1 O PATRIOTISMO EM PROL DA VALORIZAÇÃO NACIONAL NO ROMANCE TRISTE FIM DE POLICARPO QUARESMA Gerson Marcio da Silva1 RESUMO: Este artigo tem como base de estudo o romance Triste Fim de Policarpo Quaresma, com o objetivo de estudar o Patriotismo do Personagem Policarpo Quaresma na sua busca de valorização do que é nacional: produtos, livros, língua falada e também o abandono do povo brasileiro pelos seu governantes. E assim analisar as propostas feitas por Quaresma, para tentar adequá-las para uma mudança que realmente poderia acontecer, e para isso utilizamos as idéias do personagem e de autores que estudaram o Discurso de Identidade Nacional, e chegamos a conclusão que há uma grande perda da identidade (cultura) com a saída da população de seu lugar de origem, na tentativa de uma vida melhor na cidade grande. Palavras chaves: patriotismo, língua, identidade. ABSTRACT: This article has as study base the romance Triste fim de Policarpo Quaresma, with the objective to study the Patriotism of the character Policarpo Quaresma in his search of the value the what is national: products, books, language and also the abandoning of brazilian people for their governors. And thus analyze the proposals made for Quaresma, to try to adjust them for a change that really could happen, and for this we use the ideas of the character and authors who had studied the Speech of National Identity, and reach conclusion that there is a great of the identity (culture) lost with the exit of the population of their original place in the attempt of a better life in the great city. Keywords: patriotism, language, identity Introdução Trabalhamos com o Romance Triste Fim de Policarpo Quaresma em que o personagem Policarpo Quaresma é um Patriota apaixonado pelo seu país, que tem um discurso de identidade em prol da valorização do que é nacional, e tenta resgatar a identidade brasileira através da língua “Tupi-Guarani” falada pelos nativos desta terra. O personagem Quaresma um leitor apaixonado, e que aprende muito através dos livros, e por intermédio dele fica claro que no Brasil a uma forte influência de outras culturas, e algo que pode ser notado principalmente no folclore. Com Quaresma temos um retrato do panorama político brasileiro onde é demonstrado um descaso pelos representantes do país com o homem do campo, mais precisamente o pequeno proprietário, que é uma das fases da vida do personagem. 1 Pós Graduando do Curso Ciências da Linguagem. 2 Para as proposta feita por Quaresma e as situações vivenciadas por ele tentaremos encontrar possíveis soluções, e o quanto tais iniciativas poderiam contribuir para uma afirmação da identidade nacional do país, e entender como as mudanças afetam o Discurso de Identidade da população. D Nacionalidade e Globalização Publicado em folhetim em 1911 e em livro em 1915, Triste Fim de Policarpo Quaresma narra à vida de um modesto funcionário público, sonhador e patriota apaixonado pelo seu País. Em seu idealismo patriótico, Policarpo Quaresma vê o país como um recanto de farturas, facilidades, compreensão e amor. Esta visão orienta o seu projeto de reforma nacional, cujo objetivo era despertar a pátria do sono inconsciente em que jazia ignorante de seu potencial, e conduzi-la ao merecido lugar de maior nação do mundo. O personagem Policarpo Quaresma nos deixa lições no decorrer do romance que marcam o leitor, como a valorização de produtos essencialmente nacionais abdicando de utilizar no dia a dia os produtos importados de que nada favorecem a economia brasileira, e sim enriquecem a outros países. Podemos comprovar na fala de sua irmã Adelaide, o quanto Policarpo Quaresma é Patriótico ao ponto de não permitir o consumo de produtos estrangeiro em sua casa: “-É uma mania de seu amigo, Senhor Ricardo, esta de só querer coisas nacionais, e a gente tem que ingerir cada droga, chi!” (BARRETO, 1997, p. 26), além de proibir Policarpo Quaresma ainda sugere um produto nacional equivalente, como nos revela sua irmã: “Disse-me que esse petit-pois é estrangeiro e que eu o substituísse por guando.” (BARRETO, 1997, p.26), e justifica tal iniciativa dizendo: “... Não protegem as indústrias nacionais... Comigo não há disso: de tudo que há nacional, e não uso estrangeiro. Visto-me com pano nacional, calço botas nacionais e assim por diante.” (BARRETO, 1997, p.27). 3 Sabe-se que esta mudança de hábitos proposta por Policarpo Quaresma irá propiciar desavenças principalmente com governo e multinacionais, e até mesmo no núcleo familiar, pois há muitos consumidores que são atraídos por propagandas ao invés de qualidade, e essa é uma regalia que o produtor brasileiro não pode dispor devido o custo ser alto (anúncio). É um discurso em que bem analisado tem tudo a ver como o futuro do país: o Brasil. Nesse discurso sobre a valorização do que é nacional defendido por Policarpo Quaresma fica claro a forte influência de produtos estrangeiros, o que e entendido pelo personagem como uma invasão ou uma segunda colonização, feita agora por intermédio de produtos. Essa alta ligação com o que é estrangeiro nos deixa em suas mãos, pois se a uma crise perde-se o chão falso, ou melhor o tapete em que pisamos pois, o chão ainda é nosso mas, esta limpo porque não fora dado o valor que merecia. Incentivando a Leitura Além de estarmos rodeados de pessoas que se dizem ser brasileiros, mas que consomem produtos e cultuam o estrangeirismo, existem também os que subestimam a capacidade dos outros, um exemplo e o único desafeto de Quaresma, o “doutor Segadas”, que “não podia admitir que Quaresma tivesse livros: ‘Se não era formado, para quê? Pedantismo !’ ” (BARRETO, 1915, p.19). Partindo do negativismo do “doutor Segadas” podemos dizer que num país imenso como o Brasil onde a dificuldade de acesso a uma escola é comprometida pelos percalços da vida e poucos têm a glória de concluir um curso superior, deveria sim existir pessoas incentivando a leitura e aquisição de livros, para que o povo pudesse estar preparado para o processo de modernização que se consolida no país, e que a qualquer momento pode estar o leitor a frente de situações que podem ser apreendidas nos livros. 4 Ler, e determinar sentidos Sabe-se que no fim do romance Policarpo Quaresma se arrepende de ter passado a maior parte de sua vida baseando-se em livros, pois os livros são feitos por seres humanos e cheios de ufanismo em grande parte das obras. Então cabe ao leitor ser criterioso ao ponto de discordar de algumas inverdades que são sugeridas por intermédio dos autores. Mas é em livros que temos registrado todo o processo da história cultural de um povo, cabendo aos pesquisadores chegar a um consenso e coletar o real do ficcional. Pois para Durigan (2002, p. 48), O mundo criado pelo texto ficcional não é uma cópia fiel do mundo real, mas o mundo tal como é visto pelo produtor a partir de uma determinada perspectiva, de acordo com determinadas intenções. O criador (...) terá tido, antes de mais nada, o propósito de que fosse um texto, com o qual realizaria um outros propósitos: expressar e comunicar-se. Ao leitor cabe (re)agir cooperativamente, procurando determinar sentidos. Um País Diversificado Culturalmente Pesquisando em livros que Quaresma esclarece que as festas folclóricas comemoradas em nosso país, têm origem em outros países e que foram trazidas pelos colonizadores e escravos (pertencentes aos grupos dos discriminados) e são praticadas pela população. Podemos dizer que uma forte influência deste agregamento de cultura se deu pela vinda dos escravos, pois quando General Albernaz decide fazer uma festa a moda antiga, vão atrás da antiga lavadeira da família uma negra chamada de “tia Maria Rita”, mas ela não se lembra mais das cantigas. Neste momento é que temos a noção de quanto o Brasil perde de sua história cultural por deixar morrer na memória de seus ancestrais, principalmente com os que não sabem escrever e nem ler, as antigas brincadeiras, contos, músicas e relatos históricos 5 que são importantes para fomentarem uma identidade nacional. Se soubessem poderiam ter feito como o “Velho Poeta” personagem do livro que tem registrado em papéis contos e canções folclóricas e ainda se propunha a receber de outros para mantê-las em seu acervo. Segundo Bernd (2003, p. 15), [...] igualmente, as literaturas dos grupos discriminados – negros, mulheres, homossexuais – funcionam como o elemento que vem preencher os vazios da memória coletiva e fornecer os pontos de ancoramento do sentimento de identidade, essencial ao ato de auto-afirmação das comunidades ameaçadas pelo rolo compressor da assimilação. Resgate da Língua No intuito de busca da identidade nacional influenciado pelas leituras e pesquisas feitas, Policarpo Quaresma pensava que o homem do Brasil deveria se expressar como os nativos Tupinambás e não como o europeu, por isso estudou o folclore e o Tupi-guarani. Pretendeu substituir o idioma português chegando a redigir um documento, isto é, Policarpo Quaresma queria fazer uma reforma pela cultura. Vale dizer que o mesmo possuía uma biblioteca só com obras sobre o Brasil. O Requerimento em que pede o “Tupi-Guarani” como a língua oficial brasileira foi rejeitado e ele ridicularizado por todos. Porque será? Ora, se somos um país colonizado, onde os nativos desta terra foram massacrados ou obrigados a aderirem aos modos e costumes estrangeiros é obvio que não iriam se propor a tal mudança. Podemos dizer que Policarpo Quaresma pensava de forma sacralizante, pois segundo Bernd (2003, p.19): Uma literatura que se atribui a missão de articular o projeto nacional, de fazer emergir os mitos fundadores de uma comunidade e de recuperar sua memória coletiva, passa a exercer somente a função sacralizante, 6 unificadora, tendendo ao mesmo, ao monologismo, ou seja, à construção de uma identidade do tipo etnocêntrico, que circunscreve a realidade a um único quadro de referências. Mas mesmo negado o requerimento poderia ter sido aceita uma proposta de valorização da identidade brasileira, pois se somos obrigados nos bancos escolares a se deparar com a língua estrangeira, o porquê de não termos na grade curricular a adesão da língua “Tupi-Guarani” para realçar a nossa brasilidade e assim teríamos uma dessacralização, que “segundo Glissant, a um pensamento politizado, equivalendo a uma abertura contínua para o diverso, território no qual uma cultura pode estabelecer relações com as outras.” (In: BERND, 2003, p. 20). A nossa Língua é muito maior do que pretendem os gramáticos e os políticos patrioteiros. Pois para Orlandi, (1995, p.198) “A língua, enquanto idioma oficial está vinculada à idéia de país, de pátria, de povo. E assim quer a tradição que a Língua seja critério para se ter reconhecida uma identidade nacional, cultural.” Identidades Contrárias O Discurso de identidade do personagem de tão imbuído de seus propósitos patrióticos se desassociou da sua realidade levando misturar o mundo real com o ficcional ocasionando um estado de loucura que levou-o a internar-se por seis meses a fim de se restabelecer. Segundo Hall (2000, p. 13), Dentro de nós há identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, de tal modo que nossas identificações estão sendo continuamente deslocadas. Se sentimos que temos uma identidade unificada desde o nascimento até a morte é apenas porque construímos uma cômoda estória sobre nós mesmos ou uma confortadora ‘narrativa do eu’ (veja Hall, 1990). A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma fantasia. Ao invés disso, à medida em que os sistemas de significação e 7 representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente. (pág. 13) Saindo do hospício, Policarpo Quaresma já não pensava em reformas pela cultura, mas pela agricultura. Muda-se para o sítio com a intenção de mostrar que a melhor terra é o Brasil. Vencido pela má qualidade do solo, formigas e mesquinharia da política local, perde tudo, volta ao Rio para salvar a pátria do perigo representado pela Revolta Armada. Alista-se no exército, obtém uma entrevista com Floriano Peixoto e decepciona-se. Vivia Policarpo Quaresma, rodeado por funcionários públicos sem consistência moral e profissional: o general cuja filha Ismênia tem um fim trágico por causa da indecisão do noivo; Caldas, comandante de um navio inexistente; Bustamante que se preocupa em conhecer a Legislação que regeria sua aposentadoria. Apenas Ricardo se salva pela sinceridade, mas é desprezado pelos demais. Policarpo Quaresma caricatura um estilo atual de brasilidade e ao mesmo tempo critica uma sociedade pautada em valores outros que não o de identidade nacional. As Contínuas Mudanças de Discurso de Identidade O Personagem Quaresma nos demonstra um homem de atitude não preocupado somente consigo mesmo, mas com a sociedade. Pode-se dizer, por extensão, que Policarpo Quaresma, através de suas leituras, se torna mais humano: toma partido dos oprimidos, coloca-se frontalmente aos opressores e defende a massa sofredora, mas nada disso é ouvido pelos governantes que deixam o povo abandonado pela sorte, que acabam saindo de suas terras natais onde cultivaram não só plantações, mas toda sua identidade cultural e vão se aventurar nas grandes cidades e acabam por morar em favelas onde a única preocupação é 8 conseguir sobreviver, e as suas crenças acabam por se perder no esquecimento e começam a aderir ao discurso de um novo contexto histórico. A identidade nacional antes de estar associada a uma atitude, a uma preferência, a um momento histórico, a uma raça ou até mesmo a confluência alguns fatores que faz com que um grupo de pessoas adote um mesmo território, onde possam viver e desenvolver-se, é uma forma discursiva produzida em determinado contexto histórico. GIACON (2000, p.104). Podemos dizer que hoje em dia nós temos muitos Quaresmas, não pela loucura, mas se dividindo em dois para poder conciliar o meio social com o meio familiar, o que ocorre muito neste mundo moderno. Há também os que não consegue acompanhar essa evolução, devido às mudanças aceleradas que se revela à sua frente e ficam perdidos perante o processo de evolução continua do discurso de identidade. Considerações Finais O personagem Policarpo Quaresma nos leva a rever nossos conceitos de nacionalismo, pois consumimos muitos produtos importados, enquanto que os nacionais são ignorados. Assim comprometemos todo um processo de geração de renda, que começa no campo e se alastra pela população. Vivemos num país onde se fala uma língua emprestada, e ainda temos nas grades curriculares do ensino fundamental e médio, outras línguas estrangeiras sendo ensinadas, e parlamentares acomodados que não conseguem ver uma alternativa para o pedido de Policarpo Quaresma, como uma possível inclusão da Língua “Tupi-Guarani” na formação educacional da população, para uma valorização do que é realmente nacional. 9 Vivemos num país de mistura de raças onde se misturaram os nativos (índio), europeus (brancos) e africanos (escravos negros) que deram origem a um novo perfil físico e cultural através do cruzamento destes povos. Devido estas diversidades o país poderia ser o melhor lugar do mundo, se não fossem nossos governantes, pois o povo brasileiro escolhe os seus representantes e os representantes escolhem o povo que quer representar, e é neste pensamento que entra a política de uma mão lava a outro. Como os pequenos produtores ou os assalariados não têm nada a oferecer, sempre perdem com os descasos das autoridades, sendo obrigados por falta de uma política nacional abandonar a suas raízes, e ir para uma cidade grande para tentar sobreviver, deixando para trás sua verdadeira identificação para tentar adequar a uma nova realidade. Tais mudanças complementem a história cultural da população, pois é obrigado a aprender um novo discurso de identidade para se adequarem à nova realidade, há ainda aqueles que não se encaixam neste novo momento histórico em que está vivendo e ficam alienados como “Quaresma”, pois não se encaixam a novo meio social em que estão vivendo. Quaresma deixa grandes lições e uma delas é a de unirmos força para enfrentar as dificuldades; que os livros podem nos ensinar muitas coisas, basta um pouco de boa vontade para ler e por em prática; precisamos de uma reforma política social e agrícola para atender as necessidades da grande maioria que a população brasileira. Isto tudo que foi dito é possível basta um pouco de boa vontade, e deixar que as nossa diferenças fiquem somente nas nossas diversidades físicas. Referências Bibliográficas BARRETO, Lima. Triste fim de Policarpo Quaresma. São Paulo: Editora Ática, 1997. 10 BERND, Zilá. Literatura e Identidade Nacional. Porto Alegre: Editora UFRGs, 2003. BERND, Zilá; LOPES, Cícero Galeno. Identidades e Estéticas Compósitas. Porto Alegre: PPG-Letras UFRGs, 1999. DURIGAN, Marlene. Revista Cadernos p.48, 2002. GIACON, Eliane Maria de Oliveira. Viva o povo brasileiro: história e identidade. Dissertação de Mestrado. UNESP – Assis, 2002. HALL, Stuart. Identidade Cultural na Pós-modernidade. Trad. Tomaz Tadeu da Silva (et alli). 4ª ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. ORLANDI, Eni. Terra à Vista. São Paulo: Editora Ática, 1995.