O FUNCIONAMENTO COGNITIVO E SEMIÓTICO DAS REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS: PONTO DE ANÁLISE PARA A APRENDIZAGEM MATEMÁTICA FLORES, Cláudia R. – UFSC MORETTI, Méricles T. – UFSC GT: Educação Matemática / n.19 Agência Financiadora: FAPESC – CNPq Introdução Saber ler e interpretar dados e informações representadas graficamente vêm tomando um lugar de destaque na educação e, particularmente, na educação matemática. Isso porque a quantificação da diversidade de informações é cada vez mais necessária na sociedade atual. Neste sentido, vê-se que conteúdos tais como os de estatística, de probabilidade e de combinatória são solicitados ao ensino, fato este que é reforçado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997), já nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Algumas pesquisas1, na área de educação matemática, têm se pautado em tal problemática procurando trazer para o ensino, de modo concreto, a relação entre o conhecimento matemático e o tratamento da informação. A construção de gráficos, tabelas e o envolvimento de alunos em pesquisas de campo, tornou-se, portanto, uma opção metodológica que, além de outras, possibilita a compreensão da concepção do número em contextos significativos. Contudo, para além da introdução de conceitos e métodos estatísticos para auxiliar a coleta, a organização, a interpretação e a análise de dados, é preciso o desenvolvimento de habilidades que envolvam desde a leitura como o julgamento de informações semiotizadas. Neste sentido é que LOPES (2004) fala numa “literacia estatística”, ou seja, a capacidade de reconhecer e de classificar dados como quantitativos ou qualitativos, discretos ou contínuos e, ainda, a desenvoltura para ver que cada tipo de organização de dados conduz a um tipo específico de representação, por exemplo, gráficos, tabelas, diagramas. Ora, mesmo que se considere, na educação matemática, o desenvolvimento de tal capacidade, é preciso ver que a própria estrutura representacional levanta complexidades de leitura e de interpretação que exige, de nossa parte, uma certa desenvoltura visual e um empenho cognitivo. Portanto, o interesse aqui, neste estudo, é 1 Ver por exemplo, BARRETO (2003), LOPES (2003), CORDANI (2003). 2 o de ver como as representações gráficas servem de suporte para a comunicação de dados, por exemplo, de estatística, de probabilidade e, para além disso, ver como estes modos de representação possuem linguagem própria. O que significa analisar como as representações gráficas, em particular, possuem regras, códigos instituídos para a sua composição e requerem um tratamento específico no sistema de representação semiótica. Sabe-se que ler uma tabela, um diagrama não é tarefa tão imediata. A leitura exige por parte do leitor certa intimidade, e também domínio, do modo de representação utilizado. Ler, interpretar, analisar e julgar, ou organizar dados em gráficos e tabelas significa, antes de tudo, dominar o próprio funcionamento representacional. Mas, então, como compreender a complexidade da organização visual da informação e da comunicação em representações gráficas? E qual o interesse desta compreensão para a educação matemática? São estas as questões que permeiam o trabalho neste texto. O trabalho desenvolvido aqui é pautado nos estudos sobre “registros de representação semiótica para a aprendizagem matemática”, de Raymond Duval2, particularmente sobre a organização semiótica e cognitiva das representações gráficas. Então, primeiramente, discutiremos sobre as funções cognitivas das representações semióticas, que possibilitam a aprendizagem matemática; depois, destacaremos as representações gráficas, enquanto suporte representacional de dados e informações, no ensino da matemática para, enfim, empreenderemos uma análise das implicações cognitivas e das complexidades de organização representacional das representações gráficas do tipo tabelas. Com isso, pretendemos contribuir para a compreensão da diversidade e das especificidades de uso das representações gráficas na, e para, educação matemática. As funções das representações na aprendizagem matemática Ensinar matemática, sob o ponto de vista de Raymond Duval, é antes de tudo possibilitar o desenvolvimento geral das capacidades de raciocínio, de análise e de visualização. A atividade matemática, neste caso, é caracterizada pela dependência das representações semióticas, bem como pela grande variedade destas representações. Isso porque as representações semióticas, no domínio da matemática, assumem um papel 2 É filósofo e psicólogo de formação, autor de muitos trabalhos envolvendo a psicologia cognitiva e o papel dos registros de representação semiótica para a apreensão do conhecimento matemático. Sua principal obra é Sémiosis et pensée humaine (1995). 3 considerável já que os objetos matemáticos, não sendo acessíveis pela percepção, só podem sê-lo por suas representações, lembrando que um mesmo objeto matemático poderá ter representações diferentes, dependendo da necessidade e do uso. Há, portanto, uma diversidade de representações semióticas que DUVAL (2003) agrupa em quatro grandes registros: a língua natural, as escritas algébricas e formais, as figuras geométricas e as representações gráficas. O interesse pelo conhecimento da existência deste mundo das representações semióticas não se dá, tão somente, pela possibilidade de entendimento cognitivo para a aprendizagem matemática, mas pelas funções cognitivas que estas representações preenchem e que, portanto, auxiliam no processo da educação matemática. Segundo DUVAL (1999) são quatro as funções que as representações podem preencher: função de comunicação, função de tratamento, função de objetivação e função de identificação. A primeira é a função de transmissão de uma mensagem ou de uma informação entre indivíduos, ela requer a utilização de um código comum aos indivíduos. A segunda, é a função que transforma uma representação em uma outra, utilizando unicamente as possibilidades de funcionamento do sistema de representação mobilizado. A terceira, é a função que permite a um sujeito de tomar consciência daquilo que até então ainda não o tinha feito. É o trabalho de exteriorização. Esta função é, às vezes, confundida com a função de comunicação porque ela dá lugar a uma produção de modo vocal ou gráfico, quando se trata de uma produção que é por si e não por outra. De uma certa maneira, a objetivação corresponde a um uso estritamente privado de um registro de representação, mesmo se a produção é materialmente acessível a outra e pode parecer em uma produção para fins de comunicação ou às vezes de tratamento. Estas três primeiras funções são, para Duval, fundamentais para o funcionamento cognitivo. Enfim, a função de identificação que permite encontrar, ou reencontrar, um dado ou uma informação dentre muitas outras. A identificação é, portanto, o trabalho cognitivo que permite a recuperação da memória, seja ela humana ou de um sistema informático, ou seja, é concernente a organização das informações da memória. Esta função se faz importante, aqui, por ser imediatamente solicitada quando é preciso ler e analisar um quadro de dados, por exemplo. Dentre os muitos dados, e informações, contidos num quadro é preciso identificar, ou encontrar, aquele que é o solicitado na análise de um problema envolvendo dados estatísticos. 4 A representação gráfica: contribuição cognitiva e funcionamento representacional A representação gráfica constitui-se num importante recurso para a análise de dados e tratamento da informação. Basta olharmos os meios de comunicação, sejam eles virtuais ou impressos, para vermos a impregnação de quadros, tabelas, gráficos, ou seja, de uma linguagem semiotizada que permite a comunicação de dados e informações. As noções de estatística, probabilidade e problemas de contagem são, portanto, noções matemáticas que fazem parte do cotidiano atual de nossa sociedade. Isso fez com que tais noções passassem a ser objetos de ensino de matemática3. Porém, lidar com tais noções significa, antes de tudo, lidar com tabelas, gráficos, diagramas, para organizar e comunicar dados e informações, o que implica numa análise do funcionamento representacional destes modos de representação. Assim, para além de um estudo das possibilidades de aprendizagem e das formas metodológicas de ensino de noções de estatística, contabilidade e contagem na educação matemática, é preciso verificar as diversas formas de representação gráfica que constituem o suporte representacional para tais noções matemáticas, ou melhor, é preciso uma análise das características visuais, representacionais e cognitivas que acarretam cada uma das representações gráficas. Faz-se importante ressaltar o fato de que as representações gráficas preenchem as quatro funções cognitivas do pensamento. A identificação, como já foi dito aqui, é uma função fundamental para o tratamento destas representações. Em relação, particularmente, à comunicação basta abrirmos um jornal qualquer para sentirmos essa importância. Não menos importante, percebemos o papel de destaque que é dado à representação gráfica nos livros didáticos, uma vez que há um interesse crescente pelo recurso às novas tecnologias da informação. Há, portanto, uma inserção, no cotidiano do aluno, de representações gráficas tais como, quadros, tabelas, gráficos cartesianos, gráficos de barras, gráficos com três dimensões, diagramas circulares. Nesse caso, a representação deverá preencher não só o papel de comunicação, como é o caso principalmente dos jornais, mas de objetivação e tratamento. Para o aluno, não é suficiente que ele saiba “ler” um gráfico, é necessário também que ele saiba organizar e operar de forma objetiva sobre os dados contidos neste modo de representação. Assim sendo, consideramos necessária uma análise do funcionamento tanto cognitivo como semiótico nas representações gráficas na educação matemática. 3 Ver, por exemplo, o que pregam os Parâmetros Curriculares Nacionais para a Matemática. 5 Há uma forma de representação gráfica que parece simples e direta. Por isso, o recurso a ela é comum e freqüente no ensino de matemática. Trata-se das representações gráficas do tipo tabelas, ou seja, daqueles cuja disposição é feita sobre linhas e colunas; do tipo gráficos cartesianos; ou ainda, dos gráficos de barras. Porém, esta simplicidade de acesso às informações, a homogeneidade visual e a forma organizada de distribuição de dados, só são aparentes. Fatores diversos como, por exemplo, aqueles requeridos na organização representacional e visual, bem como aqueles ligados aos processos cognitivos, podem interferir tanto na leitura e análise dos dados dispostos neste tipo de representação, como na própria construção e organização dos dados. Particularmente, para as representações gráficas do tipo tabela, devemos considerar que elas possuem determinadas vantagens, como por exemplo, o fato de que permitem a visualização dos dados de forma separada preenchendo assim, explicitamente, a função cognitiva de identificação. Será, portanto, sobre estes tipos de representações, as tabelas, que nossa análise irá se deter. Isso permitirá uma extensão para a análise de outros tipos de representações gráficas. Segundo DUVAL (2002), para analisar a contribuição cognitiva das tabelas, e suas diferentes utilizações, é preciso distinguir dois importantes pontos: a própria organização representacional, ou seja, a composição semiótica das tabelas, e as funções cognitivas que elas preenchem. No que diz respeito a organização representacional das tabelas é visível a disposição dos dados, ou informações, em linhas e em colunas. Porém, esta não é uma característica exclusiva das tabelas, a utilização de uma forma quadriculada aparece, igualmente, nas representações cartesianas, e histogramas-gráficos de barra. Portanto, tal característica, diz DUVAL (2002), não é suficiente para descrever o funcionamento representacional das tabelas, sendo necessário discernir a especificidade das tabelas em relação as outras representações gráficas. Vejamos, por exemplo, as imagens a seguir: 6 Figura 14 Figura 25 Na tabela que vemos na figura 1, os dados e as informações distribuídas pelas casas não desenham uma forma qualitativa enquanto que, no gráfico cartesiano que vemos na figura 2 uma forma é configurada. Assim, os gráficos cartesianos, bem como os gráficos de barra, são representações gráficas que possibilitam o aparecimento de formas visuais tais como retas, curvas, contornos de superfícies. Este fato não ocorre nas tabelas pois não é possível reagrupar, ou fusionar, os dados de cada casa de modo que se tenha o desenho de uma forma. Isso porque nenhuma ligação contínua pode ser traçada entre os conteúdos de cada casa. “Dispor os dados em linhas e em colunas não 4 Atividade retirada de GIOVANNI & GIOVANNI JR. Matemática Pensar & Descobrir: o +novo. 6a série, p.47. Coleção pensar e descobrir. São Paulo: FTD, 2002. 5 Atividade retirada de GIOVANNI & GIOVANNI JR. Matemática Pensar & Descobrir: o +novo. 5a série, p.111. Coleção pensar e descobrir. São Paulo: FTD, 2002. 7 faz, portanto, aparecer nenhuma forma visual interpretável como num diagrama ou numa imagem.” (DUVAL, 2002, p.11). Há, ainda, um diferencial importante entre as tabelas e os gráficos cartesianos. Segundo DUVAL (2002), uma tabela é essencialmente finita, enquanto que um gráfico cartesiano não é. A título de exemplo, veja como o gráfico da figura 2 é plausível de muitas inferências para além dos dados categoricamente registrados, sendo que o mesmo não ocorre na tabela da figura 1. Notar essa diferença é importante uma vez que estes dois tipos de representação mobilizam tratamentos diferentes. “Os gráficos cartesianos se prestam a operações de interpolação e extrapolação, mas não as tabelas que se prestam somente a uma operação de permutação de linhas ou de colunas ...” (Idem, p.11). Portanto, num gráfico cartesiano as escalas das unidades podem ser mudadas, mas não a permutação das posições sobre um eixo, pois isso levaria a destruição da representação. Este fato leva DUVAL a concluir que a “... diferença entre a característica finita das tabelas e a característica potencialmente infinita dos gráficos cartesianos diz respeito aos objetos representados e não ao princípio sobre o qual o sistema de representação se funda. Este princípio repousa sobre uma disposição espacial bi-dimensional em vista de separar e de localizar os dados.” (Ibidem) A unidade elementar representacional de uma tabela constitui-se, portanto, num dos elementos desse sistema de representação. A título de exemplo, tomemos a figura 1. Para responder os itens a e b, por exemplo, basta adentrar na tabela e identificar o dado correspondente a informação desejada. Assim, para responder qual a maior temperatura registrada e em qual cidade, é preciso dirigir-se a coluna Max e associar o maior valor de temperatura a Cidade correspondente. Trata-se do uso da função de identificação, ou seja, uma consulta rápida à tabela permite encontrar a resposta quase que imediatamente. Esta é uma forma de utilização bastante familiar das tabelas, ou seja, a leitura pontual da tabela permite encontrar a informação desejada. Neste sentido, a casa correspondente a solução, que é identificada pela interseção de uma linha e de uma coluna, será a unidade elementar representacional, se a tabela apresenta a característica de ser para consultas rápidas. Mas, nem sempre uma tabela se presta unicamente para fins de consulta rápida. As tabelas podem apresentar-se com características de classificação ou de variação, 8 exigindo assim não mais uma leitura exclusivamente pontual, mas uma leitura global da tabela. Por exemplo, para responder o item e na tabela da figura 1 é preciso apreender globalmente as informações das linhas e das colunas, fazendo emergir um conceito que possibilite um tratamento na tabela. Isso significa que, além de analisar a tabela em seu conjunto comparando dados já elaborados, é preciso realizar operações que permitam encontrar a variação de temperatura, ou melhor, é preciso adentrar no conceito de variação de temperatura. Para DUVAL (2002), trata-se de um passo de “apreensão global”. “A passagem de um passo pontual a um passo de interpretação global na ‘leitura’ das tabelas representa um salto do ponto de vista cognitivo.” (p. 12). Então, para analisar o funcionamento representacional de todos os tipos de tabelas, não é a casa que deve ser considerada como unidade elementar da tabela, mas uma enumeração feita segundo uma relação de ordem (ordem alfabética, ordem numérica, ordem das posições sobre um trajeto... que são as ordens de referência usadas mais freqüentemente.). A unidade elementar que constitui o sistema de representação das tabelas é, segundo DUVAL (2002), uma Lista Ordenada, quer dizer, uma lista estrutural que irá determinar a distribuição bi-dimensional em casas, em contraposição as enumerações de levantamento de dados sistemáticos, como por exemplo, os inventários. Contudo, mesmo que todas as tabelas se pareçam iguais elas não funcionam todas da mesma maneira, quer dizer, elas não implicam nos mesmos empreendimentos cognitivos, tampouco, nas mesmas possibilidade de tratamentos. Portanto, não se aprende a ler tabelas de modo geral, mas somente um tipo particular de tabela. Sendo assim, DUVAL (2002) fornece dois grandes grupos de classificação para a análise semiótica e cognitiva das tabelas: - Tabelas que se constituem apenas como uma apresentação sinóptica, como um “banco de dados”, servindo apenas para uma consulta rápida o que implica num custo cognitivo bastante baixo. A leitura deste tipo de tabela é dada a partir de uma exploração vertical, ou horizontal, de uma ponta a outra, com parada sobre a casa correspondente ao dado indicado na questão que motiva a exploração. - Tabelas que permitem aparecer novos dados, inferir a existência de relações ou de elementos não ainda conhecidos, ou ainda mostrar a necessidade de distinções que até então não tinham sido levados em conta. A leitura deste tipo de tabela implica numa 9 dupla exploração, vertical e horizontal e, além disso, essa exploração deve ser simultânea. Com isso pode-se compreender, enfim, que a organização semiótica de uma tabela não se reduz a uma simples disposição de linhas e de colunas. Sua organização depende das listas estruturais, e da maneira como elas são colocadas em correspondência. As regras de formação de uma tabela dependem, então, de um lado da possibilidade de se colocar em correspondência casa com casa, ou colunas, ou entre linhas. E, por outro lado, o conteúdo de cada casa deve ser uma unidade de informação identificável, sem que seja preciso nenhum trabalho inicial, por exemplo, de segmentação de expressões amontoadas. Este fato é essencial pois é isto que vai permitir a exploração global da tabela. A análise do sistema semiótico das tabelas nos remete, portanto, aos níveis de apreensão deste modo de representação, quer dizer, aos passos e procedimentos de leitura de uma tabela que geram implicações cognitivas. Como bastante já foi discutido aqui, a função cognitiva mais evidente e requerida na leitura de tabelas é a de identificação. A distribuição bi-dimensional de informações em linhas e em colunas permite separar visualmente as informações e localizá-las rapidamente. Contudo, há uma grande diversidade de tabelas, de modos de representar graficamente, logo há uma diversidade de funções cognitivas que elas podem preencher. Isso implica, também, na diversidade e riqueza de tarefas possíveis requeridas a partir de uma mesma tabela. E, segundo Duval (2002), “... o simples fato de mudar de tarefa para o mesmo tipo de tabela pode acarretar uma mudança no nível de apreensão e, portanto, nos passos de leitura.” (p.28). Tomemos o exemplo dado na figura 3. 10 Figura 36 Para resolver a tarefa solicitada, a função cognitiva de identificação seria aquela requerida automaticamente. Agora, se fosse pedido que se analisasse a correspondência entre uma outra forma de representação (veja a figura 4) como representante das informações e dos dados já registrados na tabela dada na figura 3, o modo de ler e de apreender a tabela iria além da simples identificação de dados e informações. Seria preciso uma leitura global que apreendesse todas as informações no seu conjunto e, mais ainda, o entendimento do sistema semiótico do outro modo de representação (no caso, do gráfico de barras da figura 4). Este fato, muitas vezes, não é levado em conta no ensino, pensa-se que transitar de um registro a outro é tarefa natural e simples. Figura 47 Há que se considerar, ainda, outra função cognitiva requerida no uso de tabelas: o tratamento. Ora, nem sempre é suficiente a identificação imediata de uma informação, ou de um dado, mas a modificação de uma representação em uma outra, a partir das possibilidades de funcionamento do sistema semiótico em questão. É preciso, portanto, realizar procedimentos diversos, tais como, comparações entre linhas ou colunas, operações entre dados, inclusões ou permutações de dados.... Enfim, compreender os processos cognitivos requeridos no uso de tabelas, gráficos, no ensino de matemática, significa entender o funcionamento representacional que gera apreensões de leitura e tratamentos específicos. Assim, usar tabelas na educação matemática significa não somente usá-las no seu modo mais freqüente, ou 6 Atividade retirada de GIOVANNI & GIOVANNI JR. Matemática Pensar & Descobrir: o +novo. 6a série, p.25. Coleção pensar e descobrir. São Paulo: FTD, 2002. 11 seja, para situações de comunicação, que preenchem apenas a função cognitiva de identificação. Além disso, o ensino deveria possibilitar, e privilegiar, outras tarefas possíveis que não seja só a de leitura de tabelas, de gráficos. Outras tarefas tais como, construir uma tabela, interpretar e preencher a tabela, reunir todos os dados ou informações para serem organizados em outra tabela (como no caso do exemplo da figura 3 e 4), deveriam ser igualmente valorizadas e, sobretudo, tratadas como objeto de estudo e de aprendizagem. Considerações Finais As representações gráficas no ensino da matemática, e mesmo de uma maneira geral, estão longe de se constituir num meio de representação simples e evidente, como se supõem geralmente. Particularmente, no ensino, privilegia-se muito mais a tarefa de leitura e identificação de dados retirados de representações gráficas para fins de comunicação em detrimento de outras atividades, tais como a própria construção destas representações. No caso das tabelas, vimos que elas não são representações autônomas, como aliás todas as representações que privilegiam a visualização. Isto quer dizer que elas se articulam de maneira explícita, ou implícita, com representações num outro registro. Esta articulação, que diz respeito a interação entre a tabela e o enunciado verbal do problema, ou a escritura algébrica, é essencial já que será essa possibilidade que comandará a maneira de ler uma tabela. É a conversão entre os registros que possibilitará uma leitura global das representações gráficas. Há que se considerar, ainda, a grande diversidade de representações gráficas e a riqueza de tarefas que se pode explorar em cada uma destas representações. Normalmente, este fato é negligenciado no ensino. Contudo, o simples fato de mudar de tarefa para o mesmo tipo de representação gráfica pode provocar mudanças de apreensão e, portanto, nos passos de leitura. Esta estratégia implica na elaboração cognitiva, associando pensamento e registro de representação, fato este importante para a aprendizagem matemática. Enfim, podemos destacar dois elementos importantes para analisar os movimentos de leitura de representações gráficas na educação matemática. O primeiro, diz respeito a leitura cartesiana, aquela que busca a identificação rápida da resposta à questão solicitada, implicando na associação do que é pedido com a identificação do 7 Imagem retirada de GIOVANNI & GIOVANNI JR. Matemática Pensar & Descobrir: o +novo. 6a série, p.25. Coleção pensar e descobrir. São Paulo: FTD, 2002. 12 dado, ou da informação, correspondente na representação, ou representada. O outro, é a leitura global da representação, o que implica numa apreensão global da situação que é dada mediante a articulação dos muitos registros envolvidos. O papel das representações gráficas no ensino da matemática vai além, portanto, de ser aquele ligado a comunicação e organização de dados. O uso deste modo de representação implica num estudo do funcionamento semiótico e cognitivo a fim de se destacar os procedimentos metodológicos que geram aprendizagens matemática. Bibliografia BARRETO, M.de F. T. Gráficos, tabelas e pesquisa de campo – o número em contexto significativo. In: Anais do II SIPEM, CD room. Santos: SBEM, 2003. BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais (5a a 8a séries). Brasília: Ministério da Educação, 1998. BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: Ministério da Educação, 1997. CORDANI, L. K. Algumas considerações sobre a inferência estatística. In: Linguagem, Conhecimento, Ação: ensaios de epistemologia e didática. Organização de Nilson J. Machado e Marisa O. Cunha. São Paulo: Escrituras Editora, 2003. DUVAL, Raymond. Sémiosis et pensée humaine: Registres sémiotiques et apprentissages intellectuels. Suisse: Peter Lang S. A. , 1995. ________. Conversion et articulation des representations analogiques. In: Séminaires de Recherche “Conversion et articulation des représentations”. Vol I. Éditeur Raymond Duval, IUFM Nord-Pas de Calais, 1998. ________. Comment analyser le fonctionnemment représentationnel des tableaux et leur diversité? In: Séminaires de Recherche “Conversion et articulation des représentations”. Vol II. Éditeur Raymond Duval, IUFM Nord-Pas de Calais, 2002 _________. Registros de representações semiótica e funcionamento cognitivo da compreensão em matemática. In: Aprendizagem em matemática: registros de representação semiótica. Organização de Silvia Dias Alcântara Machado, p.11- 33. Campinas, São Paulo: Papirus, 2003. LOPES, Celi Aparecida Espasandin. Literacia estatística e INAF 2002. In: Letramento no Brasil: habilidades matemáticas. Organização de Maria da Conceição Ferreira Reis Fonseca. p. 187- 197. São Paulo: Global Editora, 2004. 13 __________. O conhecimento profissional dos professores e suas relações com estatística e probabilidade na educação infantil. Tese (Doutorado). Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2003.