Miopia da agenda compromete o crescimento
Dionisio Dias Carneiro
11 de outubro de 2006
Por mais que falem em crescimento econômico, a partir do desejo de crescer, o discurso
dos candidatos a presidir o país nos próximos quatro anos define uma agenda bêbada que
requer um equilibrista para fazer crescer. Como diria Aldir Blanc, faz “irreverências mil
pra noite do Brasil” e para o senso econômico.
As pré-condições são favoráveis. Mas os cenários para os próximos anos não estão mais
claros. Investimento privado insuficiente, investimento público ineficiente, orçamentos
públicos congestionados por comprometimentos passados, carga tributária elevada e
míope e má qualidade de impostos apontam para um custo de capital elevado.
O primeiro debate mostrou que os dois candidatos evitam falar dos sacrifícios que são
necessários para crescer mais. O jogo aberto é bloqueado por um impasse: Lula acusa
Alckmin de querer cortar gastos, como se isso fosse incompatível com o crescimento e
não uma imposição da necessidade de aumentar a poupança pública. Alckmin, com medo
de ser impopular, não defende o corte de gastos, que foi parte de seu competente governo
em São Paulo e promete não privatizar. Prefere bater nos juros e na flutuação cambial,
como se bastasse afrouxar a moeda e voltar às regras cambiais para crescer mais. Lula foi
corajoso para manter a política monetária e a flutuação cambial, mas não para defendêlas. Ambos ficam presos nas políticas de gastos e demanda, que determinam apenas o
nível de utilização de capacidade, e não em políticas de poupança e de oferta, voltadas
para a expansão dessa capacidade produtiva. Concentrados os ataques e as defesas nas
políticas de gastos, a resolução da batalha política não tornará mais claros os rumos da
economia.
Tornou-se moda dizer-se que a estratégia macroeconômica não “produz” crescimento,
como se a agenda microeconômica fosse compatível com qualquer política
macroeconômica. Engano perigoso para políticos que tentam apenas dizer o que seus
eleitores querem ouvir e são incapazes de defender suas idéias como líderes. Não há
caminho fácil e sem sacrifícios para o crescimento. A reorganização do ambiente
econômico é um processo essencial para que as medidas voltadas para a microeconomia
do aumento da produtividade, da redução do custo do investimento, da geração e da
incorporação de inovações ao sistema produtivo possam frutificar. Os resultados
demandam intervalos maiores do que os mandatos presidenciais e requerem
sustentabilidade macroeconômica. A maioria dos analistas tem apontado para política
fiscal, como fonte da atual dicotomia entre a organização econômica de curto prazo e as
incertezas de longo prazo. O quadro fiscal compromete o aumento dos investimentos. O
crescimento dos gastos correntes piora o quadro de crescimento e a inflação no próximo
mandato, de modo que não há equilibrista que possa considerar superada a fase de
sacrifícios. Outros fenômenos bloqueiam o crescimento : a poupança privada não tem
compensado a queda da poupança pública; a poupança voluntária cai com o aumento da
poupança compulsória e o longo período de taxas de juros reais elevadas projeta
rendimentos irrealistas para as aplicações sem risco. Tais questões requerem uma reforma
da Previdência, mas são cuidadosamente afastadas da agenda.
Outras promessas armam bloqueios estruturais à discussão de uma agenda de crescimento
e melhoria da qualidade de vida. Um exemplo é o efeito deseducador da armadilha de
baixa qualidade de vida e exclusão contida nas transferências cada vez maiores para o
eleitorado mais pobre, ainda que em detrimento das perspectivas de emprego e da
melhoria de acesso à educação. Outro, é a ênfase no barateamento do custo da construção
irregular, benefício imediato em detrimento dos esforços para organização do espaço
urbano. Se mesmo o eleitorado dos principais centros urbanos não acolhe questões de
longo prazo como qualidade da educação e corrupção, é sinal de uma complacência
perigosa diante do mau serviço prestado pelos partidos políticos. Se eleitores favorecem a
agenda enganosa concentrada no curto prazo, determinado pela demanda global e pelas
transferências, os candidatos ficam dispensados de mostrar clareza quanto ao que farão
para promover o crescimento, que depende de políticas para a oferta global, que
transformem ganhos de produtividade em capacidade de fruir os benefícios do progresso.
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