OS CONFLITOS MUNDIAIS PELO PETRÓLEO Fernando Alcoforado* Estudioso de causas e prevenções de guerras nos últimos 35 anos de sua vida, o cientista político americano Michael Klare, autor do livro Blood and Oil publicado pela Metropolitan Books em 2004, afirma que a competição por recursos como o petróleo é, atualmente, a maior fonte potencial de conflitos mundiais (Ver sua entrevista ao jornal Folha de S. Paulo de 17/10/2005 no texto sob o título Disputa por petróleo leva a estado de guerra permanente). Segundo Klare, o crescimento da demanda por petróleo vai superar a oferta global em 2020 ou 2025, apontando que o mundo vive "o crepúsculo do petróleo", isto é, um momento de transição entre a abundância e a escassez. A disputa pelo petróleo que ainda resta levará a um estado de guerra permanente, caracterizado pela presença de grandes potências em suas regiões produtoras. O prognóstico de Klare é confirmado pelo geólogo saudita especialista em petróleo, Sadad I. Al Husseini, ex-diretor de exploração e produção da Saudi Aramco, que admitiu uma estagnação da produção do petróleo a partir de 2015. Igualmente alarmante era a previsão de Al Husseini de que esta estagnação da produção duraria 15 anos, na melhor das hipóteses, e depois, a produção convencional de petróleo iniciaria um "declínio progressivo, mas irreversível" (ver o site <http://www.energybulletin.net/node/9498>). Mais recentemente, a Agência Internacional de Energia, afirmou que uma grave crise do petróleo ocorrerá aproximadamente em 2012 (Ver o site <http://criadera.wordpress.com/2008/12/10/vivendo-o-fim-do-petroleo-cientistasafirmam-crise-profunda-e-esgotamento-das-reservas-ja-em-2012/>). Outro fato objetivo é o de que a procura de petróleo cresce, no momento em que as reservas se aproximam dos seus limites. Segundo Klare, há, no momento, um forte aumento na procura por petróleo proveniente da China, Índia, Coréia do Sul, Brasil, México e outras economias em desenvolvimento. Ao mesmo tempo, constata-se um forte declínio na taxa de novas descobertas de campos de petróleo. No passado, as grandes empresas do setor descobriam mais petróleo por ano do que eram capazes de extrair, o que não acontece mais hoje em dia. Está havendo na atualidade mais extração de petróleo do que a capacidade de repor com novas descobertas. Em sua entrevista já citada, Klare afirma que, se os dois maiores produtores mundiais de petróleo (Arábia Saudita e Rússia) continuarem a aumentar suas produções nos próximos anos, a era de escassez vai provavelmente começar por volta de 2020 ou 2025, quando muitos dos grandes campos de petróleo no mundo estarão esgotados. Entretanto, se a Arábia Saudita e a Rússia não forem capazes de manter o aumento de suas produções essa era começará mais cedo, talvez ainda a partir de 2015. Segundo a Petrobras e a British Petroleum, as 10 maiores reservas de petróleo do mundo em 2007 (em bilhões de barris equivalentes) são as seguintes: 1º. Rússia – 379,1; 2º. Irã – 314,3; 3º. Arábia Saudita – 308,7; 4º. Qatar – 174,6; 5º. Emirados Árabes – 135,6; 6º. Iraque – 134,9; 7º. Kuwait – 112,7; 8º. Venezuela – 107,1; 9º. Brasil – 94,4 e 10º. Nigéria – 69,0. Existe a expectativa de que as reservas de petróleo do Iraque se esgotem em 158 anos, as da Arábia Saudita em 67 anos, as da Rússia em 22 anos, as do Brasil em 18 anos e as dos Estados Unidos em 7 anos. Segundo Igor Fuser, professor da Faculdade Cásper Líbero e autor do livro Petróleo e Poder – O Envolvimento Militar 1 dos Estados Unidos no Golfo Pérsico (Editora Unesp, 2008), a região ampliada do Oriente Médio, que inclui o Norte da África, guarda, no seu subsolo, mais de 2/3 das reservas de petróleo do mundo. Uma parte significativa dessas reservas está sob o controle político dos Estados Unidos, por intermédio de regimes monárquicos sob a sua tutela militar, como os da Arábia Saudita, Kuwait e Emirados Árabes Unidos. Para Klare, a perspectiva de que haja crescimento da demanda por petróleo superior à oferta global fará com que o mundo venha a pagar um preço mais alto em petróleo e em sangue. No crepúsculo do petróleo, ou seja, uma transição entre uma era de petróleo abundante e uma era de escassez absoluta, o ouro negro não vai desaparecer, mas se mostrará insuficiente para atender à demanda global. Assim, teremos, periodicamente, momentos de escassez, preços altos e extrema vulnerabilidade a choques de petróleo. Klare argumenta que, por causa do declínio da extração doméstica, países como os Estados Unidos estão se tornando, de modo crescente, mais dependentes de petróleo importado e que esse petróleo tem vindo de áreas instáveis cronicamente, como o Oriente Médio, a região do mar Cáspio, a África e determinadas regiões da América Latina. Klare afirma que, por causa da crescente competição entre Estados Unidos, China, Japão e outros grandes consumidores pelo acesso ao que sobrará de áreas produtoras no mundo poderão surgir conflitos militares. Para promover seus interesses, esses países, especialmente os Estados Unidos e a China, estão se preparando para forjar laços militares com países produtores e fornecer armas modernas -os Estados Unidos com o Kuait e a Arábia Saudita, e a China com o Irã e o Sudão. Esta situação leva naturalmente a uma tensão crescente nessas regiões. A China, por exemplo, vai ampliar suas forças de segurança costeiras que tende a elevar as tensões com países vizinhos com os quais a China mantém uma disputa sobre águas territoriais onde se acredita haver vastas reservas de petróleo e gás. (Ver A Folha de S. Paulo de 17/06/2011). É o cenário de crise energética iminente que explica a urgência dos Estados Unidos em invadir o Iraque para depor o regime de Saddam Hussein e, agora, em intensificar as pressões internacionais com o objetivo de eliminar o regime teocrático do Irã. A entrada de forças estrangeiras para derrubar Muammar Kadhafi na Líbia está ligada também ao interesse pelas reservas de petróleo. Mas essa explicação não basta porque, sob o regime de Khadafi, a Líbia já se encontrava bastante integrada à economia global do petróleo, com a presença de várias empresas multinacionais que lá se instalaram em parceria com a companhia estatal líbia. No caso da Líbia, outro motivo da intervenção militar tem a ver com o contexto mais amplo da "primavera árabe". A intervenção ocidental, ao lado de grupos rebeldes apoiados pela CIA, reforça o papel dos Estados Unidos, da GrãBretanha e da França no Oriente Médio no sentido de impor limites ao processo de democratização dos países árabes. Em sua entrevista à Folha de S. Paulo, Klare afirma que haverá um estado de guerra permanente porque não há mais novos continentes para descobrir e pilhar pelas grandes potências colonialistas e imperialistas como no passado. Na atualidade, está havendo extração de petróleo em cada canto do planeta. Por causa da globalização, mais e mais países estão competindo pelo acesso a essa oferta remanescente de petróleo e a demanda está crescendo. Quando essas ofertas se esgotarem, não haverá qualquer outro lugar para se apoderar a não ser tomar as reservas de petróleo daqueles que as possuem aguçando ainda mais os conflitos internacionais. O cenário mais provável é a de que vão ocorrer muitos conflitos localizados que podem detonar grandes guerras quando as maiores 2 potências se envolverem em conflitos locais, principalmente no Golfo Pérsico ou na região do mar Cáspio onde os interesses vitais das grandes potências se interpõem a um caldeirão fervente de disputas políticas, étnicas e religiosas. *Fernando Alcoforado, 71, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010) e Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), entre outros. 3