Pensamento do Dia Economistas analisam a Economia, o Brasil e o mundo, mundo, na mídia diária 26 05 2011 2011 ------------------------------------------------------------------Valor Econômico - 26/05/2011 OCDE alerta para risco de a China desaquecer Desaceleração da China pode ser mais forte, alerta OCDE Autor(es): Assis Moreira | De Paris A China, principal parceira comercial do Brasil, pode ter desaceleração econômica mais forte do que se esperava. Foi o que disse ao Valor o economista-chefe da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Pier Carlo Padoan, com o alerta de que essa possibilidade é um dos principais riscos para a economia mundial. Por sua alta dependência da China, o Brasil corre maior risco. A OCDE observa que, no primeiro trimestre, o PIB chinês voltou à taxa de crescimento de 8,7%, seu nível mais baixo desde 2008. A demanda interna diminuiu, mas a inflação continuou alta - mais de 5% ao ano nos últimos meses. Padoan exclui, porém, o risco de aterrissagem forçada da economia chinesa, que tem sido fator de especulação nos mercados. Ele disse que a crise global não foi superada, elogiou as medidas macroprudenciais do Brasil, mas sugeriu que o Banco Central continue a elevar os juros. A China, principal parceiro comercial do Brasil, pode ter uma desaceleração econômica mais forte do se que esperava, e essa possibilidade é um dos principais riscos para a economia mundial, alerta o economista-chefe da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Pier Carlo Padoan.A entidade nota que no primeiro trimestre a economia chinesa voltou à taxa de 8,7%, seu mais baixo nível desde 2008. A demanda interna diminuiu, mas a inflação continuou sua alta, de mais de 5% nos últimos meses. Mas Padoan exclui o risco de aterrissagem forçada da economia chinesa, que tem sido um fator de especulação nos mercados. Em entrevista ao Valor, ele diz que a crise global não foi superada, o desemprego continua gigantesco no mundo desenvolvido e vê risco de estagflação em alguns países. As projeções da entidade mostram no geral uma recuperação nada espetacular, mas que começa a ser impulsionada pelo setor privado. Em algumas economias emergentes, a OCDE aponta sintomas típicos de superaquecimento, com aumento sem precedentes de preços do setor imobiliário, credito ao consumo e lucros dos bancos. Sobre o Brasil, Padoan acha que medidas macroprudenciais ajudam pouco a combater a inflação e sugere por isso que o Banco Central continue aumentando os juros. A seguir, trechos da entrevista: Valor: Qual a avaliação sobre o estado da economia mundial? Pier Carlo Padoan: A retomada existe, mas em ritmos diferentes por países e regiões O desemprego continua pesando, são mais de 50 milhões de pessoas desempregadas nos países da OCDE. O motor da retomada é o setor privado, já que a demanda pública vai diminuir pois vamos entrar num período de consolidação fiscal. Mas os riscos de deterioração de nossas previsões crescem. Um deles é a China, que talvez vá desacelerar mais forte do que se espera porque há muita inflação. Valor: Qual o risco de aterrissagem forçada na China? Padoan: Aterrissagem forçada é resultado de ligações perigosas entre o setor financeiro e a economia real. Mas na China não há ainda essa relação tão forte, a ponto de o sistema financeiro enfraquecer para causar mais crise. Mas, como a China vai evoluir e se transformar, será necessário para a economia mundial ver um bom sistema financeiro na China. Valor: Até que ponto irá a desaceleração na China? Padoan: É o que vamos ver. Quanto ao impacto disso, o aumento da demanda na China é fator muito importante para explicar a dinâmica dos preços de matérias-primas e de energia e evidentemente importante para as exportações do Brasil e outros emergentes. É pela importância estratégica da China que listamos entre os riscos negativos a possibilidade de desaceleração da China, o país é importante do ponto de vista estratégico das relações internacionais, não é um país como os outros. Valor: ? Como a OCDE vê o Brasil nesse cenário? Padoan: Consideramos que o crescimento brasileiro é forte, mas o país está num momento delicado com a inflação alta. É preciso evitar que a expectativa de inflação seja permanentemente mais elevada. As pressões são fortes, como o aumento da liquidez via fluxos de capitais, que contribui a pressionar os preços. É preciso evitar que essa pressão talvez temporária se traduza em pressão inflacionária duradoura. É preciso continuar aumentando as taxas de juros. O Brasil adotou diferentes instrumentos, como controle de capital e macroprudenciais. Nossa visão na OCDE é que isso é bom, mas do ponto de vista da inflação as medidas macroprudenciais têm eficácia limitada. Para colocar as expectativas da inflação num percurso sustentável, é preciso ter política monetária apertada e constante. Também é importante aumentar a poupança pública e reduzir a rigidez do orçamento. O Brasil apoia o investimento na infraestrutura, é muito bom. Mas é preciso completar isso. Valor: Quais outros riscos? O diretor Angel Gurria fala que podemos estar na antessala da próxima recessão. Padoan: A crise não foi superada. A possibilidade de mais aumento do preço do petróleo e das commodities pode alimentar a inflação subjacente. Há um novo acesso de fragilidade dos mercados imobiliários em países da OCDE, como nos EUA. Outro risco muito importante é a vulnerabilidade da união monetária europeia, apesar de esforços de ajustamento em vários países. Existe a possibilidade de os riscos terem uma combinação muito negativa, e aí temos a ameaça de estagflação em alguns países. Analisamos episódios de estagflação no passado, e no caso presente não apenas o crescimento é débil como temos os preços altos de commodities e de energia. Precisamos estar vigilantes. A crise não passou. Valor: A Europa inquieta todo mundo, a começar pelo estado de falência da Grécia. Padoan: Estive na Grécia há duas semanas numa missão de monitoramento, falamos com todos os ministros. O governo se esforça. Mas há um problema do ponto de vista do mercado e da população: ver o resultado das políticas estruturais. Isso precisa de tempo para dar resultado. Só que os mercados não dão esse tempo e a população mostra fadiga com reformas. Daí a lógica simples de um apoio oficial do FMI e da UE para a Grécia. Achamos que medidas adicionais podem dar tempo para que os resultados de reforma estrutural, ajuste fiscal, sejam visíveis. A Grécia precisa de mais tempo do que pensávamos, talvez um ano a mais. Mas o que se esquece é que a demanda na Europa vai ser maior do que se esperava, e ajuda no ajuste. Além disso, e dissemos isso às autoridades gregas, o ajuste vai ser exigido da população inteira. É preciso combater a desigualdade econômica, sobretudo neste momento, senão o consenso politico e social aos programas de ajuste não funciona. E, para completar, a Grécia precisava das reformas, mesmo se não houvesse o problema da dívida soberana. Sua situação era insustentável. A idade da aposentadoria dos gregos é 55 anos, e é preciso elevá-la a um nível normal. Valor: Restruturação suave da dívida grega é suficiente? Padoan: Devemos considerar no futuro ampliar a responsabilidade da EFSF (European Financial Stability Facility) e depois o Mecanismo de Estabilização Europeu, dispor de mais recursos e que se tenha autorização para entrar no mercado para fazer "swaps" da dívida soberana de países da zona do euro, a exemplo do que ocorreu em alguns países em desenvolvimento nos anos 80. Era uma crise similar à de hoje. Valor: Seria "Brady bonds" para os países europeus. Padoan: Talvez seja útil, sim. O primeiro elemento é diminuir a tensão na situação atual. E, segundo, alongar o prazo de maturidade dos títulos públicos. Isso permite uma eficácia mais forte das políticas nacionais. Valor: Os detentores de títulos públicos europeus perderiam quanto, qual o desconto no valor dos papéis nesse caso? Padoan: Há várias fórmulas de "reprofile" da dívida soberana. O essencial é que outra instituição, como garantia pública, entre no mercado com horizonte temporal mais longo, e com lógica diferente daquela do mercado. No fim do dia, a dívida da Grécia será de mais longo prazo. O EFRS é um mecanismo provisório que foi estabelecido durante a crise irlandesa, com total de pacotes de socorro de € 750 bilhões (€ 250 bilhões vindos do FMI). Depois da crise de 2008-2009, os países membros do FMI multiplicaram por cinco os recursos financeiros da entidade, quando constataram que havia um problema de estabilidade sistêmica na economia mundial. É a mesma coisa agora na Europa. A Europa decidiu ter algo semelhante ao FMI, dando financiamento em troca de ajustamento econômico. Parece com a América Latina do passado? Sim. O mundo mudou. Valor: Os emergentes vão pagar mais pelos créditos internacionais, por causa dessa crise europeia? Padoan: Há um problema mais geral. Haverá um período longo de grande nível da dívida pública nos países desenvolvidos. E haverá grande pressão nos mercados financeiros por financiamento. Também haverá mais demanda dos emergentes por mais financiamento privado, porque vão investir muito. Tudo isso vai aumentar o custo dos recursos. E isso se manterá por muito tempo. Por isso que dizemos que os países desenvolvidos precisam, primeiro, evitar que a dívida aumente e depois começar a reduzi-la. Na OCDE, o nível médio da dívida pública é mais de 100%. É 30% a mais que antes da crise, é enorme. O impacto negativo sobre o crescimento é enorme, pois quando a dívida é forte, o crescimento econômico é mais fraco. E ainda mais quando se leva em conta o efeito do envelhecimento demográfico nas próximas décadas. ----------------------------------O Estado de S. Paulo - 26/05/2011 A indústria faz a diferença José Serra Vira e mexe, defrontamo-nos com a tese de que "o Brasil está se desindustrializando" ou corre grandes riscos nesse sentido. É bom esclarecer que o termo "desindustrialização" não significa declínio absoluto da produção do setor. Nem mesmo os casos notórios de perda de vitalidade industrial, como os Estados Unidos nos últimos 25 anos, acusam queda absoluta do produto manufatureiro. Em geral, desindustrialização tem que ver com a perda do poder da indústria de transformação para comandar o crescimento da economia. A queda da fatia da indústria no produto é tradicional nas economias ricas. A partir de um certo estágio do desenvolvimento, a indústria vai mesmo cedendo participação ao setor de serviços. É diferente, porém, quando o recuo relativo da indústria manufatureira ocorre antes de a economia alcançar esse estágio. Nesse caso, seu menor dinamismo não é compensado pela expansão do setor de serviços, ainda influenciado por atividades de menor qualidade. Isso define, como ocorre no Brasil, uma desindustrialização prematura. Note-se que nas economias em desenvolvimento mais dinâmicas (Índia, China e outras asiáticas), onde o PIB cresce rapidamente, o setor industrial tem estado sempre à frente. Já no grupo de países em desenvolvimento de menor crescimento, que o Brasil integra, a indústria vai ficando para trás. Diferentemente do que aconteceu entre 1930 e1980, houve queda da participação do setor no PIB de 13 pontos porcentuais entre 1985 e 2008 (dados da CNI). Desde 2004 até 2010, a fatia da indústria de transformação no produto caiu de 19,4% para 15,8%. No mesmo período, a taxa de crescimento industrial atingiu metade do ritmo do PIB. Para compreender como isso começou é preciso levar em conta os estragos da superinflação que assolou a economia brasileira durante 15 anos, desde 1980, além dos efeitos a curto prazo da estabilização alcançada pelo Plano Real, em 1994, e solidificada nos anos seguintes, inclusive pela sobrevalorização do real, até 1998. Desde a década passada a conjuntura externa mudou de sinal, tornando-se muito favorável ao comércio e às finanças do País. Mas isso não foi devidamente aproveitado como alavanca de desenvolvimento. Ao contrário, foram sendo criadas, ou consolidadas, condições negativas para a indústria: a maior taxa de juros reais do mundo, taxa de câmbio megavalorizada, a maior carga tributária entre os países engessamento fiscal e acachapante taxa de investimento governamental. emergentes, Essa taxa reduzida explica o colapso da infraestrutura que deveria dar suporte à atividade produtiva em expansão. Além disso, o capital privado não é atraído a investir nessa área por causa da incapacidade da esfera federal para promover parcerias e da taxa de juros sideral. Trocando em miúdos: eleva-se fortemente o custo Brasil. Com respeito à taxa de câmbio, isto é, à relação de troca entre o real e moedas estrangeiras, nunca antes neste país se atingiu um nível de apreciação tão escandaloso, não obstante ser considerado pelo atual governo como o último bombom da caixa de terapias anti-inflacionárias. O fato é que a política econômica lulista deixou avançar demais, de forma desnecessária, a apreciação do real. Agora, paga-se o preço. Às questões anteriores adiciona-se o problema da tributação, que não favorece a agregação de valor e pune os investimentos e a exportação. A indústria brasileira acabou se tornando, assim, refém de uma tesoura. De um lado, a lâmina da concorrência internacional, deteriorando a capacidade competitiva de nossas exportações de manufaturados. Do outro, a lâmina da concorrência dos importados, cada vez mais baratos. Como a China mantém seu câmbio fortemente desvalorizado e o Brasil faz o contrário, os produtos chineses podem apresentar preços internacionais em torno de 50% menores que os nossos. Um dos principais efeitos da tesoura é o crescente déficit comercial de manufaturados: em 2005 o saldo comercial era positivo, de U$ 31 bilhões; em 2010 o déficit foi de U$ 35 bilhões! A cada vez que importamos, por exemplo, uma válvula industrial, antes produzida no Brasil, estamos destruindo a capacidade empresarial e exportando bons empregos para o Sudeste Asiático. Aliás, a ocupação no segmento que produz essas válvulas caiu de 13 mil para 7 mil pessoas entre 2008 e 2011. No segmento de ferramentas de primeira linha, as importações triplicaram em três anos, com o desemprego de 17 mil pessoas. Porque somos ineficientes? Não. É o câmbio, estúpido! A insensatez é tamanha que o Brasil, hoje, exporta celulose para a China e começa a importar papel de lá. Plantas de indústria do alumínio estão indo para o exterior processar a matéria-prima daqui extraída. A combinação do câmbio com a tributação está tornando inviável a indústria brasileira de metais. Nossa renda per capita é quatro ou cinco vezes menor que a dos países ricos, temos índices imensos de pobreza e uma grande massa de pessoas desempregadas ou subempregadas. Enfrentar esse desafio implicaria dobrar a renda média dos brasileiros em 15 anos, com um crescimento superior a 5% ao ano. Tal resultado depende de uma indústria dinâmica. Do contrário, não haverá aumento suficiente de bons empregos. Desperdiçaremos capacidade empresarial e dispensaremos os efeitos multiplicadores e aceleradores que o setor exerce sobre os outros segmentos da economia. A indústria é a via principal de penetração e difusão do progresso técnico na economia. É um setor em que a produtividade depende do seu próprio crescimento, num círculo virtuoso. Intuitivamente, o Brasil percebeu essas coisas durante uns 50 anos do século passado. Agora precisamos reaprendê-las, num mundo mais desafiador, num país bem mais complexo. Mas vale a pena: a indústria pode fazer, sim, a diferença. ----------------------------------Valor Econômico - 26/05/2011 Choques nos termos de troca e a demanda agregada Tony Volpon Qual o verdadeiro peso dos fatores externos para explicar o comportamento da economia brasileira? Olhando para o período pós-crise, por exemplo, se convencionou explicar a forte recuperação como fruto das políticas anticíclicas executadas pelo governo. Outra avaliação comum é atribuir a demanda interna como verdadeiro motor da economia. Enquanto todos entendem que fatores externos têm sido importantes, o fato de que a corrente de comércio se encontre abaixo de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) parece ser prova de que é no mercado interno que encontramos os fatores dinâmicos da nossa economia.Essa visão da economia brasileira, defendida com igual ênfase tanto pelos ortodoxos como desenvolvimentistas, está errada. Apesar dos acalorados debates entre essas correntes, ambas mantêm igual crença no mito de que a força da economia brasileira surge do mercado interno. Tanto o discurso ortodoxo, que vê nos excessos fiscais e monetários a causa principal dos problemas inflacionários, como o discurso desenvolvimentista, que vê nesses mesmos fatores a razão pelo alto crescimento, erram em não entender que são os fatores externos que explicam o que temos de bom (maior demanda e crescimento) e de ruim (maior inflação e câmbio apreciado) na economia brasileira. A melhor métrica do impacto de fatores externos sobre a economia hoje é a tendência dos termos de troca, e como esses afetam tanto a demanda como a oferta agregada por uma variedade de canais. A alta dos preços de commodities foi desde 2003 importante para melhorar a posição externa do país. Apesar de alguma melhora nos termos de troca desde 2003, foi somente em 2007 que os preços das exportações começaram a subir de maneira mais consistente que os preços das nossas importações, movimento que acelerou depois da crise. De fato, a diferença entre os preços das exportações e os preços das importações se encontra hoje mais de 25 vezes maior que a média dessa diferença desde 2000. Tal movimento representa um fortíssimo incremento de riqueza para o Brasil que se irradia pela economia. O maior preço das nossas exportações eleva tanto a renda atual das empresas como o preço das ações. O índice Bovespa, por exemplo, subiu mais de 350% desde 2006 em dólar americano. Essa grande alta na riqueza nacional gera vários efeitos. Do lado do consumo, sabemos que este sobe com o aumento da percepção de riqueza, ou "renda permanente". Do lado dos investimentos, temos na alta dos preços das exportações o principal fator que levou os níveis do investimento estrangeiro direto (IED) subir de US$ 18 bilhões em 2006 para US$ 48,4 bilhões em 2010; e os fluxos de carteiras de US$ 9 bilhões para US$ 63 bilhões no mesmo período. Tal fluxo, para uma economia com baixa taxa de poupança (média de 17,3% do PIB desde 2006) tem sido vital para sustentar crescentes níveis de importações sem pressionar o balanço de pagamentos: o "quantum", ou quantidade, importada desde 2006 subiu 94% enquanto o quantum de exportações aumentou somente 4,4%, o que ajudou a diminuir o efeito inflacionário da expansão da demanda agregada durante esse período. Importação de bens de capital é hoje a maior categoria dessa pauta, representando 22,6% do total. A queda relativa dos preços desses bens em relação às commodities tem permitido um maior incremento da capacidade instalada neste período de forte crescimento. Tudo isso explica a economia consegue crescer nos níveis atuais sem romper a restrição externa (financiamento do déficit em conta corrente) ou interna (aumento descontrolado da inflação). Há outros efeitos que não devem ser menosprezados. A melhora da nossa posição externa nesses anos, representada, por exemplo, pela alta das reservas do Banco Central de US$ 54 bilhões em 2006 para US$ 330 bilhões hoje, permite a queda de volatilidade na economia que gera forte redução nos prêmios de risco, permitindo a expansão do mercado de crédito. E, finalmente, o governo na sua função fiscal é um sócio privilegiado de todo esse processo, com suas receitas subindo de R$ 555 bilhões em 2006 para R$ 853 bilhões em 2010, permitindo um proporcional aumento dos seus gastos. Enquanto o efeito do aumento dos termos de troca tem reconhecido papel na valorização do real, seu lugar na determinação da demanda e, portanto, no nível de juros merece igual atenção. Em recente estudo mostramos como se pode, com resultados estatísticos similares, substituir o hiato do produto em uma função de Taylor com o "hiato dos termos de troca" para explicar o nível da Selic desde 2006. De fato mostramos como um aumento de 1% no "hiato" da relação de trocas leva a Selic a subir 0,17%. Esse resultado mostra como o choque externo tem sido o fator determinante para a economia. Essa demonstração tem, em nossa opinião, varias consequências para a política econômica. Primeiro, se a mudança nos termos de troca é a causa exógena do aumento da demanda agregada, o subsequente aumento no nível de juros e câmbio são necessários ajustes de equilíbrio. Qualquer tentativa de impedir esses ajustes via, por exemplo, intervenções no mercado de câmbio, terá efeito temporário e resultado infrutífero, causando inevitável efeito compensatório no equilíbrio geral via aumento da inflação. De fato, a única forma de impedir uma maior pressão sobre o câmbio e a taxa de juros seria diminuir a pressão sobre a demanda por outros meios, como um menor nível de gastos fiscais e exuberância do crédito. A preocupante perda de competitividade do setor de manufaturados deve ser compensada via medidas microeconômicas, como a maior tributação do excedente de renda dos setores de commodities. Também temos que estar cientes que todos os mecanismos descritos acima que nos levaram à atual abundância podem se reverter. Somente se optarmos por não consumir, mas poupar e investir que vamos poder realmente criar as condições para que haja no mercado interno uma duradoura fonte de desenvolvimento econômico. Tony Volpon é diretor do Nomura Securities International, Inc. ----------------------------------Valor Econômico - 26/05/2011 Déjà vu de novo? Angel Gurría Gostaríamos de pensar que já passamos a pior fase da maior crise dos últimos 70 anos. Ainda assim, os derivativos, um dos culpados centrais do desmoronamento financeiro, continuam a representar dez vezes o Produto Interno Bruto (PIB) mundial, e a conta não para de aumentar. Uma importante aquisição de US$ 8,5 bilhões levou analistas a especular sobre uma nova bolha na internet. Algumas economias emergentes mostram sinais clássicos de sobreaquecimento com os preços imobiliários, crédito ao consumidor e lucros bancários em níveis recorde. Poderíamos merecer perdão, se nos perguntássemos se aprendemos algo nos últimos anos. Mereceríamos menos perdão se, inconscientemente, estivéssemos preparando o terreno para a próxima queda, sem ninguém soar o alarme. Se as instituições internacionais fizerem seu trabalho e cumprirem seu objetivo, temos uma boa chance de evitar os erros do passado. A crise trouxe o papel de instituições como a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a um foco mais definido. Como nunca antes, estamos coordenando esforços com o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Organização Mundial do Comércio (OMC) e Organização Internacional do Trabalho (OIT). Há muito mais a fazer, no entanto. O G-20, governos, atores da sociedade civil e cidadãos de todo o mundo agora têm mais expectativas em relação a nós. Desde a fundação da OCDE, há 50 anos, a instituição oferece um fórum único, em que líderes e autoridades se reúnem para discutir quais políticas funcionam e quais não. Temos um histórico sólido de libertar as pessoas das ruínas sociais e econômicas, começando o Plano Marshall, na sequência da Segunda Guerra Mundial. Auxiliar governos e países a entender a interdependência de suas economias e sociedades abriu o caminho para uma nova era de cooperação. Ao enfrentar a recente crise, mostramos alguns resultados concretos: acabamos com paraísos fiscais mundiais, para que contribuintes e arrecadadores estejam seguros de que todos estamos contribuindo para limpar a bagunça. Os padrões da OCDE para combater o suborno internacional possuem abrangência global, com a Rússia estando prestes a tornar-se o 40º país a assinar sua adesão. O suborno tira dinheiro das mãos das pessoas e comida de suas bocas, além de corroer o desenvolvimento. Em uma tentativa para dar nova força à necessidade de uma governança corporativa sólida, remodelamos de forma substancial nossas Diretrizes para Empresas Multinacionais. Continuamos a defender a exclusão de investimentos arriscados, como os derivativos, das operações dos bancos comuns. E fazemos esforços reais para combater a falta de proteção e educação financeira dos cidadãos, que a crise revelou de forma tão flagrante. Lideramos os esforços do G-20 para colocar em vigor uma proteção apropriada ao consumidor, de forma que as pessoas nunca sejam colocadas em posição de assinar um documento de hipotecas que não compreendam. Em regiões como o Oriente Médio, podemos levar nossa experiência para ajudar a reconstruir sociedades e economias, como o fizemos pelo Leste Europeu e Europa Ocidental. E estamos empurrando as fronteiras do conhecimento e compreensão, questionando o pensamento convencional. Depois de sete anos trabalhando para medir melhor progressos sociais, o lançamento do Your Better Life Index (algo como "seu guia para uma vida melhor", em inglês) almeja responder à demanda acumulada de cidadãos de todo o mundo para ir além do Produto Interno Bruto (PIB) como forma de mensurar o bem-estar e progresso. Ao dar às pessoas comuns um instrumento para medir seu bemestar, estamos mudando a cara da forma de se fazer políticas públicas, ajudando-as a nos ajudarem a proporcionar as melhores políticas públicas para melhorar nossas vidas. O sistema pré-crise nos decepcionou. Precisamos recuperar a confiança e cumprir o que as pessoas mais querem - crescimento e emprego. A melhor forma de fazer isso é a partir de fatos, evidências, números, compartilhamento de boas práticas e de uma avaliação honesta daquilo que funciona e do que não. Boas políticas públicas se tratam de boas ideias. Não há monopólio político sobre elas. As políticas não deveriam ser formuladas em cantos concorrentes no cenário político, mas no ponto de conexão entre economia, governo, setor privado e pessoas. Claramente, ainda não saímos da confusão no que se refere à crise. É algo bem humano iludir-se e voltar ao ponto em que começamos, levando adiante os negócios como sempre. Mas é uma tentação à qual nunca poderíamos nos perdoar por cair. Angel Gurría é secretário-geral Desenvolvimento Econômico (OCDE) da Organização para Cooperação e -------------------------------------O Globo - 26/05/11 A Terra se move Miriam Leitão Terça foi um dia devastador. Foi desmoralizante a derrota dos ambientalistas e de todos os que defendem uma modernização das práticas agrícolas no Brasil na votação do Código Florestal na Câmara dos Deputados. Os ruralistas conseguiram tudo o que queriam. Dois defensores da floresta foram assassinados no Pará e, mesmo depois de mortos, vaiados no Congresso. Foi também o dia da morte de um lutador contra o racismo. Era uma delícia conversar com Abdias Nascimento, ouvir suas histórias, e ver que, tendo nascido em 1914, em 2011 ele ainda combatia as lutas que atravessaram sua vida. Sua convicção era que o racismo brasileiro divide a sociedade de uma forma dolorosa para quem vive o preconceito; mas continua invisível e negada por uma parte do país. Abdias foi um agitador cultural e produtor de ideias. Começou a defender teses de ação afirmativa antes que o conceito existisse, nos anos 1940. Nas várias trincheiras em que atuou teatro, cinema, jornalismo, artes plásticas, política - era o mesmo Abdias: o que sustentava que sim o racismo existe entre nós, disfarçado às vezes, explícito outras, e que com todas as suas artimanhas ele apequena o Brasil. As notícias dos acontecimentos no Congresso me lembraram os clubes da lavoura dos tempos do Império. Naquela ordem escravagista, o abolicionismo era tratado como ideia que destruiria a capacidade produtiva do país. Montados como centrais de lobby para a defesa da escravidão, os clubes da lavoura sustentavam que o país se consumiria sem a escravidão. De vez em quando o Brasil segue a ordem de evitar o progresso. Contudo, a Terra se move. Por seis anos os abolicionistas, monarquistas ou republicanos, lutaram, com o apoio do Imperador, até que conseguiram aprovar a Lei do Ventre Livre. Fazendo apenas o cálculo econômico: foi uma insensatez a escolha que o Brasil começou a fazer na noite da terça-feira. O Brasil é grande e competitivo produtor de alimentos. Continuaria a ser, com mais segurança, se tivesse escolhido o caminho da conciliação com o meio ambiente. Mas ele escolheu, até agora, aceitar o desmatamento, anular as multas a grileiros e desmatadores, deixar aos estados decisões sobre áreas de preservação, reduzir a proteção das florestas e remanescentes de matas que ainda temos em outros biomas. Os cientistas alertaram que este caminho é perigoso. A Agência de Águas avisou dos riscos. Ex-ministros que serviram a partidos, governos e regimes diferentes se uniram. Mas o recado da Câmara foi eloquente: venceu o clube de lavoura. Há produtores com visão moderna, mas para eles o silêncio foi conveniente. Apareceram para falar uns poucos, como o bravo Marcos Palmeira, que refaz seu pedaço de Mata Atlântica e supre supermercados do Rio com alimento orgânico enquanto espalha informações sobre novas práticas. Mas os grandes produtores que entendem a necessidade do equilíbrio entre produção e proteção, preferiam soltar a tropa de choque do pior ruralismo. A oposição não se opôs; o partido do governo se partiu. Símbolo de um dia em que o passado engoliu o futuro foi o momento em que os ruralistas, em plenário, e sua claque, nas galerias, vaiaram vítimas de um assassinato. José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo foram mortos em emboscada no Pará. Um detalhe macrabro: os assassinos arrancaram a orelha de José Cláudio. Os dois eram líderes de projetos extrativistas. Lutavam, entre outras causas, para proteger a Castanheira, árvore que por lei não pode ser derrubada. Tinham 20 hectares em Nova Ipixuna com 80% da área preservada. Juntos com outros 500 pequenos produtores extraíam óleos vegetais, cupuaçu e açaí. Estavam ameaçados e foram mortos por denunciar desmatamento para a produção de carvão e formação de pasto. O carvão está na cadeia produtiva da siderurgia, entre outras. Os pastos estão na produção da proteína animal. No mundo inteiro a tendência da hora é limpar a cadeia produtiva. Grandes empresas sabem que perdem mercado e consumidores se não fiscalizarem a sua lista de fornecedores. A hora da verdade chegou. No mundo inteiro há consumidores se perguntando como são feitos os produtos que consomem e que tipo de prática eles legalizam nas suas compras. Foi a pressão de consumidores que levou à moratória da soja. Foi a coalizão entre supermercados, consumidores, Ministério Público e ONGs que levou ao pacto da carne legal; uma ideia ainda não realizada. O maior produtor de carne do Brasil, o JBS-Friboi, me disse que não tem como controlar sua cadeia produtiva. O BNDES, gestor do Fundo Amazônia, é hoje o maior acionista do JBS. Tudo isso vai alimentar as barreiras contra o comércio externo brasileiro. A derrubada de todas as barreiras, camufladas ou não, à ascensão dos negros tornará a economia mais forte. A inclusão da preocupação ambiental na produção agrícola vai aumentar a capacidade do Brasil de competir por mercados mundo afora, dará ao consumidor o conforto de um produto limpo, e protegerá a vocação agrícola do país das mudanças climáticas. Os clubes da lavoura estavam errados no século XIX. Os ruralistas vitoriosos de terça-feira estão errados. Contudo, a Terra se move. ----------------------------------O Estado de S. Paulo - 26/05/2011 Melhor do que o esperado Celso Ming O comportamento das contas externas do Brasil neste ano é bem melhor do que vinha sendo projetado pelo Banco Central. O resultado nas transações correntes do ano até abril, ou seja, as contas que reúnem todos os fluxos de recursos com exceção dos fluxos de capital, está negativo como esperado, mas abaixo do previsto. A balança comercial está registrando faturamento mais alto das exportações em consequência da forte melhora das relações de troca. Ou seja, os preços dos produtos exportados pelo Brasil estão subindo mais do que os preços dos importados. É a situação que reflete o bom desempenho das cotações das commodities agrícolas. É provável que as exportações deste ano ultrapassem os US$ 250 bilhões. (O Banco Central vem trabalhando com projeção de US$ 240 bilhões.) A maior surpresa está na Conta de Capitais e tem a ver com o desempenho dos Investimentos Estrangeiros Diretos (IED). Apenas nos quatro primeiros meses do ano, o Brasil recebeu US$ 23 bilhões, 3,04% do PIB, ou quase 42% do que o Banco Central prevê para o ano inteiro (US$ 55 bilhões). No período de 12 meses terminado em abril, o IED atingiu os US$ 63,7 bilhões (veja o gráfico). A entrada desses capitais durante 2011 tem tudo para ultrapassar esse volume. O mundo rico passa por uma forte crise e isso, por si só, coloca foco de luz no desempenho dos emergentes, entre os quais está o Brasil. Além disso, há enorme volume de recursos zanzando no mercado financeiro global. Essa massa de capitais ainda deve aumentar com as novas emissões do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos). No entanto, boa parte desse aumento do IED neste ano deve estar relacionada com a imposição de um IOF de 6% sobre a entrada de recursos destinados a aplicações em renda fixa. Já que ficou bem mais caro trazer recursos para o Brasil nessa rubrica, os administradores de capitais podem estar usando o IED. Esse dado parece confirmar a baixa eficácia dos dispositivos de controle do afluxo de capitais pelo governo federal. Nada menos do que 62,2% dos investimentos estrangeiros estão indo para o setor de serviços, especialmente para telecomunicações, eletricidade e comércio. Outros 25,5% vão para a indústria e 12,3% para o setor primário (agropecuária e mineração). É mais um dado que confirma o forte crescimento do setor de serviços no Brasil. No mais, ainda não há sinais de deterioração das contas externas em consequência da forte valorização do real, que tantos economistas vêm prognosticando. Por enquanto, o rombo em transações correntes vem sendo financiado com entrada de capitais de longo prazo ou pelo IED, recursos considerados de boa qualidade. De todo modo, déficit em conta corrente equivale a consumo acima do desejado. O Brasil enfrenta crônico raquitismo em seu índice de poupança (não passa de 17% do PIB). Por isso, o consumo aquecido é indicador que aponta para uma das fragilidades da economia. CONFIRA Credor líquido A dívida externa em abril atingiu US$ 242 bilhões. Como as reservas externas estavam em US$ 328 bilhões, o Brasil seguiu como credor líquido do resto do mundo. Mais viagens Nos quatro primeiros meses de 2011, o déficit no item Viagens Internacionais atingiu US$ 4,3 bilhões, ou 76,1% acima do déficit de igual período de 2010. ----------------------------------- Correio Braziliense - 26/05/2011 Pesadelo ambiental Antônio Machado Governo colhe o que plantou ao perder a votação do Código Florestal e a unidade de sua base aliada Se a principal reação oficial à aprovação de modo acachapante do novo Código Florestal pela Câmara Federal se resume ao sentimento de “irritação” da presidente Dilma Rousseff, segundo um porta-voz governista não identificado disse à Reuters, o governo se arrisca a se fragilizar e a colher problemas políticos mais sérios adiante. As mudanças mais reconhecem a realidade da ocupação agrícola nas últimas décadas, boa parte quando o limite legal de desmatamento se estendia a 50% das propriedades rurais, do que anistiam desmatador e franqueiam novas derrubadas nas Áreas de Preservação Permanente (APP) e de Reserva Legal. Ao contrário, o novo Código aprovado na Câmara não reduz o aparato fiscalizador da União e de estados, embora pudesse prever sanções mais drásticas para os crimes ambientais. A instância para os ajustes no projeto, de relatoria do deputado Aldo Rebelo (PC do BSP), segundo o rito processual, é o Senado, onde certamente receberá emendas, voltando à Câmara para referendá-las, ou não. O passo seguinte é a sanção presidencial. Dilma tem o direito constitucional de vetar parte ou totalmente o projeto. Líderes do PT na Câmara têm anunciado que ela exercerá o direito constitucional, se o Senado mantiver pelo menos dois itens que o governo considera inegociáveis: a anistia aos desmatamentos ocorridos até 2008 em APP e Reserva Legal e a transferência para os estados da decisão sobre áreas passíveis de ocupação e plantio. O governo quer legislar sobre tais questões por decreto. Os meios rurais optam pela discussão caso a caso conforme a região. A regra atual limita a exploração nas Reservas Legais — que são espaços em que a mata nativa deve ser preservada —, a 20% da propriedade, se na Amazônia, a 65%, no Cerrado, e 80% nas demais áreas do país. Pelo projeto de Rebelo, ex-ministro do governo Lula e um dos mais destacados líderes da base aliada, avanços sobre tais limites são anistiados para propriedades menores. Os ambientalistas acham que, apesar dessa restrição, há brechas para aumentar o desmatamento. As posições entre os produtores rurais e os ambientalistas já não permitem conciliação. Tempo para discussão não faltou. O assunto é discutido no Congresso desde 1999. Em princípio, o presidente Lula e sua ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, favoreciam a reforma do Código. A dissidência aberta por Marina Silva, ministra do Meio Ambiente na época, culminando com sua saída do PT e filiação ao PV para concorrer à Presidência, mudou as percepções do petismo. Marina confundiu o PT Os ambientalistas foram hábeis ao fazer o contraponto entre Dilma e Marina. Como ministra responsável pelas obras de infraestrutura, Dilma foi acusada de querer o desenvolvimento a qualquer preço, em especial ao defender a construção de hidrelétricas no Rio Madeira e a de Belo Monte, no Tapajós. Marina seria a guardiã da natureza. Dilma acusou o golpe, e confundiu seu complexo arco de alianças. No meio dessa refrega, corria a discussão sobre o Código Florestal — e já adiantada, com convergência de visões entre o PCdoB e as lideranças do agronegócio de exportação e da agricultura familiar. Nacionalismo e as ONGs É interessante acompanhar a trajetória de Rebelo. Ele, assim como o PC do B e parte do PT, adquiriu uma visão nacionalista sobre a atividade agrícola quanto mais viajava pelas regiões de fronteira, inicialmente para verificar as demandas por reservas indígenas, e foi se apercebendo da enorme influência de ONGs (organizações não governamentais) internacionais sobre o movimento ambientalista. A ideia, que há tempos é estudada nas Forças Armadas, em setores da diplomacia e em alguns partidos, é que haveria a motivação nem um pouco humanista ou ecológica nos ataques ao agronegócio, mas a intenção de abater a crescente superioridade agrícola do país. As ameaças para Dilma Para os desmatadores de ofício, de madeireiros a agricultores de todos os portes, a suspeita sobre as ONGs estrangeiras sempre foi um bom álibi para devastar. O relatório de Rabelo se enfraquece ao não prever sanções severas a tais setores, que também deveriam ser repudiados pelos líderes rurais, como a senadora Kátia Abreu (PSD-GO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura. O fato é que a posição rural é majoritária na Câmara, tende a ser no Senado e provavelmente também seja na sociedade. É com isso que Dilma tem de lidar, se não fizer um debate sereno no pouco tempo que lhe resta para evitar outra derrota, usar seu poder de veto e correr o risco de obter o inusual: o veto derrubado no Congresso. Como general do AI-5 Os ventos dessa votação não sopram a favor do governo. E mais por erro dos líderes petistas e da assessoria palaciana de Dilma. Para começar, subestimaram a aliança da base aliada com a oposição para reformar o Código Florestal, assim como supervalorizaram o peso do PT na orientação do voto. O PMDB fez barba e bigode do PT. Depois, a presidente foi mal assistida no embate com os ambientalistas. Na véspera da votação, ela foi aconselhada a receber ex-ministros do Meio Ambiente, incluindo Marina Silva, que saiu como porta-voz do encontro. A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, é que deveria ter falado. Mas gafe foi a do líder no governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP). A Câmara “corre risco quando o governo é derrotado”, disse. General da época do AI-5 dizia coisas assim. ----------------------------------Valor Econômico - 26/05/2011 Dedo no gatilho à espera de novidades Eduardo Campos Pregão morno na quarta-feira, com volumes pouco expressivos principalmente em bolsa e câmbio. Nos juros futuros, boa parte da puxada de alta da terça-feira foi devolvida, indicando que a tomada de posição tem mais base mais técnica do que fundamental. Nas mesas, os operadores falam em marasmo e falta de notícias relevantes. Os assuntos em pauta, apesar de suas nuances, continuam basicamente os mesmos: crise da dívida da Europa, aperto monetário na China reduzindo crescimento, Japão com fraco desempenho em função dos desastres naturais e economia americana saindo de um ritmo de recuperação para crescimento lento, porém contínuo. A percepção é de que os agentes estão em modo de espera (só não sabem bem esperando o quê), antes de comprar/vender dólar e bolsa de forma consistente. O mesmo parece válido para os juros, onde há semanas se consolidou a ideia de ao menos mais duas altas de 0,25 ponto percentual na Selic. No câmbio, apesar da maior volatilidade intradia, faz três semanas que o preço fica entre R$ 1,620 e 1,630, com algumas exceções. É consenso que vender dólares e se acomodar não é mais uma estratégia de ganho certo. Mas também não há gatilho para uma corrida à moeda americana. Pregão morno acaba com dólar a R$ 1,629 alta de 0,30% O próprio posicionamento dos agentes se apresenta como uma barreira à valorização da divisa americana. Temos os estrangeiros com estoque vendido de US$ 17,66 bilhões, sendo US$ 7,46 bilhões em dólar futuro e outros US$ 17,66 bilhões em cupom cambial (DDI - juro em dólar). Esse montante, que chegou a cair a US$ 13,41 bilhões no começo do mês, veio sendo gradualmente elevado. Na outra mão, os bancos têm posição comprada em US$ 12,49 bilhões, composta por US$ 5,17 bilhões em contratos de dólar e mais US$ 12,49 bilhões em cupom cambial. Conforme o fim de mês se aproxima, atenção à movimentação desses agentes para a formação da Ptax (média das cotações ponderada pelo volume) que liquida os contratos. Vale lembrar que junho é o último mês no qual a Ptax será calculada como uma média ponderada. A partir de 1º de julho, a taxa será apurada de outra forma. Serão quatro consultas feitas pelo Banco Central (BC) aos dealers entre 10 horas e 13 horas, com a Ptax resultado da média aritmética. De volta ao câmbio, a BCA, empresa que pesquisa de mercados que atua de forma independente desde 1949, recomendou vender moeda brasileira e o rand sul-africano. Essas são as duas moedas mais valorizadas dentro do universo de mercados emergentes acompanhado. A argumentação da BCA ressalta que o real e o rand têm intima ligação com algumas commodities metálicas e que essas matérias-primas são muito vulneráveis à desaceleração da China, notadamente no segmento de construção. Na visão da empresa, a recente rodada de baixa nas ações do setor de siderurgia é um sinal de alerta para os ativos relacionados aos metais e à China. Ainda de acordo com a empresa, as duas moedas também estão vulneráveis a qualquer revés nos investimentos em portfólio que cresceram com relevância nos últimos dois anos. No fim da quarta-feira, o dólar comercial marcava alta de 0,30%, a R$ 1,629 na venda. Na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), o dólar para junho tinha valorização de 0,24%, a 1,631, antes do ajuste final. No mercado de juros, os contratos longos tiveram ajuste de baixa. Sem dados relevantes sobre atividade e preços no mercado local, a agenda política continuou em pauta, com os agentes avaliando o noticiário envolvendo o ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci. Eduardo Campos é repórter -------------------------------- ECONOMIA E OUTRAS NOTÍCIAS O Globo - 26/05/2011 Combustível já está 18,9% mais barato Nos postos, preço já cai até 18% Fabiana Ribeiro e Ramona Ordoñez Os preços da gasolina e do álcool voltaram a cair nos postos no país e já acumulam quedas de até 18,91% este mês, segundo levantamento feito pelo GLOBO. Mas, no Rio, ainda não vale a pena optar pelo etanol na hora de abastecer: na maioria dos postos, o combustível, que tem rendimento menor, ainda custa mais do que 70% do valor da gasolina. O recuo vem ocorrendo depois que o governo decidiu, há duas semanas, usar a BR Distribuidora para forçar a queda de preços dos combustíveis, além de as usinas terem começado a baixar seus preços com o início da safra da cana-de-açúcar. Mas os valores cobrados nos postos ainda não refletem toda a redução nas usinas, onde o litro do álcool hidratado (combustível) foi cotado na semana passada a R$1,2129 - o que corresponde a uma queda de 55,5% em relação aos R$2,7257 cobrados na semana iniciada em 18 de abril. Já o anidro, adicionado à gasolina, registrou uma queda de 29,85%, custando R$1,0253 o litro nas usinas na semana passada, contra R$1,4616 na semana de 18 de abril. O presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis (Fecombustíveis), que reúne os postos revendedores em todo país, Paulo Miranda, diz que, como o repasse ainda não foi total, o movimento de queda de preços vai continuar nas próximas semanas. Ele afirma que em geral há um período de três semanas para que os movimentos nas usinas cheguem aos consumidores finais. - A queda dos preços nas usinas ainda não foi totalmente repassada para os postos. Mas hoje (ontem) mesmo reclamei com algumas distribuidoras que não estão fazendo o repasse na mesma velocidade - comentou Miranda. Pelo levantamento do GLOBO, o posto Centro Automotivo Taxigás, da bandeira Ipiranga, em São Cristóvão, baixou o preço do álcool para R$2,229, numa redução de 18,91%. No posto Palácio Guanabara, da Esso, em Laranjeiras, o etanol ficou 15,40% mais barato, sendo o litro vendido a R$2,198. E o Pombal, da BR, na Tijuca, baixou nas últimas semanas o combustível de R$2,569 para R$2,199 (-14,4%). - A tendência é de baixar ainda mais o etanol. Ao menos mais R$0,50 - espera Jailton de Araujo, gerente do posto da Ipiranga em São Cristóvão. Combustível mais caro na BR E a gasolina acompanhou, com menos intensidade, os freios nos preços. No BR da Lagoa, o preço da gasolina passou de R$3,149 para R$2,989 - queda de 5,08% no mês. No BR da Tijuca, saiu de R$3,07 para R$2,938 o litro, menos 4,30%. No Ipiranga, do Rio Comprido, foi de R$3,099 para R$2,969 (-4,20%). - Nas próximas semanas, o álcool deve voltar ao patamar de R$1,999. E isso puxa o preço da gasolina para baixo, que deve retornar a R$2,899 - projeta Arilson Garcia, gerente do posto Shell na Lagoa. Dos dez postos pesquisados pelo GLOBO, em apenas um o etanol custava menos do que 70% do preço da gasolina. No Shell, do Centro, o litro do álcool sai por R$1,999, ou seja, 69% dos R$2,899 que seriam pagos pela gasolina. Pesquisa da Agência Nacional do Petróleo (ANP) mostra que, no município do Rio, o preço médio do litro da gasolina ficou em R$2,972 na semana passada, queda de 1,17% em relação aos R$3,007 por litro na semana anterior. Já o álcool era vendido na semana passada pelo preço médio de R$2,404, contra R$2,517 na semana anterior, ou seja, uma redução de 4,48%. No estado do Rio, na semana passada, a gasolina foi vendida a um preço médio de R$2,974 o litro, em queda de 1,46% em relação aos R$3,009 da semana anterior. Já o preço médio do álcool no estado ficou em R$2,406 na semana passada, com recuo de 4,52% frente aos R$2,520 da semana anterior. Ironicamente, pela pesquisa da ANP, no município do Rio, os postos onde a gasolina e o álcool custavam mais caros na semana passada eram de bandeira BR. Há quase 15 dias, a BR Distribuidora reduziu o preços da gasolina em 6% e do etanol em 13% para seus postos. Segundo a pesquisa da ANP) na semana passada o Posto Recreio, da BR, na Barra da Tijuca, vendia o litro do álcool a R$2,799 - o mais caro. Já no município do Rio os valores mais altos foram apurados pela pesquisa na Barra da Tijuca, no Recreio e na Ilha do governador: R$3,149 o litro. Um deles fica na Ilha do Governador, onde o Posto Insulano, também da BR, vendia a gasolina a R$3,149 o litro. No Brasil, o preço médio da gasolina ficou em R$2,861 o litro na semana passada, representando uma redução de 1,28% em relação à semana anterior. Já o preço médio do álcool hidratado no país caiu 6,65%, para R$2,076, no mesmo período. Ainda de acordo com a pesquisa, na cidade de São Paulo a queda média dos preços de revenda foi de 9,53% para o álcool. Na gasolina a redução ficou em 1,36%. Em Brasília, o recuo nos preços dos dois combustíveis foi de 4,77%, no caso do álcool, e de 2,52%, no da gasolina. ----------------------------------- Valor Econômico - 26/05/2011 Brasil sugere cotas informais à Argentina Sergio Leo | De Brasília O governo brasileiro está disposto a aceitar restrições "voluntárias" de exportação de produtos como máquinas agrícolas, para encerrar a disputa comercial com a Argentina, revelou uma autoridade que acompanha as negociações com o país vizinho. Nos próximos dias, o governo deve entrar em contato com as associações empresariais para ver a receptividade à ideia, apresentada pelos argentinos e que já foi posta em prática no passado em acordos de cotas informais de exportação, como o de calçados - nem sempre respeitado pelos argentinos. Segundo informou um integrante do governo brasileiro, as linhas gerais do acordo foram delineadas pelo secretário-executivo do ministério do Desenvolvimento, Alessandro Teixeira, e o secretário da Indústria argentino, Eduardo Bianchi. Os dois deverão reunirse de novo em uma a duas semanas. O Brasil só aceita cotas se os argentinos liberarem os produtos retidos à espera de liberação nas alfândegas há mais de 60 dias, como calçados, eletrodomésticos da linha branca, tratores e colheitadeiras, e doces. Já foram feitas consultas informais a alguns setores empresariais no Brasil, que indicaram preferir o acordo de contenção de exportações à Argentina à situação atual, de retenção de produtos nas aduanas. Mas os limites ainda terão de ser negociados, e é possível rever resistências da parte brasileira. Os fabricantes de geladeira, por exemplo, que chegaram a aceitar acordo do gênero em 2004, recusaram-se a renová-lo em 2006 (e as datas revelam há quanto tempo a Argentina recorre a esse tipo de artifício sob argumento de que precisa dar espaço para que sua indústria doméstica ganhe força). Os argentinos têm insistido em reivindicações contra o que consideram protecionismo brasileiro. Demandam, por exemplo, permissão de exportação de mosto de uva a granel - pedido recusado terminantemente, porque exigiria uma proposta de mudança de lei, ao Congresso brasileiro, avesso a concessões aos vinicultores argentinos. Já uma queixa contra a exigência de selo fiscal para compra de vinho argentino (que encarecia a exportação) foi atendida parcialmente: a Receita Federal autorizou que os importadores comprem os selos e os repassem aos fornecedores argentinos para aplicá-los ainda nas fábricas (não mais exclusivamente em território brasileiro como era exigido antes). O governo brasileiro não admite retirar a licença não automática sobre importações de automóveis, que atingiu em cheio o principal produto de exportação argentino. Oficialmente, é mantida a explicação de que a medida foi tomada para monitorar as crescentes importações de veículos e nada teriam a ver com as queixas do Brasil contra licenças não automáticas argentinas aplicadas a produtos brasileiros. Na prática, porém, há o compromisso de, em caso de acordo, acelerar a liberação de licenças para importação de carros argentinos - e a ameaça implícita de que haverá atrasos caso haja resistência a um acordo por parte dos argentinos ou voltem os atrasos na liberação das licenças de importação aos exportadores brasileiros. Apesar do tom severo adotado pelos negociadores argentinos, as autoridades brasileiras estão otimistas e preveem que o acordo está próximo, até porque o Brasil aceitou grande parte das demandas do vizinho. Os dois governos têm apresentado números diferentes sobre o desempenho comercial bilateral e um dos pontos na negociação, será a tentativa de harmonizar os dados. Outro, o de chegar a limites de exportação aceitáveis aos dois lados. --------------------------------------------Valor Econômico - 26/05/2011 Crise dos ricos ameaça emergentes, reclama Brasil O Brasil cobrou ontem dos países desenvolvidos que "façam seu dever de casa" e reformem suas economias, porque do jeito que estão ameaçam o desenvolvimento das nações emergentes. A cobrança foi expressa pelo subsecretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty, embaixador Valdemar Carneiro Leão, na OCDE, espécie de clube dos países ricos. "A ideia de que os emergentes vão crescer indefinidamente, confiando em crescimento endógeno e em comércio sul-sul, é uma visão parcial das coisas", afirmou. "Não tomamos como certo que isso vai ser mantido no longo prazo. O desafio é como fazer que esse crescimento persista, para que todos se beneficiem, e isso depende também dos países ricos." Carneiro Leão reclamou que os desenvolvidos mantêm políticas fiscal frouxa e monetária expansionista, além de se protegerem no comércio, de maneira que terminam por prejudicar os emergentes. No debate, o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, disse que o crescimento dos emergentes é boa notícia globalmente, mas que a verdade política é que isso não é percebida como tal. Para Lamy, os países ocidentais, sobretudo EUA e os europeus, precisam abandonar o reflexo de ameaça e de proteção diante da mudança de poder na economia mundial. Alertou que se as opiniões públicas americana e europeia continuarem a pensar que China, Índia e Brasil são uma ameaça, "então vamos para um sério problemas". Daí, segundo ele, a importância de "reforçar disciplinas para que o jogo global seja de soma positiva, porque na opinião pública é jogo de soma negativa". Alguns interpretaram isso como a necessidade de a OMC não só concluir a negociação de novas regras previstas no Acordo de Doha, como ir além no futuro com regras sobre trabalho no comércio internacional, concorrência e outras questões sensíveis. Para Lamy, certo mesmo é que os países desenvolvidos precisam mudar suas políticas econômicas, para gerar mais empregos e melhorar educação, inovação e formação. Ele alertou também que o crescimento dos emergentes num ritmo de 6% a 7% por ano não é sustentável nas condições energética e ambientais atuais. E destacou a necessidade de que nos próprios países emergentes, como China, Brasil e Índia, o crescimento seja menos desequilibrado e contribua efetivamente para reduzir a desigualdade. Lamy considerou que o reequilíbrio do sistema de poder na cena internacional será consequência lógica da expansão dos emergentes, e lembrou que na OMC isso já ocorre, com Brasil, China e Índia no núcleo central das decisões, ao contrário do passado, quando EUA, UE, Japão e Canadá davam sozinhos as cartas. Na defensiva, Roberto Hormats, subsecretário de Estado dos EUA para a economia, defendeu a cooperação internacional e procurou justificar a enorme liquidez deflagrada pelos EUA, que acabou empurrando volumes gigantescos de capitais em direção dos emergentes e valorizando excessivamente as moedas locais. Segundo ele, a ação do Federal Reserve foi necessária para "impedir que a situação econômica (nos EUA) se deteriorasse". Por sua vez, em discurso ontem à noite na OCDE, a secretária de Estado americana, Hilary Clinton, defendeu que os países desenvolvidos "repartam suas lições econômicas com os emergentes". Defendeu que os países em desenvolvimento trabalhem para eliminar corrupção, taxar suas elites e criar regulamentações para atrair investimentos estrangeiros.