PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) Comunicação e sociedade: desafios e perspectivas das organizações em um ambiente em transformação1 Valdete Cecato2 Mestranda em Ciências da Comunicação – ECA-USP Resumo O objetivo desse artigo é abordar a correlação entre a comunicação e a sociedade, a partir do princípio do valor compartilhado, desenvolvido por Porter e Kramer (2011)3 e da análise de Pereira, Costa, Murad et al (2009), que trata do diálogo social como condição para o alinhamento de expectativas e articulação com o território produtivo. Com base nesses estudos, à luz das perspectivas de Grunig (2011), Ferrari (2011) e Kunsch (2009), sinalizamos para a relevância das relações públicas, como a área de conhecimento capaz de promover um ambiente de articulação e de interação que favoreça a conexão entre sociedade e organizações. Palavras-Chave Comunicação, Valor Compartilhado, Sociedade, Relações Públicas Introdução A correlação entre as organizações e a sociedade tem sido o tema de estudos de autores que, em suas diferentes abordagens, fazem reflexões no sentido de apontar novos caminhos tanto em gestão e relacionamento, como também no direcionamento estratégico dos negócios. Essas análises consideram que as transformações econômicas e sociais, alertas em relação à degradação do meio ambiente, mudanças no comportamento do consumidor, exigências legais e certificações, entre outros aspectos, 1 Trabalho apresentado no Grupo de Trabalho Comunicação, Consumo e Institucionalidades, do 4º Encontro de GTs - Comunicon, realizado nos dias 08, 09 e 10 de outubro de 2014. 2 Mestranda em Ciências da Comunicação na ECA-USP. Consultora de comunicação corporativa e jornalista formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Coautora do livro Comunicação Corporativa Gestão, Imagem e Posicionamento, lançado pela Editora Contexto em 2011. E-mail: [email protected] 3 O artigo Criação de Valor Compartilhado, escrito por Porter & Kramer, foi publicado na edição janeiro-fevereiro de 2011 da Harvard Business Review. PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) criam uma conjuntura que exige um novo padrão de relacionamentos entre empresas e sociedade. (PORTER e KRAMER, 2011; PEREIRA, COSTA, MURAD et al, 2009; FERRARI, 2011). Entre os estudos que se inserem nessa perspectiva está o princípio do valor compartilhado. Desenvolvido por Porter e Kramer4 (2011), o conceito tem entre seus fundamentos a percepção que, segundo os seus próprios autores, a sociedade vem tendo da atividade empresarial: Nos últimos anos a atividade empresarial foi cada vez mais vista como uma das principais causas de problemas sociais, ambientais e econômicos. É generalizada a percepção de que a empresa prospera à custa da comunidade que a cerca (PORTER e KRAMER, 2011, P. 18). A proposta de compartilhar o valor gerado pela atividade empresarial com a sociedade, nasce como uma tentativa de reversão do quadro descrito por Porter e Kramer (2011) e pressupõe a obtenção de sucesso econômico, mas de forma a trazer benefícios também para a sociedade. Algo que, conforme os autores, não pode ser confundido com Responsabilidade Social Corporativa (RSC), filantropia ou sustentabilidade. Também não está na periferia da atividade empresarial mas em seu centro porque implica em um redirecionamento da própria estratégia de negócio. Para compartilhar o valor criado, as empresas deverão considerar o enfrentamento de problemas sociais, ambientais, econômicos além dos efeitos de suas ações na sociedade e meio ambiente, as chamadas externalidades. Aderindo a esse modelo, as organizações estariam atuando a favor de sua competitividade e sustentabilidade e se integrariam ao que os autores definem como a próxima grande transformação no pensamento administrativo (Porter e Kramer, 2011). Em um artigo anterior, no qual analisaram a relação entre as vantagens competitivas e a RSC5, Porter e Kramer (2006) já alertavam para a interdependência 4 Michael E. Porter é titular da cátedra Bishop William Lawrence University professor da Harvard University. Mark R. Kramer é diretor-geral da consultoria especializada em impacto social FSG: Fundation Strategy Group – http://www.fsg.org), que fundou com Porter. 5 The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility, foi publicado na Harvard Business Review, edição de dezembro de 2006. PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) entre organizações e sociedade. Segundo os autores, a adoção de RSC levou muitas empresas a melhorarem o impacto de suas atividades em nível social e ambiental mas esses esforços não repercutiram (como deveriam) em sua produtividade. Porter e Kramer (2006) identificaram dois motivos para esse descompasso. O primeiro deles é que as organizações opuseram seus negócios à sociedade desconsiderando a interdependência que existe entre essas duas instâncias. O segundo é que as organizações desenvolveram suas políticas de RSC de forma genérica e sem inseri-las de maneira apropriada na sua estratégia de negócios, iniciativa considerada por Porter e Kramer (2011) essencial para o compartilhamento da riqueza produzida pela sua atividade. Para gerar valor compartilhado, Porter e Kramer (2011) indicam três caminhos, que embutem transformações profundas nos modelos de produção e atendimento da demanda mas que se fortalecem mutuamente. O primeiro deles é a redefinição de produtos e mercados além da identificação de necessidades em áreas ainda não atendidas na economia global como, por exemplo, saúde, moradia, nutrição, auxílio ao idoso, segurança financeira e redução de danos ambientais. Na sequência, encontra-se a reavaliação da produtividade na cadeia de valor em itens como a exploração de recursos da natureza, relacionamento com fornecedores, consumo de energia, logística, expansão da reciclagem e do reuso de recursos e materiais reciclados. A terceira via citada por Porter e Kramer (2011) é a promoção e o desenvolvimento de clusters locais em que empresas, negócios correlatos, fornecedores, prestadores de serviço de infraestrutura e logística compartilham o mesmo espaço geográfico, o que possibilitaria fortalecimento da conexão entre a atividade empresarial desenvolvida e a comunidade que a cerca. Porter e Kramer (2011) avaliam que a relação entre progresso social e produtividade na cadeia de valor6 é maior do que se acreditava, o que passou a exigir ainda mais atenção aos problemas socioambientais: O Instituto Ethos define cadeia de valor como o conjunto das “atividades relacionadas e desenvolvidas pela empresa para satisfazer as necessidades dos clientes, desde as relações com fornecedores e ciclos de produção e venda até a fase da distribuição para o consumidor final”. Disponível em http://www.ethos.org.br/indicadores. Acesso em 27/07/2014. 6 PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) Num nível muito básico, a competitividade de uma empresa e a saúde das comunidades a seu redor estão intimamente interligadas. Uma empresa precisa de uma comunidade vicejante não só para gerar demanda para seus produtos, mas também para suprir ativos públicos essenciais e um ambiente favorável. Uma comunidade precisa de empresas prósperas para criar empregos e oportunidades de geração de riqueza para seus cidadãos. (PORTER e KRAMER, 2011, P. 20). Na sequência dos dois artigos citados – Criação de Valor Compartilhado (2011) e The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility7(2006), um terceiro estudo - Measuring Shared Value. How to Unlock Value by Linking Social and Business Results8 (Porter, Hills, Pfitzer, Patscheke et al, 2011, p: 1-10) 9 – seguiu no desenvolvimento do tema e abordou a mensuração da geração do valor compartilhado. Segundo os seus autores, a criação de um framework, um modelo de apuração que tenha como foco a interação entre os resultados do negócio em si e aqueles decorrentes dos benefícios sociais gerados, está entre as mais importantes ferramentas para colocar em prática o princípio do valor compartilhado. Muitas companhias começaram a medir suas performances ambiental e social sem olhar para os benefícios do negócio e continuam a mensurar seus resultados financeiros sem apurar o impacto social. A determinação do valor compartilhado tem por base os sistemas de mensuração e abordagens existentes mas seu foco está na intersecção entre negócios e criação de valor social (PORTER, HILLS, PFITZER, PATSCHEKE et al, 2011, P. 10). Ou seja, a apuração do valor compartilhado inclui o impacto de todas as políticas desenvolvidas pela empresa que tenham alguma repercussão na sociedade como, por exemplo: estratégias de sustentabilidade, práticas que pressupõem ações sociais de longo prazo, reputação e compliance. De modo geral, a comunicação aparece na análise dos autores como uma decorrência da necessidade de informar os stakeholders da própria organização (Porter, Hills, Pfitzer, Patscheke et al, 2011). No entanto, se 7 A articulação entre Vantagens Competitivas e Responsabilidade Social Corporativa (tradução nossa) Mensurando o Valor Compartilhado. Como produzir valor articulando articulando resultados sociais e de negócios. (tradução nossa) 9 Disponível em http://sharedvalue.org/sites/default/files/resource-files/Measuring_Shared_Value.pdf. Acesso em 17/05/2014. 8 PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) forem consideradas as posições de estudiosos como Kunsch (2009), Grunig (2011) e Ferrari (2011), sobre a correlação entre organizações e sociedade, que serão expostas no decorrer desse artigo, é possível concluir que compartilhar valor implica no desenvolvimento de estratégias de comunicação nas quais prevaleçam os relacionamentos e a interação entre empresas e sociedade. O território produtivo e a redefinição dos papéis dos agentes sociais O conceito de território produtivo (Pereira, Costa, Murad et al, 2009, p. 294) foi construído a partir de alguns estudos de caso feitos com micro e pequenas empresas (MPEs) do estado do Rio de Janeiro. É definido pelos pesquisadores como o espaço de abrangência das redes de relacionamento de determinada organização nas suas dimensões física, política, social, econômica, cultural e públicos de interesse. Ou seja, o território produtivo não se caracteriza por ser apenas um lugar de atuação privada das organizações mas ganha uma dimensão pública. Sua atividade torna-se legítima por meio da adoção de valores éticos definidos historicamente e do atendimento a objetivos das comunidades de interesse, afetadas direta ou indiretamente no processo produtivo. O pressuposto da análise realizada pelos autores é que, ao atuarem de forma “pró-ativa e cidadã nos seus territórios”, as organizações podem estar construindo uma estratégia que, além de vantagens competitivas, gera desenvolvimento sustentável. Suas conclusões têm origem na constatação de que houve uma reinterpretação da questão social, o que desencadeou uma redefinição do papel dos agentes que transitam nesse ambiente: Um número grande, próspero, de organizações tende a se perceber (e ser percebido) como corresponsável pela gestão social do território em que atua, inclusive a entender como investimento (e não mais como gasto ou despesa) os recursos deslocados para o atendimento das demandas sociais de seus públicos de interesse, tanto o interno como externo. (PEREIRA, COSTA, MURAD et al, 2009. P. 294) PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) Simultaneamente a esse processo de releitura da questão social, a dimensão do relacionamento e das suas redes foi valorizada, o que traz repercussões na comunicação, aumentando a complexidade das pesquisas que tratam da comunicação organizacional10. Estes estudos, precisam dar conta de aspectos como o acirramento da concorrência, segmentação de mercados, de públicos e da mídia, introdução de novas tecnologias que operam em tempo real, interferência do consumidor e da sociedade na produção, articulação com o ambiente cultural e mudanças climáticas globais, como complementam os autores: A conjuntura contemporânea, portanto, é marcada pela intensificação da globalização, pelo desenvolvimento constante de novas tecnologias da comunicação e informação, pelas crescentes pressões sociais, bem como pela valorização estratégica da articulação e variáveis culturais (PEREIRA, COSTA, MURAD et al, 2009, p. 294). O cenário cada vez mais complexo impõe mudanças também nos processos de comunicação que, para Pereira, Costa, Murad et al (2009, p. 302) precisam ir além da instância das mídias, sejam elas tradicionais, digitais ou alternativas. Segundo os autores, as organizações devem desenvolver os seus processos de comunicação planejando duas políticas, estratégias e ações “em busca da licença social de operação e da sustentabilidade organizacional”. As propostas de Porter e Kramer (2011) e Pereira Costa, Murad et al (2009) sinalizam para mudanças que ocorrem nas relações entre a sociedade e as organizações. Porter e Kramer (2011) citam as transformações nos sistemas de produção e no redirecionamento de negócios, bem como nas estratégias de gestão, como condições para que as empresas tenham retorno financeiro de forma a gerar valor também para a sociedade. A abordagem de Pereira, Costa, Murad et al (2009, p. 293) trata com mais ênfase da diluição das fronteiras entre as organizações e o seu território, como decorrência da presença maciça das novas tecnologias de informação e comunicação. Os autores citados explicam que optaram pela expressão comunicação organizacional porque “ela é capaz de se referir tanto a empresas públicas quanto privadas ou organizações do terceiro setor, independente de seu porte (pequeno médio ou grande”. (KUNSCH, 1986, 1997 apud Pereira, Costa, Murad et al, 2009) 10 PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) Nesse contexto, segundo os autores, os “fatores comunicacionais e culturais emergem como vetores fundamentais para agregar valor às organizações me seus territórios”. Afinal, como afirma (Hardt, 2012, p. 56) muito mais do que estruturas centralizadas e burocráticas, voltadas à economia de escala e à produção em massa as organizações do século XXI caminham para se tornar um ecossistema relacional capaz de realizar trocas permanentes com o seu ambiente, o que nos remete à metáfora do organismo vivo (Morgan, 2007). Diante dos pontos de vista expostos, como se dará o processo de comunicação e relacionamento entre as organizações e a sociedade, especialmente os seus públicos de interesse? É esse aspecto que abordaremos com mais profundidade a seguir, por meio dos pontos de vista de autores como Kunsch (2009), Grunig (2011) e Ferrari (2011). Um novo papel para as organizações As perspectivas de Grunig (2011), Ferrari (2011), Kunsch (2009) e Pereira, Costa, Murad et al (2009) apontam para alguns caminhos sobre como a comunicação deve se posicionar nesse novo cenário. A partir dos entendimentos desses autores é possível destacar como ponto em comum a importância de se considerar a interdependência ou correlação entre as organizações/atividade empresarial e a sociedade/stakeholders para o estabelecimento de estratégias de negócios e comunicacionais. Ferrari (2011, p. 143) utiliza o termo vulnerabilidade para descrever a situação de fragilidade a que as organizações estão submetidas no mundo globalizado, o que se dá em diferentes níveis e a partir da grau de influência de dois fatores: a) os riscos externos, constituídos pelos efeitos de acontecimentos com origem nos seus micro e macro ambientes, com impacto no desempenho dos seus negócios e qualidade de relacionamento com os seus públicos b) internos, que são decorrência do “enfraquecimento de laços de confiança interpessoal dos trabalhadores e das percepções que eles têm sobre a organização”. Tendo em vista a dependência cada vez PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) mais relevante de variáveis sociais, econômicas, políticas, culturais e tecnológicas, as organizações não tiveram outra alternativa a não ser “modificar as suas práticas administrativas e seus modelos de gestão para garantir a sua sustentabilidade e a conquista dos seus objetivos”. Na visão da pesquisadora, uma organização bem sucedida na articulação desses fatores torna-se menos vulnerável e está mais apta a aproveitar as oportunidades de mercado que possam fortificá-la. A partir desse contexto, as organizações deveriam exercer a sua função política contribuindo para a manutenção do sistema social do qual fazem parte, migrando da lógica econômica para a lógica social (Simões, 1995, apud Ferrari, 2011, p. 141), conforme a explicação de Ferrari: Isso pressupõe a incorporação de novos valores decorrentes do redirecionamento do foco dos negócios: o lucro importa, mas já não é suficiente. Importa também que, no cumprimento de sua função, as organizações incluam em seus objetivos estratégicos as contribuições que elas podem dar para a sobrevivência do sistema social, contemplando questões como desenvolvimento sustentável, responsabilidade social, direito do consumidor e exercício pleno da cidadania. (FERRARI, 2011, p. 141). Na medida em que adotam um modelo de gestão mais colaborativo com a sociedade, as organizações passam a demandar transformações no processo de comunicação. Ao defender a adoção de uma “filosofia de “comunicação integrada’”, Kunsch (2009, p. 79-80) enfatiza que o modelo de comunicação a ser colocado em prática deve levar em conta “as demandas, os interesses e as exigências dos públicos estratégicos e da sociedade”. E conclui: “estudar, compreender e praticar a comunicação organizacional, portanto, é muito mais complexo do que se possa imaginar”. Na visão da pesquisadora, no cenário de transformações na sociedade, com impacto também nas organizações, o papel estratégico da comunicação se sobrepõe ao tático, priorizando a filosofia da integração e não da sua divisão em subáreas. Em sua análise sobre como deveria se dar o processo comunicativo em um cenário no qual as organizações precisam dialogar com a sociedade, Pereira, Costa, Murad et al (2009, p. 302) chamam a atenção para a importância das relações públicas. Com a mudança nos papéis dos atores sociais, a comunicação estaria se voltando a essa área PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) de conhecimento e à sua função de articulação das “redes de relacionamento com foco na construção da reputação (baseada na identidade organizacional) [...]”. A ideia central de Pereira, Costa, Murad et al (2009) é que a comunicação voltada ao mercado – marketing -, que foi determinante no passado, já não atende às demandas atuais. A comunicação volta-se, em certo sentido, aos primórdios das ‘relações públicas’. A nova perspectiva institucional ganha forma ao lidar com a organização por seu viés imaterial, simbólico, de articulação de discursos (e práticas). Em outras palavras, uma organização que precisa dialogar com a sociedade na qual está inserida. (PEREIRA, COSTA, MURAD et al, 2009, P. 302) A visão de Grunig (2011) vem reforçar esse atributo, ao conferir às relações públicas o papel de construir alianças e dar voz aos públicos estratégicos em decisões da organização que os impactem. Trata-se de uma postura que não pode ser entendida como marketing ou função gerencial. Por meio do seu trabalho, os profissionais da área compreendem que precisam ouvir as demandas das pessoas que são impactadas pelas atividades empresariais e, dessa forma, satisfazem também os interesses dos seus próprios empregadores. A expectativa é que essa maneira de conduzir o processo de relacionamento tenha como resultado a criação de valor para a organização, o que ocorre por meio do equilíbrio dos interesses das empresas e dos seus stakeholders. A atividade trata do gerenciamento da comunicação entre uma organização e todos os seus públicos – empregados, membros da comunidade, investidores, colaboradores, representantes do governo e agências reguladoras, bem como os clientes e a mídia. A essência das Relações Públicas é tornar a organização e seu quadro gerencial mais responsável perante aqueles públicos que influenciam e, nesse sentido, a atividade de relações públicas é o exercício da responsabilidade pública (GRUNIG, 2011, p. 40) A construção de culturas organizacionais que levem em consideração a correlação entre as organizações e a sociedade depende da qualidade dos relacionamentos que a empresa estabelece com os seus entornos interno e externo. O engajamento dos stakeholders tornou-se indispensável para a competitividade, junto com a política de preços, qualidade e inovação mas, para que o seu envolvimento seja efetivo, a organização precisa transmitir confiança, o que implica na construção de uma PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) missão que seja nobre mas também crível para os seus públicos. (Nakagawa, 2012). Por outro lado, ser possuidora de uma rede de relacionamentos de qualidade valoriza a organização, segundo análise de Caridade (2012, p. 68), com base na Teoria do Stakeholder, de Freeman: [...] o que cria valor para os negócios são as interações entre esses diversos grupos de stakeholders (tais como clientes, fornecedores, comunidade financeira, comunidades) nas atividades que compõem uma empresa. (CARIDADE, 2012, P.68) A construção de relacionamentos saudáveis e comprometidos com os princípios e metas da organização só é possível por meio do diálogo, definido por FRANÇA (2011, P. 265) como a “estratégia maior dos relacionamentos”. O diálogo é entendido pelo autor como a capacidade que têm as partes envolvidas de ouvir e compreender pontos de vista divergentes e, por meio da negociação, chegar a um consenso. No entanto, para que haja diálogo, os relacionamentos entre a organização e os seus públicos devem ser simétricos, de acordo com os modelos estabelecidos por Grunig e Hunt (1984 apud Grunig, 2011, p. 37). O estudo desses dois autores estabeleceu quatro modelos de relações públicas. O primeiro deles – agência de imprensa/divulgação – tem como único objetivo obter “publicidade favorável para uma organização ou indivíduos na mídia de massa”. O segundo modelo – informação pública – é semelhante ao primeiro e entende a atividade de relações públicas apenas como “disseminação de informações”. Nenhum dos dois está baseado em reflexão estratégica. O terceiro modelo – assimétrico de duas mãos – evolui ao utilizar a “pesquisa para desenvolver mensagens que provavelmente conseguirão induzir os públicos a se comportarem como a organização espera”. É o quarto modelo – simétrico de duas mãos – que, além de utilizar a pesquisa, permite que a definição “do que é correto seja objeto de negociação”. Grunig e Hunt (1984 apud Grunig, 2011, p. 38), os relacionamentos simétricos utilizam a “comunicação para administrar conflitos e aperfeiçoar o entendimento com públicos estratégicos”. Considerações Finais PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) A partir das análises feitas pelos pesquisadores consultados, é possível concluir que a comunicação tem diante de si transformações de cenário que exigem estratégias atentas às articulações entre organizações e sociedade. Nesse sentido, conceitualmente, devido à sua função de criar e manter vínculos produtivos entre as organizações e seus stakeholders, a área das relações públicas surge como a mais apropriada para apoiar as empresas (sejam elas públicas, privadas, de capital aberto ou fechado, de qualquer dimensão) no permanente processo de trocas com seus públicos estratégicos, em última instância, com a sociedade. Tal contexto indica a necessidade de um entendimento cada vez mais abrangente da conjuntura interna e externa das organizações, que considere a perspectiva de diversas áreas de conhecimento. Se tomarmos como exemplo o princípio do valor compartilhado, de Porter e Kramer, já é possível perceber uma forte mobilização internacional visando estimular a sua adesão por um número cada vez maior de empresas. O movimento a favor desse princípio é liderado pela Foundation Strategy Group11 - FSG. Criada no ano 2000 a entidade atua em pesquisa e consultoria em várias áreas da gestão e administração sendo uma delas dedicada exclusivamente ao engajamento em torno do valor compartilhado12. Companhias como Coca Cola, Nestlé, HP, Verizon, Intel, Arauco etc., de uma forma ou outra, vem apoiando a iniciativa. 13 Essas organizações, por meio de sua cadeia de valor, tendem a ampliar a disseminação da cultura do valor compartilhado ao redor do mundo. As micro e pequenas empresas (MPEs) estão sendo sensibilizadas por meio do Sebrae que colocou o assunto na agenda de um evento realizado em maio de 2014, com o objetivo de discutir negócios entre grandes empresas e MPEs. Para a comunicação essas transformações significam novos desafios e também caminhos a seguir. Nesse sentido, as metáforas da máquina e do organismo, 11 http://www.fsg.org http://www.sharedvalue.org 13 A relação completa, bem como o perfil das organizações que possuem algum vínculo com a proposta de valor compartilhado encontra-se disponível em http://www.sharedvalue.org/partners/funders. Acesso em 12/07/2014. 12 PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) consideradas centrais na teoria das organizações por Morgan (2007, p. 22), são inspiradoras. Enquanto na metáfora da máquina as organizações funcionam como estruturas estanques e fechadas, na metáfora do organismo, são similares aos seres vivos, “em constante fluxo e mutação, interagindo com o ambiente na tentativa de satisfazer as suas necessidades”. É no sentido da metáfora do organismo que as organizações devem seguir, como sugerem as análises de Ferrari, Kunsch, Pereira Costa, Murad et al além de Porter e Kramer. Referências Bibliográficas CARIDADE, Annelise Vendramini. Estratégias corporativas para a sustentabilidade: Estudos de casos múltiplos. São Paulo, SP, 2012. Tese (Doutorado). Faculdade de Economia e Administração. Universidade de São Paulo. FERRARI, Maria Aparecida. O cenário das organizações como sistemas de significados socialmente construídos. In: Relações Públicas. Teoria, contexto e relacionamentos. São Caetano do Sul. SP: Difusão, 2011. FRANÇA, Fábio. Relacionamentos Corporativos. In: Relações Públicas. Teoria, contexto e relacionamentos. São Caetano do Sul. SP: Difusão, 2011. GRUNIG, James E. Uma Teoria Geral das Relações Públicas: quadro teórico para o exercício da profissão. In: Relações Públicas. Teoria, contexto e relacionamentos. São Caetano do Sul. SP: Difusão, 2011. HARDT, Stuart. O Futuro, e baixo para cima. In: Inovação e Sustentabilidade. Bases para o Futuro dos Pequenos Negócios. Sebrae (Org.) São Paulo, SP, 2012. KUNSCH, Maria M. Krohling. Pressupostos teóricos para pensar e compreender a comunicação organizacional. In: KUNSCH, Maria M. Krohling (Org). Comunicação Organizacional: histórico, fundamentos e processos, Volume 1. São Paulo. SP: Saraiva, 2009. MORGAN, Garret. Paradigmas, metáforas e resolução de quebra-cabeças na teoria das organizações. In: CALDAS, Miguel P; BERTERO, Carlos Osmar (Coord.) Teoria das Organizações. São Paulo. SP: Atlas, 2007. NAKAGAWA, Marcelo. Plano de negócio sustentável: princípios, conceitos e aplicações. In: AMATO NETO, João (Org). Sustentabilidade e Produção. São Paulo, SP: Atlas, 2011. PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014) PEREIRA, Carlos Alberto M.; COSTA, Carlos Victor; MURAD, Eduardo Guerra; AMBRÓSIO, Vicente. 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