O Teatro do Oprimido 17 testes contra a ocupacao 1 O cinzento não é o meio-termo entre o preto e o branco. É uma terceira cor. 2 O preto e branco da imagem fotográfica é indício da encenação. Ela não é, de facto, a realidade. É uma representação da realidade. 3 É quase a mesma coisa. Pele branca sobre fundo negro. Pele negra sobre fundo branco. Pele branca sobre fundo branco. Pele negra sobre fundo negro. Com a evidência da encenação. 4 Produzir uma imagem é colocar o corpo, para contraste e comparação, por entre os mortos. Retirada a roupa, restaria a pele. Retirada a pele, restaria a carne. 5 A margem da imagem é parte da pele. A espessura da pele é proporcional à densidade do grão. Ocupa o mesmo espaço. 6 A pele não é nem mais nem menos verdadeira do que a sua própria encenação. Admitindo que existe alguém por detrás da pele, ou que restaria alguém para além da pele. 7 A busca da verdade é um exercício de dissecação. Tratar-se-ia de, segundo movimentos gradativos, aprofundar a percepção das coisas até ao limite da coincidência entre a realidade e a representação. Até aos próprios ossos. 8 A identidade não é uma relação de coincidência. É uma relação de desfasamento. De desfasamento entre o aqui e o agora. Entre o antes e o depois. Entre o nome e o rosto, entre o corpo e a pele. 9 A distância ou a proximidade não são critérios de percepção do corpo. O inventário não acrescenta nada ao seu objecto. Não dá voz à voz, movimento aos olhos. 10 Aquilo que existe coincide precisamente com aquilo que vemos. Cada rosto coincide com o seu contorno. Cada centímetro de pele coincide consigo mesmo. Cada ponto de luz, com o seu próprio reflexo. 11 Vemos o que vemos. Pelo menos tanto quanto nós sabemos que somos e não somos aquilo que o espelho de nós nos devolve. Já sem encenação. 12 Na proporção da pose, a sobre-exposição produz a subtracção do nome à imagem. 13 Os olhos das imagens vêem-se a si mesmos pelos nossos olhos. Entre uns e outros não há meio-termo. 14 A mediação da imagem fotográfica devolve o corpo à sua própria presença. À espessura da pose. À estrita possibilidade de fazer corresponder o nome ao rosto, a voz à voz. 15 O ruído da voz não dá voz às imagens. Subtrai-se a si mesmo. 16 Entre não ter voz e não ter nada a dizer, parece preferível não ter nada a dizer. 17 O ruído não é o meio-termo entre o silêncio e a voz. É um terceiro som. Hélder Gomes 2005 Título - 17 Testes Contra a Ocupação Autor - Paulo Bernaschina Design - Pedro Formosinho Coordenação - Luisa Conceição & Dina Luís Editora - Artez Produção Gráfica - ISBN - 972-99912-0-0 Depósito Legal xxxxxxxxx 2007|©Paulo Bernaschina