Instituto de Estudos para o
Desenvolvimento Industrial
O CUSTO FISCAL DA
ATUAL POLÍTICA ECONÔMICA
Junho/2005
Conselho do IEDI
Abraham Kasinski
Lirio Albino Parisotto
Sócio Emérito
Amarílio Proença de Macêdo
Luiz Alberto Garcia
Andrea Matarazzo
Marcelo Bahia Odebrecht
Antonio Marcos Moraes Barros
Mário Milani
Benjamin Steinbruch
Miguel Abuhab
Carlos Antônio Tilkian
Nildemar Secches
Carlos Francisco Ribeiro Jereissati
Olavo Monteiro de Carvalho
Carlos Mariani Bittencourt
Paulo Guilherme Aguiar Cunha
Carlos Pires Oliveira Dias
Paulo Setúbal Neto
Claudio Bardella
Pedro Eberhardt
Daniel Feffer
Pedro Franco Piva
Décio da Silva
Pedro Grendene Bartelle
Eugênio Emílio Staub
Pedro Luiz Barreiros Passos
Flávio Gurgel Rocha
Rinaldo Campos Soares
Francisco Amaury Olsen
Robert Max Mangels
Hugo Miguel Etchenique
Roberto Caiuby Vidigal
Ivo Rosset
Roberto de Rezende Barbosa
Ivoncy Brochmann Ioschpe
Roger Agnelli
Presidente do Conselho
Jacks Rabinovich
Rogério Pinto Coelho Amato
Jorge Gerdau Johannpeter
Salo Davi Seibel
José Antonio Fernandes Martins
Thomas Bier Herrmann
José Roberto Ermírio de Moraes
Victório Carlos De Marchi
Josué Christiano Gomes da Silva
Walter Fontana Filho
Diretor Geral
Paulo Diederichsen Villares
Membro Colaborador
Paulo Francini
Membro Colaborador
Julio Sergio Gomes de Almeida
Diretor-Executivo
O CUSTO FISCAL DA ATUAL POLÍTICA ECONÔMICA1
Principais Pontos e Conclusões
Uma combinação diferente de política monetária e cambial ampliaria enormemente o alcance
da política fiscal, a qual, presentemente se vê constrangida e limitada em seus efeitos pela
política de juros/câmbio que domina a política econômica. Os necessários ajustes e esforços
adicionais de redução dos gastos públicos teriam nestas condições um impacto muito maior e
contribuiriam para, a médio e longo prazo, assegurar níveis baixos de taxas de juros na
economia brasileira.
Esta é a principal conclusão do estudo que procurou mensurar o impacto fiscal da política
econômica em vigor no Brasil.
O trabalho consistiu na formulação de três cenários hipotéticos de contas públicas nos
próximos 12 meses, com o objetivo de medir os efeitos de pares combinados distintos de taxa
de juros e taxa de câmbio sobre o custo financeiro do setor público brasileiro.
O primeiro desses cenários leva em conta uma taxa Selic de 12% ao ano, associada a uma
taxa de câmbio de R$ 3,20/US$. O segundo associa uma taxa Selic de 14% ao ano com uma
taxa de câmbio de R$ 3,00. Por fim, o terceiro considera a taxa Selic que no corrente mês o
Banco Central estabilizou em 19,75%, e uma taxa de câmbio próxima a que vem vigorando
em média nos últimos meses, ou seja, R$ 2,45.
Logicamente, os pares foram tomados arbitrariamente, mas significam combinações que
vários economistas, de diferentes tendências e escolas, consideram possíveis em termos de
políticas de câmbio e juros. A última combinação equivale à que a política econômica
atualmente em vigor no Brasil “escolheu” como a combinação ideal para a economia
brasileira.
Quanto ao custo de juros, ou seja, o custo anualizado da dívida, este no 1o cenário (taxa Selic
de 12%) seria de R$ 103 bilhões, ou R$ 61 bilhões a menos que no 3o cenário, ou seja, o
cenário equivalente à política monetária em vigor (Selic de 19,75%). Na hipótese de taxa
Selic de 14% ao ano (2o cenário), o custo da dívida anualizado seria de R$ 119 bilhões ou
R$ 45 bilhões a menos que no cenário da política econômica atual. Neste último caso, o custo
sobe para R$ 164 bilhões. Em percentagem do PIB projetado para os próximos doze meses,
essas reduções do custo da dívida redundariam em economias expressivas: no primeiro caso
(R$ 61 bilhões a menos, equivalente ao 1o. cenário) 3% do PIB e, no segundo (R$ 45 bilhões,
equivalente ao 2o. cenário), 2,2% do PIB.
Com relação ao impacto do câmbio sobre a dívida pública dolarizada o estudo estimou
que uma paridade de R$ 3,00 por US$ significaria um custo adicional de R$ 20,5 bilhões
para as contas públicas com relação ao cenário no. 3 próximo, ou seja, o cenário próximo
à situação atual (R$ 2,45 por US$). Já uma taxa de câmbio de R$ 3,20 elevaria esse custo
em R$ 27,4 bilhões.
1
Trabalho preparado por Geraldo Biasoto Junior, Professor do Instituto de Economia da UNICAMP e Ana Paula
Higa, Mestre em Economia pela mesma instituição.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
1
A síntese dos impactos mostra que uma menor taxa Selic proporcionaria uma diminuição
significativa no déficit público ainda que houvesse um impacto maior da desvalorização
cambial. Sempre considerando o par de juro e câmbio correspondente à orientação da política
econômica atual (3o. cenário), na primeira alternativa, vale dizer, no par combinado taxa Selic
de 12% e câmbio de R$ 3,20, haveria redução no déficit público de quase R$ 32 bilhões. Com
uma Selic de 14% e câmbio de R$ 3,00, o déficit público diminuiria em R$ 24,5 bilhões em
relação ao par atual, ou seja, Selic 19,75% e câmbio a R$ 2,45.
Os valores encontrados no exercício são coerentes com a noção cada vez mais generalizada de
que as contas fiscais brasileiras são muito sensíveis às mudanças nos principais preços da
economia (câmbio e juro). Vale notar que uma alteração na combinação juro-câmbio poderia
reduzir os custos fiscais das políticas macroeconômicas em valores que vão de 1,2% PIB a
1,6% do PIB. Logicamente, estas mudanças tornariam possível uma readequação dos
patamares de investimentos governamentais em setores estratégicos para a economia.
Alternativamente, dados os mesmos níveis atuais de superávit primário, as mudanças
viabilizariam níveis muito baixos e próximos a zero de déficit global do setor público (ou
seja, o déficit nominal), o que contribuiria para uma redução mais rápida da relação
dívida/PIB e, além disso, para uma queda também mais rápida do risco país e,
conseqüentemente, das taxas de juros internamente.
É evidente que uma combinação alternativa de juros/câmbio também seria melhor do ponto de
vista do crescimento do produto, em função tanto da menor taxa de juro quanto de uma moeda
nacional mais desvalorizada, o que estimularia as exportações. Nem seria necessário sublinhar
que a própria dinâmica da dívida líquida seria favorecida com a perspectiva de maior
crescimento econômico. Adicionalmente, na medida em que uma outra composição de
juros/câmbio liberasse recursos públicos anteriormente necessários para equacionar as
necessidades de financiamento do setor público, a economia brasileira teria potencialmente
um crescimento não só maior, como melhor ou de superior qualidade devido ao aumento do
investimento do governo em infra-estrutura. Ao lado disso, a ampliação das inversões do setor
privado e, conseqüentemente, do produto potencial da economia, contribuiria para reduzir os
eventuais riscos presentes e futuros de aumento da taxa de inflação.
Levar em conta os fatores acima assinalados – notadamente o impacto fiscal - na execução
das políticas de câmbio e juros é a principal recomendação para uma próxima revisão da
política econômica brasileira.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
2
1. A Situação Fiscal
Nos últimos anos, a política fiscal no Brasil passou a ser crucial para o conjunto da política
econômica. A geração de superávits primários pelo setor público (ou seja, o resultado fiscal
excluído o pagamento de juros) transformou-se na condição de equilíbrio para os modelos
macroeconômicos e para as expectativas do mercado, quase sintetizando a existência de
fundamentos sólidos na economia.
As metas estabelecidas para o superávit primário têm sido cumpridas com folga. Em abril, o
setor público registrou um superávit primário (receitas menos despesas, excluindo pagamento
de juros) de R$ 16,3 bilhões. Este foi o melhor resultado mensal desde que o Banco Central
iniciou a série, em 1991, e superou em R$ 4,4 bilhões o superávit obtido em abril de 2004. O
governo central (constituído pelo Tesouro Nacional, a Previdência Social e o Banco Central)
contribuiu com um superávit de R$ 14,3 bilhões, enquanto nos governos regionais (estados e
municípios) e nas empresas estatais o resultado foi positivo em R$ 1,8 bilhão e R$ 219
milhões, respectivamente.
É fato que os números de abril refletem fatores sazonais, tais como: o pagamento da primeira
cota ou cota única do Imposto de Renda Pessoa Física relativo à declaração de ajuste do ano
calendário de 2005; a primeira cota ou cota única do Imposto de Renda Pessoa Jurídica e
Contribuição Social sobre Lucro Líquido referente à apuração trimestral encerrada em março de
2005; o pagamento trimestral referente a royalties de exploração de petróleo e gás natural. Mas,
ainda assim, não podem deixar de ser considerados excelentes e até certo ponto, surpreendentes.
No ano até o mês de abril de 2005, o superávit primário do setor público consolidado somou
R$ 44 bilhões ou 7,3% do PIB, números que superam largamente os também excelentes
resultados apurados no mesmo período do ano passado: R$ 32,4 bilhões e 6,1% do PIB. Com
relação à meta de superávit primário estabelecida para o 1o quadrimestre do corrente ano, esta
foi cumprida com uma folga de R$ 8,2 bilhões.
Tabela 1: Composição do Superávit Primário do Setor Público - Em R$ Bilhões – 2004 e 2005
Primário
Governo Central
Governo Federal
Banco Central
Previdência Social
Governos Regionais
Governos Estaduais
Governos Municipais
Empresas Estatais
Empresas Estatais Federais
Empresas Estatais Estaduais
Empresas Estatais Municipais
Abril
R$ bi
11,90
7,56
9,65
-0,01
-2,09
1,84
1,73
0,12
2,50
2,48
0,02
-0,01
2004
Jan-Abr
R$ bi
% do PIB
32,43
6,10
25,54
4,80
34,14
6,42
-0,04
-0,01
-8,56
-1,61
6,62
1,24
5,95
1,12
0,67
0,13
0,27
0,05
-1,04
-0,20
1,28
0,24
0,03
0,01
Abril
R$ bi
16,34
14,31
16,33
-0,01
-2,01
1,81
1,70
0,11
0,22
-0,45
0,65
0,02
2005
Jan-Abr
R$ bi
% do PIB
44,01
7,26
32,15
5,30
42,75
7,05
-0,01
0,00
-10,60
-1,75
9,25
1,53
6,92
1,14
2,34
0,39
2,61
0,43
0,77
0,13
1,79
0,30
0,05
0,01
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2005.
Em função do excelente superávit primário obtido em abril, o déficit nominal (este, ao
contrário do resultado primário, leva em conta o pagamento de juros) alcançou R$ 3,5 bilhões
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
3
contra R$ 2 bilhões no mesmo mês do ano passado. No acumulado do ano, o resultado
nominal foi negativo (houve déficit) em R$ 7,2 bilhões ou 1,2% do PIB, números piores do
que os R$ 8,8 bilhões ou 1,7% do PIB obtidos no mesmo período de 2004.
A piora do resultado nominal, a despeito do maior esforço fiscal do governo, deveu-se ao
aumento do pagamento de juros, que passou de R$ 41,3 bilhões nos quatro primeiros meses
de 2004 para R$ 51,2 bilhões no 1o quadrimestre de 2005, uma variação de 24%. Esse custo
adicional de R$ 10 bilhões para os cofres públicos decorreu, por seu turno, principalmente do
aumento da taxa Selic. Vale lembrar que no período janeiro-abril de 2004, esta taxa em
termos efetivos médios foi de 16,2%. No entanto, no mesmo período de 2005, fruto dos
aumentos da taxa de juros que o Banco Central promoveu desde setembro de 2004 até abril do
corrente ano, alcançou 18,7%. Por outro lado, a apreciação cambial ocorrida no primeiro
quadrimestre de 2005 contribuiu para arrefecer as pressões sobre o pagamento de juros. A
cotação média do dólar no período janeiro/abril de 2005 (R$ 2,60), foi 11,3% menor do que a
média equivalente ao mesmos meses de 2004 (R$ 2,93).
Devemos sublinhar que os R$ 51,2 bilhões de pagamento de juros no 1o quadrimestre de 2005
correspondem a nada menos do que 8,44% do PIB (7,75% do PIB no mesmo período de
2004). E que o percentual de 8,44% do PIB representa 23% da carga tributária estimada
atualmente para o Brasil em 36,5% do PIB. Ou seja, esses números querem dizer que, em
sendo mantida a atual combinação de taxa de juros/câmbio, o pagamento de juros pelo setor
público brasileiro absorverá quase ¼ de tudo o que os brasileiros pagam em impostos e
contribuições ao setor público.
Brasil - Necessidade de Financiamento do Setor Público (% do PIB)
Fluxo Acumuldo em Doze Meses
12
10,30
10
7,49
8
6,14
6
4
2,47
2
0
-2
-4,32
-4
-5,03
Nominal
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
Juros
abr/05
dez/04
ago/04
abr/04
dez/03
ago/03
abr/03
dez/02
ago/02
abr/02
dez/01
ago/01
abr/01
dez/00
ago/00
abr/00
dez/99
ago/99
abr/99
dez/98
-6
Primário
4
Brasil - Necessidade de Financiamento do Setor Público (% do PIB)
Fluxo Acumulado no Ano
16
14
12
10
8,44
8
7,26
6
4
2
1,18
0
-2
-4
-6
-8
-7,26
Nominal
Juros
abr/05
dez/04
ago/04
abr/04
dez/03
ago/03
abr/03
dez/02
ago/02
abr/02
dez/01
ago/01
abr/01
dez/00
ago/00
abr/00
dez/99
ago/99
abr/99
dez/98
-10
Primário
No corrente ano de 2005, a dívida líquida do setor público quase não se alterou em termos
nominais, passando de R$ 957 bilhões em dezembro de 2004 para R$ 956,7 bilhões em abril
de 2005. No entanto, acusou significativa redução na relação com o PIB, de 51,6% para
50,1%. Esta melhora da relação dívida-PIB deve ser atribuída, primordialmente, ao
crescimento econômico, fator que concorreu em 1,5% pontos percentuais do PIB para a
redução, enquanto a apreciação cambial contribuía para a queda da relação em 0,3% pontos
percentuais do PIB. Vale notar que a contribuição da geração de superávit primário (-2,3
pontos percentuais do PIB) nem mesmo logrou compensar o pagamento de juros nominais,
este um fator que concorreu para uma elevação de 2,7% pontos percentuais do PIB.
A análise de um período mais longo mostra que a trajetória da relação dívida-PIB vem sendo
condicionada principalmente pelo crescimento econômico, pela taxa de juro e de câmbio. Em
2002, por exemplo, um ano de forte turbulência financeira, quando ocorreu uma grande
desvalorização do Real, o ajuste cambial causou uma pressão pela elevação da dívida de 9,3
pontos percentuais do PIB. Já a evolução do PIB, tomada do ponto de vista nominal, exerceu
pressão contracionista de 11 p.p. do PIB. Ou seja, por maiores méritos que o ajuste fiscal
possa ter – e este mérito não deve ser minimizado -, seu alcance foi limitado na determinação
da relação dívida-PIB, cujo acréscimo neste ano chegou a 2,9% pontos percentuais do PIB.
O mesmo vale para 2003. Neste caso, a fragilidade do comportamento da economia real fez
com que a evolução do PIB tivesse um papel nulo. O efeito combinado do juro em elevação e
da taxa de câmbio em valorização, foram os determinantes básicos do comportamento da
relação dívida-PIB. Enquanto a valorização cambial foi fator de redução da dívida em 4
pontos percentuais do PIB, os juros nominais representaram fator expansivo de nada menos
do que 9,1 pontos percentuais do PIB. Novamente, o superávit primário, embora maior,
influiu na configuração global da relação dívida líquida/PIB, mas não evitou o aumento desta
em 1,7% pontos percentuais do PIB.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
5
Apenas em 2004 o ajuste fiscal traduziu-se em queda da relação dívida-PIB. O efeito
crescimento nominal do PIB foi responsável por uma pressão de redução da dívida de 7,9%
do PIB e mais do que compensou o efeito estimado em 6,9% do PIB que os juros nominais
exerceram sobre a dívida. Ao mesmo tempo, a valorização do dólar produziu um novo ajuste
cambial, agora de 0,9% do PIB para redução da dívida. Estes fatores - crescimento econômico
e ajuste cambial - foram determinantes para a redução global da dívida de 5,6% do PIB,
produzindo um resultado maior do que a contribuição do superávit primário, que foi de 4,4%
do PIB no período.
Dívida Líquida do Setor Público (% PIB)
64
61,7
62
60,5
60
57,3
58
57,3
55,7
56
54,2
54,2
54
52
50,5
50,5
52,2
50
50,09
48,4
48
47,1
46
44
41,7
42
abr/05
dez/04
ago/04
abr/04
dez/03
ago/03
abr/03
dez/02
ago/02
abr/02
dez/01
ago/01
abr/01
dez/00
ago/00
abr/00
dez/99
ago/99
abr/99
dez/98
40
Tabela 2: Fatores Condicionantes da Dívida Líquida do Setor Público - Em R$ Milhões - 2002 a 2005
Ano
Dívida Líquida Total - Saldo
Dívida Líquida – Var. Ac. Ano
Fatores condicionantes:
NFSP
Primário
Juros nominais
Ajuste cambial
Dív. Interna Index. Câmbio
Dív. Externa – Metodológico
Dív. Externa - Outros Ajustes
Reconhecimento de Dívidas
Privatizações
Efeito Cresc. PIB - Dívida
2002
Saldos % do PIB
881.108
55,5
220.241
2,9
220.241
13,9
61.614
3,9
-52.390
-3,3
114.004
7,2
147.225
9,3
76.662
4,8
70.564
4,4
753
0,1
14.286
0,9
-3.637
0,2
-11,0
2003
Saldos % do PIB
913.145
57,2
32.037
1,7
32.037
2,0
79.032
4,9
-66.173
-4,1
145.205
9,1
-64.309
-4,0
-22.715
-1,4
-41.594
-2,6
16.710
1,0
604
0,0
0
0,0
-0,3
2004
Saldos % do PIB
956.996
51,6
43.851
-5,6
43.851
2,4
47.144
2,5
-81.112
-4,4
128.256
6,9
-16.193
-0,9
-3.335
-0,2
-12.858
-0,7
7.137
0,4
6.516
0,4
-753
0,0
-7,9
Abr/2005
Saldos % do PIB
956.677
50,1
-320
-1,5
-320
0,0
7.171
0,4
-44.012
-2,3
51.183
2,7
-6.608
-0,3
-1.664
-0,1
-4.944
-0,3
-656
0,0
-230
0,0
0
0,0
-1,5
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2004 e 2005.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
6
O vínculo essencial da política fiscal, como fundamento da atual política
macroeconômica, é a fixação de um nível de superávit primário que compense o
pagamento de juros da dívida pública, dada uma certa expectativa sobre a evolução do
produto. Dentro deste arcabouço, as políticas monetária e cambial implementadas pelo
governo não são isentas e produzem impacto sobre a política fiscal. Como vimos, o par
juro-câmbio afeta a trajetória da dívida-PIB.
Desta forma, se o objetivo do governo é imprimir uma trajetória declinante da relação dívidaPIB, além da política fiscal, deverá também acompanhar a implementação das políticas
monetária e cambial. Determinadas combinações do par juro-câmbio podem dar algum alívio
ou mesmo demandar maior rigor sobre a política fiscal em curso, como será avaliado no
próximo item.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
7
2. Custo Fiscal da Política Monetária
A política econômica do governo brasileiro tem se pautado por uma forte rigidez na política
monetária e em metas de inflação muito ambiciosas, resultando em taxas de juros
excessivamente elevadas. Ao mesmo tempo, na área cambial, a valorização da moeda
nacional, em parte influenciada pela própria política de juros elevados, atua como mecanismo
auxiliar de política para reduzir a inflação.
Juros altos e valorização do Real produzem impactos com sinais diferentes sobre as contas
fiscais. O uso da taxa de juros elevada como principal instrumento da política econômica
implica custos muito mais elevados para a dívida pública do que seria necessário para o
seu financiamento. No tocante à taxa de câmbio, os estoques de dívidas dolarizadas,
incluindo as dívidas do setor público, são afetados de forma favorável quando a moeda
nacional se valoriza.
O exercício que se segue procura traçar três cenários hipotéticos para as contas fiscais
para os próximos 12 meses, no intuito de medir os efeitos de pares combinados distintos
de taxa de juros e taxa de câmbio. O primeiro deles leva em conta uma taxa Selic de
12% ao ano, associada a uma taxa de câmbio de R$ 3,20/US$. O segundo cenário
associa uma taxa Selic de 14% ao ano com uma taxa de câmbio de R$ 3,00. Por fim, o
terceiro considera a taxa Selic que o Banco Central estabilizou em 19,75% em junho de
2005, e uma taxa de câmbio próxima a que vem vigorando em média nos últimos meses,
ou seja, R$ 2,45. Logicamente, os pares foram tomados arbitrariamente, mas significam
combinações que vários economistas, de diferentes tendências e escolas, consideram
possíveis em termos de políticas de câmbio e juros. A última combinação equivale à que
a política econômica atualmente em vigor no Brasil “escolheu” como a combinação
ideal para a economia brasileira.
A primeira tarefa na identificação do impacto destes parâmetros sobre as contas fiscais é o
isolamento das dívidas diretamente sujeitas à taxa Selic dentre as diferentes responsabilidades
constantes do conceito de Dívida Líquida do Setor Público. O efeito direto mais importante se
dá justamente sobre a dívida mobiliária do Tesouro2. A atuação do Banco Central seja
mediante a negociação de papéis próprios, seja por meio de operações compromissadas,
também representa custos para o setor público consolidado e afeta os resultados do Banco
Central, a serem transferidos ao Tesouro. A Tabela 3 mostra que o somatório destas dívidas
ficou em R$ 903 bilhões em abril de 2005. O estoque médio será utilizado para os cálculos de
custo da dívida.
2
Logicamente, cabe a objeção de que parte da dívida mobiliária é composta de papéis pré-fixados, não
estando sujeitos à variação da Selic. A prática do mercado tem mostrado que as elevações de taxas de juros
geram recomposições de carteira, facilitadas pelas Autoridades Monetárias, o que acaba resultando em
impacto quase imediato das oscilações de juros para o conjunto da carteira de títulos negociados em
mercado.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
8
Tabela 3: Estoques de Dívidas Diretamente Vinculadas à Selic - Em R$ Milhões - 2002 a 2005
Mês
dez/02
dez/03
mai/04
jun/04
jul/04
ago/04
set/04
out/04
nov/04
dez/04
jan/05
fev/05
mar/05
abr/05
Dívida Mobiliária
do Tesouro Nac.
532.893
679.267
700.929
712.312
714.927
721.400
733.585
740.090
749.708
768.821
785.203
803.830
831.648
833.076
Dívida Mobiliária
do Bacen
67.125
30.659
26.117
24.360
22.764
18.514
16.034
14.797
13.844
13.584
13.559
13.522
14.033
13.083
Operações
Compromissadas
Total da Divida
Diretamente
Atrelada a Selic
77.089
65.810
96.534
90.540
90.491
90.348
85.374
85.368
78.947
58.892
68.607
66.909
57.806
56.948
Estoque médio
775.736
823.580
827.212
828.182
830.262
834.992
840.255
842.500
841.297
867.369
884.261
903.487
903.107
825.396
827.697
829.222
832.627
837.624
841.377
841.898
854.333
875.815
893.874
903.297
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2005 (elaboração própria).
Para uma avaliação do impacto da taxa de juros sobre o custo da dívida pública, vale lembrar
que o Banco Central voltou a adotar uma política monetária de elevação das taxas de juros a
partir de setembro de 2004. Desde então aumentou a taxa Selic em 3,75 pontos percentuais,
passando de 16% ao ano no início do processo para o nível atual de 19,75% ao ano.
A partir do estoque médio da dívida pública atrelada à Selic em abril de 2005, temos que o
custo anualizado da dívida no 1o cenário (taxa Selic de 12%) seria de R$ 103 bilhões, ou
R$ 61 bilhões a menos que no 3o cenário, ou seja, o cenário equivalente à política monetária
em vigor (Selic de 19,75%). Na hipótese de taxa Selic de 14% ao ano (2o cenário), o custo da
dívida anualizado seria de R$ 119 bilhões ou R$ 45 bilhões a menos que no cenário da
política econômica atual. Neste último caso, o custo sobe para R$ 164 bilhões. Em
percentagem do PIB projetado para os próximos doze meses, essas reduções do custo da
dívida corresponderiam, no primeiro caso (R$ 61 bilhões a menos, equivalente ao 1o. cenário)
a 3% do PIB e, no segundo (R$ 45 bilhões, equivalente ao 2o. cenário) a 2,2% do PIB. A
Tabela 4 resume os resultados em valores.
Tabela 4: Cenários de Custo da Dívida
(Hipótese 12%, 14% e 19,75%) - Em R$ Milhões
Custo Estimado nos Próximos 12 Meses
o
Diferencial em Relação ao 3 Cenário
1o Cenário
Selic a 12%
102.854,4
-61.181,1
2o Cenário
3o Cenário
Selic a 14% Selic a 19,75%
119.006,0
164.035,5
-45.029,5
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2005 (elaboração própria).
Vale observar que se a taxa Selic for mantida em 19,75% nos próximos 12 meses, o custo da
dívida terá um incremento de cerca de R$ 26 bilhões em comparação ao custo efetivo
registrado no período de 12 meses anteriores (ou seja, em relação ao período de maio de 2004
a abril de 2005), o equivalente a 1,3% do PIB estimado para os próximos doze meses. A taxa
Selic média nos 12 meses anteriores foi de 17% ao ano, enquanto na hipótese acima aventada,
a taxa Selic média seria de 19,75% para os próximos 12 meses.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
9
Tabela 5: Pagamento de Juros - Em R$ Milhões
Custo Estimado Próximos 12 meses com a Taxa Selic a 19,75%
Pagamento de Juros Efetivo entre maio/2004 a abril/2005
Diferencial
164.035,50
138.180,00
25.855,50
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2005 (elaboração própria).
O impacto da paridade cambial sobre as contas públicas deve ser avaliado em dois campos: a
dívida contratada em dólares e a dívida interna com referência cambial. No caso da dívida
contratada, importam os recursos identificados por meio da dívida líquida de reservas
internacionais e haveres das empresas estatais em moeda estrangeira. A Tabela 6 mostra os
estoques de dívida externa convertidos em Reais pela taxa de câmbio de final de período, de
2002 a abril de 2005. O procedimento utilizado foi a conversão em US$, pela taxa de fim de
período, e a aplicação de três paridades alternativas: R$ 3,00, 3,20 e R$ 2,45 por dólar.
Tabela 6: Encargos da Dívida Externa Pública - Em R$ Milhões – 2002 a 2005
Dívida externa líquida
Governo federal
Bacen (reservas)
Governos estaduais
Governos municipais
Empresas estatais
Federais
Estaduais
Municipais
Taxa de câmbio
Dívida externa líquida em US$
Dívida ext. líq a R$/US$ 3,20
Diferencial
Dívida ext. líq a R$/US$ 3,00
Diferencial
Dívida ext. líq. a R$/US$ 2,45
Diferencial
2002
226.795,8
256.731,5
-59.141,1
18.407,9
2.900,2
7.897,4
-1.855,8
9.753,2
0,0
3,5
64.188,1
205.402,0
-21.393,9
192.564,3
-34.231,5
157.260,9
-69.535,0
2003
186.457,5
218.767,4
-58.490,1
16.429,2
2.605,3
7.145,7
-667,5
7.813,1
0,0
2,9
64.536,0
206.515,3
20.057,8
193.608,1
7.150,6
158.113,3
-28.344,2
2004
138.931,1
198.197,4
-73.080,1
15.980,0
2.650,9
-4.817,0
-11.525,3
6.708,3
0,0
2,7
52.339,9
167.487,8
28.556,7
157.019,8
18.088,7
128.232,9
-10.698,3
Abr/2005
102.024,2
188.362,8
-95.852,8
14.654,1
2.462,2
-7.602,1
-13.437,5
5.835,3
0,0
2,5
40.305,1
128.976,2
26.952,0
120.915,2
18.891,0
98.747,4
-3.276,8
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2005 (elaboração própria).
Deste procedimento resultou, em abril de 2005, que uma paridade de R$ 3,00 por US$
significaria um custo adicional de R$ 19 bilhões para as contas públicas. Já uma taxa de
câmbio de R$ 3,20 elevaria a dívida líquida em R$ 27 bilhões. Por outro lado, uma taxa de
câmbio de R$ 2,45 reduziria a dívida em R$ 3,3 bilhões. Logicamente, a aferição, ao se
considerar o estoque da dívida externa existente em abril de 2005, não leva em consideração
eventuais reduções na dívida que possam ocorrem nos próximos 12 meses, por amortizações
de dívidas previamente contratadas.
A segunda via do impacto do câmbio sobre as contas públicas é a dívida não contratada
externamente, mas referenciada ao dólar: os swaps. A avaliação do impacto de uma taxa
diferente da efetiva pode ser feita, grosso modo, com base no diferencial entre a taxa do CDI e a
variação cambial, mês a mês, sobre o estoque mensal vigente em maio de 2005 e assumindo que
este estoque permanecerá constante no período de 12 meses à frente. O 3o cenário é favorável
ao governo, pois supõe uma maior taxa de juros (19,75%) e uma apreciação cambial, enquanto
nos dois outros cenários ocorre o oposto, pois além de uma taxa de juros menor, supõe-se uma
desvalorização cambial significativa. No 1o cenário, para uma taxa de câmbio de R$ 3,20 e uma
Selic de 12%, o impacto favorável do governo em relação ao 3o cenário seria reduzido em
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
10
R$ 2,4 bilhões. Enquanto no 2o cenário, com taxa Selic de 14% e taxa de câmbio de R$ 3,00, o
impacto favorável para o governo seria diminuído em R$ 1,7 bilhões
A síntese dos impactos dos dois cenários alternativos revela que a queda da taxa Selic
proporcionaria uma diminuição significativa no déficit público ainda que houvesse um
impacto maior da desvalorização cambial. A Tabela 7 mostra que, para o par combinado taxa
Selic de 12% e câmbio de R$ 3,20, haveria redução no déficit público de quase R$ 32 bilhões,
em relação ao 3o par de juro e câmbio. Com uma Selic de 14% e câmbio de R$ 3,00, o déficit
público diminuiria em R$ 24,5 bilhões em relação ao par Selic 19,75% e câmbio a R$ 2,45.
Tabela 7: Impacto de Câmbio e Juros sobre Déficit Público nos Próximos
o
12 Meses nos Cenários 1 e 2 em Comparação ao 3 Cenário - Em R$ Milhões
Diferencial taxa de juros
Diferencial de câmbio s/ Dív. Ext. Líquida
Diferencial sobre swap
Impacto conjunto
Cenário 1
Cenário 2
Selic 12% e R$ 3,20/US$
Selic 14% e R$ 3,00/US$
-61.181,1
-45.029,5
26.952,0
18.891,0
2.377,4
1.664,9
-31.851,7
-24.473,7
Fonte: Banco Central do Brasil, Nota para a Imprensa, 2005 (elaboração própria).
Os valores encontrados no presente exercício são coerentes com a noção cada vez mais
generalizada de que as contas fiscais brasileiras são muito sensíveis às mudanças nos
principais preços da economia (câmbio e juro). Vale notar que uma alteração na combinação
juro-câmbio poderia reduzir os custos fiscais das políticas macroeconômicas em valores que
vão de 1,2% PIB a 1,6% do PIB. Logicamente, estas mudanças tornariam possível uma
readequação dos patamares de investimentos governamentais em setores estratégicos para a
economia. Alternativamente, dados os mesmos níveis atuais de superávit primário, as
mudanças viabilizariam níveis muito baixos e próximos a zero de déficit global do setor
público (ou seja, o déficit nominal), o que contribuiria para uma redução mais rápida da
relação dívida/PIB e, além disso, para uma queda também mais rápida do risco país e,
conseqüentemente, das taxas de juros internamente.
É evidente que uma combinação alternativa de juros/câmbio também seria melhor do ponto de
vista do crescimento do produto, em função tanto da menor taxa de juro quanto de uma moeda
nacional mais desvalorizada, o que estimularia as exportações. Nem seria necessário sublinhar
que a própria dinâmica da dívida líquida seria favorecida com a perspectiva de maior
crescimento econômico. Adicionalmente, na medida em que uma outra composição de
juros/câmbio liberasse recursos públicos anteriormente necessários para equacionar as
necessidades de financiamento do setor público, a economia brasileira teria potencialmente
um crescimento não só maior, como melhor ou de superior qualidade devido ao aumento do
investimento do governo em infra-estrutura. Ao lado disso, a ampliação das inversões do setor
privado e, conseqüentemente, do produto potencial da economia, contribuiria para reduzir os
eventuais riscos presentes e futuros de aumento da taxa de inflação.
Ou seja, uma combinação diferente da política monetária e cambial ampliaria enormemente o
alcance da política fiscal, a qual, presentemente se vê constrangida e limitada em seus efeitos
pela política de juros/câmbio que domina a política econômica. Os necessários ajustes e
esforços adicionais de redução dos gastos públicos em outras áreas que não os encargos
financeiros teriam nestas condições um impacto muito maior e contribuiriam para, a médio e
longo prazo, assegurar níveis baixos de taxas de juros na economia brasileira.
O Custo Fiscal da Atual Política Econômica
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