filho governaram como semideuses nos 61 anos passados?
Igualmente, em que outro lugar exceto na Coreia do Sul podemos encontrar uma
igreja cristã cujo quadro de membros registrados esteja aumentando para além de
800 mil e na qual quase 100 mil seguidores frequentam cada uma das três
cerimônias religiosas de domingo todas as semanas? Em que outro lugar podemos
assistir um ex-presidente cometendo suicídio, pulando de um penhasco próximo à
sua residência? Isso tudo, num país que tinha uma renda per capita estimada de
US$ 40 na década de 1940, mas que agora se tornou a 12ª ou 13ª maior economia
do mundo.
Cornelius Osgood, um antropólogo americano, atribuiu o extremismo coreano ao
clima da península. Ele observou que o temperamento coreano é um produto de
longos e implacáveis invernos siberianos e de verões quentes e úmidos, com
apenas curtas primaveras e outonos.
Eu acredito, contudo, que o extremismo coreano origina-se a partir da geografia e
história do país. Cercados por vizinhos hostis, como os chineses, mongóis e
manchus no Norte e pelos japoneses no outro lado do oceano, os coreanos lutaram
com unhas e dentes por milhares de anos para conservar sua identidade étnica,
linguística, cultural e política.
Deixando o jogo de culpas de lado, o que pode ser feito com a Coreia do Norte?
Infelizmente, colocar o gênio nuclear de volta na garrafa é quase impossível. A
eficácia das opções disponíveis é limitada, e todas estão repletas de consequências
políticas e militares imprevisíveis.
O "estrangulamento econômico" da Coreia do Norte parece ser a opção de última
instância. O fortalecimento e endurecimento da Resolução 1718 do Conselho de
Segurança (CS) das Nações Unidas (ONU), elaborado na esteira do primeiro teste
nuclear realizado pela Coreia do Norte, em outubro de 2006, deveria ser a tarefa
imediata. O CS já está empenhado em elaborar uma nova resolução. Para tornar a
nova resolução eficaz, porém, a plena e resoluta participação da China - que ainda
não ocorreu - é crítica. Qualquer medida unilateral de países isolados adotada
contra a Coreia do Norte deve ser executada no âmbito da estrutura mais ampla da
nova resolução.
Além disso, mesmo se novas sanções forem impostas, a porta para as
Conversações entre as Seis Partes devem ser deixadas abertas para Kim Jong-il.
Nesta situação cara-a-cara, as cinco demais partes nas negociações - China, Japão,
Rússia, Estados Unidos e Coreia do Sul - não devem ceder primeiro à Coreia do
Norte. No momento, a opinião pública em todo o mundo, especialmente na Coreia
do Sul e no Japão, está altamente volátil. Um período de esfriamento é necessário.
A busca de um diálogo com a Coreia do Norte imediatamente depois da sua
explosão de raiva com mísseis e da sua atitude nuclear temerária é imprudente e
carece de espírito prático.
Após a imposição de sanções duras e eficazes lideradas pela ONU, as partes
interessadas deverão esperar até a Coreia do Norte sentir a dor do aperto
econômico. Considerando, porém, que a Coreia do Norte é um dos países mais
pobres e menos globalizados do mundo, a eficácia das sanções será limitada.
Ao mesmo tempo, a ameaça nuclear não representa o perigo mais imediato. A
maior ameaça hoje é o combate real, já que, no dia que se seguiu ao teste nuclear
da Coreia do Norte, a Coreia do Sul anunciou a sua participação integral na
Iniciativa de Segurança contra a Proliferação (PSI), que procura interceptar navios
que possam estar envolvidos no transporte de tecnologia nuclear por meios ilegais.
A Coreia do Norte criticou duramente esta decisão da Coreia do Sul, definindo-a
como uma "declaração de guerra". Portanto, muito cuidado e serenidade serão
necessários nos mares ao redor da Coreia nos próximos dias e semanas.
A tensão crescente na península coreana vem abalando rapidamente os raios de
esperança pela reunião que se seguiram a dez anos de progresso sob os governos
Kim Dae-Jung e Roh Moo-hyun. Tanto o presidente sul-coreano Lee Myung-bak, por
meio das suas bruscas mudanças de rota, como Kim Jong-il, com sua renovada
chantagem nuclear, parecem determinados a ver as relações se deteriorarem.
Os dois lideres atuais na Coreia não podem repetir o erro dos seus antecessores na
última parte do Século XIX. Blindados por lutas fraticidas internas pelo poder, eles
não conseguiram enxergar as artimanhas estratégicas das grandes potências na
região. Essa incapacidade conduziu diretamente à colonização da Coreia pelo Japão.
O agravamento das relações entre as Coreias certamente tornará os dois lados
menos seguros e estáveis, política econômica e militarmente. Presos nesse ciclo
vicioso, a Coreia do Norte e a Coreia do Sul se tornarão muito mais vulneráveis às
manobras estratégicas das potências vizinhas. Como resultado, a crescente
hostilidade entre as Coreias poderá tornar-se, no fim das contas, muito mais letal
ao bem-estar de todos os coreanos do que o trágico suicídio de Roh Moo-hyun e os
fúteis fogos de artifício de Kim Jong-il.
Sung-chul Yang foi embaixador da República da Coreia nos Estados Unidos
e atualmente é professor na Universidade Coreia em Seul; é também o
autor de "The North and South Korean Political System: A Comparative
Analysis" (Os sistemas políticos norte-coreanos e sul-coreanos: uma
análise comparativa) © Project Syndicate/Europe´s World, 2009.
www.project-syndicate.org
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OUTRAS NOTÍCIAS
Correio Braziliense - 05/06/2009
Poupança volta a ser melhor negócio –
O bom rendimento da caderneta de poupança, principalmente se comparado ao dos
Fundos de Investimento que pagam imposto e cobram taxa de administração, foi
responsável pela volta da captação positiva em maio. Segundo o Banco Central, a
poupança obteve R$ 1,881 bilhão, resultado de depósitos de R$ 78,839 bilhões e
saques de R$ 76,959 bilhões. A captação líquida é diferença entre depósitos e
saques.
Com a captação positiva de maio, a segunda do ano, a poupança reverteu as
perdas acumuladas em 2009. No período de cinco meses, a caderneta está positiva
em R$ 356 milhões. Até abril, a poupança acumulava captação líquida negativa de
R$ 1,523 bilhão. O saldo de maio, que equivale a todos os depósitos feitos pelos
poupadores mais os rendimentos aplicados sobre as contas, superou R$ 278,56
bilhões.
Para o economista Demétrius Borel Lucindo, da Top Trade Investimentos,
contribuiu para diminuir os saques na poupança uma decisão do governo. “As
medidas para taxar a poupança a partir de 2010 foram adequadas, sem
terrorismo”, avaliou. O governo anunciou que as cadernetas com saldo acima de R$
50 mil vão passar a pagar Imposto de Renda no caso de a taxa Selic ficar muito
baixa. Caso o governo tivesse tomado uma medida imediatista, o resultado poderia
ser muito diferente, na opinião do economista. Para valer, a proposta ainda tem
que ser aprovada pelo Congresso Nacional.
Apetite
Também contribuiu para a captação da caderneta ficar positiva o fim dos gastos
adicionais de início de ano. Como a maioria dos poupadores têm poucos recursos
guardados, eles servem muitas vezes para complementar a renda, que é deslocada
para despesas como pagamento de matrícula e material escolar e impostos, típicos
do começo do ano. “Certamente, teve saques para pagamento de dívidas e outros
compromissos”, disse o economista Otávio Vaz, da Global Equity.
Os dois economistas garantem que o apetite dos investidores pelas aplicações,
principalmente as que envolvem risco, como as ações na Bolsa, está voltando. “O
dinheiro está fluindo mais e migrando de uma aplicação para outra, sempre em
busca de rentabilidade”, disse Demétrius. Para ele, está sendo restaurada, aos
poucos, a credibilidade do sistema financeiro. No ano passado, com a crise, muitos
investidores perderam dinheiro e fugiram. Agora, com os juros baixíssimos pelo
mundo afora, também os estrangeiros estão vendo no Brasil uma oportunidade de
negócios.
De acordo com os dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento
(Anbid), a captação em fundos de investimento foi negativa no mês de maio em R$
412 milhões. No último dia útil do mês, incide o sistema come-cotas , que é quando
as administradoras cobram as taxas dos seus investidores. Foram R$ 2,7 bilhões.
No ano, a captação em fundos está positiva em R$ 30,6 bilhões, com o saldo
acumulado superior a R$ 1,24 trilhão.
----------------------------------Valor Econômico - 05/06/2009
Limite para a queda dos juros opõe
Fazenda e BC
O Conselho Monetário Nacional (CMN) deverá, na reunião do dia 25, manter a meta
de inflação em 4,5% para 2011. Será o sétimo ano consecutivo com a mesma
meta. Não há no governo, pelo menos até agora, disposição para ousar numa
gradual redução da inflação, a despeito da avaliação de vários economistas oficiais
de que a crise mundial, ao jogar o crescimento da economia brasileira para um
patamar bem abaixo do seu potencial, criou uma oportunidade de ouro para a taxa
de inflação doméstica se aproximar da dos países ricos, sem que isso imponha
custos adicionais à política monetária.
Inflação menor, para esses economistas, significa juros mais baixos e maior
crescimento - desde, é claro, que a meta de inflação seja plenamente crível - o que
é uma visão distinta dos que enxergam na meta mais frouxa uma possibilidade de
juros módicos e aumento do PIB. Os analistas econômicos privados apontam
inflação de 4,33% em 2009 e de 4,30% para 2010, abaixo, portanto, da meta de
4,5% definida para esse par de anos. As expectativas só não estão em percentuais
mais baixos pela insistência do próprio governo em optar por metas mais flexíveis
para ancorá-las, acreditam técnicos oficiais mais alinhados com o Banco Central.
Na verdade, desta vez o assunto meta de inflação não está sequer sendo objeto de
acalentadas discussões entre BC e Fazenda. A falta de apetite para tratar do tema e
a ausência de ambição do governo nessa área têm estreita relação com a política
monetária de 2010 - são grandes as possibilidades de se ter que aumentar os juros
em meados do ano que vem - e suas consequências no debate político-eleitoral às
vésperas da escolha do sucessor de Lula. Não se deve subtrair do elenco de
explicações para o silêncio, também, o fosso que separa o Ministério da Fazenda do
BC e as aspirações políticas do presidente Henrique Meirelles.
Embora alguns técnicos da Fazenda até considerem viável uma diminuição pequena
da meta, eles assinalam que tratar da inflação de 2011 não é prioridade agora. O
que interessa, a essa altura, é buscar o crescimento econômico e é bom notar,
nesse aspecto, que esses economistas estão achando a recuperação da atividade
economica muito lenta para quem ainda almeja crescer 1% este ano, conforme
declaração recente do ministro Guido Mantega. "Meta de inflação não é uma
questão decisiva neste momento. Não é isso que vai levar o país para frente ou
para trás ", disse um influente assessor do ministério.
Ao contrário de 2007, quando advogou a redução da meta de inflação de 2009 para
algo abaixo de 4,5%, desta vez Meirelles também não está demonstrando muita
disposição para entrar na disputa.
Por trás dessa aparente apatia está uma questão bastante delicada: para que
patamar deve ir a taxa Selic de agora em diante e quais as perspectivas para 2010?
Visto pela fotografia de hoje, em meados do próximo ano a economia deverá estar
novamente em ritmo de crescimento acelerado, a taxa de câmbio tende a se
depreciar como costuma ocorrer no Brasil em períodos pré-eleitorais (mas nada
parecido com 2002) e os preços das commodities estarão em alta. Uma confluência
de eventos que indicam pressões inflacionárias daqui a um ano e juros, portanto,
mais elevados que os atuais. Adicionar a isso uma meta mais restrita para 2011
pode ser um equívoco, alegam assessores mais afinados com Mantega.
Tal argumento poderia ser confrontado por outro: subir e baixar juros conforme os
ciclos econômicos é coisa da vida. Pode-se muito bem reduzir os juros de forma
mais acentuada agora e, em meados de 2010, se necessário, vir a aumentá-los,
mas a partir de um patamar menor.
A visão de fontes encarregadas de municiar o Copom de informações para que o
comitê decida sobre o tamanho do corte da Selic é, entretanto, bem diferente. A
gordura que havia para cortar a taxa de juros já está acabando, dizem. "Agora, a
política monetária tem que ser regida pela sintonia fina", explica um assessor.
"Estamos chegando a uma fase em que a gestão da política monetária deixará de
ser só cortar a Selic. É preciso olhar a curva de juros. Uma decisão mal tomada na
Selic hoje fará empinar a curva de juros, aumentando a taxa de um ano e
comprometendo todo o o estímulo monetário dado para o país voltar a crescer",
explicou outro economista do governo, que compartilha da visão do BC.
Para essa vertente, mais importante do que cortar a Selic em 100 pontos-base na
reunião do Copom de abril foi ter introduzido na ata daquela reunião uma
referência aos juros futuros, com o seguinte texto: "O Comitê entende também que
a melhora do cenário prospectivo para a inflação em 2009 e em 2010 não foi, até o
momento, incorporada na estrutura a termo da taxa de juros". Tal comentário teria
sido decisivo para o mercado reduzir em 50 pontos-base os juros de um ano. Essa
modesta redução foi lida pela autoridade monetária como um claro recado do
mercado de que a gordura para grandes baixas dos juros básicos estaria acabando.
Razão que justificaria a disposição do BC de , agora, ir mais devagar no processo
de redução dos juros.
A sintonia fina se justifica, segundo essa ala de economistas, porque o juro real,
hoje na casa de 5% ao ano, já está aquém do que seria uma taxa de juros neutra
(nível de juros que faz com que a trajetória de crescimento do produto coincida
com o crescimento potencial, ou seja, uma taxa que não exerce influência sobre a
oferta e a demanda da economia). Essa taxa se justifica agora pela deterioração
das condições financeiras pós-crise global, mas não parece sustentável quando
essas voltarem à normalidade, avaliam essas fontes.
Para a Fazenda, que quer uma ajuda dos juros para frear a apreciação cambial,
essa é uma conversa de quem não está lá muito afeito ao diálogo. E se esse já não
era fácil antes, hoje o espaço para um debate sobre meta de inflação, política
monetária e cambial é minúsculo, principalmente entre as equipes.
Essa não é uma situação nova. As diferenças de visão macroeconômica entre
Fazenda e BC vêm de 2006. O que há de novo, desta vez, é que nunca se teve juro
real tão baixo num regime de estabilidade da inflação. E há economistas
qualificados, no governo e fora dele, dizendo que os juros podem cair mais e a
meta de inflação pode sair do lugar e iniciar uma trajetória de queda gradual a
partir de 2011. Trata-se de uma oportunidade que deveria ser avaliada com mais
empenho, à margem das vaidades e das questões político-eleitorais.
------------------------------------O Estado de S.Paulo - 05/06/2009
Minc ataca ruralistas, que o acusam de
'circo' eleitoral –
Depois de duas semanas de ataques a cinco colegas de governo, de críticas a
ruralistas e ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o ministro do Meio
Ambiente, Carlos Minc, avaliou na tarde de ontem que continuará no cargo. "Estou
firme, firmíssimo; tremei, poluidores", afirmou ele, após audiência com o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB).
Horas antes, ele havia dito que sentia todo dia "o pescocinho na mira". "Querem
tirar uma picanha do Carlinhos", ironizou o ministro.
O triunfo anunciado pelo ministro veio na sequência de um processo de
enquadramento político, em que Lula não permitiu, por exemplo, recuo no
licenciamento da BR-319 - rodovia que corta um pedaço da Amazônia. Antes da
conversa com o presidente e de um ato com artistas da TV Globo, o ministro
participou de dois eventos em que manteve críticas aos ruralistas e à presidente da
Confederação Nacional da Agricultura e da Pecuária (CNA), senadora Kátia Abreu
(DEM-TO).
"Aqui, no Parlamento, pediram meu pescoço, mas, pelo que me consta, ele ainda
está no meu lugar e, provavelmente, vai ficar até o fim do governo Lula", afirmou
Minc, em audiência na Câmara, na Comissão do Meio Ambiente. "Não vamos deixar
essa turminha destruir nossos biomas", acrescentou, referindo-se aos ruralistas.
"Podem ameaçar, mas não vão transformar nossos biomas em latifúndios, em
monocultura."
O ministro disse que não se recusa a negociar com Kátia, usando o seguinte
argumento: "Fiz acordo com (os ruralistas) da soja, da cana e com o governador
Blairo Maggi. Por que não posso fazer com a senadora Kátia Abreu, que é muito
mais bonita, muito mais simpática e muito mais articulada?"
O ministro causou mal-estar no governo ao chamar, na semana passada, os
ruralistas de "vigaristas" e dizer que estava impedido "moralmente" de dar licença
ambiental para as obras da BR-319, previstas no PAC.
Minc relatou ontem que, em conversa na terça-feira, o presidente apenas pediu que
as "contradições" fossem discutidas no âmbito interno do governo. "Eu concordei
com ele. O presidente disse que é mais adequado que algumas contradições,
aquelas que não têm consenso, sejam arbitradas por ele."
O relato de Minc sobre a conversa com o presidente foi feito em um novo ato com
críticas a ministros que já tinham sofrido ataques na semana passada.
Para desconforto de Reinhold Stephanes (Agricultura), Dilma Rousseff (Casa Civil),
Edison Lobão (Minas e Energia) e Alfredo Nascimento (Transportes), Minc contou
com o apoio de rostos famosos. Os atores Christiane Torloni e Victor Fasano
entregaram a Lula um manifesto que teria 1 milhão de assinaturas contra a
destruição da Amazônia.
Após a audiência com o presidente, os atores deram uma longa entrevista para
defender a permanência do ministro. "A democracia não vai aguentar mais um
golpe", afirmou Christiane. "Não vai ser bom para o Brasil perder um segundo
ministro do Meio Ambiente", disse, referindo-se à demissão de Marina Silva, no ano
passado.
A atriz elevou o tom nas críticas e chegou a fazer referências ao escândalo do
assessor petista que foi preso com dólares na cueca em 2005. "Esta casa está
sendo observada", disse. Ela aproveitou para criticar setores do Congresso que se
opõem a Minc: "Temos de saber quem é a favor da preservação da Amazônia e
quem é a favor de colocar o dinheiro na cueca."
-------------------------------------O Estado de S.Paulo - 05/06/2009
Recuperações crescem 193%
O número de pedidos de recuperação judicial quase triplicou nos primeiros cinco
meses do ano, ante o mesmo período do ano passado, aponta o Indicador de
Falências e Recuperações divulgado ontem pela empresa de informações
econômicas Serasa Experian. De janeiro a maio, chegaram à Justiça 334
requerimentos de recuperação, com alta de 193% em relação aos primeiros cinco
meses do ano passado, quando houve 114 casos.
O grande salto na quantidade de pedidos protocolados revela, segundo os
economistas da Serasa, que a recessão mundial teve fortes efeitos sobre a
economia brasileira. Eles destacam que a melhora no consumo, a redução dos juros
e a maior entrada de capital externo observadas neste primeiro semestre ainda não
deram fôlego para as empresas enfrentarem seus problemas financeiros.
Apenas no mês de maio, de acordo com o levantamento da Serasa, houve 255
pedidos de falências, ante 185 em abril. Em maio de 2008, haviam sido registrados
213 pedidos.
O indicador da Serasa também levantou o número de recuperações judiciais
deferidas, ou seja, requerimentos ainda em processo de análise pela Justiça. Nos
primeiros cinco meses do ano, houve 214 deferimentos, ante 70 no mesmo período
do ano passado - um aumento de 205,7%. Quanto às recuperações judiciais
concedidas, de janeiro a maio foram registradas 36. No mesmo período do ano
passado, foram apenas 6.
Já as falências requeridas, de janeiro a maio, somaram 945, abaixo das 975
registradas nos cinco primeiros meses de 2008. As falências decretadas, por sua
vez, somaram 334 de janeiro a maio deste ano, enquanto no mesmo período de
2008 foram 408.
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