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DESTAQUE
Semanário Económico 7
MARÇO 2008
Energia | No final do mês, os consumidores de electricidade podem finalmente passar a produzir e vender à rede eléctrica a sua
própria energia. Saiba o que muda com a nova legislação e que modelos e equipamentos melhor se adaptam ao seu caso
Energias renováveis: como
poupar, investir e ganhar
Catarina Madeira
e Paulo Zacarias Gomes
[email protected]
Quando Olímpio Guedelha investiu na colocação de um
painel fotovoltaico, de um painel
solar de aquecimento e de uma
microturbina eólica, a sua intenção era apenas reduzir a factura e
a dependência energética da sua
família. Mas a estratégia de poupança acabou por resultar numa
ideia de negócio. Hoje é este economista, de 52 anos, que aconselha aos seus clientes os mesmos
equipamentos que instalou. E
prepara-se para, no fim deste
mês, ser um dos primeiros portugueses a entrar no Sistema de Registo de Microprodução de electricidade, podendo assim vender
à rede o excedente de electricidade que produz.
“Andei anos atrás da EDP para
me autorizarem a utilizar a energia produzida por mim. Dava um
livro!”, desabafa. Basta um toque
num interruptor para que, agora,
lhe seja possível escolher entre
comprar electricidade à rede ou
usar a que produz.
depois do adiamento de um mês
– que 27 de Março seja a data
para a entrada em funcionamento do site Renováveis na
Hora, que permitirá fazer o registo dos microprodutores num
sistema que já está legislado
desde 2002, mas que nunca
atingiu a expressão desejada.
Agora, para estimular a adesão,
o Governo resolveu aplicar um
regime bonificado, com preços
mais atractivos de venda de
energia à rede.
Miguel Matias, CEO da empresa
de serviços energéticos Self
Energy, estima que durante o
Reuters
Registo de consumidores/produtores ainda este mês. Tudo indica –
l Alguns especialistas afirmam que, apesar de exigir mais investimento, o fotovoltaico é aquele que oferece mais garantias de retorno l
“Será possível acumular
energia, comprando-a mais
barata à noite, e vendendo-a
quando é mais cara”,
diz Carlos Pimenta
primeiro ano a legislação venha
a abranger quatro mil famílias,
no total de 10 megawatts vendidos à rede. O que dá uma média
de 2,5 quilowatts (kW) por habitação. Contudo, nem só as famílias podem beneficiar deste
novo regime. Qualquer edifício
– seja uma pequena ou média
empresa ou um particular –
pode instalar o equipamento e
vender energia à rede, tendo
unicamente como tecto os 3,68
kW de produção para entrega à
rede.
Carlos Pimenta, ex-secretário de
Estado do Ambiente, considera
esta legislação um “bom começo”,
já que acredita que as redes eléctricas do futuro serão muito diferentes. “Cada vez mais, os consumidores serão produtores. Numa
segunda fase, será possível acumular energia, comprando-a à
noite quando é mais barata, e
vendendo-a nas horas de maior
consumo, quando é mais cara”. É,
segundo Carlos Pimenta, “o começo de uma revolução, comparável ao surgimento de fenómenos como o YouTube no universo
das telecomunicações”.
Este processo poderá ser feito
através de acumulação de energia
numa bateria eléctrica, por
exemplo num automóvel. Já o
preço poderá ser monitorizado
pela Internet, permitindo ao consumidor comprar e vender ener-
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gia à rede quando for mais rentável. O seu caso é um bom exemplo: por ano, os painéis fotovoltaicos instalados em sua casa permitem-lhe vender à rede energia
no valor de quatro mil euros, ainda ao abrigo da lei de 2002. Com
a entrada em vigor da nova legislação (aprovada em 2007), o limite máximo para venda, no seu
caso, será de três mil euros.
O investimento médio para ter
um sistema combinado de microgeração ronda, segundo uma pesquisa de mercado, os 32 mil euros, com retorno médio garantido
em seis anos. Mas 11 mil euros
são suficientes para adquirir um
sistema mais simplificado (colector solar e aerogerador, por exemplo). No caso do colector solar
térmico, o investimento inicial
pode ser dedutível até 761 euros
no IRS. A pensar neste novo mercado, a empresa criou uma unidade dedicada – a Self Enery Solutions – e disponibiliza no seu site
um simulador para ajudar o consumidor a escolher as soluções
mais adequadas.
Soluções financeiras à medida das
renováveis. Os bancos também
criaram soluções financeiras para
aproveitar este segmento de mercado, permitindo ao consumidor
pagar o investimento em todos os
equipamentos num prazo de seis
anos, garantindo que o montante
despendido mensalmente seja
equivalente ao valor ganho com a
venda de energia à rede. Assim,
no final do período de retorno e
até ao fim da vida útil do equipamento (cerca de 25 anos), todos
os ganhos são líquidos, “ainda
que a performance do equipamento possa decrescer ligeiramente a partir dos 20 anos”, explica Miguel Matias. O Banco Espírito Santo disponibiliza um
produto semelhante às empresas,
financiando até um máximo de
um milhão de euros, num prazo
máximo de dez anos.
Com a instalação do equipamento de microprodução em sua
casa, Olímpio Guedelha assegura
hoje 30% a 40% das necessidades
energéticas da família, constituída por seis pessoas. E não se mostra arrependido por ter realizado
um investimento de 23 mil euros.
Apesar de não ter adoptado medidas de eficiência energética
quando construiu a sua casa –
“Nessa altura ainda não se falava
muito desses assuntos”, reconhece –, hoje aplica princípios de
Investir e ganhar
com a microgeração
32.000
euros
é o investimento médio num microssistema de geração de energia renovável (painel solar térmico, painel fotovoltaico e
turbina eólica)
5.500
euros
é a poupança média anual resultante da
utilização destes equipamentos na geração de energia e na sua venda à rede
6 anos
de retorno
é o período de tempo que levará a perfazer o investimento realizado nos equipamentos de microgeração, com a venda
de electricidade à rede
aproveitamento como a recolha
de águas pluviais em poços, para
utilização sanitária. À semelhança de Portugal, Espanha aprovou
recentemente legislação para estimular a utilização da energia fotovoltaica, o que vai aumentar as
oportunidades também no mercado vizinho. E levar à agregação
de produtores destas tecnologias.
Por cá, explica Miguel Matias, “o
surgimento de clusters (ver texto
na página 8) é uma hipótese realista”, já que “somos dos países
que tem melhores condições para
instalar estes equipamentos e,
logo, para os desenvolver. Espero
que o Governo avance nessa perspectiva”, defende.
Menos incentivos para utilizar
estas formas de obter energia têm
tido os grandes edifícios (como
escolas, hospitais, piscinas, hotéis
e grandes empresas), com maior
necessidade de eficiência energética, embora tenham características (mais área) para produzirem
energia em maior quantidade.
Nos grandes edifícios públicos, o
Estado – que tem infra-estruturas
com menos eficiência energética
– não tem tido a mesma política
que quer incutir aos outros consumidores. Mas, Olímpio Guedelha não precisou de esperar pelo
incentivo estatal para investir em
tecnologias que lhe permitem
poupar e, em breve, lhe darão
também a ganhar. Fundos de investimento
com “boa” energia
O tema das energias CINCO FUNDOS DE INVESTIMENTO
renováveis deixou de
Performance
ser uma preocupação
a 12 meses
exclusiva de
Merrill Lynch News Energy
11,6
ambientalistas e passou Credit Suisse Future Energy
9,6
a ser um tema da moda Caixagest Energias Renováveis
1,06
no mundo dos
Pictet Clean Energy
-1,12*
investimentos. A alta
Parworld Environment
-8,1
dos preços do petróleo Oppportunities
e a preocupação
Fonte: Morningstar*O fundo só foi lançado em Maio de 2007
crescente com o tema
das alterações climáticas
tem levado muitos investidores a olharem para as energias
renováveis como um filão. A oferta de fundos de investimento
que apostam em empresas que desenvolvem tecnologias e
produtos baseados em energias limpas tem aumentado. Foi o
caso da Pictet e do Banif (embora neste caso se trate de um
fundo fechado). E embora este sector não tenha escapado à
“tempestade” que tem afectado as bolsas desde o início do ano,
existem alguns fundos que resistiram às quedas. É o caso do
Merrill Lynch New Energy (11,6%) e do Credit Suisse Future
Energy (9,6%). Contas feitas, os retornos médios dos cincos
fundos de investimento com maior exposição ao tema
das energias renováveis atingiram os 2,6% nos últimos 12
meses. Já o índice MSCI World caiu 8,3% no mesmo período.
A.B.
Perguntas e Respostas
O que precisa de saber
para começar a produzir
a sua energia
O que é a microgeração?
É a produção, pelo consumidor, de electricidade em baixa
tensão, através de microssistemas de energia renovável. A
sua utilização prioritária é o
autoconsumo e o excedente
pode ser vendido a terceiros.
O limite de produção no regime bonificado é de 3,68 kW e
não pode ultrapassar metade
da potência contratada.
Vivo num prédio. Posso instalar
este tipo de equipamentos?
Sim. Mas tem de haver um espaço mínimo por habitação
ou, se a energia se destinar a
consumo pelas áreas comuns
do edifício tem, primeiro, de
ter o acordo de todos os condóminos e de requerer uma
auditoria energética.
Quanto custa a instalação?
Varia, mas o custo médio de
um painel solar, um colector
solar e uma microturbina eólica ronda os 32 mil euros. O licenciament0 custa 250 euros.
Que alterações tenho de fazer?
Algumas, pequenas e não estruturais. Por exemplo, instalar um contador de saída, que
lhe permitirá saber quanto
vende à rede.
Há incentivos fiscais à compra
destes equipamentos?
Sim, no caso de equipamentos de produção de energia
solar, em sede de IVA e IRC
no caso das empresas e IRS
para os particulares.
Quem faz a instalação?
A um dos instaladores certificados pela Direcção Geral de
Energia e Geologia (DGEG).
Os equipamentos certificados
também constarão de uma
bolsa, actualizada on-line.
Que equipamentos posso instalar?
Microturbinas eólicas, painéis fotovoltaicos ou equipa-
mento para co-geração a biomassa, por exemplo. Mas o registo de microprodução obriga à instalação simultânea um
colector solar térmico para
consumo próprio.
Posso vender a minha unidade de
produção a outro agente, transferi-la ou aumentar a capacidade?
Sim, deve fazer novo registo.
Há vantagem em fazer parte da
primeira vaga de microprodutores?
Sim. O preço de venda à rede
é de 650 euros por megawatt
produzido até ser completado
o primeiro bloco nacional de
10 MW de potência instalada
neste tipo de produção. Os
blocos de produtores seguintes já receberão menos 5%
pela sua produção.
Quem me paga pela energia que
vendo à rede?
O comercializador com quem
assinou o contrato paga-lhe,
mensalmente, por transferência bancária. Haverá uma única transacção registada entre o
que é consumido e produzido
e o comercializador liquidará o
IVA. A lista de comercializadores está no site da DGEG.
Quanto me pagam?
Depende da origem da produção e do regime. No regime
bonificado, nos primeiros 15
anos a energia solar produzida é paga a 100%, a eólica a
70% e a hídrica e a cogeração
a biomassa a 30%.
Posso recorrer a financiamento
para comprar o meu equipamento?
Sim, já há bancos com créditos específicos para este fim.
Sou um pequeno empresário. Posso usufruir deste regime?
Sim. Mas o regime geral (para
entregas até 150 kW) pode ser
mais vantajoso, apesar do preço pago por megawatt produzido ser mais baixo. Infografia: Susana Lopes | [email protected]
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Tecnologias | Há um novo mercado para as empresas, que contam com a criatividade das universidades
Quem está a inovar para entrar
no mercado da microgeração
Universidades e empresas procuram formas mais
eficientes de obter energias renováveis e algumas destas tecnologias vão chegar a casa dos con-
sumidores ainda este ano. Descoberta esta nova
área de negócio, Portugal tem condições para assumir a dianteira na criação de um cluster de
empresas produtoras de equipamentos, com
clientes no mercado nacional e potencial no
mercado europeu, onde há espaço por explorar.
Catarina Madeira
e Paulo Zacarias Gomes
Além de permitir que os
consumidores de energia se
tornem produtores, a nova
legislação para a microgeração cria oportunidades no
mercado das renováveis.
Empresas e universidades
estão atentas e desenvolvem produtos para responder às necessidades do País,
mas para lá da fronteira
também há oportunidades.
No mercado ibérico, nenhuma empresa produz pilhas de hidrogénio para habitação. Mas a SRE, que já
fabrica pilhas de baixa potência para aplicações portáteis, está a trabalhar no
desenvolvimento de uma
solução de um quilowatt
(kW), a potência mínima
necessária para aplicar
uma tecnologia deste género numa casa. Segundo José Campos Rodrigues, administrador da empresa,
este equipamento deverá
estar disponível no mercado até ao final do ano:
“Mas ainda é preciso
DR
[email protected]
testar estes equipamentos
no mercado, para ver se são
comercializáveis”, alerta o
responsável. Contudo, para
que esta tecnologia se enquadre no novo regime, o
hidrogénio a utilizar deverá resultar de outras energias renováveis de produção doméstica, o que exige
a aquisição de um electrolisador, que custa mais do
dobro do preço da pilha. A
viabilidade da pilha-teste de 1
kW está a ser
demonstrada no
abastecimento eléctrico do
escritório da administração
da empresa.
Noutros casos, foi o mercado a pedir às universidades
que desenvolvessem soluções à medida das suas necessidades. Recentemente,
um aluno da Universidade
de Aveiro começou a desenvolver uma tecnologia
para quantificar ventos em
ambiente urbano, a ser utilizada pelos instaladores e
ajudando à escolha das melhores localizações. “A instalação de um equipamento eólico é mais barata, mas
o risco é maior, devido à dificuldade da previsão dos
ventos”, defende Nelson
Martins, professor no departamento de Engenharia
Mecânica da Universidade
de Aveiro (UA). Francisco
Faria, director de microgeração da KW Energia confirma a dificuldade: “Os pedidos para microeólicas são
raros, só os estudos de vento demoram entre um e
três anos e ficam mais caros que as próprias turbinas”. Além do investimento
na fotovoltaica dar mais garantias quanto ao retorno
do investimento, o impacto
ambiental é menor e o conforto é maior, acrescenta o
investigador.
Outro exemplo da participação da UA foi a parceira estabelecida com uma empresa para produzir painéis fotovoltaicos domésticos para
maior aproveitamento da
exposição solar, permitindo
que o custo de produção do
kW/hora seja mais baixo.
Também a Self Energy está a
ponderar investir nesta área
com um parceiro que não
revela, porque ainda está em
fase de negociação. Parcerias que abrem espaço para o
mercado europeu, onde Portugal, pode ocupar um lugar
importante. A empresa
abriu agora, num investimento de 100 mil euros, um
escritório da sua participada
Esco em Londres, na área da
consultoria energética para
grandes empresas, onde o
primeiro cliente vai ser a
embaixada portuguesa.
Outras empresas presentes
neste mercado são a Efacec, na tecnologia para ligação à rede, e a ISA, na
área dos contadores. Eficiência
energética,
a palavra
do momento
Enquanto não
arranca a
microgeração, a
palavra de ordem é
economizar. É o que
têm feito 225 famílias
de todo o País,
acompanhadas pela
Quercus e EDP. No
arranque do projecto,
a associação
ambientalista calculou
o consumo global de
energia em cada casa.
Depois, deu conselhos
na área da construção
para evitar perdas
térmicas (instalação
de vidros duplos,
isolamento das
paredes, climatização
passiva) e alertou para
os desperdícios de
energia, evitáveis com
a utilização racional
de electrodomésticos
como as máquinas de
lavar. Os primeiros
dados referem que,
eliminando o standby
de equipamentos,
foram poupados cerca
de 30 euros na factura
anual, valor que chega
aos 50 euros quando
se adoptam outras
medidas, como a
substituição por
lâmpadas mais
eficientes. O resultado
do EcoFamílias 2008
será conhecido
no final do mês,
explica Filipa Alves,
coordenadora
do projecto.
Infografia: Marta Carvalho | [email protected]
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