Não me ufano por mais dez anos
LUDMER, Paulo. “Não me ufano por mais dez anos”. CanalEnergia, São Paulo, 07 de
maio de 2010.
O caráter negocista do governo federal, com contornos e feições pontuais de dissídios
trabalhistas, é apenas um retrato a mais de um país sem Agenda de Nação, limitado a
uma Agenda de Poder. Em política energética dá-se tudo neste perímetro.
Há pouco mais de um ano atrás, quando a EPE – Empresa de Política Energética
punha em discussão pública o Plano Decenal de ocasião, o seu presidente Mauricio
Tolmasquim discutia na mídia o leilão exclusivo de energia eólica, que acabou
ocorrendo em 14 de dezembro de 2009. Mas, no plano – DETERMINATIVO, pelo
regramento a gosto do socialismo – não havia eólica senão em nível insignificante.
Vale dizer: nasceu estéril o Plano Decenal. Não orientava porque não oferecia
confiabilidade.
Esta semana apresentou-se novo Plano Decenal, eivado de energias renováveis. Mas
onde estão as inúmeras nucleares enfaticamente defendidas pelo ministro de Minas e
Energia, Edson Lobão? Elas mantêm-se ocultas por propósitos opacos à opinião
pública. O governo, nos qual os ministros intestinamente não conversam entre si,
como tenho dito, insistiu no anúncio de que pelo menos quatro centrais atômicas serão
edificadas. Portanto, a governança não tem uma visão e nem atitude sistêmica.
Mencionamos o caráter negocista do ritual do governo (com clientelismo, nepotismo,
partidarismo e intervencionismo) porque suas medidas, em energia, não se dirigem
genericamente a todos. Elas são gota a gota aplicadas de modo pouco discutido para
benefício de uns e outros. Assim foi o leilão de Belo Monte, no qual não me deterei.
A eólica mereceu incentivos: desonerações fiscais, créditos mais longos e baratos,
contratações de venda estendidas no tempo e que tais. A biomassa, como a eólica,
ganhou de presente, depois do Proinfa (Programa de Incentivos a Fontes Alternativas),
um novo encargo - denominado de Energia de Reserva – que agora as PCHs –
pequenas centrais também querem. Os consumidores na ponta do rabo de cavalo
aceitam qualquer desaforo.
Ou seja: medidas anticíclicas criam privilégios, como a redução do IPI e do ICMS para
linhas brancas de eletrodomésticos, automóveis e construção civil. Antes disso, a
política de impostos e encargos são dificuldades para toda a economia ... cabendo aos
deuses do planalto as convenientes distribuições de benesses sob a forma de alívio. O
Brasil é o país do pédouvido.
Nos oito anos do presidente Lula, abandonou-se o fulcral: ignorou-se a reforma
tributária e a trabalhista, a política e a legal. Então, de fato, receberemos mesmo sua
herança maldita.
Estamos por assistir as julietas (treminhões) com vinte toneladas de cana de açúcar,
cada uma, viajando nas magníficas rodovias em Goiás e Minas Gerais até chegar a
uma usina de etanol, que queima um monstro desses, a cada cinco minutos.
Continuaremos, na capital paulista, a assistir pás de 45 metros cada uma, sobre
enormes caminhões, cruzando a avenida Faria Lima, nas madrugadas, em busca do
Porto de Santos, uma vez que não atravessam a marginal do Rio Pinheiros em São
Paulo? Ou o Rodoanel, odiado pelos ecologistas, nos livrará disso? Preciso mencionar
a incapacidade dos portos de Mucuripe (CE), a possível saturação de Pecém(CE), a
inexistência de cabotagem?
Os campos de pouso dos ricos freqüentadores do litoral sul de São Paulo se
converterão em importantes aeroportos, para receber 90 helicópteros simultaneamente
pelo Pré-Sal? Como acomodar 400 mil sofisticados novos habitantes entre Santos e
Paraty? Água, saneamento, hospitais, escolas, polícia, barbeiros, açougues, cinemas e
que tais?
As linhas de transmissão que irão buscar a energia nas usinas por meio das
Instalações Compartilhadas de Geração (ICGs) não parecerão os comboios de metrô
que, no pico, ninguém consegue entrar? Não é sua falta que hoje perturba a operação
das térmicas no Nordeste?
Aqui me limito a explicitar fantasmas da logística. É o que me resta para os
pasteurizados planos determinativos do setor elétrico, cuja inexistência foi tão utilizada
para denegrir o governo de Fernando Henrique Cardoso.
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