www.arede.inf.br
ano 11 | nº 101 | especial novembro 2014
TECNOLOGIA PARA A INCLUSÃO SOCIAL
Prêmio
ARede
2014
Personalidade do Ano
Os projetos vencedores
editorial
Participação
cidadã
É sempre um prazer fazer a
apresentação desta edição especial
da revista ARede, dedicada aos
projetos vencedores do Prêmio ARede.
Todos os anos, recebemos iniciativas
múltiplas, voltadas à inclusão social,
educacional e cultural que se apoiam
no uso de ferramentas as tecnologias da
Equipe
Redação
Lia Ribeiro Dias
Diretora editorial
Miriam Aquino
Diretora associada
Áurea Lopes
Editora-executiva
Rafael Bravo Bucco
Repórter
Camila Sipahi Pires
Editora de arte
informação e comunicação (TICs).
Colaboradores
Fatima Fonseca (textos)
Não é fácil fazer a seleção dos melhores
Publicidade
entre mais de 200 projetos, de todo
o país, envolvendo de crianças e
adolescentes a idosos. Por isso, nosso
reconhecimento aos profissionais que
integram a comissão julgadora e que
dedicaram seu tempo a este trabalho,
alguns nossos parceiros desde a
primeira edição do prêmio, há oito anos.
A todos os concorrentes inscritos, nosso
agradecimento pelo prestígio, mas
especialmente pelo trabalho importante
que fazem por todos os rincões deste
país que tanto precisa de iniciativas
desse tipo. Aos projetos premiados,
que se destacaram em suas categorias,
nossos parabéns. Esperamos que a
Meire Alessandra
Diretora
Leonardo Rodrigues
Executivo de contas
Edna Fonseca
Gerente de circulação e marketing
Administrativo-financeiro
Adriana Rodrigues
Gerente
Camila Carvalho
Assistente
Web e Suporte de Rede
Ricardo Oliveira
Técnico
Gráfica Gráfica Ipsis
Distribuição Correios Entrega Direta
publicação das reportagens sobre as
iniciativas premiadas possam propiciar
a divulgação que os projetos merecem
e, mais que tudo, consigam inspirar
ativistas, empresas e gestores públicos
a utilizar a tecnologia para criar novas
frentes de inclusão social.
ARede é uma publicação bimestral
da Bit Social - www.arede.inf.br
Av. São Luiz, 258, 21º andar, cj. 2111,
01046-000, São Paulo, SP.
Tel.: 11 3129-9928 / 11 3151-2115
[email protected]
Foto Robson Regato
Jornalista responsável – Lia Ribeiro Dias (MT 10.187)
4
Lia Ribeiro Dias
Diretora Editorial
www. arede.inf.br
ARede adota Licença CompartilhaIgual (SA)
O uso livre do conteúdo não se aplica às fotos, que pertencem a seus autores.
Conselho editorial
Antônio Carlos Silva
Representante da
Rede Mocambos
Luiz Ernesto Gemignani
Presidente do Conselho
de Administração da Promon
Beatriz Tibiriçá
Diretora do Coletivo Digital
Manoel Horácio
Conselheiro do Banco Fator
Carlos Seabra
Coordenador Técnico
Pedagógico na Gerência
de Inovação e Novas Mídias
da Editora FTD
Mário Luís Teza
Representante do Projeto
Software Livre Brasil
Cláudio Prado
Presidente do Laboratório
Brasileiro de Cultura Digital
Cristina Kiomi Mori
Diretora do Escritório de
Projetos Especiais de
Modernização da Gestão
(Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão)
Edson Fregni
Professor da Escola Politécnica
da Universidade de São Paulo
Felipe Fonseca
Representante da
Metareciclagem
Jorge Bittar
Deputado Federal (RJ)
Júlio Semeghini
Secretário de Planejamento
e Desenvolvimento Regional
do Estado de São Paulo
Misael Dentello
Coordenador Regional de
Inclusão Digital do Serpro-SP
ATENÇÃo assinante!
Além de receber a revista ARede impressa,
você tem direito a receber, gratuitamente,
o boletim eletrônico com notícias e artigos
do portal ARede Online.
Para isso, precisamos cadastrar seu e-mail
em nosso sistema. Entre o no site. Na
barra superior, clique no botão CADASTRESE e coloque seus dados.
www.arede.inf.br
Paulo Lima
Representante do
Projeto Saúde e Alegria
Ricardo Knoepfelmacher
Diretor da Angra Partners
Ricardo Kobashi
Integrante do Coletivo
Lixoeletrônico.org
Rodrigo Baggio
Diretor do Comitê para
a Democratização da
Informática (CDI)
realização
Rodrigo Ortiz D’Avila Assumpção
Presidente da Dataprev
Sérgio Amadeu da Silveira
Pesquisador e educador
Thiago Tavares de Melo
Diretor da SaferNet Brasil
Promotores da
inclusão digital
A empresa ou a instituição que faz um
pacote de assinaturas da revista ARede
se torna um agente na promoção da
inclusão digital no Brasil, ajudando a
difundir informações e apoiar a formação
em telecentros, escolas públicas e outros
pontos de acesso coletivo às tecnologias
da informação e comunicação.
Venha se juntar a esse time
Assine ARede para a sua comunidade ou
patrocine um lote de assinaturas para uma
instituição que precisa.
ARede especial novembro 2014
5
índice
Prêmio ARede 2014
Conexões com um mundo melhor 8
Personalidade do Ano
Alessandro Molon 12
Marco Civil é garantia da democracia na rede
Especial Educação
Conhecimento livre e universal14
A mina de dados da educação16
Terceiro Setor
Conteúdo de interesse público 20
Linha direta com a navegação segura
Capacitação e formação 22
Uma história, muitas leituras, saberes compartilhados
Serviços aos usuários e à comunidade Uma rede para anônimos
24
Setor Público
Conteúdo de interesse público 26
Observatório social para a juventude
Capacitação e formação 28
Um novo jeito de ensinar e de aprender
Serviços aos usuários e à comunidade 30
Articulação política? Coisa de hackers!
Tecnologia para acessibilidade 32
Escolas preparadas para a inclusão
Setor Privado
Conteúdo de interesse público 34
A moçada dos morros aparece no mapa
Capacitação e formação 36
Todos podem aprender
Serviços aos usuários e à comunidade 38
A saúde vencendo distâncias!
Tecnologia para acessibilidade 40
Informações que libertam
6
www. arede.inf.br
Conexões com
um mundo melhor
A tecnologia já é transparente nos processos
de desenvolvimento humano e social.
Faz parte da rotina de jovens e idosos, ricos e pobres,
educadores e educandos. Por isso, cada vez mais,
os projetos vencedores do Prêmio ARede ganham
destaque pelo ganho no conhecimento e pelo salto
de qualidade de vida proporcionados
a seus beneficiados.
8
www. arede.inf.br
VENCEDORES 2014
» Personalidade do Ano
Alessandro Molon
Deputado federal – relator do
Marco Civil da Internet
» ESPECIAL EDUCAÇÃO
REA.br
Instituto Educadigital
QEdu: aprendizado em foco
Fundação Lemann
» Terceiro Setor
> Conteúdo de interesse público
HelpLine
SaferNet Brasil
> Capacitação e formação
E se eu fosse o autor?
Associação Casa da Árvore
> Serviços aos usuários e à comunidade
DiasporaBR
Anahuac de Paula Gil
» Setor Público
Foto: Shutterstock | YanLev
> Conteúdo de interesse público
Participatório – Observatório
Participativo da Juventude
Secretaria Nacional de Juventude
O Brasil é um enorme baú de boas surpresas,
quando se trata de descobrir pessoas e iniciativas que contribuem para o crescimento social
e cultural da população. Fazemos essa afirmação sem medo de errar, pois há 8 anos o Prêmio
ARede realiza o gratificante trabalho de identificar e promover projetos sociais apoiados pelas
Tecnologias da Informação e da Comunicação
(TICs). Os milhares de candidatos inscritos e as
dezenas de vencedores, ao longo desse tempo,
compuseram um quadro que dá a medida do
quanto a tecnologia é fundamental para transformar realidades.
Este ano, entre os mais de 200 projetos inscritos
no prêmio, foi possível notar que aumentaram as
> Capacitação e formação
Ensino de programação para alunos do
4º e 5º anos do ensino fundamental
Prefeitura de Cascavel
> Serviços aos usuários e à comunidade
Laboratório Hacker
Câmara dos Deputados
Patrocínio
> Tecnologia para acessibilidade
Recursos Tecnológicos Acessíveis
Secretaria Municipal de Educação
de São Paulo
» Setor Privado
> Conteúdo de interesse público
Agentes da Transformação
Instituto TIM
> Capacitação e formação
Projeto Tecnologia para Todos
Projeto Tecnologia para Todos
Apoio
> Serviços aos usuários e à comunidade
Projeto de Telemedicina de Sergipe
Cisco do Brasil e Universidade
Federal de Sergipe
> Tecnologia para acessibilidade
Vida Mais Livre
Espiral Interativa
Realização
ARede especial novembro 2014
9
ações de participação social e cidadania – facilitadas pelas políticas públicas voltadas à universalização do acesso e pela forte adesão dos brasileiros às redes sociais. Também despontaram
mais iniciativas de inclusão digital de pessoas
com deficiência – que conseguem, por meio das
ferramentas virtuais, garantir sua integração em
um mundo antes inalcançável para elas.
Mas o que mais chamou atenção foi a ênfase
e os investimentos em projetos de tecnologias
educacionais, de formação e de capacitação.
A quantidade de bons projetos nesse segmento foi tal que a comissão organizadora decidiu
conceder dois prêmios na categoria especial
Educação (ver página 9).
TICs nas escolas das redes públicas e particulares de todo o país.
No ano em que o mundo todo voltou as atenções
ao Brasil, durante o mês de abril, quando nos tornamos a nação com a mais avançada lei de internet do planeta, o Prêmio ARede Personalidade
do Ano fez jus a um parlamentar que esteve à
frente dessa conquista. Relator do Marco Civil da
Internet, o deputado federal Alessandro Molon
(PT-RJ) recebeu o título, eleito com ampla margem de votos pela comissão julgadora.
A educação foi destaque também no Anuário ARede 2014, lançado durante a cerimônia
de entrega do Prêmio ARede, em São Paulo. Na 6ª edição, o anuário – que inovou, em
2009, ao divulgar projetos nacionais de inclusão digital – traz novamente uma pauta inédita. A publicação é a primeira a reunir reportagens que mostram boas práticas do uso de
A equipe da revista ARede dá os parabéns aos
concorrentes, em especial aos vencedores – que
este ano ganham, além do troféu, bolsas de estudo em cursos da área de TI, oferecidos pelo
Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel).
Também agradecemos à comissão julgadora,
que gentilmente cedeu seu tempo e agregou
prestígio a esta premiação (ver abaixo). E esperamos que, para o próximo ano, novos projetos
surjam, cada vez mais qualificados e inspiradores para outras iniciativas, sejam da sociedade,
sejam do poder poder público.
Comissão Julgadora
versidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Regina Silva, professora e diretora de projetos educaTodos os anos, o Prêmio ARede conta com a
contribuição de um time de especialistas que
dedica seu tempo e sua competência para eleger os vencedores, entre tantos bons projetos.
Nosso agradecimento a esses colaboradores.
» Especial Educação
Felipe Fonseca, pesquisador do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp
Jesulino Alves de Souza, ativista do software livre e
cionais especiais da Positivo Informática
Roseli Lopes, professora da Escola Politécnica da
USP e pesquisadora do Laboratório de Sistemas Integráveis (USP)
» Setor Público
Cecília Hartmann Regueira, presidente do Instituto
Hartmann Regueira
Giovana Évi Labegalini, engenheira de banda larga
Wilken David Sanches, diretor do Coletivo Digital
da inclusão digital
José Manuel Moran, educador e especialista em projetos de mudança na educação presencial e online
Márcia Padilha, consultora e tecnologias educacionais
» Setor Privado
Bianca Santana, diretora do Instituto Educadigital
Maria Rebeca Otero Gomes, coordenadora do Setor
de Educação da Unesco no Brasil
» Terceiro Setor
Carlos Seabra, coordenador técnico-pedagógico na
Selma Bessa, educadora, integrante do Núcleo de
Gerência de Inovação e Novas Mídias da Editora FTD
fessor-Fort.CE
Maria das Graças Pinto Coelho, professora da Uni-
10
www. arede.inf.br
Tecnologia Educacional/Centro de Referencia do Pro-
ARede especial novembro 2014
11
Fotos: Laycer Tomaz
Personalidade do ano
Marco Civil é garantia
da democracia na rede
O deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ) teve, como relator,
papel relevante no debate do Marco Civil da Internet, que foi
aprovado graças ao empenho pessoal da presidente Dilma Rousseff.
Lia Ribeiro Dias
O que levou o deputado federal Alessandro
Molon, do PT do Rio de Janeiro, a lutar pela
relatoria do Marco Civil da Internet, foi sua
convicção de que a neutralidade da rede é essencial para garantir a democracia na rede, de
que todos os internautas tenham seus pacotes
tratados da mesma forma, sem privilégio de uns
sobre outros.
Em seu primeiro mandato na Câmara dos Deputados, Molon, eleito a Personalidade do Ano
do Prêmio ARede de 2014, teve os holofotes
dirigidos à sua atuação, tanto pelos militantes
da liberdade na web, como pelos provedores de
12
www. arede.inf.br
conexão que queriam alterar a redação do artigo referente à neutralidade.
“O prêmio é um justo reconhecimento”, afirma Beá Tibiriçá, diretora do Coletivo Digital, que
acompanhou os embates no Parlamento em torno do Marco Civil. Ela conta: “Molon se manteve de pé em todas as indas e vindas do projeto.
Negociação era seu nome quando a conjuntura
exigia. Em outros momentos, ficava clara sua
disposição para o confronto direto. Isso permitiu
que o texto aprovado garantisse os três princípios
básicos do movimento: neutralidade, privacidade e liberdade de expressão”.
A relatoria do Marco Civil da Internet – o projeto de lei do Executivo começou a tramitar no
Congresso em 2011 e só foi aprovado em abril
de 2014 – colocou Molon no centro das pressões. “Houve muita movimentação em função
de visões divergentes, mas são movimentos legítimos”, diz ele, que antes de chegar a Brasília
teve dois mandatos de deputado estadual pelo
PT fluminense – na Assembleia do Rio de Janeiro, seu foco foram os direitos humanos e a segurança pública. E também a educação. Afinal,
foi sua experiência como professor de História
de escola pública que o levou à política.
“Descobri que a política era o caminho para
influir na qualidade da educação, tirar a escola
pública da precariedade, melhorar o ensino, a
segurança, a relação com os pais de aluno”, relata ele. E para se preparar melhor para a arena
da política, resolveu fazer a faculdade de Direito, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, onde hoje é professor.
Sua experiência na sala de aula e na rádio Catedral, uma rádio católica também no Rio de Janeiro, onde fez trabalho voluntário, desenvolveu
suas habilidades para a comunicação. “Isso me
ajudou na vida pública”, relata o mineiro de Belo
Horizonte, militante católico, casado e pai de
dois filhos, que em outubro completou 43 anos.
Apesar de seu reconhecido desempenho no
papel de relator do Marco Civil, Molon diz que
se não fosse o empenho pessoal da presidente
Dilma Rousseff talvez o projeto ainda estivesse
tramitando. “O episódio da espionagem dos
dados de brasileiros, da própria presidente da
República e de estatais pelo governo estadunidense, após denúncia de Snowden [Edward
Snowden, analista de inteligência da National
Security Agency – NSA], deflagrou o processo
que levou à aprovação do Marco Civil”, avalia.
Agora, passadas as eleições presidenciais, seu
empenho está dirigido ao processo de regulamentação da lei. Em sua avaliação, o processo deveria começar ainda antes do final do ano
e vai seguir o mesmo caminho de construção
coletiva que levou à formulação do Marco, conduzido no final da segunda administração Lula
pelo Ministério da Justiça. Molon acredita que
os dois pontos mais delicados são justamente a
neutralidade da rede – ou seja, quais exceções
podem ser admitidas sem reverter em privilégios – e a guarda de logs dos usuário.
Este item, o artigo 15 da nova lei, foi duramente criticado pelos ativistas da liberdade na rede.
Molon entende, no entanto, que a regulamentação pode ser mais restritiva, estabelecendo exatamente que tipo e porte de empresa fica obrigada a guardar os logs, em quais circunstâncias.
“Esse é um bom debate. Não serão incluídas na
regulamentação coisas que não façam sentido,
como obrigar que universidades e ONGs a guardar logs. E mesmo em relação a empresas poderá se estabelecer um corte”, diz ele.
Ele sabe que a regulamentação, que será feita com participação também pela internet,
será um momento de novos embates em torno
desses dois pontos mais polêmicos. Mas acredita que será possível construir uma boa regulamentação.
Mega Não!
Alessandro Molon, então deputado estadual, começou a se envolver com as questões relativas à
liberdade na rede e aos direitos dos internautas
em 2009, quando foi lançada a vitoriosa campanha Mega Não! contra o projeto de lei (PL 84/99),
apresentado pelo então senador Eduardo Azeredo, do PSDB mineiro, que tratava de crimes na
internet. “Como advogado e militante dos direitos
humanos, passei a ter conhecimento da importância que as primeiras leis relativas à internet
fossem leis que garantissem os direitos dos internautas, e não que os criminalizassem. Daí, passei a participar do debate”, relembra.
Foi esse aprendizado que o levou a lutar pela relatoria do Marco Civil, que Tim Bernes Lee, um
dos criadores da internet, definiu não como um
projeto de internet, mas de direitos humanos na
rede. “Sua promulgação pela presidente Dilma,
na abertura do NET Mundial, em 23 de abril, foi
um momento histórico”, relembra, citando as
manifestações de apoio de personalidades estrangeiras e de nomes importantes no universo
da internet.
ARede especial novembro 2014
13
Especial Educação
Conhecimento livre
e universal
Conceito que defende conteúdos e práticas educacionais abertos,
criado pela Unesco, começa a se disseminar no Brasil.
Fatima Fonseca
A concepção de educação aberta se dissemina pelo Brasil, incentivando a produção de
conteúdos para o uso comum e de políticas públicas para uma educação livre. O conceito de
Recursos Educacionais Abertos (REA), elaborado em 2002, em um congresso da Unesco, já é
aplicado em 22 países. O Instituto Educadigital
(IED) criou, em 2008, o REA.br, projeto vencedor do Prêmio ARede 2014.
Priscila Gonsales
dirige o IED.
Ao lado, a equipe
e pessoal da
comunidade.
14
São considerados recursos educacionais abertos conteúdos, metodologias e práticas em
qualquer suporte ou mídia de domínio público
ou sob licença de uso flexível. A proposta agrega quatro premissas: usar, aprimorar, recombinar e distribuir. “A ideia é que professores e
alunos se tornem produtores de conhecimento,
não apenas meros usuários”, explica Priscila
Gonsales, diretora do IED.
www. arede.inf.br
Jornalista com especialização em comunicação, educação e tecnologias digitais, Priscila
atua na área desde 2001. Em 2009, se engajou
na comunidade REA – sigla em português para
Open Educational Resources. Em 2011, assumiu a gestão do projeto, que tem no conselho
consultivo, entre outros, a advogada e especialista em propriedade intelectual e direito da internet, Carolina Rossini; e o professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal da
Bahia, Nelson Pretto.
“Com o salto possibilitado pela tecnologia, educadores e educandos passam a ser produtores
de formação e conhecimento, mas para isso
precisam entender o que realmente é gratuito e
aberto”, comenta Priscila, informando que rede
REA tem se dedicado a ajudá-los a entender políticas como a do creative commons.
Ainda há muito terreno a ser conquistado no Brasil. Uma das razões, acredita Priscila, é que nem
tudo que está na internet pode ser usado livremente. “O entendimento do que pode ou não ser
reproduzido precisa ser contextualizado de acordo com a nossa Lei de Direito Autoral”, explica.
E dá um exemplo: pela lei, uma obra autoral só é
de uso livre 70 anos após a morte do autor.
em uma área que trata do uso pedagógico das
tecnologias da informação e da comunicação
(TICs) e estamos implantando uma rede social de aprendizagem, toda em software livre”,
relata Cristina Moreira, coordenadora de modernização da gestão da educação. “É um projeto
de plataforma livre e um dos diferenciais teóricos
é o conhecimento livre, o que compreende acesso aberto, software livre e recursos educacionais
abertos”, diz a coordenadora. Segundo ela, uma
das ações do projeto, que será lançado em 2015
pela Secretaria de Educação, é um portal. “Nossa proposta é ter uma biblioteca digital REA no
DF para que os professores depositem o material
didático e façam consultas”, informa.
A comunidade REA.br reúne 273 profissionais
em uma lista de e-mails e quase 8 mil no Facebook, mídias por meio das quais a rede articula
seu trabalho, que tem três frentes. A primeira é
a orientação de políticas públicas, que acontece
em oficinas com representantes do setor legislativo, em uma articulação para que a educação
aberta se torne lei. A comunidade já conseguiu
a aprovação, pela Assembleia Legislativa de São
Paulo, de um projeto de lei – que acabou vetado
pelo governo do Estado. Também colocou o tema
na pauta do legislativo do Paraná e do Distrito Federal, onde tramitam projetos similares. O tema
está em debate ainda na Câmara dos Deputados.
Formação de gestores
O segundo foco é a formação de gestores públicos. As oficinas também são organizadas a
partir da interlocução com a comunidade REA.
Este ano, na Bahia e no DF, foram capacitadas
95 pessoas. “Nas oficinas explicamos os conceitos e fazemos exercícios práticos do uso da
licença”, explica a diretora do IED. Por último,
há o foco na pesquisa, na produção do conhecimento e na disseminação da informação. “No
site postamos informações e referências sobre
direito autoral, educação aberta, licenças livres,
além de notícias e entrevistas sobre iniciativas
REA no Brasil e no mundo”, conta Priscila.
A maior conquista, até agora, foi um decreto da
prefeitura de São Paulo, que orienta os princípios
da educação aberta. “Na Câmara, a matéria está
em discussão para que o PL seja desvinculado
da Lei do Direito Autoral, de modo a não dificultar
o encaminhamento”, informa Priscila.
O REA.br é financiado pela Open Society Foundation, que destina anualmente US$ 90 mil ao
projeto, o que cobre 80% dos custos. O restante
vem de doações e da receita obtida com cursos,
palestras e oficinas. Além do parceiro financiador e do apoio institucional da Unesco, tem
apoio da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), do Creative Commons Brasil, da
Wikimedia Foundation, do Impact Hub São
Paulo e da Ashoka Brasil. O site foi construído
com a ferramenta Wordpress e as apresentações são feitas em LibreOffice. Além da lista de
discussões no Google e do Facebook, são usadas ferramentas de outras mídias sociais, como
Twitter, Flickr, Youtube e Slideshare.
Fotos: Divulgação
No Distrito Federal, o conceito REA foi encampado pela Secretaria de Educação. “Trabalho
www.rea.net.br
www.facebook.com/groups/reabrasil/?fref=ts
ARede especial novembro 2014
15
Especial Educação
A mina de dados
da educação
A plataforma QEdu coleta dados oficiais sobre
o desempenho de escolas e alunos e os transforma em um mapa
para gerar reflexões sobre políticas públicas
Áurea Lopes
Lançado em novembro de 2012, o portal QEdu,
da Fundação Lemann, publica dados educacionais organizados de forma fácil e intuitiva sobre
as condições de ensino em escolas, municípios
e estados. O conteúdo, garimpado a partir de informações oficiais em geral formatadas em planilhas complexas, é “traduzido” em uma apresentação fácil de compreender. “Nossa primeira
preocupação foi facilitar a visualização de dados
a partir de uma busca”, diz Ernesto Martins Faria, coordenador de Projetos da Fundação. Esse
objetivo foi alcançado. Em 2013, mais de um
milhão de pessoas visitaram o portal, que deve
encerrar 2014 com 1,5 milhão de visitas.
Vencedor do Prêmio ARede 2014, o QEdu se
transformou em uma referência tanto para gestores de escolas, como para jornalistas e outros
formadores de opinião. A equipe coordenada
por Faria trabalha com as avaliações do Censo
Escolar e da Prova Brasil, ambos divulgados
pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep), autarquia
do Ministério da Educação (MEC). Estão no portal, aberto e gratuito, números sobre o aprendizado dos alunos de 5º e 9º anos em matemática
e português; perfis e opiniões de alunos, professores e diretores; matrículas, taxas de aprovação, abandono e reprovação; taxas de distorção
idade-série; informações relativas à infraestrutura escolar e o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb). O trabalhado, diz o coordenador, consiste em uma radiografia quantitativa e qualitativa. O sistema também permite
comparar os dados entre as escolas.
16
www. arede.inf.br
Como o site foi desenvolvido para facilitar a busca para pessoas de diferentes perfis, a complexidade na navegação vai aumentando aos poucos. Alguém que esteja buscando, por exemplo,
dados de desempenho, vai encontrar primeiro o
resultado da prova do último ano. Depois consegue fazer uma comparação com o município
ao qual pertence aquela escola, e ainda fazer
a mesma comparação observando o desempenho em vários anos. “Quem tem mais facilidade
pode pular as abas mais simples e ir direto para
os campos com mais informação”, recomenda
o coordenador.
Avaliação
Outro exemplo é a avaliação sobre o desempenho dos alunos em leitura. De acordo com
Faria, o resultado da Prova Brasil não diz muito
sobre a qualidade da escola ou como estão os
alunos nesse quesito, pois a nota vai de zero a
500. “Não dá para se ter uma visão clara se a
média em uma determinada escola é boa ou
não. Mas a plataforma mostra quantos alunos
daquela escola obtiveram uma pontuação adequada”, informa.
Além de ser referência de dados educacionais,
o QEdu tem dois outros objetivos: garantir que
gestores se apropriem dos dados disponíveis
na plataforma; e oferecer informações educacionais para jornalistas e para a sociedade civil.
“Conseguimos trazer à tona informações que
a sociedade não recebia ou às quais não tinha
acesso tão fácil”, destaca Faria. Ele dá como
exemplo uma experiência no Distrito Federal,
Fotos: Divulgação
onde a compilação de dados mostrou que a capital era a unidade da Federação com o mais
alto índice de violência na escola. “Isso gerou
uma pauta e a reportagem teve repercussão. Na
volta às aulas, a polícia do DF foi acompanhar
para ver o que estava acontecendo na escola”,
exemplifica.
dos para a elaboração do Projeto Político Pedagógico e do Plano de Gestão Escolar”, diz Flávia
Rossi, secretária de Educação de Itapira (SP).
Outra gestora, Adriana Cristina Valentin Mantovani, dirigente municipal de Educação de Novais (SP), escreveu: “Usei o QEdu no momento
de realizar o diagnóstico da rede para estipular
metas para o meu município”.
Os resultados mostrados pelo QEdu não são
apenas os negativos. Um levantamento realizado pela equipe do portal gerou uma lista das
escolas que se destacam no ensino de matemática no país. E revelou que a pequena Cocal dos
Alves (PI), com menos de 6 mil habitantes, tem
se firmado como um celeiro de campeões nacionais em matemática.
Para 2015, os planos são fazer uma versão
mobile e intensificar a oferta de formação. Além
do curso Investigando a Qualidade da Educação com Dados Públicos, voltado a jornalistas,
a Fundação Lemann vai oferecer um curso para
gestores, mostrando como os dados podem ajudar as escolas a mudar suas práticas.
A considerar pelos depoimentos de secretários
de educação e técnicos no portal QEdu, a meta
de dar um norte para o gestor público e incentivar novas políticas tem dado resultados. “Na
rede municipal de educação do nosso município, o QEdu está sendo uma das bases de da-
www.qedu.org.br
www.facebook.com/groups/reabrasil/?fref=ts
ARede especial novembro 2014
O QEdu é capaz
de exibir dados
geralmente
apresentados
apenas em
conjunto,
permitindo avaliar
médias por aluno
nas escolas.
17
19
Terceiro Setor | Conteúdo de interesse público
Linha direta com
a navegação segura
Portal fornece informações para proteger crianças
e adolescentes na internet e atende vítimas de violência online
Áurea Lopes
Crianças navegando na internet não são
uma questão polêmica por natureza. Muito
menos representam, obrigatoriamente, uma situação de perigo. A presença da tecnologia já
é irreversível na vida de todos nós, não se trata
de permitir ou proibir, ser bom ou ruim. E isso
é muito bom e saudável, até para as crianças,
desde que elas sejam preparadas para enfrentar os desafios e riscos postos pela web – assim como acontece em outros lugares por onde
circulam, como as ruas, as baladas, as escolas,
as estradas do mundo que precisam explorar. O
portal Helpline.br, vencedor do Prêmio ARede
2014, foi desenvolvido com esse propósito.
Criado pela organização não governamental
SaferNet Brasil, em 2012, é a primeira iniciativa
desse tipo no país com foco no mundo digital.
Oferece orientação gratuita “de forma pontual
e informativa para esclarecer dúvidas, ensinar
formas seguras de uso da internet e também
orientar crianças e adolescentes que vivenciaram situações de violência online como humilhações, intimidações, chantagem, tentativa de
violência sexual ou exposição forçada em fotos
ou filmes sensuais”.
Juliana Cunha, coordenadora psicossocial do
Helpline, conta que o ambiente virtual é favorável para esse tipo de contato, em especial
para interagir com os adolescentes sobre seus
problemas. “Não fazemos julgamentos, nem
censuramos. Eles também não precisam dar os
dados pessoais. Tudo isso os deixa mais à vontade para escrever e participar dos chats”, diz a
coordenadora.
20
www. arede.inf.br
Porém, ela faz questão de frisar que não se trata de psicoterapia, nem substitui o atendimento
psicológico presencial: “Fornecemos acolhimento e esclarecimentos sobre o uso seguro da internet”. Por isso, são feitas, no máximo, quatro
orientações pelo chat ou pelo e-mail. E a partir do
segundo contato é preciso um termo de autorização dos pais, conforme determina o artigo 8º do
Código de Ética Profissional do Psicólogo.
Os profissionais que fazem a interface com
os usuários estão credenciados no Conselho
Federal de Psicologia para atendimento de vítimas de violência – como atesta o selo exibido
no site, com data de renovação, que deve ser
feita de dois em dois anos. Juliana explica que
os casos que exigem uma intervenção clínica ou
o conhecimento por parte de uma autoridade
são encaminhados para órgãos parceiros, como
o Ministério Público, os Conselhos Tutelares, a
polícia, entre outros. O atendimento acontece
de segunda a sexta-feira, das 13h às 19h.
Software Livre
O site foi viabilizado por meio de um edital da
Secretaria de Direitos Humanos, órgão ligado à
Presidência da República, dentro de um programa de prevenção à violência sexual. Recebeu
recursos de R$ 579.165,10, com contrapartida
da organização social no valor de R$ 92.280,00.
Hoje, é mantido exclusivamente pela SaferNet,
com apoio institucional da operadora de telecomunicações GVT. O portal foi desenvolvido
pela equipe de tecnologia da informação da
ONG, com ferramentas livres, códigos abertos
e criptografia.
O Helpline contabilizou, de janeiro de 2012 a
setembro de 2014, 3.047 atendimentos. Entre
as demandas (ver quadro abaixo), destacam-se
19% referentes a ciberbullying (constrangimento via canais digitais) e 12% a sexting (exposição
de imagens de nudismo). Juliana alerta: “Os casos de sexting triplicaram desde o ano passado.
Essas fotos e vídeos sempre acabam vazando”.
E também revela que o ciberbullying acontece
predominantemente entre pessoas conhecidas.
A única forma de proteger crianças e jovens dessas situações, diz a psicóloga, é municiá-los com
informação e orientação.
www.safernet.org.br/site/webline
Fonte: Helpline – wwwsafernet.org.br
ARede especial novembro 2014
21
Terceiro Setor | Capacitação e formação
Uma história, muitas
leituras, saberes
compartilhados
Projeto de incentivo à criatividade estimula o uso
da cultura digital para ampliar a formação dos professores
e as competências dos estudantes
Fatima Fonseca
Trabalhar a criatividade e, ao mesmo tempo, incentivar a leitura. Essa é a fórmula do
projeto E se eu fosse o autor? que estimula a
produção de vídeos e livros digitais por alunos
de escolas públicas. “A produção sempre parte
da leitura de uma obra, uma vez que o objetivo
central é estimular o gosto pela literatura entre
crianças e adolescentes”, resume Leila Dias,
educadora e presidente da associação Casa
da Árvore, ONG que ganhou o Prêmio ARede
2014, por desenvolver ações socioeducativas
no contexto da cultura digital.
Criada em 2007, em Palmas, Tocantins, a Casa
nasceu com foco em arte, educação e tecnologia. O primeiro projeto – Telinha de cinema, voltado para produção de filmes com celular –, deu
origem a um segundo, o Telinha na escola. “O
primeiro surgiu como uma atividade para alunos
de escolas públicas, no contraturno escolar. Depois percebemos a necessidade de se trabalhar
também com professor e aí surgiu o Telinha na
Escola”, conta Leila. Implementado em Fortaleza, Recife e Rondônia, o programa fez um circuito em 18 capitais, formando professores dos
Núcleos de Tecnologia em Educação (NTE).
A ideia do projeto surgiu durante a implementação do Telinha do cinema, que tem entre as
atividades a elaboração de roteiros. “Verificamos que os alunos tinham dificuldade em ler,
escrever e criar. Além disso, o projeto era vol22
www. arede.inf.br
tado para um público de 16, 17 anos e tivemos
pedidos dos pais para os filhos mais novos. A
partir da demanda da população e das deficiências dos alunos, pensamos nesse novo projeto”,
lembra a educadora. Assim, em 2010 começou
com um piloto na cidade de Palmas (TO), por
quase dois anos, com estudantes entre 9 e 12
anos, na região periférica de Aureny. Foram
duas turmas de 20 alunos cada, por semestre,
envolvendo 120 meninos e meninas.
Naquela ocasião, a ONG conseguiu recursos do
programa EDP Solidária, do Instituto Energias de
Portugal. Também conquistou o apoio da prefeitura de Palmas e, posteriormente, foi contemplada com um edital da Petrobras. Com os recursos de R$ 300 mil da estatal, este ano levou o
projeto para Senador Canedo, em Goiânia (GO),
onde as atividades estão planejadas até 2015.
Somente na capital goiana, 341 crianças e adolescentes e 120 educadores já participaram.
O projeto acontece em uma escola da periferia
e na Biblioteca Municipal Arlete Tenório de Castro. Duas vezes por semana os alunos frequentam as oficinas no Laboratório Criativo de Leitura e Tecnologia, trabalhando com o conceito
leitor-autor. A obra é escolhida pelos educadores da Casa da Árvore, que têm interação com
as escolas. “Fazemos na escola uma exposição,
para entenderem a proposta. Conversamos com
coordenadores pedagógicos e professores liga-
dos às áreas de português, literatura, redação.
Também verificamos quais alunos querem fazer
parte do projeto”, explica Leila. A gestão participativa envolve representantes da escola e da
Secretaria Municipal de Educação não só nas
estratégias de implementação, mas também na
avaliação e no monitoramento.
Canedo, como exemplo do impacto do projeto.
Durante a formação de professores, foi identificada a dificuldade de trabalhar gêneros pessoais
e leitura de clássicos. “Fizemos uma formação
presencial e os professores adquiriram uma nova
metodologia para tratar um conteúdo já previsto
no programa”, relata.
Transformações Pedagógicas
O passo seguinte é a escolha de um tema. Os
educadores da Casa da Árvore fazem a mediação de leitura, discutem a prática com os alunos e
orientam pesquisas sobre autor e tema. Aí vem a
fase de criação. Existe liberdade para reconstruir
a história ou escrever outra relacionada ao tema,
adaptar a obra, recriar personagens e enredo,
transformando o texto em uma nova linguagem.
O resultado é compartilhado nas redes sociais.
“O mais interessante é que o projeto constitui
um conjunto de ações que incluem atuação direta com alunos, capacitação de professores
e suporte a esses professores para a aplicação
das práticas. A ideia é usar elementos da cultura
digital para transformações nos projetos político-pedagógicos das escolas”, comenta Aluísio Cavalcante, coordenador geral do projeto.
O resultado foi a leitura de Dom Quixote, de Miguel de Cervantes, utilizando a escrita colaborativa. As turmas usaram o Whatsapp e o bloco
de notas. Além dessas ferramentas, o projeto
usa também LibreOffice, GoogleDocs, SMS e
Word para a construção de textos; aplicativos
e programas de edição de imagens e apresentação interativa (Gimp, Photoscape, PowerPoint,
Prezi, PaintBrush, entre outros aplicativos para
desenho e edição de imagem no celular indicados pelos alunos); aplicativos para leitura
de arquivos em PDF no celular; mapas digitais; ferramentas para e-books (Animated
Book, Booker etc.) e para edição de vídeo (Pitivi, OpenShot, Movie Maker, KdenLive, JayCut
e YouTube Editor). O Laboratório Criativo tem
computadores, smartphones, leitores digitais,
lousa digital, impressora/scanner, máquinas fotográficas e projetores.
Jornalista e educador social, ele cita a Escola
Municipal Vovó Dulce, na zona rural de Senador
www.casadaarvore.art.br
Fotos: Divulgação
Os jovens se
mobilizam para
contar uma
história da forma
como desejarem.
ARede especial novembro 2014
23
Terceiro Setor | Serviços aos usuários e à comunidade
Uma rede para anônimos
O Diasporabr é um dos nós nacionais da rede que garante a
privacidade de dados dos usuários e a independência dos servidores
Rafael Bravo Bucco
A Diaspora é uma rede já conhecida por quem
usa software livre. Criada em 2010 pelos universitários Dan Grippi, Maxwell Salzberg, Raphael
Sofaer e Ilya Zhitomirskiy, de Nova York, a rede
social se propõe a não fazer aquilo que o Facebook mais faz, embora poucas pessoas se deem
conta: coletar dados dos usuários. É uma rede
social que permite a interação, a conexão entre
amigos, a publicação de mensagens públicas e
privadas. Mas faz isso sem que as informações
sejam direcionadas a um enorme banco de dados para cruzamentos e venda de publicidade.
E tudo de forma gratuita, com código livre, para
ser checado, usado e modificado à vontade.
A rede social livre ganhou um pod – como são
chamados seus nós nas redes de servidores
– 100% brasileiro: o Diasporabr, vencedor do
Prêmio ARede 2014. Mantido pelo ativista das
tecnologias livres Anahuac de Paula Gil, o pod
é hospedado gratuitamente nos servidores da
empresa goiana RGV. No começo de outubro,
24
www. arede.inf.br
contabilizava 15,5 mil participantes. Entrou no
ar em 11 de dezembro de 2013. Seu diferencial
em relação aos pods mundiais é a observância
das leis brasileiras. Os logs e as navegações do
usuário não são armazenados, pois não há essa
exigência no Marco Civil da Internet para um
serviço não comercial, como é o caso.
Um pod funciona de forma integrada à rede
Diaspora mundial, mas também de forma independente. Essa é uma premissa fundamental
dessa rede social aberta. A comunidade tem
autonomia para decidir como usar os dados
dos usuários. Esse sistema de gestão, em que
cada provedor de acesso à rede social define as
regras para administrar os dados, é chamado
“federado”. Funciona como em um país federativo, em que cada estado tem autonomia para
criar as próprias leis. Na rede federada, cada
servidor decide como tratar os dados. “Todas
as contas de todos os servidores comunicam-se
entre si, mas a gestão de cada servidor é inde-
Fotos: Divulgação
A maior diferença
da Diaspora é sua
rede distribuída,
com servidores
autônomos.
pendente”, explica Gil. Ou seja, se o pod tiver
regras com as quais o usuário não concorda,
basta cadastrar a conta em outro pod. E se nem
assim o usuário encontrar um servidor com políticas que lhe agradem, pode baixar o software
criar seu próprio servidor, como quem hospeda
um site. “Você pode ser mestre e senhor de um
servidor de rede social. O conceito primário da
democracia é exatamente a fragmentação do
poder”, resume Gil.
No caso da Diasporabr, a opção é garantir o anonimato dos usuários. “Não exigimos nenhum
tipo de validação de identidade. O nome e o
e-mail não precisam ser reais e não há qualquer
campo pedindo seu número de telefone. Se as
contas são anônimas e pode-se ter seu próprio
servidor, ninguém pode censurar o conteúdo
das publicações”, diz Gil. O usuário é dono do
que escreve, do que compartilha. É detentor das
próprias ideias, fotos e músicas. Os seguidores
podem ler, partilhar, opinar. Mas nenhuma empresa, ou a ferramenta da rede, é capaz de reunir, analisar e cruzar informações – uma vez que
a comunicação entre as bases de dados, entre os
servidores, é encriptada por padrão.
Além disso não é preciso aceitar termos de contrato que transformam conteúdos pessoais em
produtos das empresas. “Suas fotos continuam
sendo suas. Suas ideias continuam sendo suas.
Não haverá mineração de dados, análise, catalogação, tratamento estatístico ou perfilamento”,
explica o ativista. Isso quer dizer também que,
quando o usuário quiser apagar a conta, vai conseguir, e junto, pode apagar todos os dados rela-
cionados. “As mensagens e imagens são removidas de verdade da base de dados e do disco. Não
há uma segunda base escondida”, observa.
Integração
Vale lembrar, porém, que a Diaspora não está
isolada do mundo das redes sociais digitais mais
populares da internet. A comunidade reconhece
a necessidade de transição. Por isso, criou ferramentas que facilitam a integração com Facebook, Twitter, Tumblr e Wordpress. “Assim pode-se manter contato com as pessoas que estão
por lá enquanto isso for interessante”, diz Gil,
que nunca teve Facebook e não usa Gmail.
Ele ressalta que, por ter como base o software
livre, a rede passa por atualizações constantes. E o pod nacional não vai ficar para trás.
Está na versão 4.1.0, mas os preparativos
para receber a versão 5, em desenvolvimento, já começaram. Gil é o responsável pela
integração com a plataforma Jabber, que facilita a troca de mensagens instantâneas. Ele
insistiu para que a comunidade levasse o recurso para popularizar a rede social. A “militância” deu resultado. “Já estão comentando
os primeiros códigos do chat que virá na versão 5. Deve estar funcionando em breve no
Diasporabr. Ter um chat, antes de qualquer coisa, elimina a sensação de inércia, de que a rede
está parada. A ferramenta é fundamental para a
rede crescer”, defende.
diasporabr.com.br
ARede especial novembro 2014
25
Setor Público | Conteúdo de interesse público
Observatório social
para a juventude
A plataforma online cria um espaço para articulação
de interesses e construção colaborativa de políticas
públicas que atendam as demandas dos jovens
Fatima Fonseca
Lançada em julho de 2013, a plataforma
virtual Participatório, desenvolvida no âmbito
da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), já
mostra bons resultados em pouco mais de um
ano que está no ar: no início de outubro, o portal contabilizava 11,6 mil usuários, tinha 282
vídeos cadastrados e 534 comunidades debatendo temas como educação, reforma política
e corrupção, sob a ótica dos jovens. Algumas
dessas comunidades foram criadas pelos próprios usuários. “Nós estimulamos o uso da plataforma como um fórum de discussão, de produção de documentos”, conta Carla de Bezerra
Paiva, gestora do Participatório: Observatório
Participativo da Juventude, projeto premiado no
Prêmio ARede 2014.
tiva. Ela ressalta que “a proposta do Participatório dialoga com a ideia de um observatório
social, mas busca também articular uma rede
social, voltada à produção do conhecimento sobre e para a juventude”. A proposta inicial era
juntar duas demandas que existiam na Secretaria Nacional da Juventude, vinculada à Secretaria Geral da Presidência da República. Uma,
um mecanismo de comunicação mais ágil com
a juventude, pensando na linguagem das redes
sociais para promover a participação. A outra,
um espaço de produção do conhecimento focado em dados da juventude. “Da fusão desses
dois objetivos, tentamos quebrar a lógica do conhecimento como algo elitizado, pensando em
dados acessíveis a todos”, conta a gestora.
Especialista em políticas públicas, Carla é um
dos dez profissionais responsáveis pela inicia-
A plataforma foi construída com diferentes tecnologias, em códigos livres e abertos. As prin-
O portal tem mais
de 11 mil usuários,
mais de 280 vídeos
cadastrados e 530
comunidades.
26
www. arede.inf.br
Além da biblioteca, a plataforma traz dados e
pesquisas, como a realizada no ano passado e
em fase final de conclusão, com três mil brasileiros de 15 a 29 anos, de todas as regiões e
diferentes classes sociais. “Abrange temas relacionados ao perfil do jovem, seus valores, o
que essa geração considera mais importante,
a participação política, e questões de educação, trabalho e saúde”, conta Carla. O resultado, previsto para ser publicado no final do ano,
mostrará os valores que essa parcela da população considera mais importantes.
O Participatório tem, ainda, ferramentas para
debate e deliberação sobre documentos e políticas públicas. A gestora do projeto destaca duas
consultas públicas: uma sobre o sistema nacio-
nal de juventude, realizada no ano passado, e
que reuniu as contribuições para a elaboração
do Estatuto da Juventude, que resultou na Lei
nº 12.852, de agosto de 2013; e a consulta para
o documento apresentado pela delegação brasileira na Conferência Mundial da Juventude,
realizada em maio deste ano, em Colombo, no
Sri Lanka. Os processos de articulação política
e produção de conteúdo, via Participatório, envolvem também a academia e redes de pesquisadores voltados para esse segmento. “Essas
ações têm impulsionado outras atividades, como
uma revista eletrônica. Tudo isso objetiva tornar
o conteúdo mais acessível”, explica Carla.
Espaço único
Estimado em R$ 3 milhões ao longo de dois
anos, com recursos do orçamento da SNJ, o
Participatório agrega três parceiras: a Universidade Federal do Paraná, a Universidade Federal do Rio de Janeiro e o Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea). Junto com essas
instituições, os gestores do projeto trabalham
para fazer a fusão de outros portais relacionados à juventude. “Vamos construir um grande
portal temático, que vai abrigar o portal institucional da SNJ, o portal Juventude Vida, o portal
do Conjuve e o próprio Participatório”, anuncia
Carla, antecipando que o nome será Portal da
Juventude. Previsto para ser lançado em dezembro, manterá o visual e a metodologia herdados do Participatório.
www.participatorio.juventude.gov.br
Fotos: Divulgação
cipais são o ELGG e o DSpace. O primeiro é
um software de rede social, desenvolvido em
linguagem PHP. Estão disponíveis um blog, comunidades com fóruns de discussão ou blogs
comunitários, espaço para repositório de arquivos, e-portifólio, tecnologia RSS para o conteúdo gerado dentro da rede, entre outras funcionalidades. O DSpace é resultado de um projeto
colaborativo entre a MIT Libraries, do Massachussetts Institute of Technoloogy, e a HP. A
organização que adota o DSpace arca com as
responsabilidades e o custo das atividades de
arquivamento e publicação de sua produção.
Esse programa permitiu criar a Biblioteca Digital, que reúne a produção bibliográfica da SNJ e
do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve).
ARede especial novembro 2014
27
Setor Público | Capacitação e formação
Um novo jeito de
ensinar e de aprender
A rede municipal de educação de Cascavel adotou o Scratch
para inovar no ensino. Com interface simples, o programa estimula
o raciocínio lógico e faz sucesso com os estudantes.
Fatima Fonseca
É possível aprender e ensinar de forma mais
divertida, com atividades dinâmicas e utilizando como instrumento aquilo que os estudantes
mais gostam: a tecnologia que permite jogar, interagir, criar. A experiência, que tem como base
o Scratch, linguagem desenvolvida pelo Massachussetts Technology Institute (MIT), começou
no ano passado em uma escola de Cascavel, no
Paraná, e já chegou a 20 das 62 unidades da
rede municipal de ensino do município. “É uma
ferramenta cheia de possibilidades para professores e alunos”, comenta Jocemar do Nascimento, coordenador do Núcleo de Tecnologia
Educacional (NTE) de Cascavel.
28
na escola. Em três anos, 1,28 mil professores
passaram por 3.8 mil horas de capacitação.
O projeto Ensino de programação para alunos
do 4º e 5º anos do ensino fundamental, vencedor do Prêmio ARede 2014, tem sido apresentado em fóruns educacionais e de software livre
como um caso de sucesso.
A ideia do ensino de programação surgiu em
2012, durante a formação de professores de
laboratórios. “Alguns começaram a aplicar no
ano passado com os alunos de 4º e 5º ano”,
relata Nascimento. Como a professora de informática Roseli de Souza Ramalho, pioneira no
uso do Scratch em sala de aula. E o curioso é
que Roseli deu os primeiros passos em tecnologia com mais de 30 anos de idade. Ela conta
que aprendeu com os filhos, jogando videogame. “Hoje, estar aqui com eles, ensinando, é
um acontecimento. Jamais imaginei que poderia fazer isso. É muito gratificante você ensinar
aquilo que você sofreu para aprender”, afirma.
Segundo ela, com o Scratch, o aluno se força a
pensar, a exercitar as funções cognitivas. “E o
aprendizado já começa nesse ponto”, destaca.
Com uma interface simples, o programa Scratch estimula o desenvolvimento do raciocínio
lógico. Além disso, pode mudar a cara dos trabalhos em sala de aula, substituindo a prova
convencional por um jogo de perguntas e respostas, por exemplo. Os exercícios são divididos
por tópicos (animações, jogos, distorção interativa, música etc.), cada um com lições e práticas de aprendizagem diferentes. “O aluno programa sem perceber que se está programando.
E o professor consegue trabalhar praticamente
com todos os conteúdos do currículo escolar”,
diz Nascimento, responsável pela formação de
professores no uso da tecnologia no cotidiano
Na televisão
O coordenador do NTE acrescenta que os frutos
começaram a ser colhidos este ano, com o resultado dos programas elaborados pelas crianças. O
projeto funciona no horário da aula de informática – todos os estudantes têm 50 minutos por
semana de aula – e algumas escolas têm usado o
Scratch em atividades em sala de aula. “Não é só
programação. O aluno tem que pesquisar na internet, usar fontes. A programação é o resultado
disso”, ressalta Nascimento. Mas o que a garotada mais gostou foi de ter participado, em maio de
2014, do programa Esquenta, comandado por
Regina Casé na Rede Globo. A professora Roseli
www. arede.inf.br
e mais dois alunos estiveram na TV contando sobre o que fazem nas aulas de programação.
A Secretaria Municipal de Educação, junto com
o NTE, está instalando o Scratch nos notebooks
que começaram a ser distribuídos para professores e alunos do 4º e 5º ano. De acordo com Nascimento, a adoção do projeto nas demais escolas
depende apenas de cada instrutor, uma vez que
todos já receberam formação e todas as escolas
têm infraestrutura – em 49 instituições, o laboratório tem 27 computadores, nas demais entre 10
e 15 computadores.
Fotos: Divulgação
Dos 25 mil alunos da rede municipal, 4 mil já têm
acesso ao Scratch. “As escolas têm projetos diferentes para uso em laboratório. Umas adotaram
o Scratch, outras o Moodle (plataforma de ensino
a distância), algumas usam o game Minecraft, de
acordo com a habilidade que o instrutor tem com
a ferramenta”, explica Nascimento. Os trabalhos
dos alunos são publicados no blog da escola. O
NTE está, agora, levando os projetos para a sua
plataforma.O programa Escola.com, lançado
pela prefeitura de Cascavel em abril, tem como
proposta levar os portáteis a todos os alunos da
rede municipal. Este ano foram distribuídos 4,5
mil notebooks para os alunos do 5º ano e para
professores. “Todas as máquinas vêm com Scratch, software livre e cerca de 4 mil atividades selecionadas pelos instrutores de informática das
escolas”, informa Nascimento. Em 2015 serão
mais 9 mil notebooks para estudantes do 4º e 5º
ano. Quando concluírem o 5º ano, os estudantes
poderão ficar com os computadores – a rede municipal de ensino de Cascavel vai até o 5º ano. “A
Escola.com vai fazer o diferencial no município
de Cascavel. Vamos dar um salto de qualidade
para que em 3, 4 anos possamos colher os frutos
dessa tecnologia”, diz o prefeito Edgar Bueno.
www.ntcascavel.com
Quando saem do
5º ano, os estudantes
de Cascavel ficam
com os notebook
em que aprenderam
a programar.
ARede especial novembro 2014
29
Setor Público | Serviços aos usuários e à comunidade
Articulação política?
Coisa de hackers!
da Câmara dos Deputados, o Labhacker gera
aplicativos, ferramentas e atua para promover o debate
e a formulação de políticas públicas.
Fatima Fonseca
Há atividades hackers na Câmara dos Depu-
Fotos: Divulgação
tados. Não para vasculhar as comunicações
dos parlamentares, mas para formar uma rede
colaborativa de desenvolvimento de aplicativos
e ferramentas – em softwares livres – destinados a melhorar a interação da sociedade com
seus representantes no poder legislativo. Esse
é o propósito do Laboratório Hacker, vencedor
do Prêmio ARede 2014. “Aqui no Labhacker
temos a possibilidade de criar uma nova forma
de trabalhar, de colocar o ator político, o deputado; os burocratas e qualquer cidadão, não só
hacker, para discutir e repensar o parlamento”,
explica Cristiano Ferri, coordenador do laboratório, criado em 2013.
Os hackathons
do Labhacker
recebem gente
de dentro e de fora
da Câmara
30
www. arede.inf.br
A ideia surgiu durante a Maratona Hacker
(hackathon), realizada em outubro de 2013 no
Legislativo, por sugestão de um dos participantes, Pedro Markun, que é um dos líderes do movimento hacker no Brasil voltado à transparência. “Fizemos um grande esforço para colocar o
presidente (deputado Henrique Alves) em contato direto com os hackers. E o Markun sugeriu
ao presidente a criação do espaço hacker na
Câmara”, relembra Ferri.
No hackerspace, que começou a funcionar de
forma mais híbrida e evoluiu para o Laboratório
Hacker, está em fase final de implementação
um painel social que dá aos parlamentares um
termômetro do que a sociedade está discutindo nas redes sociais, em determinado dia, sobre políticas públicas. Também são realizados
eventos chamando pessoas para discutir na
Câmara temas relacionados à transparência
de dados.
Para novembro, estava sendo organizado um
novo hackathon com foco na questão de gêneros. “Vamos discutir a construção de ferramentas para acompanhar a eficácia das
politicas pró-gênero no Executivo”, antecipou
Ferri. Doutor em ciência política e sociologia, e
mestre em políticas públicas, além de pesquisador associado do Ash Center for Democratic
Governance and Innovation da Universidade
de Harvard, Ferri idealizou, anteriormente, o
Portal e-Democracia, de participação social da
Câmara dos Deputados. De janeiro a outubro de
2014, o portal teve 703 mil visitantes únicos e
31.596 cadastrados nas comunidades. Ferri é
ainda gestor de projetos ligados à transparência
2.0, que trata de dados abertos, e acaba integrando diferentes atividades inter-relacionadas.
Resistência
O coordenador do Laboratório Hacker conta
que no início houve uma certa resistência, tanto dos parlamentes em abrir a Câmara para os
hackers, como de uma parcela da comunidade.
“Mas o desafio maior foi na burocracia”, relata
Ferri. “Um espaço hacker dentro de uma instituição pública gera uma série de discussões e
questionamentos sobre a forma como a burocracia se organiza”, explica.
das politicas públicas. Por exemplo: o laboratório foi procurado por estudantes que alugam
um barco e vão às comunidades ribeirinhas da
Amazônia levar conhecimento de tecnologia e
inclusão digital. São povoados onde, às vezes,
nem luz elétrica existe. “O projeto foi para uma
audiência pública na Comissão de Desenvolvimento da Amazônia. A articulação é nesse
sentido. E a ideia é formar essa rede que possa
apoiar esses projetos”, diz Raquel.
A equipe do Laboratório Hacker tem o apoio
da academia. A Universidade de Goiás está
fazendo o mapeamento do perfil de usuários
do e-Democracia. “Queremos conhecer os cidadãos que participam do portal, que tipo de
colaboração eles fazem”, explica Raquel. Outro
convênio, com o Laboratório de estudos sobre
Imagem e Cibercultura (Labic), da Universidade Federal do Espírito Santo, contempla a produção de relatórios e metodologias para redes
sociais, buscando compreender o que pensa a
sociedade em relação a políticas públicas e aos
temas em debate na Câmara. Com a Universidade Federal da Bahia, a parceria inclui intercâmbio e colaboração técnica e científica especializada em redes, visando o desenvolvimento
de recursos humanos.
Superadas as dificuldades de “incluir um elemento externo da sociedade” em uma instituição pública, sobreveio o lado positivo da iniciativa: propiciar uma nova forma de trabalho às
três dimensões, social, política e burocrática.
Ou seja, as ações do Labhacker colocam os atores políticos (deputados), os burocratas (servidores) e todo e qualquer cidadão (não só um
hacker) para discutir e repensar o parlamento.
O Labhacker tem 13 desktops, quatro laptops e
quatro tablets, utilizados pelos funcionários da
Câmara envolvidos com o projeto, por colaboradores e visitantes. Em quatro das máquinas
roda GNU/Linux. A Casa também cedeu para
o laboratório câmeras e outros equipamentos
de vídeo e áudio para transmissão ao vivo dos
eventos e duas TVs para apresentações, com
interação por videoconferência. O ambiente
tem cobertura WiFi e a divulgação de eventos
é feita pelas páginas do Laboratório e do e-Democracia no Facebook, no Instagram e no
Twitter. O modelo wiki é utilizado na ferramenta
da wikilegis do e-Democracia, o que permite a
contribuição de internautas para projetos de lei,
a exemplo do que aconteceu com o Marco Civil
da Internet e com o Estatuto da Juventude.
A assistente da coordenação do Laboratório
Hacker, Maria Raquel Melo, acrescenta que o
espaço está aberto para a articulação de varia-
http://edemocracia.camara.gov.br/web/laboratorio-hacker
ARede especial novembro 2014
31
Setor Público | Tecnologia para acessibilidade
Escolas preparadas
para a inclusão
Com softwares de acessibilidade instalados nos
laboratórios de informática, São Paulo assegura formação
para estudantes com deficiência em toda a rede municipal.
Fatima Fonseca
Instalar laboratórios de informática em
560 escolas públicas de ensino fundamental,
que atendem a um contingente de 1 milhão de
alunos, não é tarefa fácil. E se torna ainda mais
complexa se, nesse universo, existirem 25 mil
estudantes com algum tipo de deficiência. Esse
desafio foi superado, na cidade de São Paulo,
por uma iniciativa do Núcleo de Informática
Educativa, da Secretaria Municipal de Educação (SME). Os educadores e técnicos foram a
campo buscar softwares de acessibilidade para
que alunos com deficiência pudessem não apenas ser incluídos mas ter maior interatividade,
inclusive social. O projeto Recursos Tecnológicos Acessíveis, vencedor do Prêmio ARede
2014, investiu também na formação dos professores especializados em informática educativa.
“Os professores tinham dificuldade em fazer
com que alguns desses alunos com deficiência
32
www. arede.inf.br
participassem da aula de informática”, conta
Deise Tomazin Barbosa, assessora técnica de
Informática Educativa da SME. “Diante dessa
necessidade, decidimos realizar uma pesquisa
e garimpar softwares para suprir a necessidade
desses alunos dentro do laboratório de informática ou na sala de aula”.
O projeto, que começou em 2012, com seis
programas de acessibilidade, envolve hoje dez
sistemas e os chamados objetos de aprendizagem, entre os quais games educativos, cujo objetivo é fazer com que a criança aprenda brincando. De acordo com Deise, todas as escolas
da rede têm equipamentos onde estão instalados os programas DosVox, MecDaisy, Eugênio,
PCS, Teclado Virtual, Sarobã Virtual, Mouse
Virtual, NVDA, Simon e MicroFênix. São soluções voltadas a pessoas com baixa visão, deficiência física, mobilidade reduzida, limitação
Fotos: Divulgação
maneiras para que nenhum aluno fique fora
do laboratório”, informa a assessora técnica
de Informática.
Professores recebem
capacitação para
ensinar estudantes
com deficiência
usando TICs
motora, deficiência intelectual, dificuldade de
leitura e escrita, deficiência auditiva e dificuldade em comunicação verbal e não verbal. Conforme outras necessidades vão aparecendo, os
técnicos promovem novas pesquisas.
O projeto encontrou apoio na comunidade acadêmica e foi além dos muros da escola. Como
alguns só têm a possibilidade da comunicação
através do recurso tecnológico, os educadores
orientam as famílias a instalar os softwares nos
computadores de casa. “Também recebemos
ligações de profissionais pedindo formação, propondo parceria. Por isso, na Diretoria de Educação temos uma equipe que trabalha diretamente
com os alunos com deficiência”, conta Deise.
capacitação docente
Já foram capacitados cerca de 900 Professores
Orientadores de Informática Educativa (Poie),
que atuam nos laboratórios. “Os softwares de
acessibilidade foram instalados inclusive nas
redes administrativas das escolas e os cursos
são oferecidos para todos os professores que
queiram se atualizar e aprender a elaborar as
atividades e projetos para que alunos com deficiência possam participar das atividades com
o uso de tecnologias”, acrescenta Deise. Esses
cursos são coordenados por gestores ligados às
13 diretorias regionais de educação. Todos os
dez softwares são livres, mas a formação para
os profissionais da educação abrange também
as atividades com a acessibilidade do Windows. “Estamos tentando cercar de todas as
Os números da Secretaria de Educação mostram
que, ao todo, cerca de 2,6 mil profissionais, desde o professor da educação infantil até o professor de ensino médio, receberam formação em
tecnologias para acessibilidade. O levantamento
do número de alunos incluídos ainda está sendo
feito pela equipe da Educação Especial. A gestão
do programa contempla uma reunião mensal
com os profissionais de informática educativa,
que apreentam um relatório dos resultados em
sala de aula.
Uma das gestoras em Informática Educativa,
Maria Izilda Almeida Borges, relata os avanços.
Integrante da Diretoria Regional de Educação
de Freguesia do Ó, que responde por 49 escolas do ensino fundamental, ela se orgulha do
uso, também por alunos deficientes, do scratch
(criado pelo Media Lab, do Massachusetts Institute of Technology, MIT). “Essa linguagem de
programação está sendo disseminada na nossa
rede, contemplando a todos, inclusive os alunos
com deficiências”, relata. Os estudantes usam
o scratch para criar histórias animadas, jogos e
outros programas interativos.
Há 26 anos na profissão, a professora Roselaine
Chanes, orientadora da EMEF Zilka Salaberry
de Carvalho, no Jardim Antártica, zona Norte de
São Paulo, confirma: “As tecnologias de acessibilidade ajudaram bastante. Temos nesta escola
alunos com deficiência motora, dificuldades na
fala e muitos com paralisia cerebral, com enorme dificuldade até de se mexer. Para esses alunos é uma alegria quando conseguimos entender um pouco do que eles falam”, afirma. Com
o uso do programa MecDaisy, que converte a
escrita em fala, esses alunos se tornam capazes de se comunicar e elaborar uma narrativa
ou uma história. “Mesmo não sendo a fala dele,
o aluno consegue ouvir, e fica feliz por conseguir se comunicar. Isso tudo ajuda bastante no
aprendizado”, comemora a educadora.
http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Projetos/ie/
Default.aspx
ARede especial novembro 2014
33
Setor Privado | Conteúdo de interesse público
A moçada dos morros
aparece no mapa
Projeto Agentes da Transformação recorre aos moradores
das comunidades para saber mais sobre as necessidades locais
e subsidiar políticas públicas
Áurea Lopes
to Pereira Passos (IPP), autarquia da prefeitura
do Rio de Janeiro, está levantando informações
sobre os jovens que vivem nas comunidades
pacificadas cariocas. O projeto Agentes da
Transformação, vencedor do Prêmio ARede
2014, capacita meninas e meninos de 14 a 24
anos para trabalhar como entrevistadores nas
regiões onde moram, reunindo indicadores socioculturais que podem orientar a formulação
de políticas públicas.
A primeira fase foi realizada em 2013, em dez
comunidades (ver quadro ao lado). Agora, na
segunda etapa, estão sendo mapeadas as comunidades de Batan, Parque Oswaldo Cruz
(Manguinhos), Unidos de Santa Teresa (Fogueteiro), Mangueira, Salgueiro, Santa Marta e São
João. Em cada localidade, dez jovens integram
o time de pesquisadores locais. Em 2013, foram aplicados 5 mil questionários. Este ano,
serão 3,5 mil.
Andréa Pulici, gerente de Pesquisa e Avaliação
do IPP, e coordenadora da segunda edição da
pesquisa, explica que para formar a equipe de
campo o IPP visita as escolas estaduais dos
bairros e convida os estudantes, que por sua
vez divulgam o projeto entre seus amigos. A TIM
paga uma bolsa de R$ 250 aos participantes e
fornece os tablets usados para registrar os dados coletados, todos com conectividade 3G.
Antes de sair batendo nas portas dos vizinhos,
os jovens recebem uma capacitação sobre o ofí34
www. arede.inf.br
cio de entrevistador, aprendem noções de estatística e colaboram para montar um plano de
ação. Recebem, também, treinamento para lidar com os tablets no trabalho. As capacitações
duram quatro semanas, com carga de 4 horas
diárias, sempre no contraturno escolar. Depois,
os pesquisadores ficam em campo por cerca de
três meses. “Concluída a coleta, fazemos nova
capacitação em cima dos resultados. É um segundo ciclo, em que a gente apresenta os resultados para eles, que analisam e os apresentam
depois, em uma formatura, a uma plateia de
jornalistas, funcionários da prefeitura e familiares”, diz Andréa.
Fotos: Rubens Kurin
Uma parceria entre o Instituto TIM e o Institu-
Os jovens das
comunidades
realizam o estudo
e mapeamento,
usando tablets 3G.
Rubens Kurin, coordenador geral do projeto desde o início, aponta outros efeitos sociais da inicitaiva: “O contato entre os jovens e com a comunidade acaba por estimular a formação de grupos
e propiciar articulações locais. Assim, o trabalho
também se torna um instrumento para formação
cidadã, de onde podem surgir novas lideranças”.
Comunidade cansada
Ano passado foram 5 mil entrevistas. Em 2014,
mesmo com uma quantidade (um pouco) menor, a rotina não é moleza não. “Algumas pessoas ficam assustadas quando a gente chega
perguntando. É natural. Antes da pacificação,
a coisa aqui era complicada”, conta Matheus
Wassil Mesavilla Esperança, de 18 anos, que
participa da segunda fase do projeto, iniciada
em junho. Ele mora no Morro do Salgueiro. Faz
um curso supletivo pela manhã e no período da
tarde se dedica ao projeto. No dia a dia, precisa também vencer outro preconceito, o de que
levantamentos do tipo não levam a nada. “A comunidade está cansada de responder pesquisas e não ver mudanças, de não ver continuidade nos projetos”, diz.
Os agentes carregam a tiracolo o tablet, que
usa o sistema operacional Android. Inserem os
dados coletados no software livre Para Pesqui-
sa, desenvolvido por outra parceira, a empresa
La Fabrica, especialmente para o projeto. Os
formulários preenchidos são transmitidos pela
internet e armazenados em plataforma web.
Pela internet, os gestores podem criar novos formulários e acompanhar os registros. O programa tem interfaces para pesquisas realizadas,
pendentes, fluxo de aprovação de pesquisas,
criação de usuários pesquisadores e coordenadores e atribuição de cotas de pesquisa.
Marlon de Souza Rangel, 17, estudante do
3º ano do ensino médio, já participa pela segunda vez do Agentes da Transformação. “Fiquei
surpreso de ver quantos jovens pararam de estudar. E concluí que muitas pessoas reclamam
da vida, mas não sabem como é a realidade de
gente que está muito abaixo, gente que ganha
400 reais para sustentar três filhos”, diz. Seu
colega, Eduardo Rosa Thomé dos Santos, que
participou da primeira fase do projeto, se chocou, ainda, com a pobreza extrema e falta de
projetos sociais. “Na época do tráfico eu praticamente não saía de casa. Por isso, não conhecia a minha comunidade”, relata.
www.institutotim.org.br
Retrato de uma geração
Na primeira etapa do Agentes da Transformação, em 2013,
cem jovens e mais dez coordenadores de campo trabalharam nas comunidades Borel, Cidade de Deus, Formiga,
Morro dos Prazeres, Nova Divineia, Pavão, Pavãozinho, Providência, São Carlos, Tabajaras e Vidigal. Descobriram que
89% acessam a internet rotineiramente, 72,8% o fazem
todos os dias, e o Facebook é o serviço mais usado, acessado por 86,3% deles. O levantamento também revelou,
por exemplo, que 17% dos jovens são responsáveis pelo
domicílio e que 19,1% têm filhos. Estudar é um desafio
para a maioria. Dos jovens de 18 a 24 anos, apenas 20% se
dedicam unicamente aos estudos. Entre o restante, 6,9%
estudam e buscam emprego, 13,3% estudam e trabalham,
29,8% só trabalham, 10% só buscam emprego e 20% não
estudam, nem trabalham, nem procuram emprego.
ARede especial novembro 2014
35
Setor Privado | Capacitação e formação
Todos podem aprender
Cursos gratuitos, palestras, programas de rádio e TV,
sites de conteúdos. Um projeto que usa diferentes ações
e mídias dissemina o conhecimento sobre tecnologia.
FATIMA FONSECA
Desde os cinco anos de idade Fernando
Lemos gostava de tecnologia. Na época, década
de 1960, o interesse era só uma curiosidade de
criança, aquela vontade de abrir um rádio para
ver o que tem dentro ou de entender como funcionava a televisão. O passatempo da infância
acabou incorporado à vida de adulto e se tornou profissão. Formado em uma das primeiras
turmas do curso de Tecnologia do Mackenzie,
Lemos passou por algumas multinacionais do
setor de TI e, desde 2008, criou o projeto Tecnologia Para Todos, vencedor do Prêmio ARede
2014. “A ideia é transformar a vida das pesso-
as com a tecnologia, fazer a inclusão social por
meio da inclusão digital”, sintetiza Lemos.
O projeto começou com a realização de palestras – em outubro deste ano, Lemos fez sua
palestra de número 1.300 –, chegou ao rádio,
depois à TV e, claro, à web, onde estreou um
programa semanal na Webcomtv. O segredo de
tantas atividades está na maneira simples de falar sobre tecnologia para todas as pessoas, seja
uma dica pessoal ou profissional. As palestras
são realizadas tanto para um público leigo como
para profissionais do setor corporativo.
Após as primeiras palestras, veio a ideia de lançar o site. Ao falar sobre o assunto com uma
amiga, surgiu um novo projeto, o Tecnologia
Fotos: Divulgação
Fernando Lemos grava
o programa Tecnologia
para Todos, que está no
rádio, na TV e na web.
36
www. arede.inf.br
Para Todos, baseado em três pilares: informações para profissionais de tecnologia, informações para usuários, adotando uma linguagem
fácil, e preocupação com o social.
Além de levar conhecimento, em palestras e
em diferentes mídias, para qualquer cidadão,
o projeto doa computadores para organizações
da sociedade civil. “Desde o início, nosso objetivo foi o de levar informação para as pessoas,
mostrar como a tecnologia pode ajudar”, ressalta Lemos.
Nas diferentes mídias, Lemos dá dicas sobre
aplicativos, sites, segurança, serviços, tendências, cursos gratuitos, usando sempre uma linguagem que as pessoas entendam. “É preciso
ter humildade, segurança e responsabilidade”,
ensina. Entre os programas já realizados, ficou
com o Tecnologia p ara Todos durante mais de
seis anos na Rádio Oi FM e apresenta o programa, no mesmo formato, na NET, em 22 cidades.
Com o sucesso de público, será ampliado e deve
chegar em 30 cidades até o início de 2015.
Na TV, são 30 minutos de programa semanal. A
cada edição, Lemos aborda um tipo de tecnologia. Na estreia, na NET em São Paulo, a audiência medida pelo Ibope digital foi de 9 mil pessoas.
Hoje há, em média, 52 mil telespectadores assistindo ao programa. Os temas escolhidos seguem
tendências, como a tecnologia na nuvem e outras inovações que surgem no dia a dia, abordam
sempre a questão da segurança e, principalmente, muitas dicas sobre o uso de tecnologia.
Novas mídias
Para outubro, estava previsto o lançamento da
Revista Tecnologia Para Todos. A publicação,
em formato eletrônico, surge para tratar de inovação, tecnologias educacionais, redes sociais,
vírus (e antivírus), entre outros temas afins.
“Um dos objetivos é contribuir para mudar a
forma como se aplica a educação nas escolas”,
salienta o tecnólogo. Para isso, juntou à equipe duas pedagogas, que vão ajudar na formatação de conteúdos para crianças. “Queremos
ensinar uma criança a fazer backup”, exemplifica. O conteúdo educacional, que deve virar
uma cartilha, será colocado à disposição das
secretarias municipais e estaduais de educação, gratuitamente.
O site foi reformulado e, além de hospedar a revista, passa a publicar a versão online do programa Tecnologia na TV, além de manter as seções
que já existiam como tecnologia de A a Z, Dicas,
Vídeos e Faça a Diferença, um espaço para a divulgação de ações sociais. A gerente de Planejamento, Fernanda Martins, explica que o objetivo
da seção é motivar as pessoas que são simpáticas à tecnologia a ajudar quem precisa.
“Este projeto consiste em levar formação e informação para pessoas, doar tecnologia para
instituições, incentivar profissionais da área a
serem voluntários em algum centro de treinamento”, explica Fernanda. A equipe pesquisa
instituições e as referencia no site do projeto. Alguns exemplos: Casa de David, Graac, Instituto
Dorina Nowill, Casa do Zezinho.
“Também fornecemos conteúdo, fazemos palestras e ajudamos na formação para o Terceiro Setor”, diz Fernanda, destacando que anualmente
o Tecnologia Para Todos faz o Congresso ONG
Brasil e organiza o Congresso Nacional para
Gestão da Pessoa com Deficiência. As palestras
em ambiente social e acadêmico são gratuitas,
e as corporativas, pagas. A sustentabilidade dos
projetos se dá também por meio de propaganda,
veiculada nos programas de TV e rádio.
Outra inovação foi a criação do aplicativo Dicas
de Tecnologia com Fernando Lemos. Para baixar
o aplicativo na loja da Apple ou na do Google, o
usuário paga R$ 2,99. O conteúdo é gratuito e
está dividido em dez temas (formação, entretenimento, segurança, os melhores apps etc.). Dentro desses temas há vários grupos com dicas rápidas. De acordo com Fernanda, em setembro,
já estava posicionado no 222º lugar no ranking
dos aplicativos mais baixados no Google.
www.tecnologiaparatodos.com.br
ARede especial novembro 2014
37
Setor Privado | Serviços aos usuários e à comunidade
A saúde vencendo
distâncias
Parceria entre Cisco, Universidade Federal
de Sergipe e governo do estado aproxima médicos
especialistas da capital a pediatras regionais.
Áurea Lopes
Sergipe é palco de uma experiência em tele-
medicina capaz de levar medicina especializada a comunidades distantes. Vencedor do
Prêmio ARede 2014, o projeto tocado pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) e a fabricante de equipamentos de telecomunicações
Cisco, batizado de Programa Avançado de Colaboração e Educação em Saúde, está proporcionando atendimento pediátrico por telemedicina
e telepresença em duas cidades do estado. As
clínicas de saúde da família das cidades de Lagarto e Tobias Barreto são conectadas a hospitais e especialistas de Aracaju, capital do Estado, e de São Cristovão, onde há um campus da
UFS. Desde fevereiro, foram realizados cerca
de 80 atendimentos virtuais por mês.
O projeto faz parte do programa global de
responsabilidade social da Cisco Connected
Healthy Children e combina os esforços da
universidade e dos prestadores de assistência
médica nos municípios envolvidos. Tem o apoio
também do governo do estado, do Ministério da
Saúde e das prefeituras e secretarias de saúde
das duas cidades. A Cisco doou os aparelhos e
os softwares. São utilizadas a videoconferência
Cisco TelePresence e tecnologias de colaboração baseadas em rede, como Show and Share, WebEx e Jabber. A empresa forneceu ainda
duas unidades móveis, que podem ser levadas
para salas de aula, leitos hospitalares ou para
casas de pacientes. São carrinhos com a solução de telepresença e com entradas para dispositivos móveis como tablets e celulares, ou
equipamentos os médicos com conexão digital.
38
www. arede.inf.br
Lagarto é a terceira maior cidade do Sergipe,
com cerca de 100 mil habitantes. Apesar do tamanho, a cidade tem uma séria deficiência na
área de saúde. Para lá, foram enviados dez profissionais do programa Mais Médicos, de acordo com a secretária municipal de Saúde, Tânia
Cristina Prado Corrêa. Antes do projeto, a rede
pública tinha apenas três pediatras para um contingente de cerca de 25 mil crianças até 14 anos.
Cada um atendia onze meses por ano. No mês
de férias, as consultas eram suspensas. A falta
de especialistas se estende por uma longa lista
de áreas médicas. Nesses casos, assim como
em ocorrências que exigem intervenção mais
complexa, os pacientes são transportados para
Aracaju. Na clínica de Lagarto, a diretora contabilizava uma média de dez viagens por semana.
Foco na pediatria
A telemedicina vem sendo usada justamente
para sanar essas dificuldades. O foco inicial é
a pediatria. Os equipamentos instalados conectam médicos e pacientes, em tempo real, com
imagem em alta definição. O médico generalista
da clínica de Lagarto pode, por exemplo, fazer
uma consulta em conjunto com um especialista de Aracaju, que interage com o paciente por
telepresença.
O médico remoto pode compartilhar com o colega local a visualização de exames e ter acesso
ao estetoscópio digital acoplado ao equipamento da clínica, durante o exame do médico local
ao paciente. O generalista fica encarregado
também de focalizar ferimentos, por exemplo,
Fotos: Divulgação
para que o especialista veja ampliado e em detalhes, 78 quilômetros longe dali. E se o especialista não estiver em um dos campi da UFS,
poderá se conectar ao sistema por computador,
tablet ou celular. Os profissionais foram capacitados para operar os equipamentos e trabalhar
com os softwares e com o banco de dados que
vai suportar os aplicativos de gestão e análise de
informações.
O projeto começou este ano. A proposta é utilizar a solução em três frentes: para diagnósticos colaborativos, com os especialistas da
universidade trabalhando em conjunto com os
generalistas locais; para promover a troca de
conhecimentos entre profissionais da capital e
do interior; para a produção e a distribuição de
conteúdos de saúde. Além de criar uma alternativa para atenuar gargalos cotidianos, como o
transporte de pacientes para a capital.
O professor da UFS Mario Adriano dos Santos,
um dos responsáveis pela iniciativa, acredita
que, nas consultas, a sensação de telepresença
pode fazer toda a diferença. No programa federal Telessaúde, compara ele, as câmaras são
de baixa resolução, a conexão não é alta e os
hardwares são limitados. Ele explica que serão
monitorados dados como a quantidade de saídas evitadas, número de aulas que as crianças
perderiam com os deslocamentos, redução de
gastos públicos. “Acima de tudo, vamos verificar
qual o ganho de qualidade de vida nos casos de
crianças com doenças crônicas”, acrescenta.
Salas com
equipamentos de
videoconferência
e telemedicina
são instaladas
nos hospitais
e nos campi
da UFS
O projeto deu tão certo que as parcerias com a
Cisco e com o governo do estado foram ampliadas. A empresa cedeu mais 50 licenças para
uso do software, enquanto o governo financiará
a instalação de mais salas em outros municípios. “A ideia é ampliar para mais 50 cidades,
mas depende de infraestrutura local, como pessoal, médicos e conectividade nas unidades. A
gente quer as novas unidades funcionando já
no primeiro trimestre”, afirma Santos. O foco
em pediatria permanecerá.
ARede especial novembro 2014
39
Fotos: Divulgação
Setor Privado | Tecnologia para acessibilidade
Informações que libertam
Portal especializado oferece conteúdos e serviços
que incluem pessoas com deficiência no mundo digital
e melhoram suas vidas no mundo reAl
Áurea Lopes
Além de superar os traumas de suas histó-
rias de vida, pessoas com deficiência precisam
fazer enormes esforços para se adaptar a um
mundo que ainda não está plenamente preparado para elas. A consciência da sociedade
e as políticas públicas referentes a esse tema
se ampliam a cada dia, é verdade. Mas ainda
existem muitas limitações à locomoção e à integração de quem não é capaz de andar, ou de
enxergar, ou de ouvir, entre outras funções humanas básicas. “Tem gente que não sai de casa
por causa de um problema físico. E a tecnologia
pode fazer toda a diferença para essa pessoa”,
diz a jornalista Simone Nunes Freire, diretora da
agência de comunicação digital Espiral Interativa, empresa responsável pelo portal Vida Mais
Livre, vencedor o Prêmio ARede 2014.
A iniciativa foi idealizada por Simone quando ela decidiu trocar sua carreira na grande
imprensa por um negócio próprio. “Tinha em
mente elaborar um projeto paralelo, de cida40
www. arede.inf.br
dania. Então fiz uma análise dos segmentos,
das demandas sociais, para ver onde poderia
fazer algo que fosse mais útil e acabei me deparando com a questão da deficiência”, conta a dona da Espiral, inaugurada em 2009.
Lançado pouco depois, em fevereiro de 2010,
o Vida Mais Livre é um dos poucos sites do país
focado especialmente em conteúdos especializados em todas as modalidades de acessibilidade. Foi totalmente desenvolvido pela equipe
da agência.
Tem dois colaboradores exclusivos e conta com
o apoio de programadores a jornalistas da Espiral que dedicam parte do seu tempo na agência
para o portal. O site atende, desde a arquitetura
da informação até as linhas de código, aos critérios da W3C – principal organização de padronização da web. Pessoas com deficiência visual
podem ouvir as reportagens com ajuda dos leitores de tela, surdos podem ler transcrições de
conteúdos em áudio e vídeo. Há ainda recursos
de zoom de tipografia, navegação por meio do
teclado e contraste de cores para daltônicos e
pessoas com dificuldades de leitura.
O portal oferece diversos conteúdos, presta serviços e dá voz aos usuários em diversos canais:
noticiário com produção própria, entrevistas,
artigos, agenda com dicas culturais e de formação, vídeos, áudios, troca de experiências, denúncias de violação aos direitos dos deficientes,
fóruns para debates. Desde 1º de fevereiro de
2010, quando entrou no ar, até o final de outubro de 2014, a página contabilizou 1 milhão e
55 mil acessos únicos. Foram 1 milhão e 300
visitantes, que fizeram 2 milhões e 100 mil visualizações de páginas. A divulgação é feita exclusivamente pelas redes sociais e pelas indicações de quem acompanha o portal.
Dede o início, o Vida Mais Livre procurou se fundamentar no que havia de mais atual e nas tendências mais inclusivas de acessibilidade, conta
Simone. Por isso, assim que sua ideia foi para
o papel, ela buscou aprofundar o conhecimen-
to em uma das mais respeitadas instituições do
setor, o Instituto Mara Gabrilli. “Eles adoraram a
proposta, nos acolheram e nos ampararam em
tudo... consultoria técnica, legislativa, apoio institucional”, diz Simone. A parceria dura até hoje.
O Mara Gabrilli tem uma forte produção de materiais especializados, como cartilhas, audiovisuais.
Camila Benvenuto, coordenadora institucional do
instituto, ressalta a importância do papel do Vida
Mais Livre ao ampliar e disseminar essas informações: “Os deficientes hoje têm muitos desafios pela frente, nas questões de infraestrutura,
transporte, atendimento médico. Mas a maior
necessidade, de longe, é de informação. Muita
coisa poderia ser feita de forma melhor, com mais
benefícios para os deficientes e isso não acontece por pura falta de informação!”, alerta Camila.
Em 2012, concorrendo com 23 finalistas, o portal
ganhou o prêmio Todos@web – 1º Prêmio Nacional de Acessibilidade, na categoria WebSite externo, promovido pelo W3C Escritório Brasil.
www.vidamaislivre.com.br
Um banco de exemplos
inspiradores
No canal Conte sua história, o portal oferece
um espaço para que as pessoas compartilhem
suas experiências “de luta, força e superação”.
Essa ferramenta encorajou, por exemplo, a catarinense Roberta Angeloni de Almeida a dar
seu testemunho, que pode inspirar e confortar outros leitores: “Nasci com má formação
congênita, que incluía fissura lábio-palatina.
Enxergo apenas de um olho, perda total de audição no ouvido esquerdo e no direito escuto
com ajuda de um aparelho auditivo. Apesar
de todos estes percalços da vida, sempre fui
uma criança alegre e divertida. (...) Sempre fui
atrás dos meus objetivos, determinada, persistente, uma pessoa positiva. Gosto de conversar, ouvir. Me formei em nutrição e psicologia.
Atualmente moro em SP e trabalho na área de
Recursos Humanos”.
42
www. arede.inf.br
Outro depoimento espontâneo enviado ao
portal foi de Edvania Almeida: “Sempre fui
uma pessoa independente, e sempre achei
que jamais dependeria de ninguém, até o dia
22/05/2010, dia em que me levantei para ir
para a faculdade e não cheguei lá! Dia em que,
se eu tivesse ficado dormindo, talvez hoje eu
estaria com as minhas duas pernas saudáveis.
Mas... com tudo isso, aprendi que temos que
tirar o “se” de nossas vidas, pois, quando é da
vontade de Deus, nada mudará o destino! Com
a graça de Deus, eu venci uma enorme barreira.
Lógico que “amigos” não faltaram ao meu lado.
Na hora, minha ficha não caiu. O médico entrou
em meu quarto e me disse que a possibilidade de eu voltar a andar era praticamente nula.
E hoje, depois de quase quatro anos passados
de meu acidente, estou em pé, mancando,
mas em pé!”
Download

PDF para baixar